
INTOLERÂNCIA – Comissão Estadual da Memória e da Verdade participou do encontro e coletou depoimentos sobre assunto. Foto: João Bita
No mês em que se celebra o Dia da Consciência Negra (20/11), a Assembleia Legislativa abriu espaço para a realização de audiência pública da Comissão Estadual da Memória e da Verdade (CEMV), onde foi feita a coleta de relatos sobre a perseguição contra religiões de matriz africana no período entre 1946 e 1988. O encontro, realizado nesta segunda (28), foi coordenado pela Comissão de Cidadania da Alepe.
Elaborado pela Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República, o Relatório sobre Intolerância e Violência Religiosa (2011-2015) expôs que, ao longo desses anos, 27% das denúncias recebidas tiveram como vítimas adeptos de religiões de origem africana. Na avaliação de Manuel Moraes, relator da temática CMV, durante o período militar, pode ter havido subnotificação nos números dessas perseguições. “Temos algumas fichas do Dops (Departamento de Ordem Política e Social) que atestam essa intolerância. Inclusive, houve naquela época proibição de manifestação de culto. Vamos ouvir as pessoas e, com a metodologia da História Oral, incorporar as informações no relatório final da comissão”, destacou.
Criada em 2012 pela Lei Estadual nº 14.688 , a CEMV encerrará suas atividades no dia 31 de dezembro, após cerca de 90 sessões públicas. A audiência desta segunda foi a última atividade de escuta da comissão. O relatório final será divulgado em 2017, mas muito do que foi apurado já pode ser conferido por meio do site da Companhia Editora de Pernambuco (Cepe), responsável pela digitalização do documento. Moraes frisou que quem ainda tiver relatos a respeito do tema pode procurar a CEMV para prestar depoimento.
Presidente da Comissão de Cidadania, o deputado Edilson Silva (PSOL) lembrou que, “ao longo deste mês, a Assembleia Legislativa tem realizado diversas reflexões acerca da violação dos direitos humanos e da perseguição às pessoas adeptas de religiões de matriz africana”. No dia 11, o colegiado reuniu diversas instituições em debate sobre a tolerância religiosa e laicização do Estado.
O professor aposentado José Amaro dos Santos foi um dos que participou da audiência. Citando jornais da década de 1980, ele pontuou que muitos dos atos contra os terreiros de candomblé no Recife ocorriam sob a tutela da então Secretaria de Segurança Pública. “O jornal Diário da Tarde referia-se aos terreiros como refúgio de macumbeiros e de bruxaria, destacando a ação da polícia contra esse grupo. Essa era a linguagem contra a nossa religião”, relatou.

ENCONTRO – Integrantes de manifestações religiosas de matriz africana compareceram à audiência pública. Foto: João Bita
Secretário estadual de Desenvolvimento Social, Criança e Juventude, Isaltino Nascimento fez uma sugestão. “Seria interessante que a Assembleia produzisse publicação resgatando a importância e a luta do povo negro em Pernambuco, com capítulo especial para suas celebrações e fé religiosa”, observou. Também elencou ações do Governo do Estado em prol da preservação da cultura negra, como a incorporação da Caminhada dos Terreiros ao Calendário Oficial do Estado ( Decreto Estadual nº 42.483/2015) e a criação da Medalha Solano Trindade ( Decreto Estadual n°42.481/2015).
Além de integrantes de diversas manifestações religiosas de matriz africana e do Movimento Negro Unificado, a audiência contou, também, com a participação do promotor Westei Conde, da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos do Ministério Público de Pernambuco (MPPE), do presidente da Comissão de Direito e Liberdade Religiosa da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PE), Paulo de Tarso, entre outros.