Pescadoras denunciam invasões e falta de apoio

Em 25/04/2025 - 09:04
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COMISSÕES – Debate conjunto pautou políticas públicas e violações de direitos. Foto: Giovanni Costa

A luta por condições dignas de vida e trabalho para pescadoras artesanais em Pernambuco pautou a audiência pública realizada em conjunto pelas comissões de Meio Ambiente e de Cidadania na tarde de quinta (24). As trabalhadoras relataram situações que envolvem problemas e conflitos nos territórios onde atuam, além de questões de saúde e dificuldades burocráticas. 

Leia reportagem especial sobre a pesca artesanal em Pernambuco

Ameaças

A pescadora artesanal aposentada Joana Mousinho, de Itapissuma, na Região Metropolitana do Recife (RMR), ressaltou que 70% dos pescados consumidos pela população vêm da pesca artesanal, mas que a atividade está ameaçada pelo avanço do turismo desenfreado e dos grandes empreendimentos. “Cercas nas águas, muros nas praias, invasão imobiliária, carcinicultura (criação de camarões em cativeiro): nós temos que dar um basta nisso. Queremos territórios livres para manter nossos lares e sustentar nossos filhos, sem estar em porta de prefeitura pedindo cesta básica, porque nós não precisamos fazer isso”, externou. 

ALERTA – Joana Mousinho denunciou avanço de empreendimentos sobre territórios pesqueiros. Foto: Giovanni Costa

O alerta foi reforçado por outras trabalhadoras, como Maria Aparecida Santana, de Jaboatão dos Guararapes, também na RMR. “Quando aterram os rios para os grandes empreendimentos, ficamos impedidas de pescar. Não somos contra o desenvolvimento, mas precisamos ser ouvidas. Nossa opinião não importa e isso é muito triste”, enfatizou. Para Cícera Estevão, de Rio Formoso, na Mata Sul, o poder público também tem responsabilidade na proteção dos territórios da pesca artesanal. “Quem libera essas construções são os nossos governantes, os órgãos competentes. A gente não quer terra ou empreendimento de ninguém, a gente só quer continuar a nossa pesca artesanal botando o pão em nossas mesas”, frisou.

A representante do Conselho Pastoral dos Pescadores e Pescadoras (CPP), Laurineide Santana, também cobrou ações mais enfáticas. “Esse Estado tem uma lei de pesca no papel, mas na prática não tem orçamento, não tem políticas públicas definidas. Esse modelo de desenvolvimento não é de inclusão, é de exclusão e é de morte”, pontuou.

Diversas pescadoras ainda relataram que enfrentam dificuldades burocráticas para tirar o Registro Geral da Atividade Pesqueira (RGP) e entrar no Sistema PesqBrasil pela plataforma Gov.br, que exige nível prata ou ouro para acesso. É através desse sistema que se obtém a Licença de Pescador e Pescadora Profissional, que precisa ser renovada anualmente. 

Outras demandas, como questões de saúde, direito à aposentadoria e necessidade de programas de incentivo para jovens pescadores, também foram apresentadas.

Respostas

Representantes dos governos federal e estadual responderam aos questionamentos. O porta-voz da Secretaria Nacional da Pesca Artesanal, do Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA), Diogo Nunes, lembrou que as ações voltadas à pesca artesanal no Brasil foram retomadas somente no atual governo, já que a pasta havia sido extinta em 2016. Ele ressaltou que o MPA conta com um orçamento pequeno, de R$ 273 milhões.

GESTÃO – Diogo Nunes, do Ministério da Pesca, apresentou ações do Governo Federal como a política nacional. Foto: Giovanni Costa

“É muito pouco, somos o terceiro ministério com o menor orçamento da Esplanada, e a gente não consegue fazer uma política com respostas imediatas sem orçamento”, salientou. 

Mas destacou que a pasta tem concentrado esforços na instituição da Política Nacional da Pesca Artesanal para os próximos 10 anos, com a realização de plenárias regionais e, em agosto deste ano, da plenária nacional, para a consolidação do documento final. 

Nunes ainda afirmou que o Ministério tem se colocado contrário a políticas que causam a destruição dos territórios de pesca, como a privatização das praias e a energia eólica marítima. Ele acrescentou a necessidade de encaminhar o PL nº 131/2020, para a demarcação de territórios pesqueiros no Brasil. Também registrou que foi criada uma força-tarefa para zerar a fila do cadastro do RGP em até 90 dias. 

Para atender a demandas de saúde, frisou que foi firmada uma parceria com o Ministério da Saúde e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) a fim de desenvolver um curso de agentes populares de saúde para o atendimento especializado às mulheres pescadoras. Por fim, destacou a criação de um programa de bolsas de pesquisas para jovens do ensino médio na área da pesca artesanal.

O representante do Governo de Pernambuco, Josimar Gurgel, destacou ações de assistência técnica que visam facilitar o acesso de pescadores a linhas de crédito específicas do governo federal, realizado com intermédio do Instituto Agronômico de Pernambuco (IPA). Também falou de parcerias com o MPA para ampliar o mapeamento de territórios pesqueiros e para a aquisição e distribuição de equipamentos de pesca para colônias de pescadores. “O Estado reconhece a importância da atividade, e com essa união entre o setor produtivo e as esferas governamentais vamos avançar nesse processo”, garantiu.

Encaminhamentos

Entre os encaminhamentos da reunião, a presidente da Comissão de Cidadania, Dani Portela (PSOL) solicitou a apresentação de prazos, pelo MPA, para a correção dos problemas apresentados na plataforma PesqBrasil, com o atendimento imediato de pescadores que não têm cadastro. A parlamentar ainda disse que irá solicitar ao Ministério Público de Pernambuco a apuração de denúncias de assédio e intimidação contra pescadores e pescadoras.

CIDADANIA – Dani Portela solicitou apuração de denúncias e defendeu orçamento para efetivar políticas públicas do setor. Foto: Giovanni Costa

“A gente não tem como valorizar o trabalho das pescadoras sem orçamento e sem políticas públicas efetivas. Se organizar para lutar por direitos é também se organizar para lutar pela defesa dos territórios e das nossas águas”, pontuou.

Já a presidente da Comissão de Meio Ambiente, Rosa Amorim (PT), encaminhou, entre outras demandas, a elaboração de uma política de saúde específica para as pescadoras e a criação de novas reservas extrativistas, além do fortalecimento das que já existem. Também solicitou do Governo do Estado a distribuição de itens como protetor solar e camisas com proteção UV. Por fim, destacou a necessidade de lutar pela proteção dos territórios de pesca que vêm sendo invadidos e destruídos de forma crescente.

MEIO AMBIENTE – Rosa Amorim defendeu a criação de novas reservas extrativistas e políticas de saúde. Foto: Giovanni Costa

“Temos um desafio enorme contra os grandes empreendimentos que invadem os territórios e impactam diretamente a vida nas comunidades, e o resultado é a vulnerabilidade principalmente das mulheres e jovens”, ressaltou. “Vamos fazer um acompanhamento assíduo de todos os encaminhamentos que fizemos aqui”, finalizou. 

Também presente na reunião, o deputado João Paulo (PT) defendeu a ampliação das ações voltadas à comunidade pesqueira, especialmente para as mulheres. “A luta é grande e vocês podem contar conosco para que possam ter trabalho e recursos para viver dignamente com suas famílias”, afirmou.