
EMBOSCADA – “Manifestantes foram agredidos com bombas de efeito moral, spray de pimenta e balas de borracha”, registrou Jô Cavalcanti, das Juntas. Foto: Jarbas Araújo
A operação policial que interrompeu, de forma violenta, o protesto realizado contra o presidente Jair Bolsonaro no último sábado (29), no Recife, repercutiu na Reunião Plenária desta quinta (3). Os deputados Jô Cavalcanti, do mandato coletivo Juntas (PSOL), Doriel Barros (PT) e Teresa Leitão (PT) cobraram esclarecimentos e a responsabilização dos envolvidos. Já o deputado Alberto Feitosa (PSC) defendeu a atuação dos agentes de segurança.
“O ato organizado e pacífico que vinha ocorrendo nas ruas do Recife foi alvo de uma emboscada da Polícia Militar de Pernambuco (PMPE). Manifestantes foram agredidos com bombas de efeito moral, spray de pimenta e balas de borracha”, registrou Jô Cavalcanti. Ela lamentou, ainda, a violência praticada contra a vereadora do Recife Liana Cirne (PT) e a falta de interesse da corporação em dialogar com os parlamentares que estavam no evento tentando mediar a situação.
Na avaliação da representante das Juntas, as informações repassadas à Alepe pelo secretário estadual de Defesa Social (SDS), Antônio de Pádua, nesta semana, ainda são insuficientes. “O povo quer saber o que levou a PM a agir com tanta violência. Quem ordenou a ação? Quanto custou a operação? Qual vai ser o apoio às vítimas?”, questionou, garantindo que acompanhará toda a investigação.
Na sequência, Doriel Barros relatou que “um ato pacifico, cumprindo todos os protocolos de distanciamento social, sofreu agressões covardes”. “Os policiais responsáveis pelos ataques não merecem usar fardas com o símbolo do Governo de Pernambuco”, afirmou. O petista voltou a condenar a atuação da PM na reintegração de posse realizada em Amaraji (Mata Sul), no último dia 25 de maio. “O que ocorreu lá se repetiu no Recife, de forma grave”, observou.

COVARDIA – “Os policiais responsáveis pelos ataques não merecem usar fardas com o símbolo do Governo de Pernambuco”, afirmou Doriel Barros. Foto: Roberto Soares
Para o parlamentar, a ação pareceu ter sido “motivada politicamente”. “Espero que não exista, na polícia, a ideia de que algumas manifestações políticas precisam ser atacadas e outras, protegidas. Se há tal pensamento, deve ser cortado pela raiz, com uma ação firme, até para outros policiais saberem que o Estado tem comando.”
Teresa Leitão reforçou que a mobilização pelo “Fora Bolsonaro” foi tranquila até chegar à Ponte Princesa Isabel, onde ocorreu a repressão policial. “As pessoas foram encurraladas e atacadas, ficaram sob a mira de fuzis. Além de vários manifestantes feridos, dois passantes perderam a visão de um dos olhos”, afirmou. A petista também se solidarizou com Liana Cirne, “atingida covardemente com spray de pimenta”. “Ela ainda tem sido acusada de dramatizar a situação”, criticou.
Para a deputada, a Polícia Militar “se apequenou pela covardia e pela violência desproporcional”. “Em vez de garantir a paz, aquele grupo expôs Pernambuco negativamente em todo o País”, ressaltou. Ela defendeu que a Alepe forme uma comissão suprapartidária para se reunir com o governador Paulo Câmara. “Precisamos mostrar a urgência desse tema”, enfatizou. Ao final do discurso, o deputado Diogo Moraes (PSB), que presidia a reunião, anunciou que a demanda está sendo encaminhada pelo presidente da Casa, Eriberto Medeiros (PP).
Em apartes, os deputados Waldemar Borges e Laura Gomes, ambos do PSB, endossaram a fala. “O Batalhão de Choque é chamado para apaziguar conflitos, o que não havia ali. A PM é mais do que centenária, não é justo que fique manchada em razão dessa insubordinação”, afirmou Borges. “Foi um momento muito triste para o Estado”, acrescentou a socialista.
Contraponto

REPERCUSSÃO – Para Teresa Leitão, a Polícia Militar de Pernambuco “se apequenou pela covardia e pela violência desproporcional”. Foto: Roberta Guimarães
Por outro lado, Alberto Feitosa argumentou que a ação da Polícia Militar foi realizada para impedir infrações ao decreto estadual que proíbe aglomerações. “O ato descumpriu o acordo que previa o encerramento aos ‘pés’ da Ponte Duarte Coelho. Quando os participantes avançaram em direção à Praça do Diário, o Batalhão de Choque recebeu ordens para fazer a dispersão”, narrou.
Além disso, segundo o parlamentar, a PM teria sido atacada com pedras, o que gerou reação. “O Batalhão de Choque teve que revisar a atuação porque estava ali para evitar que o patrimônio público fosse depredado”, opinou. “Se houve excesso por parte dos policiais, é preciso dar o direito de defesa e aplicar o regulamento, entendendo a situação do servidor público.” Ele propôs novas regras para essa unidade policial, com ordens por escrito, a partir do Governo Estadual.
Feitosa concordou com a formação de uma comissão na Alepe, sugerindo que o grupo investigue os fatos e quebre sigilos telefônicos para descobrir de onde partiu a ordem de dispersão. “Colegas do alto comando da PM revelaram que o então comandante Vanildo Maranhão, ao receber a determinação, disse que isso não daria certo”, contou Feitosa. “Então, com certeza, quem falou estava acima dele.”
Ao comentar o discurso do colega, o deputado Delegado Erick Lessa (PP) declarou que a manifestação foi “completamente inadequada ao momento em que vivemos”. Ele defendeu a apuração de eventuais excessos, mas considerou “hipocrisia provocar aglomeração e, ao mesmo tempo, criticar a atuação de uma instituição policial para cumprir o que está no decreto do Governo do Estado”. Também enalteceu o ex-comandante Vanildo Maranhão: “Teve um papel brilhante na diminuição da violência em Pernambuco em seus quatro anos à frente do Comando Geral da PM”.

MOTIVAÇÃO – Segundo Alberto Feitosa, ato descumpriu acordo para encerrar na Ponte Duarte Coelho. “O Batalhão de Choque recebeu ordens para dispersar.” Foto: Nando Chiappetta
Parlamentares governistas discordaram do posicionamento de Feitosa. Teresa Leitão e Waldemar Borges pediram que seja revelado o nome do autor da ordem para dispersar o protesto. “Fui contra o ato por razões sanitárias, mas ele ocorreu com um nível de organização difícil de se obter em movimentos de massa. Quem perturbou foram os que atiraram, numa ação descabida que não está em qualquer protocolo”, declarou o socialista. Jô Cavalcanti lembrou que o normativo da PM prevê tiros de balas de borracha apenas abaixo do pescoço e a distância, mas “houve disparos à queima-roupa”.
Encontro com vereadora
Outro ponto que gerou polêmica foi o encontro do governador com a vereadora Liana Cirne. Alberto Feitosa censurou a atitude de Paulo Câmara, que desautorizaria a PM, e acusou a petista de ter praticado “abuso de autoridade” ao confrontar os policiais. “Ela deu uma ‘carteirada’ e depois caiu, de maneira cinematográfica, ao receber uma pequena dose de spray de pimenta. E estava com vestido e salto alto, algo não muito adequado para uma manifestação”, descreveu.
Jô Cavalcanti e Teresa Leitão reagiram. “Ao afirmar que a vereadora fez ‘artes cênicas’ após ser atacada por policiais, o deputado faz uma agressão política”, comentou a representante das Juntas. Para a petista, falar das roupas que Liana usou é “comum nos ataques que as mulheres sofrem na política, algo que a própria Alepe tem um projeto para coibir.”
Outros episódios
No tempo destinado à Comunicação de Lideranças, o deputado João Paulo (PCdoB) citou outros episódios recentes de violência policial para indicar a criação de “uma espécie de força parapolítica dentro dos órgãos de segurança”. “Isso representa um risco ao estado democrático de direito”, alertou.

RISCO – João Paulo citou episódios recentes de violência policial para indicar a criação de uma “força parapolítica dentro dos órgãos de segurança”. Foto: Nando Chiappetta
O comunista registrou a prisão de um professor petista em Goiás, no dia 31 de maio, por colocar uma faixa com os dizeres ‘Fora Bolsonaro Genocida’ no capô do carro. Também o uso de bombas de gás lacrimogêneo contra 200 famílias em reintegração de posse em Amaraji, na Mata Sul pernambucana. Mencionou, ainda, agressões a enfermeiros em protesto em Brasília, em fevereiro; um motim de policiais militares no Ceará, em 2020; e a incursão que provocou mais de 20 mortes na Favela do Jacarezinho, no Rio de Janeiro (RJ).
Na opinião dele, as ligações da família Bolsonaro com milicianos cariocas e as políticas que o presidente adota a fim de armar a população apontam para o risco de uma ação semelhante à invasão do Capitólio por apoiadores do ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump, após a derrota para Joe Biden. “É algo que ele pode incentivar em 2022, se ainda estiver em situação desfavorável nas pesquisas ou se tiver perdido a eleição”, advertiu João Paulo.
Teresa Leitão também reconheceu a existência de um “movimento insurgente de policiais”. “Os poderes públicos não podem aceitar um comando paralelo das forças de segurança no Brasil”, avaliou.