
ENCONTRO – Lideranças religiosas fizeram questionamentos e sugestões ao texto original da proposição. Foto: Sabrina Nóbrega
Um grupo de trabalho com representantes de diferentes credos vai debater alterações na proposta de criação do Estatuto Estadual da Liberdade Religiosa ( Projeto de Lei nº 1773/2018). O encaminhamento foi anunciado nesta quarta (15), durante audiência pública da Comissão de Cidadania da Alepe sobre o tema. No encontro, lideranças religiosas fizeram questionamentos e sugestões ao texto apresentado pelo deputado Henrique Queiroz (PR).
A matéria já foi distribuída na Comissão de Justiça, sendo que o relator, deputado Edilson Silva (PSOL), que também é o presidente da Comissão de Cidadania, fez um pedido de vista. De acordo com o parlamentar, a audiência pública foi convocada para que o tema seja melhor discutido com a sociedade. “Estamos iniciando o processo de diálogo. Esse estatuto precisa estar de acordo com a legislação federal e com a nossa realidade local. O grupo de trabalho vai analisar a construção de emendas ou de um substitutivo, e fará a mobilização política”, acentuou o deputado.

EDILSON – “Estatuto precisa estar de acordo com a legislação federal e com a nossa realidade local”. Foto: Sabrina Nóbrega
Mãe Jane de Oyá contou que a casa dela foi invadida e falou sobre o componente racial nos casos de intolerância religiosa. “Quem construiu as igrejas e os palácios do governo não foram os brancos”, expressou a professora de História. “O Brasil atravessa um período em que as liberdades religiosas não são respeitadas como deveriam e como preconiza a Constituição Federal. Precisamos trazer a pauta das liberdades em geral e da religiosa, de maneira especial, pois a diversidade é uma marca do País e um valor civilizatório”, agregou Mãe Vera Baroni, fundadora da Sociedade das Mulheres Negras de Pernambuco.
Frei Anderson Ruan Soares, da Igreja Católica Tradicionalista do Brasil, relatou casos de pedradas em procissões públicas. O pai de santo e babalorixá Edson de Omolu, da Tenda de Umbanda e Caridade Caboclo Flecheiro, defendeu que, no texto do projeto, o termo “incômodo” seja substituído por “violação de direitos” e que os dispositivos passem a falar de racismo religioso. “Esse estatuto abre brechas para que as violações continuem acontecendo, na forma da lei”, alertou. Ele ainda citou o Artigo 12, que fala em assegurar às populações indígenas e comunidades tradicionais o direito de mudar de religião.

RACISMO – Mãe Jane de Oyá falou sobre componente racial nos casos de intolerância religiosa. Foto: Sabrina Nóbrega
Para Alexandre L’Omi L’Odò, da Jurema, o documento não leva em conta o Decreto nº 6.040/2007, da Presidência da República, que institui a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais, além de desconsiderar as políticas públicas construídas com o povo de terreiro.
O sociólogo Joanildo Burity, pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj) e praticante da religião anglicana, a proposta de estatuto não traz inovações jurídicas e, contraditoriamente, regula a liberdade, em vez de favorecer a livre organização religiosa. “É um documento defeituoso”, avaliou. A professora de Direito Ciani Sueli das Neves denunciou o uso de meios de comunicação por igrejas evangélicas neopentecostais para demonizar as religiões de matriz africana. Para ela, falta, no projeto, um dispositivo que impeça o proselitismo religioso em espaços públicos.