Promotor diz aos deputados que inquérito deve “começar do zero”

Em 26/06/2003 - 00:06
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“Esse inquérito está contaminado e tem que ser começado do zero”. A afirmação foi feita pelo promotor da comarca de Ipojuca, Miguel Sales, que analisou e devolveu o inquérito da Polícia Civil que aponta os kombeiros Valfrido e Marcelo Lira como autores dos assassinatos das adolescentes Maria Eduarda Dourado e Tarsila Gusmão. Ele falou durante a audiência pública da Comissão de Defesa da Cidadania que ouviu também o secretário de Defesa Social, Gustavo Lima, o secretário-adjunto, Renato Silva, o chefe da Polícia Civil, Aníbal Moura, e o defensor público José Francisco Nunes.

Além de questionar detalhadamente o inquérito, Miguel Sales denunciou a distribuição do material antes da conclusão dos trabalhos. “Eu mesmo recebi uma cópia, em minha casa, de várias peças do inquérito ainda sem todas as assinaturas e sem numeração”, declarou.

A audiência durou mais de quatro horas, seguiu por mais de duas horas em caráter reservado, a pedido do chefe da Polícia Civil do Estado, e foi marcada pelo desencontro de informações. O promotor Miguel Sales questionou o fato de algumas pessoas citadas no inquérito não terem sido ouvidas e afirmou, categoricamente, que ele está incompleto. “Por que não vistoriaram a lancha ou a casa onde as meninas estiveram? E por que apenas um telefone celular foi rastreado e o orelhão de onde elas teriam telefonado pela última vez não passou por nenhuma perícia ou rastreameto? Em tese, os komebeiros podem ser os autores do crime. Mas também, em tese, podem ser co-autores, cúmplices ou terem apenas dado carona até um determinado ponto”, acrescentou.

Sales seguiu dizendo que recebeu o inquérito incompleto, faltando a peça que descrevia as roupas encontradas nos corpos das vítimas, e questionou a divergência quanto aos números de tiros que atingiram as adolescentes. “Durante a coletiva, foi dito que Tarsila teria levado cinco tiros e Eduarda dois. No inquérito não consta isso, e o Dr. Silvestre (delegado do Grupo de Operações Especiais – GOE) disse que houve uma perícia complementar que apontava essa quantidade de tiros. Como podem ser consideradas informações que não foram incluídas no inquérito? E por que não foram incluídas?”, perguntou.

Em meio a troca de farpas entre o promotor e o chefe da Polícia Civil, o deputado Pedro Eurico (PSDB) disse que “a Assembléia não queria ver o inquérito se transformar numa fogueira de vaidades, onde se discute quem errou ou quem errou menos”. “Queremos os fatos”, concluiu. O presidente da Casa, deputado Romário Dias (PFL), sugeriu que a Comissão de Cidadania aguardasse a conclusão das novas diligências e do inquérito para, depois, discutir sobre possíveis dúvidas.

Apesar do grande número de dúvidas levantadas, o chefe da Polícia Civil afirmou estar convicto quanto a autoria do crime. “Estou com a consciência religiosamente tranqüila de que foram os dois kombeiros que mataram as adolescentes. O Ministério Público tem o direito de devolver o inquérito, a polícia de soltar os acusados, mas saibam que estarão soltando os assassinos de Maria Eduarda e Tarsila”, reafirmou Aníbal Moura.