Frente discute merenda nas escolas dos povos tradicionais

Em 21/05/2025 - 14:05
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A qualidade da merenda escolar de povos tradicionais – como indígenas, quilombolas e ribeirinhos – foi tema de reunião realizada pela Frente Parlamentar de Combate à Fome da Alepe nesta quarta (21). O colegiado debateu com especialistas estratégias para assegurar aos estudantes dessas comunidades alimentos que façam parte da cultura local.

O encontro foi motivado por queixas levantadas em audiência pública no mês passado, explicou a coordenadora da Frente, deputada Rosa Amorim (PT). Ela também relatou participação recente na assembleia do povo Kapinawá, em Buíque (Agreste Meridional), território indígena que tem como base econômica a produção de frutas, como caju e umbu, além de macaxeira e outras raízes. “A denúncia é de que a escola estadual sobrevive à base de bolacha e suco artificial. É uma contradição quem produz alimento não receber no seu território uma alimentação de qualidade.”

Para identificar casos como esse, a Frente Parlamentar criou a plataforma De Olho na Merenda, na qual estudantes, professores e gestores da comunidade escolar podem colocar informações. “Já recebemos, neste ano, mais de 200 denúncias. Por que no Sertão não tem mel, carne de carneiro e macaxeira na alimentação escolar? Queremos avançar nisso”, complementou a petista.

TERRITÓRIOS – Rosa Amorim defendeu a produção de alimentos da merenda pelas comunidades. Foto: Nando Chiappetta

Regras

A reunião contou com a participação de integrantes da Comissão de Alimentos de Povos Tradicionais (Catrapovos). O assistente técnico da entidade e integrante do Observatório das Economias da Sociobiodiversidade Márcio Menezes explicou que situações de alimentação descaracterizada da cultura em escolas indígenas estão na origem do órgão.

ALIMENTOS – Márcio Menezes argumentou a favor de uma mesa de diálogo permanente com os povos indígenas. Foto: Nando Chiappetta

Ao relatar a fundação do colegiado, ele contou que o Ministério Público Federal constatou em visitas que os gestores escolares esbarravam em regras de controle sanitário. Para sanar o problema, o órgão ministerial publicou notas técnicas regulamentando o autoconsumo dos alimentos produzidos na própria comunidade. Menezes também considerou importante a instituição da Mesa Permanente de Diálogo Catrapovos Brasil, que busca qualificar as políticas públicas e incentivar a pauta junto ao Governo Federal.

Representante do Fundo Mundial para a Natureza (WWF, na sigla em inglês) e também membro do Observatório, Vinícius Abílio defendeu a alimentação tradicional nas escolas como estratégia para conter o êxodo rural. “É preciso ter, na escola, todos os elementos de cultura e tradição, para ela ser um vetor de incentivo e de valorização da permanência dos jovens nos campos, nas aldeias e nos territórios”, opinou.

Projetos

Em Pernambuco, a Superintendência do Ministério do Desenvolvimento Agrário vem mapeando a situação das instituições de ensino no campo e promovendo mutirões de cadastro de agricultores familiares. Essas e outras ações foram destacadas pela chefe da Divisão de Articulação do órgão e representante da Catrapovos no Estado, Camila Lima.

PROJETOS – Camila Lima detalhou as ações do Ministério do Desenvolvimento Agrário em Pernambuco. Foto: Nando Chiappetta

A representação federal também tem atuado em dois projetos piloto de chamadas públicas: com a Prefeitura de Garanhuns, para povos quilombolas, e com a Secretaria Estadual de Educação, para estudantes quilombolas e da Educação de Jovens e Adultos (EJA) indígena. As iniciativas de formação de cardápios escolares junto com as comunidades utilizarão recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). “O projeto estadual para os povos quilombolas já está avançado, abrangendo 19 municípios e atingindo cerca de 2 mil estudantes, com previsão orçamentária de R$ 9 milhões”, relatou Lima. “Seria uma grande chamada pública do Governo do Estado para atender a esses jovens com uma alimentação culturalmente referenciada, produzida pelas comunidades.”

Também da Catrapovos Pernambuco, Flávio Duarte sugeriu que a discussão inclua a Agência Estadual de Defesa e Fiscalização Agropecuária (Adagro). “A gente não pode imaginar que uma comunidade quilombola, para poder alimentar sua escola, precisa ter uma indústria de beneficiamento nos padrões das grandes agroindústrias”, observou.

FISCALIZAÇÃO – Flávio Duarte sugeriu a inclusão da Adagro no debate sobre a alimentação tradicional. Foto: Nando Chiappetta

No encerramento do debate, Rosa Amorim citou outras iniciativas do mandato dela com foco na segurança alimentar: a campanha Cesta Básica, Imposto Zero em Pernambuco e o Projeto de Lei nº 587/2023, que institui o Programa Primeira Merenda na rede pública de ensino. “Os estudantes já chegam na escola com fome, porque não fizeram desjejum em casa”, disse. “Nosso horizonte é que cada comunidade possa fornecer alimentos para as escolas dos seus próprios territórios”, concluiu.