
PAUTA – Audiência pública cobrou efetivação de políticas de proteção às mulheres. Foto: Giovanni Costa
Entre janeiro e abril deste ano, 35 mulheres foram assassinadas em virtude do gênero em Pernambuco. No mesmo período de 2024, haviam sido 27. Só em fevereiro, enquanto os homicídios apresentaram redução superior a 15%, o número de feminicídios foi mais do que o dobro do registrado no ano passado. Os dados são da Secretaria de Defesa Social do estado. O aumento dos índices de violência letal contra mulheres motivaram audiência pública em conjunto das Comissões de Defesa dos Direitos da Mulher e de Cidadania nesta terça (6).
O objetivo do encontro foi debater políticas públicas de combate à violência de gênero. A iniciativa partiu de uma provocação da Campanha Levante Feminista contra o Feminicídio, o Lesbocídio e o Transfeminicídio, que reúne 64 organizações de defesa dos direitos das mulheres em Pernambuco. Representante do coletivo, a educadora popular Rosimere Nery apresentou um número ainda maior de feminicídios. Segundo ela, já foram 43, em 2025.

CAMPANHA – Rosimere Nery fez apelo por reforço na estrutura de enfrentamento ao feminicídio. Foto: Giovanni Costa
Rosimere cobrou do Governo de Pernambuco a efetivação das políticas estaduais de enfrentamento ao feminicídio e de proteção e atenção integral aos órfãos e órfãs do feminicídio, previstas em leis de 2022, originadas de projetos do deputado William Brigido (Republicanos) e da deputada Delegada Gleide Ângelo (PSB), respectivamente.
Ela apresentou um diagnóstico da rede de apoio destinada às mulheres em situação de violência no estado. “São apenas 30 centros de referência de atendimento e 15 delegacias de mulheres. E dessas delegacias, apenas cinco funcionam 24 horas, num estado que tem 185 municípios”, registrou. “Três casas da mulher brasileira foram prometidas e ainda não cumpridas. E a legislação também não é cumprida”, salientou Rosimere.

ASSISTÊNCIA – Delegada Gleide Ângelo defendeu rede de proteção integrada. Foto: Giovanni Costa
A importância de uma rede de proteção integrada, que envolva diversos serviços públicos, foi o principal ponto abordado na audiência. Além do trabalho da polícia, a deputada Delegada Gleide Ângelo, que preside a Comissão da Mulher, reforçou a importância das assistências psicológica, jurídica e social.
“São necessárias muitas engrenagens para fazer a proteção funcionar. A roda não está funcionando, porque a gente não tem um plano de segurança para as mulheres pernambucanas. Quando a mulher sai de uma delegacia, ela tem que saber que precisa entrar numa rede de proteção. E essa rede é pelos municípios, na maioria das vezes”, considerou a parlamentar.
Na avaliação da delegada Bruna Falcão, gestora do Departamento de Polícia da Mulher, as mulheres que entram na rede de proteção têm a vida preservada. “Das 77 vítimas de feminicídio em Pernambuco no ano passado, apenas 11 tinham feito registro de ocorrência anteriormente contra o agressor. Não é só com polícia que vamos erradicar isso. É preciso fortalecer todos os equipamentos”, ressaltou.
Segundo a delegada, dados do Senado indicam as estimativas de subnotificação: 61% das vítimas do Brasil não fazem registro da violência que sofreram. A deputada Socorro Pimentel (União), líder do Governo na Alepe, reforçou a importância de denunciar a violência. “É preciso uma conscientização coletiva, de nós mulheres, para que diante de qualquer tipo de violência – seja patrimonial, física, psicológica – haja a denúncia do agressor. As estatísticas ainda são muito baixas perto da realidade enfrentada pelas mulheres”, pontuou.
Casas-abrigo
Também marcaram o debate as denúncias de problemas na administração das casas-abrigo, destinadas ao acolhimento temporário de mulheres em situação de violência doméstica e familiar. A presidente da Comissão de Cidadania, deputada Dani Portela (PSOL), lembrou que desde 2023 a questão tem sido apontada.

PROBLEMAS – Dani Portela relatou denúncias e questionou execução orçamentária. Foto: Giovanni Costa
“Há um descaso do poder público de Pernambuco com as casas-abrigos. Já provocamos 13 órgãos e, mais de um ano e meio depois, não temos respostas. Há relatos de mulheres abrigadas que sofreram revitimização nesses espaços, passaram fome. E filhos também abrigados que sofreram maus tratos. Nem nesse lugar as mulheres estão seguras”, lamentou a parlamentar.
O promotor de Justiça Westei Conde informou que está acompanhando o caso, que segue em sigilo. “Precisamos ser responsáveis na divulgação do que tem sido constatado, porque pode ser um fator de inibição para outras mulheres que precisem recorrer às casas-abrigo. No momento oportuno as informações virão a público, junto com as medidas adotadas sobre as irregularidades”, comunicou.
A diretora de Enfrentamento à Violência de Gênero da Secretaria Estadual da Mulher, Walkiria Alves, representou o Governo do Estado. A gestora anunciou que foi realizada a requalificação dos espaços, com afastamento de funcionários e ampliação da equipe. “Até o dia 20 de abril, eram 160 abrigados, entre mulheres e crianças. O serviço está funcionando e, desde que ele foi criado, nenhuma mulher que passou pela proteção foi vítima de feminicídio. A mulher fica, sim, mais protegida”, garantiu.
Orçamento
Dani Portela fez questionamentos relacionados aos recursos públicos voltados a políticas para as mulheres. De acordo com a parlamentar, o Governo anunciou uma meta de redução de 30% nos índices de violência contra a mulher até 2026. “Quais as principais ações e quanto foi investido em 2024 para alcançar essa meta?”, indagou.
Ela ainda destacou ações previstas na Lei Orçamentária Anual (LOA) do último ano que não foram executadas, de acordo com o Portal da Transparência. “Dos R$ 2 milhões previstos para a prevenção à violência de gênero, foram aplicados R$ 74 mil. E, dos R$ 505 mil destinados à ampliação da estrutura de proteção a mulheres em situação de violência, nem um real foi investido. Se a gente prioriza a mulher, isso tem que estar no orçamento”, afirmou a deputada.

RECURSOS – Walkiria Alves, da Secretaria da Mulher, registrou ampliação do financiamento. Foto: Giovanni Costa
Walkiria Alves informou que o orçamento da Secretaria da Mulher saltou de R$ 26 milhões para R$ 85 milhões, entre 2024 e 2025. Ela destacou o fortalecimento dos organismos que atuam nos municípios. “Nós sabemos que muitas vezes não há sequer mesa para realizar esse trabalho. Uma das prioridades desse incremento da verba foi estruturar a atuação nos municípios. Todos os organismos de política pública para mulheres estão recebendo mobília e, no segundo semestre, um carro”, frisou a diretora.
A necessidade de atenção à diversidade das mulheres em situação de violência também foi apontada. Muitos participantes cobraram do Governo informações detalhadas sobre os indicadores de violência contra mulheres negras, transexuais e travestis, e informações sobre os órfãos de feminicídios.
O encontro contou com a presença de coletivos feministas de diversas regiões de Pernambuco e de familiares de vítimas de feminicídio. Ainda participou da audiência a coordenadora do Núcleo de Defesa da Mulher da Defensoria Pública de Pernambuco, Débora Andrade, além do deputado Junior Matuto(PSB) e da vereadora do Recife Kari Santos (PT).