
Parecer 7257/2021
Texto Completo
PROJETO DE LEI ORDINÁRIA DESARQUIVADO Nº 1790/2017
AUTORIA: DEPUTADA PRISCILA KRAUSE
PROPOSIÇÃO QUE INSTITUI A OBRIGATORIEDADE DE OS ÓRGÃOS DO PODER PÚBLICO ESTADUAL DIVULGAREM INFORMAÇÕES DETALHADAS A RESPEITO DOS DESLOCAMENTOS AÉREOS REALIZADOS SOB SUAS RESPONSABILIDADES. MATÉRIA INSERTA NA ESFERA DE COMPETÊNCIA ADMINISTRATIVA E FINANCEIRA DOS ESTADOS-MEMBROS (ARTS. 18 E 25 C/C ART. 24, INCISO I, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL). VIABILIDADE DA INICIATIVA PARLAMENTAR. OBRIGAÇÃO COMPATÍVEL COM DEVER GERAL DE PROMOÇÃO DE PUBLICIDADE E TRANSPARÊNCIA NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA (ART. 5º, INCISOS XXXIII E XXXIV, “B”, E ART. 37, CAPUT E § 3º, INCISO II, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL). INEXISTÊNCIA DE VÍCIOS DE INCONSTITUCIONALIDADE E DE ILEGALIDADE. PELA APROVAÇÃO, NOS TERMOS DO SUBSTITUTIVO DESTE COLEGIADO.
1. RELATÓRIO
Vem a esta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, para análise e emissão de parecer, o Projeto de Lei Ordinária Desarquivado nº 1790/2017, de autoria da Deputada Priscila Krause, que institui a obrigatoriedade de os órgãos do poder público estadual divulgarem informações detalhadas a respeito dos deslocamentos aéreos realizados sob suas responsabilidades.
Em síntese, a proposição obriga que os órgãos e entidades públicas estaduais publiquem informações individualizadas sobre a emissão e o respectivo pagamento de viagens aéreas custeadas pelos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e órgãos correlatos, nos seus respectivos sítios eletrônicos destinados à transparência. Além disso, o Projeto de Lei prevê que, no caso de fretamento ou locação de aviões, devem ser divulgados os nomes dos passageiros, os destinos e motivação das viagens, a empresa responsável pelo deslocamento e o valor da contratação por trecho realizado. Por fim, a proposta esclarece que suas disposições não serão aplicáveis ao Programa de Tratamento Fora de Domicílio, incluindo o paciente e o acompanhante.
O Projeto de Lei em referência tramita nesta Assembleia Legislativa pelo regime ordinário (art. 223, inciso III, do Regimento Interno).
É o relatório.
2. PARECER DO RELATOR
A proposição vem arrimada no art. 19, caput, da Constituição Estadual e no art. 194, I, do Regimento Interno desta Assembleia Legislativa.
A matéria vertida no Projeto de Lei Ordinária Desarquivado nº 1790/2017 invoca a promoção da publicidade e da transparência com gastos públicos em âmbito estadual, encontrando-se inserta na autonomia administrativa e financeira do Estado-membro. Logo, resta afirmada a possibilidade de exercício da competência legislativa, com fundamento nos arts. 18 e 25, caput, c/c art. 24, inciso I, da Constituição de 1988.
Outrossim, inexiste impedimento à iniciativa parlamentar, uma vez que a proposição não se enquadra nas hipóteses do art. 19, § 1º, da Constituição Estadual, que atribuem privativamente ao Governador do Estado a possibilidade de deflagração do processo legislativo.
Em verdade, a divulgação das despesas governamentais com viagens aéreas constitui especificação de um dever geral que já está previsto no art. 37, caput e § 3º, inciso II, c/c art. 5º, incisos XXXIII e XXXIV, “b”, da Constituição de 1988, in verbis:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
[...]
§ 3º A lei disciplinará as formas de participação do usuário na administração pública direta e indireta, regulando especialmente: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
[...]
II - o acesso dos usuários a registros administrativos e a informações sobre atos de governo, observado o disposto no art. 5º, X e XXXIII;
Art. 5º [...]
XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado;
XXXIV - são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas:
[...]
b) a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal;”
Dessa forma, os comandos vertidos na proposição não criam novas atribuições ou acarretam o aumento de despesa para órgãos da Administração Pública estadual e, portanto, não demandam a iniciativa do Chefe do Poder Executivo.
Em sentido semelhante, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal afirmou a constitucionalidade de projeto de lei de origem parlamentar que aperfeiçoa a transparência das atividades governamentais:
EMENTA Ação direta de inconstitucionalidade. Lei nº 11.521/2000 do Estado do Rio Grande do Sul. Obrigação do Governo de divulgar na imprensa oficial e na internet dados relativos a contratos de obras públicas. Ausência de vício formal e material. Princípio da publicidade e da transparência. Fiscalização. Constitucionalidade. 1. O art. 22, inciso XXVII, da Constituição Federal atribuiu à União a competência para editar normas gerais de licitações e contratos. A legislação questionada não traz regramento geral de contratos administrativos, mas simplesmente determina a publicação de dados básicos dos contratos de obras públicas realizadas em rodovias, portos e aeroportos. Sua incidência é pontual e restrita a contratos específicos da administração pública estadual, carecendo, nesse ponto, de teor de generalidade suficiente para caracterizá-la como “norma geral”. 2. Lei que obriga o Poder Executivo a divulgar na imprensa oficial e na internet dados relativos a contratos de obras públicas não depende de iniciativa do chefe do Poder Executivo. A lei em questão não cria, extingue ou modifica órgão administrativo, tampouco confere nova atribuição a órgão da administração pública. O fato de a regra estar dirigida ao Poder Executivo, por si só, não implica que ela deva ser de iniciativa privativa do Governador do Estado. Não incide, no caso, a vedação constitucional (CF, art. 61, § 1º, II, e). 3. A legislação estadual inspira-se no princípio da publicidade, na sua vertente mais específica, a da transparência dos atos do Poder Público. Enquadra-se, portanto, nesse contexto de aprimoramento da necessária transparência das atividades administrativas, reafirmando e cumprindo o princípio constitucional da publicidade da administração pública (art. 37, caput, CF/88). 4. É legítimo que o Poder Legislativo, no exercício do controle externo da administração pública, o qual lhe foi outorgado expressamente pelo poder constituinte, implemente medidas de aprimoramento da sua fiscalização, desde que respeitadas as demais balizas da Carta Constitucional, fato que ora se verifica. 5. Não ocorrência de violação aos ditames do art. 167, I e II, da Carta Magna, pois o custo gerado para o cumprimento da norma seria irrisório, sendo todo o aparato administrativo necessário ao cumprimento da determinação legal preexistente. 6. Ação julgada improcedente.
(ADI 2444, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 06/11/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-021 DIVULG 30-01-2015 PUBLIC 02-02-2015)
De outro lado, sob o aspecto material, o Projeto de Lei também se mostra compatível com a Lei Federal nº 12.527, de 18 de novembro de 2011, verdadeiro marco no que tange ao acesso à informação em face de órgãos e entidades da Administração Pública, direta e indireta, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Com efeito, a Lei nº 12.527/2011, conhecida como Lei de Acesso à Informação – LAI, parte do pressuposto de que todas as informações produzidas ou custodiadas pelo Poder Público, desde que não classificadas como sigilosas, são públicas e, portanto, acessíveis aos cidadãos.
O tratamento normativo adotado pela referida lei federal distingue duas formas de divulgação da informação: a transparência ativa e a transparência passiva. Segundo o entendimento da Controladoria Geral da União:
A LAI contém comandos que fazem referência à obrigatoriedade de órgãos e entidades públicas, por iniciativa própria, divulgarem informações de interesse geral ou coletivo, salvo aquelas protegidas por algum grau de sigilo.
A iniciativa do órgão público de dar divulgação a informações de interesse geral ou coletivo, ainda que não tenha sido expressamente solicitada, é denominada de princípio da “Transparência Ativa”. Diz-se que, nesse caso, a transparência é “ativa”, pois parte do órgão público a iniciativa de avaliar e divulgar aquilo que seja de interesse da sociedade.
[...]
Assim como estabelece mecanismos da chamada “Transparência Ativa”, a LAI estabelece procedimentos e ações a serem realizados pelos órgãos e entidades públicas de forma a garantir o atendimento ao princípio da “Transparência Passiva”. A “Transparência Passiva” se dá quando algum órgão ou ente é demandado pela sociedade a prestar informações que sejam de interesse geral ou coletivo, desde que não sejam resguardadas por sigilo. A obrigatoriedade de prestar as informações solicitadas está prevista especificamente no artigo 10 da LAI: Art. 10. “Qualquer interessado poderá apresentar pedido de acesso a informações aos órgãos e entidades referidos no art. 1° desta Lei, por qualquer meio legítimo, devendo o pedido conter a identificação do requerente e a especificação da informação requerida”. Dessa forma, além de disponibilizar informações que o estado/município julgue ser de caráter público e de interesse coletivo, é também dever do ente garantir que as informações solicitadas pela população sejam atendidas.
(Manual da Lei de Acesso à Informação para Estados e Municípios, 1ª ed., 2013. Disponível em: <www.cgu.gov.br/Publicacoes/transparencia-publica/brasil-transparente/arquivos/manual_lai_estadosmunicipios.pdf>)
Na hipótese do Projeto de Lei analisado, tem-se uma manifestação própria da transparência ativa, visto que o Poder Público adota a iniciativa de divulgar informações e dados de inegável interesse público.
Por fim, cumpre destacar que não existe legislação em vigor no Estado de Pernambuco que tenha por objeto os gastos efetuados com o custeio de viagens aéreas. Nesse contexto, a medida revela-se salutar a fim de instituir uma Administração Pública comprometida com a democracia e a cidadania, não se vislumbrando impedimento de ordem constitucional e legal para aprovação da proposição.
Entretanto, com intuito de promover adequações pertinentes à técnica e redação legislativa, que não comprometem a finalidade e validade do Projeto de Lei, propõe-se a aprovação do seguinte substitutivo:
SUBSTITUTIVO Nº ______/2021 AO PROJETO DE LEI ORDINÁRIA DESARQUIVADO Nº 1790/2017
Altera integralmente a redação do Projeto de Lei Ordinária Desarquivado nº 1790/2017.
Artigo único. O Projeto de Lei Ordinária Desarquivado nº 1790/2017 passa a ter a seguinte redação:
“Dispõe sobre a divulgação de informações individualizadas relativas a viagens aéreas custeadas por órgãos e entidades da Administração Pública do Estado de Pernambuco.
Art. 1º Os órgãos e entidades da Administração Pública do Estado de Pernambuco ficam obrigados a divulgar informações individualizadas sobre as viagens aéreas custeadas com recursos públicos.
Parágrafo único. Para efeitos desta Lei, entende-se por órgãos e entidades da Administração Pública, os entes que integram os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, o Ministério Público, a Defensoria Pública e o Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco.
Art. 2° As informações individualizadas serão divulgadas em área específica do sítio eletrônico oficial destinado à transparência, no prazo de até 30 (trinta) dias após a realização da viagem, e conterão, no mínimo, os seguintes dados:
I - nome do passageiro;
II - cargo e lotação do agente público, se for o caso;
III - locais de origem e de destino;
IV - data do vôo;
V - companhia ou empresa contratada para prestação do serviço de transporte aéreo;
VI - o valor da passagem aérea; e
VII - finalidade da viagem.
Parágrafo único. Se a passagem aérea for emitida em nome de pessoa que não integra a Administração Pública, também deverá ser indicada a motivação para o custeio da viagem.
Art. 3º Em se tratando de fretamento ou locação de aeronaves, a divulgação de informações contemplará, além do disposto no art. 2º, os seguintes dados:
I - identificação de todos os passageiros e de seus eventuais acompanhantes; e
II - valor global da contratação por trecho.
Art. 4º O disposto nesta Lei não se aplica aos deslocamentos custeados com recursos do programa de Tratamento Fora de Domicílio - TFD.
Parágrafo único. Ficam resguardadas, ainda, as hipóteses de sigilo estabelecidas na Lei nº 14.804, de 29 de outubro de 2012.
Art. 5º O descumprimento do disposto nesta Lei ensejará a responsabilização funcional da autoridade ou do agente público na conformidade da legislação aplicável.
Art. 6º Esta Lei entra em vigor após decorridos 90 (noventa) dias de sua publicação oficial.”
Diante do exposto, opino pela aprovação do Projeto de Lei Ordinária Desarquivado nº 1790/2017, de autoria da Deputada Priscila Krause, nos termos do Substitutivo acima proposto.
É o Parecer do Relator.
3. CONCLUSÃO DA COMISSÃO
Tendo em vista as considerações expendidas pelo relator, o parecer desta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, por seus membros infra-assinados, é pela aprovação do Projeto de Lei Ordinária Desarquivado nº 1790/2017, de autoria da Deputada Priscila Krause, nos termos do Substitutivo deste Colegiado.
Histórico