Assembleia discute precarização de costureiras do polo de confecções

Em 30/04/2024 - 20:04
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AUDIÊNCIA – Discussão reuniu coletivos de mulheres, ONGs e pesquisadoras. Foto: Giovanni Costa

Problemas de saúde mental, dores de coluna, falta de sono e até violência física foram algumas das questões apontadas na audiência pública que debateu a precarização do trabalho das costureiras do polo de confecções do Agreste. O encontro, promovido pela Comissão de Cidadania, foi realizado na Câmara Municipal de Caruaru, no Agreste Central, nesta terça (30).

O trabalho em facções foi apontado como prejudicial às mulheres. Nesse modelo, não se produz uma peça inteira, mas é realizado, em grande escala, um único serviço como pregar mangas, zíperes ou fazer bainhas. O valor unitário pode chegar a R$ 0,05. 

Outra dificuldade desse sistema é a informalidade. As mulheres trabalham de casa e precisam, além de bater as metas da costura, cuidar dos afazeres domésticos e dos filhos.

No ramo há 15 anos, Maria Valdinete é faccionista. Ela contou que a carga de trabalho chega a 14 horas diárias e que, devido às longas jornadas, teve a coluna comprometida. 

Representando o coletivo Mulheres Criando Moda, Valdinete descreveu a condição das costureiras informais. “Ninguém vê a realidade dessas mulheres que viram a noite, sem hora para comer e dormir e chegam a apanhar por não dar conta do serviço. São situações degradantes”, relatou. 

“Nós somos a maioria do polo. É preciso valorizar e dar visibilidade a esse trabalho, porque sem as costureiras informais não existe polo de confecções”, afirmou.

TRABALHADORAS – “Sem as costureiras informais não existe polo de confecções”, apontou Maria Valdinete, do coletivo Mulheres Criando Moda. Foto: Giovanni Costa

Produção feminina

A falta de valorização do trabalho das costureiras foi apontada como uma contradição por Maria Betânia Ávila, do Instituto Feminista pela Democracia SOS Corpo. 

“As mulheres dão sustentação a esse arranjo produtivo tão importante para Pernambuco, mas têm o trabalho e, consequentemente, a vida precarizados”, analisou.

Presidente da Comissão de Cidadania, a deputada Dani Portela (Psol) reforçou que as mulheres são as principais responsáveis pela produção do polo de confecções do Agreste, o segundo maior do Brasil. 

“É fundamental sabermos quais as condições de trabalho de quem produz essa riqueza para o estado. São mulheres, mães de família, que trabalham de casa por horas a fio, por valores baixos. E acabam tendo a própria saúde e a da família afetadas”, destacou a parlamentar.

EXAUSTÃO – “Ao perguntarmos às mulheres o que elas querem, muitas respondem que desejariam um dia de lazer”, pontuou Pergentina Vilarim. Foto: Giovanni Costa

Pergentina Vilarim, do coletivo de mulheres Casa Lilás, falou sobre o projeto Costurando Moda com Direitos, coordenado pela ONG Fase, que mobiliza as costureiras a lutar por condições dignas de trabalho. 

“Ao perguntarmos às mulheres o que elas querem, muitas respondem que desejariam um dia de lazer”, pontuou, ressaltando a rotina intensa a que estão submetidas essas trabalhadoras.

Coordenadora da Fase, Luiza de Melo Souza levantou necessidades da categoria. “Políticas de fomento à produção de mulheres, subsídio para pagamento de energia elétrica, cuidados com a saúde, construção de creches e a definição de preço mínimo por facção são algumas dessas medidas”, listou.

A participação no mercado de trabalho é maior nos municípios do polo do que em outras regiões do país, como afirmou a representante do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Milena Prado.

Porém, segundo ela, isso não significa boas condições de trabalho. “Há uma grande população ocupada, mas ela vive na informalidade. E muitas dessas pessoas se identificam como empresárias, porque trabalham de casa. Não se veem numa lógica de precarização”, observou.

Iniciativas

PARLAMENTARES – As deputadas Dani Portela e Rosa Amorim foram as representantes da Alepe no evento. Foto: Giovanni Costa

A secretária executiva da Mulher de Pernambuco, Juliana Gouveia, indicou iniciativas do governo estadual voltadas para as trabalhadoras, como o programa Bora Empreender, Mulher, com R$ 18 milhões em linhas de crédito para alavancar negócios encabeçados por mulheres. 

“Sabemos da lacuna de direitos e da invisibilidade das costureiras. A governadora Raquel Lyra tem compromisso com as pautas das mulheres e vai continuar investindo em ações como abertura de creches e cursos de qualificação profissional”, disse a gestora.

A deputada Rosa Amorim (PT), que solicitou o encontro, anunciou uma indicação ao Poder Executivo sugerindo a inclusão das costureiras do polo de confecções no programa Chapéu de Palha. A medida destina benefícios para trabalhadores da cana, da fruticultura irrigada e da pesca artesanal, em períodos de entressafra. 

“O Estado deve garantir o mínimo de crédito para essas mulheres que impulsionam a economia. São pelo menos 11 mil trabalhadoras que têm quase todos os direitos negados e que precisam estar assistidas em momentos de baixa produtividade”, defendeu a parlamentar.

Rosa Amorim informou, ainda, que vai pedir uma audiência com a governadora, junto com representações das costureiras, para apresentar a indicação. A iniciativa tem autoria dela, da deputada Dani Portela e do deputado João Paulo (PT).

GOVERNO – “Sabemos da lacuna de direitos e da invisibilidade das costureiras”, respondeu a secretária executiva Juliana Gouveia. Foto: Giovanni Costa