
ESTIAGEM – Em meio século, região se firmou como projeto bem-sucedido de fruticultura irrigada no Sertão. Entretanto, há cinco anos, produção de frutas é ameaçada pela seca. Foto: Rinaldo Marques
Uva, manga, banana, goiaba, acerola e coco verde. Em pleno Semiárido nordestino, no Vale do Rio São Francisco, a máxima do “em se plantando, tudo dá” pareceu se confirmar ao longo dos últimos 50 anos. A terra em que antes predominava a pecuária extensiva – o gado “criado solto” – e alguns cultivos, como os de algodão e feijão de corda, passou a receber investimentos para a agricultura irrigada em maior escala. Principalmente, a partir da criação da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), em 1959.
O cenário se consolidou com a instalação da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), em 1973, e da Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco (Codevasf) – hoje também do Parnaíba – no ano seguinte. “Inicialmente, o foco era as tecnologias de sequeiro, ou seja, a agropecuária dependente de chuva, como milho e feijão de corda”, relata o chefe-adjunto de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Semiárido, Flávio Souza.
Nos anos 1980, a região ganhou novo impulso direcionando investimentos paira a exportação de frutas frescas. “Com a evolução do Vale, houve migração das pesquisas para a introdução de cultivos irrigados. Agora estamos dando um novo passo com culturas de clima temperado, como pera, maçã e caqui”, explica. Segundo Souza, o papel da Embrapa é avaliar as variedades mais adaptadas ao ecossistema e os níveis mais adequados de irrigação e adubação. “Assim, conseguimos programar a safra de manga e melhorar o manejo das uvas finas de mesa”, acrescenta.
Hoje, a fruticultura irrigada e a agroindústria de vinhos finos são a base da economia dos municípios de Lagoa Grande, Santa Maria da Boa Vista e Petrolina, que, ao lado de Orocó, compõem a porção pernambucana do Vale. São 300 mil hectares contemplados pela tecnologia, nos quais se produz 99% da uva nacional e 85% da manga brasileira vendidas nos mercados estrangeiros. Juntas, essas cidades representam um Produto Interno Bruto (PIB) da ordem de R$ 2,8 bilhões, dos quais R$ 2,2 bilhões estão em Petrolina.
Dados do Ministério de Desenvolvimento e Comércio Exterior apontam que Petrolina já exportou o equivalente a US$ 86,5 milhões, somente nos dez primeiros meses deste ano, duas vezes mais que o Recife. O município alcançou o segundo lugar em exportação no Estado – atrás apenas de Ipojuca, onde está o Complexo de Suape. Também é vice-líder na produção de vinhos no País, com sete vinícolas e sete milhões de litros da bebida por ano, o que representa 15% do mercado nacional.
Informações do Governo do Estado indicam, ainda, que o Vale reúne três mil produtores de frutas, gera cerca de 1,15 milhão de empregos diretos e indiretos em Pernambuco e na Bahia. Petrolina foi, ainda, a cidade que mais criou empregos em Pernambuco, de janeiro a agosto deste ano, com a abertura de 3.141 postos de trabalho, conforme o Ministério do Trabalho e Emprego.
SECA – Meio século de investimentos públicos e privados na área enfrentam, desde 2010, uma estiagem que fez secar a Barragem de Sobradinho, um dos maiores lagos artificiais do mundo. O reservatório, principal fonte de água para os produtores, aproxima-se do volume morto. Para não interromper o fornecimento, balsas flutuantes estão sendo instaladas emergencialmente.
“As perspectivas são as piores. Mesmo esse sistema de captação só será capaz de operar com uma vazão total de 13,3 metros cúbicos por segundo, mas nossa demanda atual é de 16”, argumenta o gerente-executivo do Distrito de Irrigação Nilo Coelho (Dinc), Paulo Sales. A associação sem fins lucrativos administra uma estrutura pública de fornecimento de água para 2.322 produtores.
“Se essa situação se prolongar, todo mundo vai quebrar, pois o custo de energia vai chegar a R$ 4 milhões com gastos com óleo diesel para manter o sistema funcionando.” Responsável por 120 mil empregos diretos, o Dinc representa 25% do PIB de Petrolina e produz 700 mil toneladas de frutas por ano.
A expectativa da Codevasf, órgão que montou a estrutura de irrigação administrada pelo Dinc e responsável pela instalação dos flutuantes, é menos sombria. “Sobradinho tem hoje cerca de 2,5% do volume útil, mas ainda há seis bilhões de metros cúbicos de volume morto. Não existe nenhuma restrição hídrica para o projeto”, afirma o gerente de Irrigação da Codevasf em Petrolina, José Barros. A obra da estrutura auxiliar de captação está em estágio avançado. “Mas só vamos acionar se houver real necessidade”, pontua.
*Esta matéria faz parte do jornal Tribuna Parlamentar de novembro. Confira a edição completa.