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PARECER


PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 1254/2017

AUTORIA: DEPUTADO CLODOALDO MAGALHÃES


EMENTA: PROPOSIÇÃO QUE DISPÕE SOBRE O DESCONTO AOS PROFESSORES DAS REDES
PÚBLICAS DE ENSINO. INICIATIVA PRIVATIVA DO GOVERNADOR DO ESTADO, NOS TERMOS DO
ART. 19, §1º, INCISO II, DA CARTA ESTADUAL. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL
SUBJETIVA. INTERFERÊNCIA DO PODER LEGISLATIVO SOBRE OS CONTRATOS DE CONCESSÃO.
OFENSA AO PRINCÍPIO REPUBLICANO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. INCONSTITUCIONALIDADE
MATERIAL. LEI ESTADUAL Nº 11.519, DE 5 DE JANEIRO DE 1998. PELA REJEIÇÃO.

1. RELATÓRIO
É submetido à apreciação desta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça,
para análise e emissão de parecer, o Projeto de Lei Ordinária nº 1254/2017, de
autoria do Deputado Clodoaldo Magalhães, que institui desconto de 50% nas
tarifas de transporte intermunicipal para professores das redes públicas do
Estado de Pernambuco.

Em sua justificativa o Exmo. Parlamentar defende que:

“[...] Recentemente, a Secretaria de Estado da Educação promoveu um confuso
processo de atribuição de aulas para os professores da rede. Muitos não
conseguiram mais ter aulas numa mesma unidade e muitos outros, nem mesmo na
mesma cidade.
Como se isso não fosse o bastante, o Governo Estadual passou a caçar os
professores e retirar-lhes o benefício de desconto nas passagens
intermunicipais. Ora, se o profissional mal recebe para exercer o trabalho, há
anos sem reposição sequer das perdas inflacionárias, agora ainda terá que,
literalmente, pagar para ir dar aulas. [...]”

O projeto de lei em referência tramita sob o regime ordinário.

É o relatório.


2. PARECER DO RELATOR

Indubitavelmente, a iniciativa do Exmo. Sr. Deputado Clodoaldo Magalhães é
bastante valorosa, e representa uma elevada sensibilidade social, ao pretender
propiciar plena liberdade de locomoção aos professores das redes públicas de
ensino.

Entretanto, apesar de a proposta prever 50% de desconto dos preços das
passagens, que representa justamente a ausência de custo financeiro a priori, o
fato é que há aí uma repercussão econômica oculta. Pois bem, a tarifa que os
professores deixarão de pagar será suportada ou por aqueles não contemplados
pela gratuidade (refletida no aumento tarifário), ou por subsídios do Poder
Público.

Sob esse prisma, a instituição de qualquer espécie de gratuidade significa
diminuição da receita das empresas consorciadas. Por conseguinte, haverá
alteração das bases para o cálculo da tarifa estabelecida, acarretando ao final
o desequilíbrio econômico-financeiro de todos os contratos de concessão.

Nesse sentido, é importante mencionar a Lei Estadual nº 11.519/1998 (estabelece
critérios para a concessão de gratuidade no transporte público de passageiros
em todo o território do Estado de Pernambuco e dá outras providências), que
veda, expressamente, o subsídio de gratuidade ou abatimento no preço da
passagem às custas do Sistema de Transportes Públicos de Passageiros, à exceção
dos benefícios de natureza social já concedidos a maiores de 65 anos;
estudantes residentes nos Municípios da Região Metropolitana do Recife; e
deficientes físicos.

Logo, a previsão de novas espécies de gratuidade tão somente poderia ser
concebida caso houvesse a estipulação de fonte de receita vinculada, como
assegura o art. 1º da retro citada lei, senão vejamos:

Art. 1º A gratuidade ou abatimento na passagem de transporte de passageiros
intermunicipal, em todo o território do Estado de Pernambuco, só poderá ser
concedida com fonte de receita vinculada.

Art. 3º O Sistema de Transporte Público de Passageiros não poderá subsidiar a
gratuidade ou abatimento no preço da passagem, exceto para os seguintes
benefícios de natureza social já concedidos:
I - aos maiores de 65 anos, em cumprimento à determinação contida no parágrafo
segundo do art. 23 da Constituição Federal, que concede gratuidade nos
transportes urbanos e intermunicipais;
II - aos estudantes residentes nos municípios da Região Metropolitana do
Recife, em cumprimento à Lei Estadual de nº 5.703/65, que concede abatimento de
50% (cinquenta) por cento sobre o preço de passagens; e
III - aos deficientes físicos, em cumprimento à Lei nº 15.582/92, no âmbito do
Município do Recife.
IV- aos pacientes crônicos renais e transplantados.

Em reforço às disposições acima, no sentido de que a instituição de gratuidade
no transporte público deve ser considerada como despesa, impende transcrever o
art. 8º da Lei Estadual 14.474/2011, que trata da política tarifária do Sistema
de Transporte Público de Passageiros da Região Metropolitana do Recife –
STPP/RMR, in verbis:

Art. 8º Compete ao CSTM, considerados dotações orçamentárias dos entes
consorciados em favor do CTM e eventuais subsídios tarifários instituídos por
quaisquer dos entes consorciados, nos termos do art. 26 da Lei Complementar
Federal nº 101, de 4 de maio de 2000, fixar, a partir de proposta do CTM
fundada nos custos e no número estimado de usuários pagantes do STPP/RMR
pagantes, as tarifas a serem cobradas.
Parágrafo único. Os valores das tarifas a serem cobradas dos usuários devem
custear e suportar, já consideradas dotações orçamentárias e subsídios
tarifários referidos no caput, as seguintes despesas: [...]
VII - gratuidades e abatimentos.

Assim sendo, adotada a premissa de que a gratuidade representa despesa
(pública), caberá em última instância ao Poder Executivo a obrigação de arcar
com os gastos correspondentes.

Como consequência, um eventual projeto nesse sentido colidiria frontalmente com
o inciso II, do §1º, do art. 19 da Constituição Estadual:

Art. 19. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer
membro ou Comissão da Assembleia Legislativa, ao Governador, ao Tribunal de
Justiça, ao Tribunal de Contas, ao Procurador-Geral da Justiça e aos cidadãos,
nos casos e formas previstos nesta Constituição.
§ 1º É da competência privativa do Governador a iniciativa das leis que
disponham sobre: [...]
II - criação e extinção de cargos, funções, empregos públicos na administração
direta, autárquica e fundacional, ou aumento de despesa pública, no âmbito do
Poder Executivo;

Segundo se observa, é da competência privativa do Governador a iniciativa de
leis que disponham sobre criação e extinção de cargos, funções, empregos
públicos na administração direta, autárquica e fundacional, ou aumento de
despesa pública, no âmbito do Poder Executivo. Esse é rigorosamente o caso ora
em estudo.

Inclusive, situações semelhantes já ocorreram em outros Estados da federação, e
os Tribunais de Justiça respectivos se posicionaram no sentido da
inconstitucionalidade em razão do vício de iniciativa. Eis as ementas dos
citados julgados:

“INCONSTITUCIONALIDADE - LEI MUNICIPAL N° 311/2002 DA COMARCA DE ITU - LEI QUE
ESTENDEU O BENEFÍCIO DA GRATUIDADE DO TRANSPORTE PÚBLICO AOS PORTADORES DE
DEFICIÊNCIA MENTAL - LEI DE INICIATIVA DE VEREADORA DA CÂMARA MUNICIPAL DE ITU
- INCONSTITUCIONALIDADE POR VÍCIO DE INICIATIVA - MATÉRIAS QUE IMPLICAM EM
AUMENTO DAS DESPESAS DO MUNICÍPIO QUE SÃO DE INICIATIVA PRIVATIVA DO PREFEITO
MUNICIPAL - INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA INCIDENTALMENTE - RECURSO
PROVIDO.”
(TJSP, ACÓRDÃO VOTO 18035, 17ª Câmara de Direito Privado, Relator Des. Tersio
José Negrato, 07/11/2007)

“INCONSTITUCIONALIDADE – ADIN - LEI ESTADUAL – INSTITUIÇÃO GRATUIDADE AOS
MAIORES DE 65/ANOS PARA USO DE TRANSPORTE COLETIVO INTERMUNICIPAL - CRIAÇÃO
INDEVIDA PELA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA - INVASÃO DE COMPETÊNCIA EXCLUSIVA DO
PODER EXECUTIVO – A COMPETÊNCIA, COM EXCLUSIVIDADE, DAS INICIATIVAS DE LEI QUE
DISCIPLINAM A CONCESSÃO E PERMISSÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS, PREVISTO NO ART. 61,
II, "b" DA CF, ART. 47 XVIII, DA CONST. EST. S. PAULO, É INDELEGÁVEL -
INICIATIVA DE LEI DESSA QUALIDADE POR DEPUTADO, NÃO SE CONVALIDA PELA SANÇÃO
POSTERIOR DO GOVERNADOR, ATO QUE NÃO TEM O CONDÃO DE TRANSMUDAR EM
CONSTITUCIONAL LEI INVALIDA DESDE A SUA INICIATIVA - AFRONTA A DISPOSITIVOS
CONSTITUCIONAIS ESTADUAIS - AÇÃO PROCEDENTE.”
(TJSP, OE, ADIN. N°: 131.548-0/1-00, COMARCA: SÃO PAULO, VOTO N°: 15761,
Relator OSCARLINO MOELLER, 15/08/07)

“CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA. ISENÇÃO DE TARIFA NO TRANSPORTE COLETIVO
MUNICIPAL. LEI DE INICIATIVA DO EXECUTIVO. 1. É INCONSTITUCIONAL A LEI
3.214/03, DO MUNICÍPIO DE SÃO BORJA, QUE CONCEDEU ISENÇÃO DE TARIFA NO
TRANSPORTE COLETIVO, INSTITUINDO "PASSE LIVRE", PORQUE SE CUIDA DE LEI DE
INICIATIVA EXCLUSIVA DO CHEFE DO EXECUTIVO, A TEOR DO ART. 82, VII, DA CE/89.
PRECEDENTES. 2. AÇÃO DIRETA JULGADA PROCEDENTE.”
(TJRS, Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 70007642739, Tribunal Pleno,
Relator: Araken de Assis, Julgado em 05/04/2004)

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI MUNICIPAL RESULTANTE DE PROJETO DE
ORIGEM PARLAMENTAR, QUE ESTABELECE ISENÇÃO DE TARIFA NO TRANSPORTE COLETIVO
URBANO. MATÉRIA DE INICIATIVA EXCLUSIVA DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO LOCAL.
INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL DA NORMA. CONCESSÃO DE SERVIÇO PÚBLICO. TRANSPORTE
URBANO. ISENÇÃO TARIFÁRIA SEM ESPECIFICAÇÃO DA FONTE DE CUSTEIO. COLISÃO COM O
ART. 137, § 2º, II, DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL. INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL.
PEDIDO PROCEDENTE.
(TJ-SC, Relator: Maurílio Moreira Leite, Data de Julgamento: 04/08/2004,
Tribunal Pleno)

Noutro giro, haveria de se cogitar também na indevida interferência do Poder
Legislativo sobre o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos celebrados
com os concessionários (empresas de ônibus), a significar ofensa ao Princípio
da Separação dos Poderes.

Neste particular, o Supremo Tribunal Federal, julgando ação direta de
inconstitucionalidade, já encampou tese bastante semelhante, senão vejamos:

EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI N. 7.304/02 DO ESTADO DO
ESPÍRITO SANTO. EXCLUSÃO DAS MOTOCICLETAS DA RELAÇÃO DE VEÍCULOS SUJEITOS AO
PAGAMENTO DE PEDÁGIO. CONCESSÃO DE DESCONTO, AOS ESTUDANTES, DE CINQUENTA POR
CENTO SOBRE O VALOR DO PEDÁGIO. LEI DE INICIATIVA PARLAMENTAR. EQUILÍBRIO
ECONÔMICO-FINANCEIRO DOS CONTRATROS CELEBRADOS PELA ADMINISTRAÇÃO. VIOLAÇÃO.
PRINCÍPIO DA HARMONIA ENTRE OS PODERES. AFRONTA.
1. A lei estadual afeta o equilíbrio econômico-financeiro do contrato de
concessão de obra pública, celebrado pela Administração capixaba, ao conceder
descontos e isenções sem qualquer forma de compensação.
2. Afronta evidente ao princípio da harmonia entre os poderes, harmonia e não
separação, na medida em que o Poder Legislativo pretende substituir o Executivo
na gestão dos contratos administrativos celebrados.
3. Pedido de declaração de inconstitucionalidade julgado procedente.
(ADI 2733, Relator(a): Min. EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 26/10/2005,
DJ 03-02-2006 PP-00011 EMENT VOL-02219-02 PP-00280)

Destarte, a proposta carrega vício de inconstitucionalidade formal subjetiva,
por ofensa às regras de iniciativa.

Sobre a inconstitucionalidade formal subjetiva, assim leciona Pedro Lenza, in
verbis:

“Vício formal subjetivo: o vício formal subjetivo verifica-se na fase de
iniciativa. Tomemos um exemplo: algumas leis são de iniciativa exclusiva
(reservada) do Presidente da República, como as que fixam ou modificam os
efetivos das Forças Armadas, conforme o art. 61, § 1.º, I, da CF/88. Iniciativa
privativa, ou melhor, exclusiva ou reservada, significa, no exemplo, ser o
Presidente da República o único responsável por deflagrar, dar início ao
processo legislativo da referida matéria. Em hipótese contrária (ex.: um
Deputado Federal dando início), estaremos diante de um vício formal subjetivo
insanável, e a lei será inconstitucional.”
(LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado / Pedro Lenza. 16. ed.
rev., atual. e ampl. – São Paulo: Saraiva, 2012)

Diante do exposto, opino pela rejeição do Projeto de Lei Ordinária nº
1254/2017, de autoria do Deputado Clodoaldo Magalhães, por vício de
inconstitucionalidade.

3. CONCLUSÃO DA COMISSÃO
Ante o exposto, tendo em vista as considerações expendidas pelo relator, a
Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, por seus membros
infra-assinados, opina pela rejeição do Projeto de Lei Ordinária nº 1254/2017,
de autoria do Deputado Clodoaldo Magalhães, por vício de inconstitucionalidade.

Presidente: Waldemar Borges.
Relator: Isaltino Nascimento.
Favoráveis os (5) deputados: Antônio Moraes, Isaltino Nascimento, Ricardo Costa, Romário Dias, Teresa Leitão.
Favoráveis com restrições os (0) deputados: .
Contrários os (0) deputados: .

Presidente
Waldemar Borges
Efetivos
Edilson Silva
Isaltino Nascimento
Ricardo Costa
Rodrigo Novaes
Romário Dias
Sílvio Costa Filho
Teresa Leitão
Tony Gel
Suplentes
Aluísio Lessa
Antônio Moraes
Joel da Harpa
José Humberto Cavalcanti
Julio Cavalcanti
Lucas Ramos
Simone Santana
Socorro Pimentel
Autor: Isaltino Nascimento

Histórico

Sala da Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, em 22 de maio de 2018.

Isaltino Nascimento
Deputado


Informações Complementares

Status
Situação do Trâmite: Enviada p/Publicação
Localização: Publicação

Tramitação
1ª Publicação: 23/05/2018 D.P.L.: 11
1ª Inserção na O.D.:

Sessão Plenária
Result. 1ª Disc.: Data:
Result. 2ª Disc.: Data:

Resultado Final
Publicação Redação Final: Página D.P.L.: 0
Inserção Redação Final na O.D.:
Resultado Final: Data:


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