Comissão de Cidadania recebe denúncias de violações em unidades prisionais e socioeducativas

Em 20/05/2025 - 17:05
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VIOLAÇÕES – Audiência da Comissão de Cidadania recebeu instituições de defesa dos direitos humanos. Foto: Nando Chiappetta

Violações de direitos humanos dentro de unidades prisionais e socioeducativas do Estado foram denunciadas em um relatório elaborado pelo Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT). O documento, apresentado durante audiência pública da Comissão de Cidadania na segunda (19), resultou de diversas inspeções promovidas pela entidade. 

As visitas ocorreram no mês de abril de 2024. As unidades acessadas pelo grupo foram a Colônia Penal Feminina de Buíque, no Agreste Meridional; a Penitenciária Juiz Plácido de Souza, em Caruaru, no Agreste Central; o Presídio de Igarassu, na Região Metropolitana do Recife, e o Hospital Psiquiátrico Ulysses Pernambucano, no Recife, que atende presos diagnosticados com transtornos mentais. 

RELATÓRIO – Camila Antero, do MNPCT, apontou superlotação, violência e transferências ilegais. Foto: Nando Chiappetta

Segundo a coordenadora-geral do MNPCT, Camila Antero, além de superlotação e dificuldades estruturais, foram identificados outros problemas. “Violência, tortura e coação, pouca oferta de trabalho e educação, e uso de armamento letal nos pavilhões. É muito sintomático, quando a gente entra em uma unidade, e a maioria das pessoas não quer conversar porque está com medo.”

Afora isso, conforme denunciou a representante do organismo de direitos humanos, está havendo em Pernambuco, ainda, a prática de transferências administrativas de presos para unidades mais distantes, sem ordem judicial prévia. Camila Antero explicou que isso tem funcionado “como uma espécie de castigo ilegal, para afastar essas pessoas, inclusive, do convívio com a família”.

   

Menores de idade

Com relação à realidade dos socioeducandos no Estado, o MNPCT disse não estar muito distante daquela constatada nas casas de detenção. Foram inspecionadas duas unidades: o Centro de Internação Provisória (Cenip) do Recife, que atende meninos, e o Centro de Atendimento Socioeducativo (Case) Santa Luzia, também localizado na capital e que assiste meninas. 

 Nesses locais, detectou-se o uso de algemas, quartos semelhantes a celas, ambientes sujos – sem equipes de serviços gerais –, ausência de práticas esportivas e um cenário de agressões e ameaças praticadas por agentes públicos. Além disso, no Case Santa Luzia, foram encontradas, à época da visita, três adolescentes gestantes. Após denúncia, as jovens evoluíram para medidas mais brandas e foram retiradas da internação.  

Relatos

O relatório foi reforçado pelos relatos de familiares de detentos e socioeducandos que fizeram cobranças ao Governo do Estado. Marcela Betânia narrou a rotina de medo a que o marido tem sido submetido no Presídio de Itaquitinga 2, na Mata Norte. “O diretor chamou o meu esposo dizendo que eu estava num protesto e, se ele não dissesse o meu nome, iria botar ele no isolamento. E que estava grampeando o telefone da gente, das esposas.”

Já Josias Alexandre, que é pai de um detento, denunciou as péssimas condições de infraestrutura do Presídio Policial Penal Leonardo Lago, que integra o complexo do Curado, no Recife. Segundo comentou, os pavilhões foram erguidos com estruturas de ferro similares a containers. “Como é que aquelas pessoas vão sobreviver seis meses, um ano, dentro de uma cela, sem ventilação e sem iluminação? E alguns de lá sofrem de problemas psicológicos, que nem meu filho.

O juiz de Execução Penal da capital, Evandro Cabral, manifestou apoio às famílias das pessoas com privação de liberdade e destacou que “as denúncias que chegam à unidade são registradas e devidamente apuradas”. A representante do Núcleo de Direitos Humanos da Defensoria Pública, Marília Tenório, por sua vez, também classificou como inaceitáveis certas condutas dentro das penitenciárias.

Nomeações

Outro aspecto questionado, na audiência, foram as nomeações de integrantes para o Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate à Tortura feitas pelo Governo do Estado, no mês passado, por meio de decreto e não por seleção pública. O órgão estava parado desde janeiro de 2023, quando a atual gestão promoveu uma série de exonerações. 

PRESIDENTE – Dani Portela criticou nomeações para órgão estadual sem seleção pública. Foto: Nando Chiappetta

Presidente da Comissão de Cidadania, a deputada Dani Portela (PSOL) argumentou que as indicações feitas pela governadora Raquel Lyra ferem as prerrogativas da entidade, comprometendo sua independência e autonomia, conforme previstas na lei 14.863/2012. “Diante disso, eu pergunto se o governo lançará um edital respeitando o artigo 5º, parágrafo primeiro e segundo, assegurando a participação do comitê estadual nesse processo.”

A secretária-executiva de Direitos Humanos do Estado, Gláucia Andrade, informou não ter havido descumprimento legal nas nomeações feitas pelo Governo para o mecanismo estadual e reafirmou o compromisso do Poder Executivo com a proteção dos direitos humanos. “Estamos trabalhando para fortalecimento tanto do mecanismo para que possa realizar suas visitas técnicas a locais de privação de liberdade e documentar, como também, de forma estadual, recomendar as medidas contra as práticas de tortura e maus-tratos.”

Encaminhamentos

Ao final da audiência pública, Dani Portela propôs alguns encaminhamentos. Dentre eles, solicitou a revogação imediata, pelo Governo do Estado, do ato que nomeou peritos para o mecanismo estadual; pediu o envio do relatório do mecanismo nacional a todas as entidades presentes; demandou ao Ministério Público de Pernambuco a inspeção das denúncias relativas ao uso de armas com balas de borracha, spray de pimenta e gás lacrimogêneo dentro dos presídios, entre outros.

Também participaram do encontro o defensor público Henrique da Fonte; a representante do Gabinete de Assessoria Jurídica das Organizações Populares (Gajop) Marília Falcão, bem como representações da Secretaria de Administração Penal e Ressocialização e da Fundação de Atendimento ao Socioeducativo.

Homenagem

ATIVISTA – Militante de direitos humanos, Wilma Melo foi homenageada durante a audiência pública. Foto: Nando Chiappetta

Ainda durante o encontro, a deputada Dani Portela prestou uma homenagem à coordenadora do Comitê Estadual de Prevenção e Combate à Tortura, Wilma Melo. A parlamentar foi autora de um requerimento de Voto de Aplausos, em reconhecimento aos mais de 30 anos de dedicação da militante à defesa dos direitos humanos. Na ocasião, uma placa comemorativa foi entregue à homenageada.