Efetivação de Plano contra exploração sexual infantil é tema de debate

Em 14/05/2025 - 18:05
-A A+

DISCUSSÃO – Audiência pública integrou a programação do Maio Laranja. Foto: Nando Chiappetta

A naturalização e a subnotificação dos casos de exploração sexual de crianças e adolescentes são algumas das principais dificuldades apontadas para o enfrentamento desse crime. Essa é a avaliação dos participantes da audiência pública dedicada ao tema, promovida pela Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da Alepe nesta quarta (14).

Foi apresentada no encontro a estimativa de que, por ano, 23 mil menores de idade são vítimas de exploração sexual na Região Metropolitana do Recife. O número contrasta com os números do Governo. Dados da Secretaria de Defesa Social de Pernambuco (SDS-PE), informados pela Rede Estadual de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes, indicam apenas cinco ocorrências do crime, de janeiro a março deste ano.

O número maior foi apresentado pela pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz Ana Brito. Ela esteve à frente de um estudo financiado pelo Governo dos Estados Unidos que resultou no documento Um enfoque sobre as vítimas invisíveis: Crianças e adolescentes envolvidas no comércio sexual na região metropolitana de Recife, Pernambuco, Brasil.

Ambiente escolar

ATENÇÃO – Ana Brito reforçou o papel das escolar na observação de sinais de exploração sexual. Foto: Nando Chiappetta

A pesquisadora frisou a necessidade de buscar as estimativas, já que, segundo ela, os registros da polícia não dão conta de mostrar a realidade. Ana Brito acredita que ações de prevenção e combate deveriam ocorrer prioritariamente em equipamentos de saúde e educação.

“O levantamento mostrou que pelo menos 80% das crianças exploradas estavam matriculadas nas escolas e frequentavam unidades de saúde. Antes de chegar à polícia, as vítimas acessam esses locais. Precisamos trabalhar melhor os profissionais desses espaços, para perceberem os sinais da exploração de menores”, observou.

A adolescente Renata Laurentino, de 17 anos, que integra o Coletivo Mulher Vida, relatou a falta de orientação sobre o assunto no ambiente escolar. “A minha escola não tem assistente social. Como a criança vai enfrentar uma situação de abuso, se ela não sabe nada sobre esse problema? É preciso que as escolas falem sobre isso”, pontuou a jovem.

OMISSÃO – Rosana França criticou o Estado por ter passado oito anos sem Plano Decenal para o setor. Foto: Nando Chiappetta

O delegado Darlson Freire de Macedo, gestor do Departamento de Polícia da Criança e do Adolescente de Pernambuco, reforçou a importância de denunciar os casos de exploração sexual de crianças e adolescentes. “Eu faço um apelo à sociedade, para que denuncie. Essa subnotificação precisa acabar. A gente precisa de conhecimento para poder agir. E toda a rede precisa ser fortalecida”, afirmou.

A coordenadora da Rede, Rosana França, comentou um mapeamento da Polícia Rodoviária Federal (PRF) que identificou 812 pontos de risco para a exploração sexual de menores nas rodovias federais de Pernambuco, nos anos de 2023 e 2024.

Plano decenal

Ela criticou o Governo do Estado por ter passado oito anos sem Plano Decenal de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes. “O cenário é de total descaso e omissão do Estado. O último Plano havia sido elaborado em 2007. Foram oito anos de luta da sociedade civil organizada, denunciando a ausência dessa ferramenta que orienta e elabora políticas de prevenção e enfrentamento”, enfatizou. 

Rosana  França salientou que, embora um novo Plano tenha sido aprovado pelo Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (Cedca-PE) no último mês, não há dotação orçamentária destinada à execução do instrumento.

Ela ainda listou uma série de ações necessárias para o combate à exploração sexual de menores, entre elas a implementação da Lei Federal nº 13.431/2017, que estabelece o sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência. Rosana também solicitou a realização de um levantamento que inclua dados de todo o estado de Pernambuco.

Governo

GOVERNO – Carlos Diego apresentou ações como a capacitação de conselhos tutelares. Foto: Nando Chiappetta

O secretário executivo da Criança e Juventude, Carlos Diego, apresentou a atuação do Governo na área. Ele ressaltou o trabalho de capacitação de aparelhos municipais, como conselhos tutelares e Centros de Referência de Assistência Social (CRAS). Destacou ainda a atividade do Comitê de Escuta Protegida, que coordena a implantação da Lei nº 13.431/2017 no estado, e comunicou a previsão de instalação de um Centro de Atendimento Integrado (CAI) para crianças e adolescentes vítimas de violência e de um observatório para monitorar indicadores e metas da gestão.

O secretário também comentou a aprovação do Plano Decenal. “Um orçamento para colocar em prática o que está previsto no Plano é um passo posterior, que deve ser tomado a partir do momento em que o Plano é implementado. Mas muitas das ações previstas no documento já vêm sendo executadas”, informou o gestor.

Parlamentares

PRESIDENTE – Gleide Ângelo defendeu fiscalização para o Estado cumprir o dever de proteger as crianças. Foto: Nando Chiappetta

A audiência foi solicitada pela presidente da Comissão da Mulher, deputada Delegada Gleide Ângelo (PSB). Ela anunciou que o colegiado vai acompanhar a atuação do Executivo no enfrentamento à exploração sexual de crianças e adolescentes. “A  Rede já indicou o que o Estado precisa fazer. Agora a gente precisa cobrar, precisa de prazos. Não é só fazer um relatório, mandar para o Governo e esperar. Vamos fiscalizar”, declarou a deputada.

O deputado João Paulo (PT) ressaltou a necessidade de integrar ações dos governos federal, estadual e das prefeituras no combate ao problema. “Não adianta nos reunirmos, fazermos apontamentos e não ver as coisas acontecendo na ponta, com a prioridade que a lei garante e o tema exige”, considerou o parlamentar.

O encontro foi realizado no mês dedicado à conscientização sobre o tema, o Maio Laranja, marcado pelo Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, no dia 18. Também participaram do encontro representantes da OAB-PE, do Conselho Municipal de Defesa e Promoção dos direitos da Criança e do Adolescente do Recife, do Departamento de Polícia da Mulher e das secretarias estaduais da Mulher e de Assistência Social, Combate à Fome e Políticas Sobre Drogas.