Audiência alerta para risco de colapso nos serviços de hemodiálise

Em 13/12/2023 - 17:12
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CRISE – Médicos, gestores e donos de clínicas debateram problemas do setor que atende 6,5 mil pernambucanos. Foto: Roberta Guimarães

As dificuldades enfrentadas cotidianamente pelos pacientes com doença renal crônica motivaram a audiência pública realizada nesta quarta (13) pela Comissão de Saúde da Alepe.  Durante o encontro, médicos, gestores e donos de clínicas especializadas discutiram a crise no setor de hemodiálise em Pernambuco. Eles apontaram a defasagem da tabela de procedimentos do Sistema Único de Saúde (SUS) como um dos riscos para a continuidade dos serviços oferecidos.

CENÁRIO – Situação das clínicas vêm se agravando não só em Pernambuco, mas em todo o Brasil, salientou Luciano Duque. Foto: Roberta Guimarães

O debate foi presidido pelo deputado Luciano Duque (Solidariedade), que pediu a realização da audiência. Ele reforçou que mais de 6,5 mil pernambucanos dependem da hemodiálise, enfrentando ainda o risco de ficar sem atendimento. “A falta de equipamentos e de vagas para sessões vêm se agravando não só em Pernambuco, mas em todo o Brasil, formando uma fila de quem simplesmente não pode esperar”, disse o parlamentar. 

De acordo com ele, o SUS remunera cada sessão de hemodiálise por R$ 240,97, enquanto o custo real é de R$ 305. Portanto, cada atendimento gera um prejuízo de R$ 64. Por esse motivo, segundo ele, as clínicas estão sucateadas, endividadas e algumas já sem recolher obrigações trabalhistas e tributárias. “Mensalmente, somado o prejuízo de todas as clínicas de hemodiálise do estado, chega a mais de R$ 5 milhões”, emendou.

DEFASAGEM – Tabela do SUS torna insustentável situação das clínicas , relatou Wagner Barbosa. Foto: Roberta Guimarães

Ele ainda destacou que a falta de vagas nas clínicas conveniadas leva pacientes renais crônicos a serem internados em hospitais públicos e conveniados. Atualmente, são mais de 200 pessoas internadas por esse motivo, informou o parlamentar 

Vice-presidente da Associação Brasileira dos Centros de Diálise e Transplante (ABCDT) em Pernambuco, o nefrologista Wagner Barbosa, ainda sugeriu a abertura de linhas de crédito para a renovação dos equipamentos das clínicas conveniadas. 

“Com a tabela defasada, a condição está insustentável. Não podemos ampliar o número de vagas e o parque de máquinas está péssimo”, disse. Ele considerou “desumanas” ainda as jornadas enfrentadas por pacientes do Interior que precisam se deslocar três vezes por semana para realizar sessões de quatro horas de hemodiálise fora de suas cidades.

Cofinanciamento

Os participantes da discussão enfatizaram que governos de estados como Rio de Janeiro, Santa Catarina, Bahia e Mato Grosso do Sul passaram a destinar recursos próprios para complementar os repasses federais. E outros, como Paraná, Minas Gerais e Distrito Federal, além da prefeitura de São Paulo, estão avaliando alternativas semelhantes.

PROPOSTA – Joaquim Melo defendeu cofinanciamento por parte da gestão estadual, como já ocorre em outros estados. Foto: Roberta Guimarães

Esse tipo de cofinanciamento foi defendido pelo médico Joaquim Melo, proprietário de clínicas de diálise nas cidades do Cabo e Paulista, ambas na Região Metropolitana do Recife. Para ele, é preciso criar um sistema auto-sustentável, para atender os pacientes atuais e futuros. 

“É urgente que a Secretaria estadual de Saúde se sensibilize com a questão neste momento dificílimo. Em quase todas clínicas do estado há listas de espera. São pacientes que estão em leitos de hospitais e enfermarias e poderiam estar em casa”, assinalou.

Risco de colapso

“Em Carpina, por conta da necessidade, estamos fazendo quarto turno. Os pacientes fazem a sessão de 20h à meia-noite. É desumano. O colapso está iminente”, agregou Tarcísio Gomes, que administra duas clínicas. “Não temos nefrologista em campo e, por conta do subfinanciamento, nenhum jovem hoje quer atuar nessa área”, emendou a médica Suzana Melo.

Integrante da diretoria do Sindicato dos Hospitais de Pernambuco (Sindhospe), Clóvis Carvalho acentuou que a inflação medida pelo INPC nos últimos 29 anos, desde a criação do Plano Real, foi de 667,5%, enquanto o aumento médio da tabela SUS foi de 93%. Já Nivaldo Souza Júnior, do Instituto Nephron de Estudos e Pesquisas, sugeriu a criação de um segundo Hospital das Clínicas no Estado. 

Gestão

SECRETARIA – Diana Sarmento informou que gestão estadual também pretente ter ações preventivas do uso de diálise. Foto: Roberta Guimarães

Representando a Secretaria Estadual de Saúde, Diana Sarmento informou que o estado está preparando um plano de ação voltado aos pacientes portadores de doença renal crônica. Para ela, a solução depende de atenção aos três níveis de atendimento – primário, secundário e terciário. Diana lembrou que cerca de 65% dos pacientes com indicação para fazer diálise tiveram tratamentos de hipertensão e diabetes negligenciados. 

“O nosso plano de ação é para intervir de forma estruturada e contínua, de forma que a diminuir as demandas que a gente têm hoje e desacelerar o número de pessoas entrando na diálise em médio e longo prazo”, explicou. “Vamos iniciar um projeto piloto em Afogados da Ingazeira (Sertão do Pajeú), para treinar profissionais de unidades básicas de saúde para diagnosticar precocemente qualquer alteração renal e encaminhar para um especialista”.

ALERTA – Socorro Pimentel (União) avalia que hemodiálise vive “início de uma crise sanitária”. Foto: Roberta Guimarães

Durante a audiência pública, a deputada Socorro Pimentel(União) alertou para o “início de uma crise sanitária” e para o risco de a situação se agravar, já que a quantidade de pacientes renais crônicos tende a aumentar no país. “Hoje a conta não fecha. Esse debate tem que envolver o governo federal, o Congresso, a Alepe e os prefeitos, para que a gente possa encontrar uma solução viável e evitar a perda de vidas”, defendeu.

Ao tratar do financiamento da Saúde, o deputado José Patriota (PSB) recordou a extinção, a partir de 2008, da CPMF. O tributo havia sido criado em 1996 para ampliar as receitas do setor. Ele ainda cobrou mais empenhos dos municípios na ampliação da cobertura da atenção básica. “O problema não é só de dinheiro. Também é de foco e gestão”, observou.

O debate ainda teve a participação de representantes da SOS Rim de Caruaru, do Real Hospital Português, e de outras clínicas de nefrologia em funcionamento no estado.