
IMPACTO – Dani Portela vai solicitar por ofício detalhes do projeto à Prefeitura do Recife. Foto: Nando Chiappetta
O direito de permanecerem em seus territórios e a necessidade de serem ouvidos pelo poder público foram algumas das principais demandas apresentadas por moradores de comunidades que vão ser diretamente impactadas por obras de desenvolvimento urbano na capital pernambucana, durante audiência pública promovida pela Comissão de Cidadania da Alepe na tarde desta quinta (5). Os debates giraram em torno do projeto Orla Parque, da Prefeitura do Recife, que vai requalificar e integrar os 11 quilômetros de orla da capital – desde o Parque das Esculturas até o bairro de Setúbal, incluindo as praias de Brasília Teimosa, Pina e Boa Viagem.
No discurso de abertura, a presidente do colegiado, deputada Dani Portela (PSOL), reconheceu que investimentos em infraestrutura urbana são fundamentais para o desenvolvimento da cidade, mas enfatizou a importância de respeitar, incluir e contemplar as pessoas que vivem nos territórios impactados pelas obras. “Por trás de cada casa tem uma história de vida, de luta, sonhos e memórias, e esses valores são imensuráveis”, pontuou. “O poder público tem a responsabilidade de garantir que as pessoas mais afetadas tenham um tratamento digno”, completou.

PROGRESSO – João Paulo ressaltou que as transformações na cidade devem beneficiar o povo. Foto: Nando Chiappetta
O deputado João Paulo (PT) somou-se à fala da parlamentar. Ele reiterou que as transformações urbanas feitas em nome do progresso devem beneficiar a todos, especialmente aqueles que mais trabalham para construir e gerar as riquezas da cidade: o povo.
Morador de Brasília Teimosa e representante do Coletivo Teimosinho, Carlos Augusto Pereira, denunciou que o projeto da orla foi apresentado sem qualquer escuta da comunidade por parte da Prefeitura. “Primeiro, ela não dá conhecimento do que está para acontecer e não apresenta o projeto antes da elaboração, e, depois, traz o bolo pronto e quente para a gente comer. Só que a gente não sabe o que tem ali, se tem remoção, quais são os impactos que vão ter na nossa vida”, desabafou. Ele ressaltou a necessidade das comunidades se unirem e se organizarem para terem seus direitos garantidos.

ESCUTA – Carlos Augusto Pereira afirmou que a comunidade não foi ouvida a respeito do projeto. Foto: Nando Chiappetta
A representante do Coletivo Caranguejo Tabaiares Resiste, Sara Marques, criticou as estratégias veladas de desapropriação usadas pelo poder público. “Querem nos expulsar tirando nossas estruturas, porque falta água, falta esgoto, falta escola – e não é por acaso”, ressaltou. Ela também lembrou que as remoções são sempre feitas para áreas de morro e distantes do centro e das praias.
Remoções
Essa prática é vista como uma estratégia de “higienização” da cidade pela representante do Instituto Brasileiro de Direito Urbanístico (IBDU), Fernanda Costa. “Na hora que a gente vê um projeto sendo executado que promove um grande número de remoções, muitas que não seriam necessárias, e que não reassenta as pessoas e não garante moradia a elas – e se garante, coloca a quilômetros de distância -, esse é um projeto que não busca melhorar a qualidade de vida da população, mas sim, limpar determinados territórios da cidade”, apontou.

REMOÇÕES – Fernanda Costa denunciou a estratégia de “higienização” de zonas da cidade. Foto: Nando Chiappetta
Representando o vereador do Recife Ivan Moraes (PSOL), Carol Vergolino apresentou um estudo feito pelo mandato dele sobre remoções e impactos de obras públicas sobre moradias no Recife. O documento reafirma essas estratégias, que incluem a desinformação da população sobre o que será feito, o enfraquecimento das comunidades pela desmobilização e cooptação de lideranças, e a realização das obras sem possibilidade de negociação.
Para o vice-presidente do Conselho Estadual de Direitos Humanos, Fenelon Pinheiro, as grandes obras que ameaçam a existência das comunidades pobres e periféricas visam atender à especulação imobiliária e aos interesses do capital. “Não podemos permitir que o avanço aconteça em detrimento da dignidade da pessoa humana. As pessoas devem ser parte do planejamento, e não retiradas dele”, enfatizou.
Como encaminhamento da reunião, Dani Portela destacou que será enviado um ofício ao prefeito do Recife para uma pedir uma reunião em que ele possa apresentar os detalhes do projeto. “Precisamos pensar em formas de trazer esse debate da forma mais transparente possível e garantir que os gestores públicos dialoguem com as pessoas. Há muitas lacunas sobre como esse projeto vai ser conduzido e se vai haver desapropriações”, pontuou.
Ela também ressaltou que vai ser feito um pedido de informação para saber se haverá um plano de reassentamento involuntário e como ele será elaborado. Por fim, a deputada lamentou a ausência do prefeito João Campos e da governadora Raquel Lyra, que foram convidados para a audiência mas não compareceram nem enviaram representantes.