A Comissão de Cidadania da Alepe promoveu, nesta segunda (3), uma audiência pública para debater os conflitos territoriais e ambientais na Zona Especial de Interesse Social (Zeis) Muribeca, localizada no município de Jaboatão dos Guararapes, na Região Metropolitana do Recife. A área enfrenta alagamentos e riscos de remoções de moradores, além de dificuldades cotidianas de acesso à água potável, saneamento básico e coleta de lixo.
Durante o encontro, organizações da sociedade civil denunciaram que empresas privadas têm promovido desvios de rios e aterros irregulares, aumentando os riscos ambientais na região do Baixo Jaboatão, que já é particularmente suscetível a enchentes. Essas medidas têm aumentado ainda mais o temor de inundações como as de maio de 2022, que deixaram 129 mortos no Grande Recife, sendo 64 em Jaboatão.
Fiscalização
Representante da organização Somos Todos Muribeca, Marcelo Trindade expôs as dificuldades enfrentadas pela população local no acesso a serviços básicos e cobrou medidas efetivas do poder público, especialmente dos órgãos de fiscalização ambiental. “Onde está a gestão pública? Quem está deixando essas obras acontecerem sem fiscalização, sem um projeto de proteção aos comerciantes e moradores locais? Cadê a CPRH? Cadê o Ibama?”, questionou.
A urbanista Manoela Jordão, do Centro Popular de Direitos Humanos (CPDH), chamou a atenção para o desvio do curso do canal Mariana, aproximando da comunidade o curso da água. De acordo com ela, o empreendimento não possui estudo de impacto ambiental ou licenciamento adequado e, num inquérito civil do Ministério Público, os moradores são apontados como culpados pelas inundações. “Chama a atenção a total e completa falta de comprometimento dessas empresas em entender quais eram os impactos desses empreendimentos para a comunidade”, assinala.
O debate foi solicitado pelo deputado João Paulo (PT), que lamentou a falta de diálogo do poder municipal com os moradores da Muribeca. “A comunidade não foi ouvida até agora. Sem sombra de dúvida, isso já é um grande empecilho. Vamos pressionar para que o Estado como todo, mas principalmente a Prefeitura, possa cumprir o seu papel”, acentuou o petista.
Entre os encaminhamentos, serão encaminhados pedidos para que CPRH e Ministério Público prestem informações e ampliem a fiscalização na região. Também foi acatada a proposta de leis com punições mais duras para empresas que violem normas ambientais. A Comissão de Cidadania ainda pretende fazer uma visita ao local.
Racismo
De acordo com a presidente do colegiado, deputada Dani Portela (PSOL), será defendida a elaboração de planos municipais de saneamento e drenagem ao longo do processo de revisão do plano diretor de Jaboatão. O grupo parlamentar vai se reunir com as defesas civis estadual e municipal para que apresentem planos de contingência em caso de enchentes.
A parlamentar do PSOL considerou a Zeis Muribeca um exemplo de racismo ambiental e denunciou os problemas de saúde ocasionados pela falta de acesso à água potável e saneamento básico. “Por falta de regulamentação fundiária, a população tem enfrentado conflitos territoriais e impactos dos interesses econômicos. A especulação imobiliária vem avançando e visa, no final, afastar de lá as pessoas que sempre viveram e construíram suas histórias naqueles territórios”, afirmou.
Os deputados Renato Antunes (PL) e Nino de Enoque (PL) defenderam a conclusão da barragem do Engenho Pereira como uma alternativa para os problemas de alagamentos na região. A obra está paralisada desde 2014.
Município
O secretário-executivo de Saneamento de Jaboatão, Alex Ramos, apresentou medidas tomadas pela Prefeitura, como a requalificação de canais (com limpeza e desassoreamento), ao custo de R$ 400 milhões. O gestor apontou a necessidade, porém, do aumento do nível dos terrenos para construção. “O plano diretor, em sua narrativa, informa em diversos momentos que a solução para aquela região é a elevação da cota de assentamento daqueles que ali residem ou irão se estabelecer”, disse.
A superintendente de Habitação de Jaboatão, Ana Catarina Maranhão, informou que a Prefeitura está realizando um programa de regularização fundiária para 700 unidades habitacionais no entorno do conjunto Muribeca.
“Se houver necessidade da retirada de Sapolândia, que é uma situação crônica, está sendo vista com as autoridades federais a construção de unidades do Minha Casa Minha Vida para realocação da comunidade em um local próximo, para que não fiquem fora do seu contexto social”, emendou.
A audiência pública ainda teve a participação da Defensoria Pública do Estado de Pernambuco e do ex-prefeito de Jaboatão, Elias Gomes. O Governo do Estado e o Ministério Público de Pernambuco foram convidados, mas não compareceram ao debate.