CPI das Faculdades Irregulares é a 37ª criada na Assembleia

Em 27/11/2015 - 12:11
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INVESTIGAÇÕES – CPI das Faculdades Irregulares iniciou seus trabalhos no dia 15 de outubro. Foto: Jarbas Araújo

Com a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar a oferta ilegal de cursos superiores no Estado, que iniciou seus trabalhos no dia 15 de outubro, a Assembleia Legislativa contabiliza 37 CPIs em toda a história Casa. O colegiado surgiu a partir do recebimento de denúncias, apontando que algumas faculdades estão oferecendo cursos de extensão – modalidade mais curta, voltada à qualificação de profissionais –, afirmando serem formações equivalentes a cursos de graduação. Os parlamentares deverão apurar a possível ocorrência de crime de estelionato por parte das instituições.

“Essas faculdades copiam o currículo dos cursos superiores, mas só dedicam dez horas-aula para disciplinas que deveriam ter 60 horas de conteúdo”, denunciou Licínio Lustosa, representante da Associação das Instituições de Ensino Superior do Estado (Assiespe), na reunião de instalação da CPI. Tais informações foram confirmadas por alunos das instituições, em depoimentos, e por meio de materiais publicitários dos cursos, recebidos pela Comissão.

As denúncias já haviam motivado uma audiência pública no âmbito da Comissão de Educação da Casa, realizada no dia 23 de setembro. Na ocasião, o deputado Rodrigo Novaes (PSD) propôs a criação da CPI para investigar as irregularidades. Reunidas as assinaturas necessárias, a Comissão foi criada e Novaes se tornou o presidente do colegiado.

O colegiado terá duração de seis meses, podendo ser prorrogado pelo mesmo período. “Precisamos punir os responsáveis por essas fraudes, mas também procurar realocar os alunos que foram prejudicados. Além disso, acho preocupante que esse problema não esteja sob o olhar do Ministério da Educação”, ressaltou o parlamentar. Novaes afirmou que uma das providências já tomadas pela CPI foi procurar técnicos do MEC, além da Polícia Federal e dos Ministérios Públicos Federal e Estadual, a fim de que os órgãos contribuam com a investigação dos casos recebidos.

Uma das empresas denunciadas, a Faculdade de Desenvolvimento e Integração Regional (Fadire), negou as acusações. Em reunião da CPI, o diretor-geral da unidade, Jean Alves Cabral, argumentou que “os estudantes são informados, expressa e claramente, que os cursos da entidade não equivalem à graduação e não asseguram a emissão de diploma universitário”.

Já o diretor da Fundação de Ensino Superior de Olinda (Funeso), Célio da Costa Silva, chegou a ser detido em reunião da Comissão realizada no dia 18 de novembro. Segundo Rodrigo Novaes, o diretor incorreu no crime de falso testemunho, por ter entrado em contradição em depoimento a respeito do funcionamento da Funeso em outros Estados. Com o intuito de receber denúncias, a CPI criou um e-mail ( cpidasfaculdadespiratas@alepe.pe.gov.br) e um número de telefone com whatsapp: (81) 999570898.

Poderes da CPI – As Comissões Parlamentares de Inquérito permitem que uma investigação seja feita com a pluralidade de pontos de vista do Poder Legislativo, que representa diferentes setores da população.  “A CPI tem essas duas características: de um lado, chama atenção da sociedade, o que permite surgirem mais denúncias sobre o fato investigado. Do outro, oferece prerrogativas que nenhuma outra comissão tem, que dão força de polícia ao trabalho dos deputados”, explicou Rodrigo Novaes.

No papel de investigadores, os parlamentares podem trazer pessoas para serem ouvidas de forma coercitiva, ou determinar a quebra dos sigilos telefônico, bancário e fiscal. “É importante lembrar que, para a Comissão restringir algum direito, como quebra de sigilo, por exemplo, a iniciativa tem que ser colegiada. Não pode ser definida por um deputado isoladamente“, ressaltou o procurador-geral adjunto da Assembleia Legislativa, Hélio Lúcio. Além disso, há medidas que só podem ser tomadas pela CPI com autorização do Poder Judiciário, como  a realização de interceptação telefônica, indisponibilidade de bens e busca e apreensão de documentos.

Um ponto muitas vezes mal entendido das CPIs é a punição dos crimes e irregularidade descobertos. As Comissões Parlamentares de Inquérito não têm poder para julgar e condenar qualquer pessoa, já que seu resultado final é um relatório que é encaminhado para órgãos como Ministério Público, Tribunal de Contas e demais entidades responsáveis pela fiscalização do assunto investigado. O relatório final também pode incluir propostas de mudanças nas leis. A detenção de uma pessoa determinada pela Comissão, como ocorreu com o diretor da Funeso, só pode ocorrer se for verificado um crime em flagrante.

De toda maneira, a investigação parlamentar pode gerar resultados antes mesmo da conclusão dos trabalhos do colegiado: “Durante a CPI dos Combustíveis, em 2003, houve um aumento de arrecadação de impostos, apontado pela Sefaz, apenas pelo efeito dissuasório da investigação”, lembrou o procurador Hélio Lúcio.

História – O instituto das CPIs foi estabelecido no Brasil com a Constituição de 1934, embora uma atuação semelhante a elas já estivesse presente na análise que parlamentares do Império fizeram do Banco do Brasil em 1826. A primeira investigação realizada pelo Parlamento pernambucano, por meio desse dispositivo, aconteceu em 1961 com a apuração de irregularidades na cobrança de impostos pelo Governo Estadual.

 Confira nessa linha de tempo interativa quais foram as 37 CPIs da Alepe:

 

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MEIO AMBIENTE– Em 1979, a Alepe criou uma CPI para apurar desmatamento de uma área de Mata Atlântica. Foto: Vinicius Depizzol/FLICKR

A atuação investigativa do Poder Legislativo, no entanto, foi limitada em períodos autoritários, como o Estado Novo e a Ditadura Militar. Durante a ditadura, por exemplo, apenas duas CPIs foram realizadas pela Casa, no período de distensão do final do regime. Uma dessas comissões, realizada em 1979, se destacou por ser considerada a primeira investigação parlamentar de cunho ecológico, ao apurar a legalidade e os efeitos do desmatamento de uma área de 180 hectares de Mata Atlântica para a construção de residências luxuosas no antigo Engenho Uchôa, no Recife. A investigação contribuiu para transformar o local em área de proteção ambiental.

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SAÚDE – Em 1996, a Casa investigou as causas e consequências da tragédia da hemodiálise em Caruaru. Foto: Governo da Bahia/FLICKR

 “Foi a partir da Constituição de 1988 que as CPIs passaram a ter mais força, ganhando prerrogativas jurídicas e policiais”, considerou o deputado Romário Dias (PTB), que assumiu seu primeiro mandato na Alepe em 1990. O ex-presidente da Casa destacou a Comissão que presidiu, em 1996, sobre a tragédia da hemodiálise em Caruaru. Na ocasião, a intoxicação por conta de uso de água contaminada atingiu 146 pacientes do Instituto de Doenças Renais (IDR), na capital do Agreste, levando à morte de 73 pessoas e deixando sequelas permanentes em muitos sobreviventes. “Chamamos especialistas da área médica para ajudar nas investigações e visitamos as instalações, que eram precárias. Constatamos que os filtros usados na diálise eram usados por muito mais tempo do que o recomendado, e que a água utilizada era de péssima qualidade. Eles pensavam muito mais no lucro do que nas pessoas”, recordou o deputado. “Graças a Deus, o tratamento de diálise em Pernambuco melhorou em 100%, o que é oriundo da CPI que fizemos na ocasião”, avaliou.

Outra CPI que marcou a Assembleia Legislativa de Pernambuco foi a do Narcotráfico e Pistolagem, em 2000. A Comissão levantou informações e dados sobre o narcotráfico, crimes de pistolagem, e grupos de extermínio e violência contra crianças e adolescentes. Entre as consequências da CPI, destaque para a concretização de um acordo que pacificou uma briga histórica de famílias na cidade de Cabrobó, no Sertão do Estado. “Foram mais de 160 pessoas presas, e diversas audiências públicas e visitas a várias cidades do Interior. A Comissão fortaleceu mecanismos de controle e combate ao crime, reduzindo a impunidade”, relembrou  o ex-deputado Pedro Eurico, que presidiu o colegiado, e é atualmente secretário estadual de Justiça e Direitos Humanos.

Já nas últimas três CPIs promovidas pela Alepe há um perfil de defesa do cidadão contra abusos de entidades privadas. O questionamento do tratamento dado aos cidadão por empresas de energia elétrica, telefonia móvel e, agora, de empresas educacionais foi assumido pelo Poder Legislativo nessas investigações. A CPI da Celpe, em 2007, ocorreu quando a empresa tinha o maior número de reclamações no Procon do Estado.

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ENERGIA ELÉTRICA – A CPI da Celpe, em 2007, surgiu quando a empresa tinha o maior número de reclamações no Procon.Foto: Humberto de Oliveira/ FLICKR

Quando a Celpe foi privatizada, a empresa Iberdrola aumentou de forma abusiva a conta de energia. Era o maior aumento do Brasil, e as pessoas não tinham como pagar por isso”, relembrou Sérgio Leite, ex-deputado que presidiu essa Comissão. Segundo ele, a CPI também ajudou a acabar com a prisão de pessoas que faziam ligações clandestinas de energia. “A pessoa que cometia esse pequeno delito era chamada de ‘eletrotraficante’ e colocada junto com bandidos na prisão. Essa penalização excessiva era uma afronta aos direitos humanos”, lembrou o ex-deputado.

Já a CPI da Telefonia Móvel, em 2011, apurou insatisfações dos usuários desse serviço. “Com a investigação, conseguimos sensibilizar o Governo para levar os serviços móveis para lugares longínquos que não eram atingidos pela rede existente. Além disso, junto com o Procon e o MPPE conseguimos obter Termos de Ajustamento de Conduta (TAC) para melhorar a qualidade do atendimento das empresas”, ressaltou Rodrigo Novaes, que foi relator desta CPI.