
Parecer 6674/2021
Texto Completo
PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 2192/2021
AUTORA: DEPUTADA DELEGADA GLEIDE ÂNGELO
PROPOSIÇÃO QUE DISPÕE SOBRE A VEDAÇÃO DA EXIGÊNCIA DE EXPERIÊNCIA PROFISSIONAL PRÉVIA PARA A SELEÇÃO DE ESTAGIÁRIOS, NO ÂMBITO DO ESTADO DE PERNAMBUCO.VIABILIDADE DA INICIATIVA PARLAMENTAR. POSSIBILIDADE DE EXERCÍCIO DA COMPETÊNCIA LEGISLATIVA DOS ESTADOS-MEMBROS EM RELAÇÃO ÀS SELEÇÕES REALIZADAS PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. COMPETÊNCIA CONCORRENTE DOS ESTADOS PARA LEGISLAR SOBRE EDUCAÇÃO (ART. 24, IX, DA CF/88). COMPATIBILIDADE MATERIAL COM O DEVER IMPOSTO AO ESTADO DE PROMOVER O PLENO DESENVOLVIMENTO DA PESSOA E SUA QUALIFICAÇÃO PARA O TRABALHO (ARTS. 205; 214, INCISO IV; E 227 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL). PELA APROVAÇÃO.
1. RELATÓRIO
Vêm a esta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, para análise e emissão de parecer, o Projeto de Lei Ordinária nº 2192/2021 de autoria da Deputada Delegada Gleide Ângelo, que dispõe sobre a vedação da exigência de experiência profissional prévia para a seleção de estagiários, no âmbito do Estado de Pernambuco.
O Projetos em referência tramita nesta Assembleia Legislativa pelo regime ordinário (art. 223, inciso III, do Regimento Interno).
É o relatório.
2. PARECER DO RELATOR
A proposição em análise encontra guarida no art. 19, caput, da Constituição Estadual e no art. 194, inciso I, do Regimento Interno desta Assembleia Legislativa, não estando no rol de assuntos cuja deflagração do processo legislativo compete privativamente ao Governador do Estado. Infere-se, portanto, quanto à iniciativa, sua constitucionalidade formal subjetiva.
No que tange à possibilidade de exercício da competência legislativa, cumpre destacar que o PLO nº 2192/2021 trata sobre matéria inserta na competência concorrente entre União e Estados-Membros para legislar sobre educação:
“Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
[...]
IX - educação, cultura, ensino, desporto, ciência, tecnologia, pesquisa, desenvolvimento e inovação;”
Nesta mesma linha, o Supremo Tribunal Federal, ao analisar lei catarinense, em 2019, assim se pronunciou:
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. LEI ORGÂNICA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DE SANTA CATARINA. CRIAÇÃO DE PROGRAMA DE ESTÁGIO PARA ESTUDANTES DE PÓSGRADUAÇÃO NO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL. AUSÊNCIA DE USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIAS LEGISLATIVAS PRIVATIVAS DA UNIÃO. DIPLOMA QUE NÃO REGULAMENTA MATÉRIA AFETA A DIREITO DO TRABALHO. COMPATIBILIDADE DA NORMA COM A LEGISLAÇÃO FEDERAL QUE DISCIPLINA A MATÉRIA (LEIS FEDERAIS 9.394/1996 E 11.788/2008). INEXISTÊNCIA DE AFRONTA AO PRINCÍPIO DO CONCURSO PÚBLICO. ESTABELECIMENTO DE CRITÉRIOS OBJETIVOS PARA A SELEÇÃO DOS ESTUDANTES CONTEMPLADOS PELO PROGRAMA. AÇÃO DIRETA CONHECIDA. PEDIDO JULGADO IMPROCEDENTE.
- A Constituição Federal dispõe que compete privativamente à União legislar sobre direito do trabalho (artigo 22, I) e estabelecer as diretrizes e bases da educação nacional (artigo 22, XXIV), ao passo que compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre educação, cultura, ensino, desporto, ciência, tecnologia, pesquisa, desenvolvimento e inovação (artigo 24, IX).
- O estagiário, diferentemente do empregado, tem como objetivo fundamental da sua jornada – seja perante entidade privada, seja em meio ao serviço público – agregar conhecimentos e desenvolver capacidades essenciais à sua inserção e progresso no mercado de trabalho e não contribuir, primordialmente, para o incremento de lucratividade/eficiência da instituição em que estagia. 3. A Lei federal 11.788/2008 determina que o estágio não cria vínculo empregatício de qualquer natureza, observados os seguintes requisitos: (i) matrícula e frequência regular do educando em curso de educação superior, de educação profissional, de ensino médio, da educação especial e nos anos finais do ensino fundamental, na modalidade profissional da educação de jovens e adultos e atestados pela instituição de ensino; (ii) celebração de termo de compromisso entre o educando, a parte concedente do estágio e a instituição de ensino; e (iii) compatibilidade entre as atividades desenvolvidas no estágio e aquelas previstas no termo de compromisso. 4. O regime jurídico do estágio profissional do parquet estadual de Santa Catarina apresenta os mesmos critérios delineados na legislação federal, ao fixar, como requisitos para a admissão de graduandos ou pósgraduandos (i) a regular matrícula do aluno em instituição de ensino (art. 65); (ii) a celebração de termo de compromisso (art. 70); e (iii) a limitação da jornada de estágio a 30 horas semanais, de maneira a compatibilizar seu exercício com os estudos do educando. A lei estadual determina, igualmente, que o estagiário será dispensado automaticamente quando da conclusão ou do abandono do curso em que estiver matriculado ou na hipótese de ausência de renovação da sua matrícula no curso (artigo 71, III, alíneas a e d, da Lei Complementar 738/2019)
[...]
6. A legislação in foco institui verdadeiro programa de estágio para estudantes de pós-graduação, não se prestando à contratação de servidores em caráter temporário por vias transversas, de modo que as normas impugnadas estão adstritas à seara da competência legislativa concorrente insculpida no artigo 24, IX, da Constituição Federal. 7. O artigo 205 da Constituição Federal consagra um conceito amplo de direito à educação, enfatizando suas potencialidades no campo do desenvolvimento existencial do indivíduo, de um lado, e na seara econômica, de outro, dada a sua especial relevância para a concretização dos objetivos constitucionais associados à valorização do trabalho humano e à tutela da livre-iniciativa. 8. A complexidade, a dinamicidade e a especialização que marcam o mercado de trabalho contemporâneo, fruto da sociedade do conhecimento, demandam que o processo de aprendizado do cidadão, enquanto pressuposto para o pleno desenvolvimento das suas capacidades individuais para o trabalho, seja contínuo”
(ADI 5752, Relator(a): LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 18/10/2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-238 DIVULG 30-10-2019 PUBLIC 04-11-2019)
Sob a perspectiva exclusiva das seleções de estágio promovidas por órgãos e entidades da Administração Pública do Estado de Pernambuco, a matéria é ainda mais pacífica, posto tratar-se de matéria contemplada na autonomia político-administrativa dos entes federativos estaduais, nos termos dos arts. 18, caput, e 25, § 1º, da Constituição Federal, in verbis:
Art. 18. A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.
[...]
Art. 25. Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem, observados os princípios desta Constituição.
§ 1º São reservadas aos Estados as competências que não lhes sejam vedadas por esta Constituição.
Por fim, em relação à constitucionalidade material, o teor da proposição coaduna-se com valores e preceitos consagrados na Carta Magna, em especial com o dever imposto ao Poder Público de promover o desenvolvimento da pessoa e sua qualificação para o trabalho:
Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
Art. 214. A lei estabelecerá o plano nacional de educação, de duração decenal, com o objetivo de articular o sistema nacional de educação em regime de colaboração e definir diretrizes, objetivos, metas e estratégias de implementação para assegurar a manutenção e desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis, etapas e modalidades por meio de ações integradas dos poderes públicos das diferentes esferas federativas que conduzam a: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 59, de 2009)
[...]
IV - formação para o trabalho;
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Diante do exposto, opina-se pela aprovação do Projeto de Lei Ordinária nº 2192/2021, de autoria da Deputada Delegada Gleide Ângelo.
É o Parecer do Relator.
3. CONCLUSÃO DA COMISSÃO
Tendo em vista as considerações expendidas pelo relator, o parecer desta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, por seus membros infra-assinados, é pela aprovação do Projeto de Lei Ordinária nº 2192/2021, de autoria da Deputada Delegada Gleide Ângelo.
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