
DEMANDAS – Setor quer investimentos em infraestrutura e redução de impostos. Foto: José Paulo Lacerda/CNI
Luciano Galvão Filho
Em épocas de crise, é sobre os investimentos que pesa a caneta dos governantes. Porque há mínimos a respeitar em áreas como saúde e educação, normalmente são as obras públicas os primeiros alvos dos cortes necessários para atravessar os momentos de dificuldade. Assim, adutoras, estradas, infraestrutura urbana e outros empreendimentos que rendem melhorias imediatas para a população ficam à espera de que a situação fiscal se recupere.
Obras públicas são primeiros alvos de cortes necessários para atravessar momentos de dificuldade.
Os investimentos públicos são, também, uma demanda da indústria. A depender do porte, a instalação e a operação dos empreendimentos industriais mobilizam recursos contados aos bilhões, o que torna a participação do poder público decisiva para a viabilidade dos negócios – e aumenta o peso com que as escolhas políticas se fazem sentir sobre o segmento.
Nesta terceira e última reportagem da série Economia e Eleições, representantes da indústria em Pernambuco apontam quais as pautas a serem enfrentadas para superar o momento de dificuldade do setor – que experimenta recuos nos últimos anos – e analisam de que maneira o momento da política no Brasil repercute sobre a economia industrial do Estado.
Infraestrutura
Há pelo menos 1,5 mil obras públicas paralisadas em Pernambuco, segundo o levantamento mais recente divulgado pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-PE). O inventário inclui apenas os contratos sob a responsabilidade do Governo do Estado e das prefeituras. “A infraestrutura de Pernambuco está se deteriorando e precisa ser reativada. Precisamos resolver problemas no Porto de Suape e fazer o Arco Metropolitano. A Adutora do Agreste já deveria estar pronta e a Ferrovia Transnordestina precisa tomar destino”, enumera o presidente da Federação das Indústrias de Pernambuco (Fiepe), Ricardo Essinger.
Ele desconfia da possibilidade de que projetos como esses sejam concluídos em breve. Isso porque, analisa, as principais candidaturas, a contar pelas propostas, não sinalizam claramente a intenção de atuar para melhorar a situação fiscal dos governos – que hoje têm dificuldades para dar conta dos compromissos mais básicos. “O que a gente tem visto preocupa”, resume Essinger.
A apreensão manifestada pelo empresário tem fundamento naquilo que se observa nos anos mais recentes. O momento da economia e a consequente piora no caixa do Estado resultaram em uma atuação mais tímida do setor público como indutor do crescimento. Se em 2013, quando a arrecadação vivia seus melhores dias, o Governo de Pernambuco destinou R$ 2,9 bilhões para obras e para a compra de equipamentos, nos últimos três anos esse valor mal ultrapassou R$ 1 bilhão por ano.
Secretário executivo do Sindicato das Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico de Pernambuco (Simmepe), Girley Brazileiro relata como toda uma cadeia pode sofrer com mudanças bruscas nos rumos de grandes investimentos públicos – nesse caso, por decisão do Governo Federal e das estatais vinculadas à União.
Projetado para ser a âncora da industrialização de Pernambuco, o polo naval instalado no Complexo de Suape, na Região Metropolitana do Recife, tem como único cliente a Petrobras e as subsidiárias dela. Com toda a turbulência produzida pelo envolvimento da empresa em escândalos de corrupção e pela troca de governo a partir do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, boa parte dos contratos com os estaleiros foram cancelados e os empreendimentos estancaram.

CRISE – Envolvimento da Petrobras em escândalos de corrupção prejudicou empreendimentos ligados ao Estaleiro Atlântico Sul. Foto: José Paulo Lacerda/CNI
“Quem investiu pesadamente para atender o setor naval viu as oportunidades desaparecerem”, descreve Girley Brazileiro. Mesmo os esforços das empresas para fechar negócios no mercado internacional têm esbarrado na desconfiança das companhias estrangeiras com o momento do País, acrescenta. “O mercado se retraiu, e as pequenas empresas estão sofrendo amargamente, muitas fechando as portas. A expectativa é sombria e, apesar de todos os instrumentos de incentivos fiscais de que o Estado dispõe, ninguém tem coragem nem condições de investir”, pontua.
em crédito imobiliário vão sobrar no Brasil em 2018 e 2019, calcula Abecip.
A baixa demanda também tem sido um problema para o setor de construção civil, que representa um terço da produção industrial em Pernambuco. Muito por conta da incerteza sobre de que maneira irá se comportar a economia, calcula-se que irão sobrar quase R$ 115 bilhões em crédito imobiliário no Brasil neste e no próximo ano, um recorde de recursos disponíveis sem que haja interessados em tomá-los, segundo cálculos da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip).
Para o presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil de Pernambuco (Sinduscon-PE), José Antonio Simón, uma saída para driblar esse cenário pode ser a criação de um fundo estadual destinado à construção de habitações de interesse social. Isso garantiria recursos para uma política semelhante ao programa Minha Casa, Minha Vida, do Governo Federal. “Nosso déficit habitacional ainda é razoável, e foram poucas construções de moradias populares em Pernambuco nos últimos tempos”, avalia.
Alternativas de energia
Instabilidade na oferta de energia elétrica e altas tarifas relacionadas ao serviço são outro obstáculo à expansão da atividade industrial no Estado, apontam os representantes do setor. Servindo-se principalmente de hidrelétricas e de termelétricas, a geração de energia sofre influência da inconstância das chuvas, dos altos e baixos dos níveis de reservatórios e dos elevados custos de geração pelas usinas térmicas – o que torna o ambiente menos favorável a novos negócios.
“Aqui a energia é cara, inconfiável e de futuro imprevisível. No nosso Nordeste, a alternativa hídrica está praticamente esgotada e a desertificação é um ponto bastante visível. Para piorar, as possibilidades eólicas, solar e de biomassa ainda são soluções limitadas e onerosas”, registra Ricardo Essinger. O presidente da Fiepe defende incentivos para a geração a partir de fontes alternativas.
No Sertão do Araripe, onde se produz praticamente todo o gesso do País, o problema da disponibilidade de energia tem, inclusive, repercussões ambientais. Formada por cerca de mil empreendimentos, a cadeia do Polo Gesseiro é composta principalmente por pequenos negócios – que fazem amplo uso da lenha como fonte de energia e, em muitos casos, extraem madeira de espécies nativas da Caatinga e de áreas de preservação.
Para a presidente do Sindicato da Indústria do Gesso de Pernambuco (Sindugesso), Ceiça Costa, dada a realidade das empresas, o cenário requer participação intensa do poder público. “Precisamos de diversificação da matriz energética, de manejo florestal sustentável e de fontes energia limpa. Mas nossas empresas estão, em sua maioria, em crise, e não têm condições de realizar esses investimentos sem ajuda dos governos”, conta. Para ela, as mudanças também precisam ser seguidas de fiscalização dos negócios que insistirem em práticas irregulares. “Se não forem fiscalizadas, a informalidade e a ilegalidade prejudicam a concorrência.”
Reduzir impostos
Se a demanda por investimentos públicos é uma constante no discurso de quem se dedica à indústria, equilibrar essa necessidade com o imperativo de manter saudáveis as contas dos governos não é uma equação simples – e o caminho mais fácil para a gestão, o de aumentar tributos, é também o mais doloroso para o contribuinte.
“Para voltarmos a crescer necessitamos de austeridade fiscal, capaz de aumentar a produção e não os impostos, como algumas propostas mirabolantes possam sugerir”, reage Ricardo Essinger. Ele ainda propõe a edição, em Pernambuco, de um Código Estadual de Defesa do Contribuinte, nos moldes de uma proposta que tramita no Congresso Nacional para ampliar os direitos na relação entre os pagadores dos tributos e os órgãos de fiscalização.
O segmento de confecções de Pernambuco – o segundo maior do Brasil e responsável por cerca de 180 mil empregos no Estado – é particularmente sensível a essa questão. Também composto por pequenos empreendimentos, a exemplo do Polo Gesseiro, a tributação do setor foi sempre um problema tanto para os governos quanto para a formalização dos pequenos negócios. Um modelo desenhado no ano passado pela Secretaria da Fazenda em conjunto com os empresários simplificou a cobrança dos impostos estaduais e pode, inclusive, viabilizar a instalação de novas fábricas de tecidos no Interior.
Presidente do Sindicato da Indústria de Fiação e Tecelagem de Pernambuco (Sinditêxtil), Oscar Rache Ferreira comemora as iniciativas do Estado para facilitar o trabalho das empresas. “Quando tudo está caminhando, os atores do setor ficam mais confiantes”, observa. “Os gestores da cadeia têxtil e da moda têm mantido um bom diálogo com instâncias governamentais. Embora a situação da economia ainda seja muito ruim, a gente espera que as eleições tragam alguma estabilidade e tenhamos à frente um horizonte um pouco melhor”, projeta.
*Fotos em destaque: Rinaldo Marques/Arquivo Alepe (home) e José Paulo Lacerda/CNI (especial)