PROJETO DE LEI ORDINÁRIA 137/2023
Garante às mulheres vítimas de Crimes de Violência Doméstica e Familiar e de Crimes Contra a Dignidade Sexual, o direito ao atendimento por policiais femininas no âmbito das Delegacias de Polícia Civil do Estado de Pernambuco.
Texto Completo
Art. 1º Fica garantido o atendimento por policiais femininas, no âmbito das Delegacias de Polícia Civil do Estado de Pernambuco, às mulheres vítimas de crimes caracterizados como Violência Doméstica e Familiar, nos termos da Lei Federal nº 11.340, de 7 de agosto de 2006, e de Crimes Contra a Dignidade Sexual, nos termos do Decreto-Lei Federal nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal).
Art. 2º As Delegacias de Polícia Civil afixarão cartazes informativos com a divulgação do direito assegurado por esta Lei.
§ 1º Os cartazes serão afixados em local de fácil visualização, com o tamanho padrão mínimo de 29,7 cm (vinte e nove centímetros e sete milímetros) de altura por 42,0 cm (quarenta e dois centímetros) de largura (Folha A3), com caracteres em negrito, contendo a seguinte informação:
“CONFORME LEI Nº _______, MULHERES VÍTIMAS DE CRIMES CARACTERIZADOS COMO VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR E DE CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL, POSSUEM O DIREITO DE SEREM ATENDIDAS POR POLICIAIS FEMININAS.”
§ 2º A critério do estabelecimento, os cartazes podem ser substituídos por tecnologias, mídias digitais ou audíveis, desde que assegurado, nos dispositivos utilizados para consulta, exibição ou audição, o mesmo teor do informativo.
Art. 3º O descumprimento dos dispositivos desta Lei pelas instituições públicas ensejará a responsabilização administrativa de seus dirigentes, em conformidade com a legislação aplicável.
Art. 4º Caberá ao Poder Executivo regulamentar a presente Lei em todos os aspectos necessários para a sua efetiva aplicação.
Art. 5º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Justificativa
Até o ano de 1985, Pernambuco não possuía delegacia de polícia voltada ao atendimento às mulheres. A 1ª Delegacia Especializada em Atendimento à Mulher (DEAM) de Pernambuco, foi instalada na cidade do Recife (a segunda no Brasil) e criada por força do Decreto nº 10.917 de 1º de novembro de 1985; em seguida, foi instalada a DEAM de Jaboatão dos Guararapes (Portaria nº 475/1990 – 2ª DEAM); as quais faziam parte da estrutura básica da Diretoria Executiva de Polícia Especializada.
Uma década depois, no ano de 2001, foram criadas a 3ª e a 4ª DEAM nas cidades de Petrolina e Arcoverde, respectivamente, por meio do Decreto nº 23.367, de 25 de junho daquele ano. A 5ª Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher foi criada por meio do Decreto nº 24.092/2002 e instalada na cidade de Caruaru.
A Lei nº 13.457, de 3 de junho de 2008, criou o Departamento de Polícia da Mulher – DPMUL, que tem como competência reprimir, apurar e coibir os casos de violência contra a mulher, especialmente os decorrentes de violência doméstica e familiar, inclusive os crimes de homicídios cometidos em tais circunstâncias (‘feminicídios’).
A lei traz na estrutura do DPMUL, além das DEAMs já citadas, a 6ª DEAM (Ipojuca – ainda não instalada), 7ª DEAM (Surubim), 8ª DEAM (Goiana), 9ª DEAM (Garanhuns), 10ª DEAM (Vitória de Santo Antão), 11ª DEAM (Salgueiro – ainda não instalada), 12ª DEAM (Ouricuri – ainda não instalada) e a 13ª DEAM (Afogados do Ingazeira).
No entanto, mesmo com a criação de equipamentos policiais especializados em determinadas localidades do Estado, ainda não é possível comportar a demanda que surgem em todas as regiões, visto que a violência contra a mulher é classificada como uma pandemia global.
Segundo o Mapa da Violência de 2019, houve um crescimento expressivo de 30,7% no número de homicídios de mulheres no Brasil durante a década de 2007-2017, assim como no último ano da série, que registrou acréscimo de 6,3% em relação ao anterior. A taxa passou de 3,9 para 4,7 mulheres assassinadas por grupo de 100 mil mulheres.
Abaixo, destacamos a evolução anual dos números de registros de crimes de violência doméstica e familiar do sexo feminino e do número de crimes de estupro, em Pernambuco, durante o período de janeiro de 2012 a dezembro de 2019, conforme dados fornecidos pela Secretaria Estadual de Defesa Social:
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2012 |
2013 |
2014 |
2015 |
2016 |
2017 |
2018 |
2019 |
Violência Doméstica e Familiar |
28.189 |
33.080 |
32.875 |
30.326 |
31.081 |
33.493 |
40.331 |
42.483 |
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2012 |
2013 |
2014 |
2015 |
2016 |
2017 |
2018 |
2019 |
Estupro
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2.761 |
2.916 |
2.627 |
2.205 |
2.312 |
2.361 |
2.756 |
2.466 |
Por essas razões, hoje, a Polícia Civil de Pernambuco possui em sua estrutura o DPMUL e as onze DEAMs. Porém, como a demanda é alta e pulverizada, o atendimento é descentralizado para as delegacias não especializadas, onde muitas vezes as vítimas precisam relatar aos policiais a dor e a humilhação vivenciadas nas situações de abuso e agressão.
O atendimento nas DEAMs correspondeu a 33,93% dos Boletins de Ocorrência registrados em todo Estado no ano de 2017, e 34,08% das ocorrências registradas no ano de 2018; ou seja, nelas foram efetuadas 1/3 (um terço) do total das ocorrências no que se refere a aplicação da Lei Maria da Penha pela Polícia Civil de Pernambuco.
Apesar do aumento do número de registros de ocorrências e de medidas protetivas expedidas, é inegável que existe o fenômeno da subnotificação dos crimes de violência doméstica e familiar. Dentre outros fatores, um dos motivos é que muitas vítimas relatam em órgãos de acolhimento que ainda têm dificuldades em registrar o Boletim de Ocorrência contra seus agressores: ou por temerem passar por um possível constrangimento, ou por não serem compreendidas em suas angústias, ou ainda por não serem levadas a sério e sofrerem preconceitos e julgamentos nas Delegacias de Polícia comuns, quando são atendidas por homens.
Estas mulheres relatam ainda que se sentem bem mais à vontade em efetuarem tais denúncias nas DEAMs ou quando são atendidas por agentes de polícia femininas.
É importante lembrar que o aumento dos registros de Boletins de Ocorrência resulta na redução dos números de feminicídio, uma vez que quanto mais se denuncia, reduz-se as chances da vítima sofrer violência novamente e facilita-se a identificação do agressor pela Polícia. Por isso, é fundamental que o Estado estabeleça mecanismos para tornar menos desconfortável o processo de atendimento a essas mulheres, estimulando-as a realizarem a denúncia.
Entretanto, sabemos das dificuldades fiscais que nosso Estado e todo setor público brasileiro vem enfrentando, o que dificulta a instalação de DEAMs em todos os municípios pernambucanos.
Dessa forma, apresentamos a presente proposta legislativa para que se garanta às vítimas desses tipos de crimes, o direito de ao menos serem atendidas por policiais femininas em todas as Delegacias (especializadas ou não). Cumpre registrar que recomendamos fortemente que esse atendimento também venha associado a um programa de qualificação para as policiais que forem realizar esses acolhimentos.
Felizmente, hoje, a Polícia Civil de Pernambuco já conta com um número significativo de agentes de polícia femininas, o que já torna possível a execução desse projeto de lei.
Lembramos, ainda, que a competência legislativa para essa proposição encontra respaldo no art. 19, da Magna Carta do Estado de Pernambuco, e no art. 194, I, do Regimento Interno desta Casa, uma vez que seu conteúdo não esbarra no rol de matérias a qual a iniciativa é reservada privativamente ao Governador do Estado.
Nesse sentido, salientamos que sob o aspecto financeiro e orçamentário, a execução normativa desta iniciativa não implicará em aumento de despesas para o Poder Público, e nem implicará na criação de atribuições para Secretarias de Estado, órgãos e entidades da administração pública.
Ademais, a proposição não viola os limites estabelecidos pela Constituição Federal, no que tange a competência remanescente dos Estados-membros para legislar sobre matérias que não foram incluídas nas competências enumeradas ou implícitas da União e dos Municípios, bem como não incidam nas vedações constitucionais que balizam a atuação dos entes federados, conforme previsto no §1º do art. 25 da Constituição Federal.
Destacamos que nosso Projeto cria uma garantia legal às mulheres pernambucanas, fundamentada na Constituição Federal de 1988 e na já mencionado Lei Federal nº 11.340/2006, que determina em seu art. 10-A que “é direito da mulher em situação de violência doméstica e familiar o atendimento policial e pericial especializado, ininterrupto e prestado por servidores - preferencialmente do sexo feminino - previamente capacitados”.
A medida ora proposta consolida a proteção da mulher, conferindo maior tranquilidade e liberdade no momento do atendimento, levando em consideração que, sob a ótica psicológica, a vítima se sentirá mais confortável em narrar seu caso para alguém do mesmo gênero. Na prática, essa garantia irá ajudar a redução do fenômeno da revitimização de milhares de mulheres pernambucanas.
O art. 1º, inciso III, da Carta Maior, elenca a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil. Da Constituição de l988 ainda emergem inúmeras outras normas afirmativas que buscam resguardar a mulher em situação de vulnerabilidade, a exemplo do § 5º do art. 226 da Lei Maior, que prevê isonomia jurídica entre homens e mulheres, especificamente no âmbito familiar, assim como o inciso XX, do art. 7º, que proíbe a discriminação das mulheres no mercado de trabalho.
O art. 3º da Lei Maria da Penha impõe ao Poder Público o dever de assegurar às mulheres "as condições para o exercício efetivo dos direitos à vida, à segurança, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, à moradia, ao acesso à justiça, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária".
Verifica-se, assim, que nossa proposição aperfeiçoa o disposto no art. 10-A da Lei Maria da Penha, não havendo, quanto à sua juridicidade, desarmonias entre a matéria discutida no projeto e as regras jurídicas positivas e os princípios gerais de Direito previstos explícita ou implicitamente na Constituição da República.
Diante de tais considerações, não havendo comprovado vício de inconstitucionalidade ou ilegalidade, estando presente o interesse público que motiva e legitima esse Projeto de Lei, solicito o valoroso apoio dos Nobres Parlamentares desta Assembleia Legislativa para sua aprovação.
Histórico
Delegada Gleide Angelo
Deputada
Informações Complementares
Status | |
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Situação do Trâmite: | PUBLICADO |
Localização: | SECRETARIA GERAL DA MESA DIRETORA (SEGMD) |
Tramitação | |||
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1ª Publicação: | 15/02/2023 | D.P.L.: | 8 |
1ª Inserção na O.D.: |