A Comissão de Cidadania realizou, nesta quarta (6), uma audiência pública na Câmara de Vereadores do Cabo de Santo Agostinho, Região Metropolitana do Recife, para discutir a atuação de milícias no Complexo Industrial Portuário de Suape e a situação das famílias que vivem no entorno do empreendimento. O objetivo foi verificar o andamento das ações encaminhadas nas últimas duas audiências públicas já realizadas pelo colegiado, em 2015, além de apurar novas denúncias.
De acordo com moradores, os casos de violência física e psicológica vêm ocorrendo há anos por parte de grupos armados ligados a Suape e às polícias Civil e Militar. São diversas denúncias relacionadas à destruição de casas e plantações, crimes ambientais, roubos, perseguições, impedimentos na realização de boletins de ocorrência, entre outras violações para forçar a saída dos moradores da região.
O representante da comunidade quilombola Ilha de Mercês, Magno Araújo, ressalta que os casos vêm se agravando em diversas áreas. “Colocaram fogo em residências, por exemplo, nas comunidades de Serrarias e Rosário. Então está se intensificando esse tipo de ação, não apenas para impedir a construção de novas casas, mas sim para violentar as comunidades.”
Já a presidente da Associação dos Pequenos Agricultores do Engenho Ilha, Vera Lúcia Domingos, afirma viver com medo das constantes ameaças de morte que recebe das milícias. “É muito difícil para a gente ficar parada esperando que as coisas aconteçam. Eu incomodo por estar sempre buscando melhorias para a comunidade e, por isso, tenho recebido várias ameaças.”
A advogada Luísa Duque, assessora jurídica do Fórum Suape – grupo que reúne acadêmicos, entidades e lideranças locais para defender os interesses dos moradores -, criticou o arquivamento precoce de um inquérito instaurado pelo Ministério Público de Pernambuco após a última audiência pública realizada pela Comissão de Cidadania. Segundo ela, o órgão teria alegado o avanço nas políticas de assentamento e a diminuição dos conflitos. Ela ressaltou, no entanto, que os casos de violência aumentaram.
Mas a promotora de Justiça do Cabo de Santo Agostinho, Alice Morais, argumentou que, na ocasião, houve, de fato, a informação de redução dos conflitos por parte da Polícia Civil. Ela também fez um apelo pela participação da comunidade na apresentação de provas para dar prosseguimento aos inquéritos. “O que a gente vê é que, muitas vezes, até por medo, a população não colabora com a Justiça, não vem depor como testemunha, ou quando chamada na Justiça diz que não é bem aquilo, e isso a gente sente que tem dificultado muito na instrução desses casos.” A promotora destacou ainda que o fato de um inquérito ter sido encerrado não impede a abertura de outros, caso surjam novas denúncias. Mas, segundo os moradores, as provas têm sido apresentadas, inclusive com fotos e vídeos.
Segundo o coordenador do Fórum Suape, Heitor Scalambrini, apesar das diversas audiências já realizadas ao longo dos anos, nada teria mudado. Para ele, o melhor caminho para solucionar a questão é o diálogo. “Resolvemos estabelecer uma iniciativa no sentido de discutir os diferentes problemas. Mas a coisa anda muito lentamente e, em todo caso, continuamos fazendo denúncias e pressão para que esses problemas sejam solucionados.”
Ao final do encontro, ficou definida a criação de um grupo de trabalho pelo Fórum para monitorar os encaminhamentos da reunião. Entre eles, estão a abertura de um procedimento investigativo por parte dos Ministérios Públicos Federal e Estadual sobre a atuação das milícias, além da apuração sobre a cobrança de pedágios a moradores e de especulação imobiliária na região.
O presidente da Comissão de Cidadania, deputado Edilson Silva (PSOL), ressaltou que é importante cobrar ações diretamente do Governo do Estado, e não apenas dos gestores de Suape. “Se a responsabilidade política pelo que está acontecendo também for para a gestão estadual, talvez consigamos desequilibrar um pouco essa relação e permitir que haja um diálogo com um representante do complexo portuário.” O parlamentar também garantiu a participação do colegiado no grupo de trabalho proposto pelos participantes.