
PROJETO DE LEI ORDINÁRIA 730/2023
Altera a Lei nº 14.789, de 1º de outubro de 2012, que institui, no âmbito do Estado de Pernambuco, a Política Estadual da Pessoa com Deficiência, a fim de classificar como deficiência auditiva a surdez unilateral.
Texto Completo
Art. 1º A Lei nº 14.789, de 1º de outubro de 2012, passa a vigorar com o seguinte acréscimo:
“Art. 2º......................................................................................................................
.................................................................................................................................
b) deficiência auditiva: perda unilateral (parcial ou total) e bilateral (parcial ou total), de quarenta e um decibéis (dB) ou mais, aferida por audiograma nas frequências de 500Hz, 1.000Hz, 2.000Hz e 3.000Hz. (NR)
.................................................................................................................................”
Art. 2º Caberá ao Poder Executivo regulamentar a presente Lei em todos os aspectos necessários para a sua efetiva aplicação.
Art. 3º Esta Lei entrará em vigor na data da sua publicação.
Justificativa
A deficiência auditiva unilateral caracteriza-se pela presença do sentido auditivo por apenas um dos ouvidos, o que limita sensivelmente a capacidade sensorial, prejudicando a capacidade plena de interação pessoal com o seu ambiente, causando limitações em diversas vertentes cognitivas, como a noção precisa de direcionamento do som percebido, a diminuição da qualidade do som obtido pelo ouvido ouvinte, posto que é usual o enfrentamento das barreiras físicas, muitas vezes do próprio corpo, para a melhor compreensão do que foi dito.
Uma grande barreira que afeta diretamente a perfeita compreensão pelo sistema sensorial responsável é o excesso de ruídos existentes no ambiente entre a pessoa emissora do som e o receptor surdo unilateral, dado que tais interferências tornam ainda mais difícil a compreensão da fala humana para o deficiente auditivo unilateral, sendo necessário o total controle dos sons ambientais para o exercício pleno da conversa.
A pessoa com deficiência unilateral enfrenta algumas situações em relação ao ouvinte de ambos os ouvidos, tais como: não percepção da localização da fonte sonora, a própria cabeça da pessoa com a deficiência unilateral tornasse-se obstáculo a ser contornado, para ouvir o som, para entender a fala em ambiente barulhento requer sofisticado sistema de processamento neurológico.
Além dos pontos acima citados, temos também que grande parte dos surdos unilaterais possuem a presença constante de Tinnitus, definido pela ciência como “zumbido”, o qual é capaz de causar diversos outros problemas de saúde, como sonolência, problema de audição, desespero, frustração, depressão, dor de cabeça, dificuldade de concentração, aborrecimento e irritação com facilidade, e Hyperacusis (situação em que a alta frequência do som pode causar dor). Definição dada pelo Portal Hear-It, disponível em <https://www.hear-it.org/pt/consequencias>.
No Brasil, desde que instituída a primeira definição legal de deficiente, o texto passou a ser entendido e compreendido como favorável aos deficientes auditivos unilaterais, definindo deficiência auditiva como:
Decreto 3.298 de 20 de dezembro de 1999: (REDAÇÃO NÃO VIGENTE)
Art. 4º É considerada pessoa portadora de deficiência a que se enquadra nas seguintes categorias:
II - deficiência auditiva – perda parcial ou total das possibilidades auditivas sonoras, variando de graus e níveis na forma seguinte:
a) de 25 a 40 decibéis (db) – surdez leve;
b) de 41 a 55 db – surdez moderada;
c) de 56 a 70 db – surdez acentuada;
d) de 71 a 90 db – surdez severa;
e) acima de 91 db – surdez profunda; e
f) anacusia; (Surdez Total)
Conforme interpretação vigente à época, o termo “das possibilidades auditivas” deixava claro a grande abrangência que a Lei se propôs a ter, sendo a unilateralidade desta deficiência uma das contempladas.
A partir de 2004, o Decreto 5.296 de 02 de dezembro de 2004 mudou o texto do decreto anterior, passando o mesmo a vigorar com a seguinte redação:
Decreto 3.298 de 20 de dezembro de 1999: (REDAÇÃO VIGENTE)
Art. 4º É considerada pessoa portadora de deficiência a que se enquadra nas seguintes categorias:
II - deficiência auditiva - perda bilateral, parcial ou total, de quarenta e um decibéis (dB) ou mais,
aferida por audiograma nas frequências de 500HZ, 1.000HZ, 2.000Hz e 3.000Hz;
(Redação dada pelo Decreto nº 5.296, de 2004)
Com isto, vimos a terminologia “das possibilidades auditivas” ser suprimida, deixando os surdos unilaterais desprotegidos, sem direito claro, fazendo com que estes passassem a judicializar seus direitos, os quais gozavam de forma plena anteriormente.
Assim, após reiteradas decisões judiciais sobre a matéria, onde nem sempre eram favoráveis, o Superior Tribunal de Justiça passou a sumular, negando o direito dos Surdos Unilaterais à definição de deficiência, ipsen litere:
SÚMULA 552 – STJ
O portador de surdez unilateral não se qualifica como pessoa com deficiência para o fim de disputar as vagas reservadas em concursos públicos.
Com isto, o anseio por um aparato jurídico garantidor é renovado, mobilizando os surdos unilaterais e dando um novo fôlego ao Projeto de Lei n° 7.699/06, que detinha o nome de “Estatuto do Portador de Deficiência”, e foi aprovado como “Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência”, o qual foi impulsionado e aprovado.
Frisa-se que a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência – LBI, tinha como texto original (quando Projeto de Lei) a seguinte definição:
PROJETO DE LEI 7699/2006
Art. 2º Considera-se deficiência toda restrição física, intelectual ou sensorial, de natureza permanente ou transitória, que limita a capacidade de exercer uma ou mais atividades essenciais da vida diária e/ou atividades remuneradas, causada ou agravada pelo ambiente econômico e social, dificultando sua inclusão social, enquadrada em uma das seguintes categorias:
II - deficiência auditiva:
a) perda unilateral total;
b) perda bilateral, parcial ou total média de 41 dB (quarenta e um decibéis) ou mais, aferida por audiograma nas freqüências de 500HZ, 1.000HZ, 2.000Hz e 3.000Hz;
Assim, vemos uma clara intenção do legislador em incluir os surdos unilaterais no rol dos classificados como deficientes, porém, quando aprovado, buscando adotar uma definição mais moderna para deficiência, bem como, ajustar tal definição baseado nas limitações sociais do indivíduo, a LBI trouxe o seguinte texto:
LEI Nº 13.146, DE 6 DE JULHO DE 2015
Art. 2º Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
§ 1º A avaliação da deficiência, quando necessária, será biopsicossocial, realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar e considerará: (Vigência) (Vide Decreto nº 11.063, de 2022)
I - os impedimentos nas funções e nas estruturas do corpo;
II - os fatores socioambientais, psicológicos e pessoais;
III - a limitação no desempenho de atividades; e
IV - a restrição de participação.
§ 2º O Poder Executivo criará instrumentos para avaliação da deficiência. (Vide Lei nº 13.846, de 2019) (Vide Lei nº 14.126, de 2021)
Com tal redação, não ficam dúvidas de que sob o prisma da Lei Brasileira de Inclusão, o surdo unilateral seja considerado pessoa com deficiência, pois conforme já vimos em seu artigo segundo:
“Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.”
Aliás, há de se ressaltar o Estatuto da Pessoa com Deficiência é a eliminação de barreiras que dificultem qualquer tipo de acesso para as pessoas com deficiência, conforme consta em seu art. 3º:
LEI Nº 13.146, DE 6 DE JULHO DE 2015
Art. 3º Para fins de aplicação desta Lei, consideram-se:
[...]
IV - barreiras: qualquer entrave, obstáculo, atitude ou comportamento que limite ou impeça a participação social da pessoa, bem como o gozo, a fruição e o exercício de seus direitos à acessibilidade,
à liberdade de movimento e de expressão, à comunicação, ao acesso à informação, à compreensão, à circulação com segurança, entre outros,
................................................................................................................
e) barreiras atitudinais: atitudes ou comportamentos que impeçam ou prejudiquem a participação social da pessoa com deficiência em igualdade de condições e oportunidades com as demais pessoas;
Dessa forma, há muito tempo os surdos unilaterais já deveriam estar em pleno gozo de seus direitos, entretanto, o que se vê, são os reiterados atos administrativos denegatórios de direitos, não atendendo os ouvintes unilaterais quanto às suas necessidades para a prática total de sua cidadania.
Assim, visto a inércia do Poder Executivo Federal em definir os novos requisitos de avaliação para classificação ou não do ser como deficiente físico, o legislativo federal mostrou mais uma vez sua clara intenção de apontar a esta categoria a compatibilidade com a definição de deficiente, novamente protocolando um projeto de lei a qual garante esta interpretação, in verbis:
PROJETO DE LEI Nº 1.361/2015
Art. 1º Fica estabelecido que deficiência auditiva é a perda unilateral ou bilateral, parcial ou total, de quarenta e um decibéis (dB) ou mais, aferida por audiograma nas frequências de 500HZ, 1.000HZ, 2.000Hz e 3.000Hz.
Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Entretanto, até a presente data, o supracitado projeto de lei ainda não foi aprovado, aguardando análise de seu veto pelo Congresso Nacional.
Em esfera concorrente, os legislativos estaduais já estão agindo contra esta lacuna, apresentando projetos independentes do Legislativo Federal, e garantindo o acesso pleno aos direitos aos que se encontram nesse limbo jurídico, conforme as Casas Legislativas abaixo:
ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE MATO GROSSO:
LEI COMPLEMENTAR N° 114, DE 25 DE NOVEMBRO DE 2002
Art. 4º É considerada pessoa portadora de necessidades especiais a que se enquadra em uma das seguintes categorias:
II - deficiência auditiva: perda parcial ou total das possibilidades auditivas sonoras, variando de graus e níveis na forma seguinte:
a) de 25 a 40 decibéis (db): surdez leve;
b) de 41 a 55 decibéis (db): surdez moderada;
c) de 56 a 70 decibéis (db): surdez acentuada;
d) de 71 a 90 decibéis (db): surdez severa;
e) acima de 91 decibéis (db): surdez profunda; e
f) anacusia;
ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL:
LEI Nº 3.181, DE 21 DE FEVEREIRO DE 2006.
Art. 4º É considerada pessoa portadora de necessidades especiais a que se enquadra em uma das seguintes categorias:
II - deficiência auditiva: perda parcial ou total das possibilidades auditivas sonoras, variando de graus e níveis na forma seguinte:
a) de 25 a 40 decibéis (db): surdez leve;
b) de 41 a 55 decibéis (db): surdez moderada;
c) de 56 a 70 decibéis (db): surdez acentuada;
d) de 71 a 90 decibéis (db): surdez severa;
e) acima de 91 decibéis (db): surdez profunda; e
f) anacusia;
CÂMARA LEGISLATIVA DISTRITO FEDERAL
LEI Nº 4.317, DE 09 DE ABRIL DE 2009
Art. 5º. Para fins de aplicação desta Lei, devem-se considerar as seguintes categorias de deficiência:
II - deficiência auditiva:
a) perda unilateral total;
b) perda bilateral, parcial ou total, de 41 db (quarenta e um decibéis) ou mais, aferida por audiograma nas frequências de 500 Hz (quinhentos hertz), 1.000 Hz (mil hertz), 2.000 Hz (dois mil hertz) e 3.000 Hz (três mil hertz);
c) de 41 a 55 decibéis (db): surdez moderada;
d) de 56 a 70 decibéis (db): surdez acentuada;
e) de 71 a 90 decibéis (db): surdez severa;
f) acima de 91 decibéis (db): surdez profunda; e
g) anacusia;
Conforme já explanado acima, após um longo período de inércia do Legislativo e do Executivo Federal, vários Estados já tomaram iniciativa a fim de garantir os direitos inerentes aos unilaterais, neste sentido, não somente há as Leis estaduais acima já expostas, como também há diversos projetos de leis tramitando nas Assembleias Legislativas de vários Estados, que visam estabelecer os mesmos direitos.
Em Pernambuco, os direitos dos deficientes já são amplamente garantidos, não só reconhecendo e definindo os que podem ser considerados deficientes, mas também instituindo toda uma política de acesso a direitos e serviços disponibilizados pelo Estado.
Entretanto, quando analisamos a Lei nº 14.789/2012, que institui a Política Estadual da Pessoa com Deficiência, a mesma traz consigo uma taxativa definição de quem poderá ser classificado e reconhecido como deficiente, excluindo várias outras possibilidades que também enfrentam as mesmas dificuldades e barreiras, como exemplo, os Surdos Unilaterais.
Vejamos a seguir a redação em vigor:
LEI Nº 14.789, DE 1º DE OUTUBRO DE 2012
Art. 1º Fica instituída, no âmbito do Estado de Pernambuco, a Política Estadual da Pessoa com Deficiência, com fundamento no inciso XIV do art. 24 da Constituição Federal de 1988 e o Decreto Federal 6.949, de 25 de agosto de 2009, que recepciona a Convenção Internacional da Pessoa com Deficiência no ordenamento jurídico brasileiro, bem como na forma especificada nesta Lei.
Parágrafo único. A implantação da Política Estadual da Pessoa com Deficiência referida no caput permitirá a divisão de responsabilidades na configuração de um novo modelo operacional das ações estaduais voltadas para a inclusão das pessoas com deficiência, bem como a negociação das estratégias das mencionadas ações.
Art. 2º Para os efeitos desta Lei, consideram-se:
I - Deficiência - Resulta da interação entre pessoas com deficiência e as barreiras, devido às atitudes e ao ambiente que impedem a plena e efetiva participação dessas pessoas na sociedade em igualdade de oportunidades com as outras pessoas, enquadrando-se nas seguintes categorias:
...............................................................................................................
b) deficiência auditiva: perda bilateral, parcial ou total, de quarenta e um decibéis (dB) ou mais, aferida por audiograma nas frequências de 500Hz, 1.000Hz, 2.000Hz e 3.000Hz;
Assim, percebemos que a supracitada Lei acaba por excluir os surdos unilaterais de sua abrangência, contemplando apenas os bilaterais, sejam este com perdas totais ou parciais. Dessa forma, a fim de garantir os direitos dos surdos unilaterais, como pessoa com deficiência, evitando que o nosso Estado continue sendo mais um dos que se omitem do seu dever garantista para o referido grupo, encaminhamos o projeto de lei reconhecendo as pessoas com audição unilateral como deficiência auditiva.
Histórico
Delegada Gleide Angelo
Deputada
Informações Complementares
Status | |
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Situação do Trâmite: | AUTOGRAFO_PROMULGADO |
Localização: | SECRETARIA GERAL DA MESA DIRETORA (SEGMD) |
Tramitação | |||
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1ª Publicação: | 23/05/2023 | D.P.L.: | 11 |
1ª Inserção na O.D.: |
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