Rebeca Carneiro
Pessoas transplantadas e doadores cadastrados de órgãos ou tecidos pagam meia entrada em cinemas, shows e teatros em Pernambuco. A lei que garante esse direito foi proposta pelo deputado Fabrizio Ferraz (Solidariedade) e está em vigor desde 2021. O objetivo da norma é incentivar que mais pessoas se declarem doadoras, assim como valorizar quem já doou.

DESCONTO – Benefício estadual também contempla pessoas transplantadas. Foto: Divulgação
O benefício é àqueles considerados aptos por entidade reconhecida em nível estadual, desde que sejam respeitadas as normas estabelecidas pelo Ministério da Saúde (MS) e Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A condição deverá ser comprovada na entrada do estabelecimento por documento oficial.
A fisioterapeuta Vivana Lins, que faz parte do grupo de doadores de medula óssea, já utiliza a meia-entrada. “Fiz meu cadastro em 2007, quando nem sabia que poderia vir a existir algum tipo de benefício em relação a isso. Para mim, é um privilégio poder doar, esse é o benefício”, afirma.

VALORIZAÇÃO – Fabrizio Ferraz propôs norma para incentivar que mais pessoas se declarem doadoras. Foto: Jarbas Araújo
Para acessar o desconto, ela utiliza o aplicativo do Registro Nacional de Doadores de Medula Óssea (Redome), no qual constam os dados dela e as informações sobre o cadastro como doadora. “Poder dar a oportunidade de alguém recomeçar a vida com um ato tão simples é muito gratificante”, acredita Vivana.
Os estabelecimentos que descumprirem a norma podem levar uma advertência na primeira autuação. Se for recorrente, a multa pode chegar a R$ 100 mil, além da suspensão temporária da atividade ou até a cassação da licença de funcionamento.
Autorização
O coordenador da Central de Transplantes de Pernambuco, André Bezerra, explica o processo para se tornar um doador. “Posso me tornar doador de medula óssea ainda vivo, fazendo uma coleta de sangue no Hemope. Farei parte de um banco e, quando precisarem, vão me ofertar a possibilidade de doar”, diz.
“Também há a doação de órgãos intervivos, mas a legislação só prevê essa possibilidade entre parentes até o grau de primos, ou com autorização judicial. Já no caso do doador falecido, posso fazer uma autodeclaração no Sistema Aedo (Autorização Eletrônica de Doação de Órgãos), do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Me inscrevo, agendo com um tabelião e crio um documento seguro daquela minha vontade.”

DECLARAÇÃO – CNJ criou Sistema Aedo para registrar vontade do doador. Foto: Reprodução Internet
Entretanto, o médico frisa que mesmo a Aedo não tem poder legal: “Se eu concordo com a doação dos meus órgãos e tecidos, devo deixar minha família, de forma séria, ciente dessa minha vontade”, complementa Bezerra.
Lista de espera

ESPERANÇA – “A partir do transplante, meu filho irá renascer”, diz Geziane Cristina. Foto: Reprodução TV Alepe
Moradora do município de Carinhanha, no interior da Bahia, Geziane Cristina é mãe de Antônio, de 4 anos, que tem uma doença hepática e realiza o tratamento em um hospital de referência no Recife. O menino está na fila do transplante de órgãos: aguarda para receber um novo fígado.
“É muito difícil aceitar que seu filho está doente, sendo que você o via correndo e brincando saudável. Tem família que não pensa em doar órgãos, mas desconsidera quantas vidas poderia salvar. A partir do transplante, meu filho irá renascer”, anseia.
Ela e Antônio foram acolhidos pela Associação Pernambucana de Apoio aos Doentes do Fígado (Apaf), entidade sem fins lucrativos que colabora para melhorar a vida dos pacientes em tratamento. A equipe médica da instituição atua diretamente na unidade de transplante de fígado do Hospital Universitário Oswaldo Cruz e já realizou mais de 1.600 transplantes.
Diretor-presidente da instituição, o hepatologista Cláudio Lacerda ressalta a importância da doação de órgãos. “Existem milhares de pessoas que dependem de um órgão para sobreviver. Além disso, qualquer um de nós a qualquer momento poderá passar para o lado daqueles que precisam desesperadamente de um transplante”, frisa o especialista.

SUS – Para o médico Cláudio Lacerda, sistema de transplantes brasileiro é “motivo de orgulho”. Foto: Reprodução TV Alepe
Em 2024, o Brasil bateu recorde histórico de transplantes realizados no Sistema Único de Saúde (SUS), com mais de 30 mil procedimentos, um crescimento de 18% em relação a 2022. O resultado foi apresentado pelo Ministério da Saúde no último dia 4 de junho. “Deve ser motivo de orgulho para nós”, afirma Lacerda.
Coordenado pelo MS, o Sistema Nacional de Transplantes (SNT) é responsável pela regulamentação, controle e monitoramento do processo de doação e de transplantes de órgãos e tecidos realizados no país. A lista de espera é única e vale tanto para o SUS quanto para pacientes da rede privada. Dados de junho de 2025 apontam que mais 45 mil brasileiros aguardam pela cirurgia.
“As pessoas que precisam de transplantes de órgãos no Brasil são completamente apoiadas, é algo muito sério. Não existe nenhum tipo de privilégio. Quem regula e define é a gravidade”, conclui Lacerda.