A luta para erradicar o analfabetismo em Pernambuco

Em 07/09/2018
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“A gente sem aprender a ler e a escrever, a gente é cega, e a gente aprendendo a ler e a escrever, você tem outra visão, tudo fica mais claro. Aprendi a falar melhor, a me comportar melhor também.” Faz apenas três anos que a dona de casa Josenilda Maria da Silva saiu da estatística. No nordeste, 14% das pessoas acima dos 15 anos não sabem ler nem escrever de acordo com o IBGE. Todas as noites, Josenilda e outros 27 colegas frequentam uma sala de aula do Sesc, no bairro de Santo Amaro, área central do Recife. Estão na segunda fase do fundamental da Educação de Jovens e Adultos, EJA, que corresponde ao período entre o terceiro e o quinto ano do ensino regular.

Coordenadora regional do EJA no Sesc Pernambuco, Ana Freire conta que a oferta da modalidade de ensino se tornou uma atividade regular da instituição no ano de 2000. Atualmente, existe em 14 unidades, na capital e interior do Estado: “Nós temos tanto a realidade daqueles estudantes mais idosos, que são dos anos iniciais, como também nós temos a realidade de pessoas mais jovens, que são trabalhadores do comércio e serviços, que eles são alfabetizados, eles concluíram o ensino fundamental, mas eles não conseguiram chegar até a conclusão do Ensino Médio”.

A partir dos 15 anos, é possível ingressar no Ensino Fundamental e na Alfabetização. Aos 18, é permitido o acesso ao Ensino Médio. E não há limite de idade. Em Bodocó, por exemplo, a instituição chegou a atender uma estudante de 100 anos. Alfabetizar os mais velhos é essencial para que o país cumpra a meta do Plano Nacional de Educação, PNE: erradicar o analfabetismo absoluto até 2024 e reduzir em 50% o analfabetismo funcional, que atinge aqueles que, mesmo frequentando a escola, não são capazes de compreender textos simples ou resolver pequenas operações matemáticas. Trinta e oito por cento dos idosos nordestinos não sabem ler.

Aos 68 anos, Sebastiana Jacinta de Oliveira precisou formar os filhos primeiro para satisfazer a vontade de frequentar a escola que a acompanha desde criança: “Eu nem sabia que aqui no Sesc tinha. Eu frequentava a terceira idade, o padre chegou lá chamando a turma, aí eu disse: ‘Ai, meu Deus, eu vou! Eu vou, porque faz vergonha, né, a pessoa querer escrever e não saber? Agora não, eu leio no meio do público e não sinto mais vergonha, me sinto mais segura, né?”

A aproximação dos conteúdos com a realidade dos estudantes é um diferencial do trabalho na avaliação do supervisor pedagógico, padre Bruno Lira: “Eles têm que saber onde aplicar, o que a gente chama de ensino resinificado. Sempre partindo da realidade deles. Eles também trazem textos para ser lidos aqui. Através de palavras geradoras também, usamos um pouquinho o método Paulo Freire, e sempre temos um projeto conjunto, que a alfabetização também entra. É um projeto de leitura crítica da realidade, de transformação social, porque a gente acredita que o ensino é para a transformação social.

No Sesc, as séries iniciais são gratuitas. Para as demais, as mensalidades de 50 reais para comerciários e 100 reais para o público em geral podem ser dispensadas se a renda familiar for de até três salários mínimos. Já na Rede Estadual, a oferta de Educação de Jovens e Adultos acontece em 500 escolas, de 166 municípios, incluindo aquelas localizadas em unidades prisionais. O foco é no Ensino Médio, assim como ocorre na educação regular. São mais de 60 mil alunos, a maioria na faixa etária dos 18 a 29 anos.

Também há programas em parceria com o Governo Federal direcionados à alfabetização em si, a exemplo do Paulo Freire, que, na última edição, atendeu 20 mil pessoas em 94 municípios. Na avaliação de Ana Freire, o maior desafio para motivar adultos a estudar é mesmo trabalhar a autoestima: “Muitos acham que não são capazes, que não conseguem, que nunca estudaram, que não sabem pegar na caneta, e que vêm totalmente sem nenhuma condição de aprendizagem. E a gente fazer com que esse estudante perceba que ele tem potencial, e que ele vai ter o tempo dele no processo de aprendizagem é um grande desafio.” Assim, quem pensava apenas em assinar o nome, pode alçar vôos mais altos e chegar – quem sabe? – a uma universidade.