
PROJETO DE LEI ORDINÁRIA 2042/2021
Inclui Pessoas Gestantes ou Puérperas como grupo prioritário, na fase 1, do Programa Emergencial de vacinação para o combate e erradicação do vírus da COVID-19 no estado de Pernambuco.
Texto Completo
Art. 1º Ficam incluídas todas as pessoas gestantes ou puérperas como grupo prioritário, na fase 1, do Programa Emergencial de vacinação para o combate e erradicação do vírus da COVID-19 no estado de Pernambuco.
§ 1º Para fins de aplicação desta Lei, a pessoa gestante não está obrigada a apresentar teste de gravidez como pré-requisito para a administração da vacina.
§ 2º O estado puerperal atingido pela abrangência desta Lei contempla o período que vai até o 45º dia após o parto.
Art. 2º A vacinação das pessoas gestantes ou puérperas será efetuada por intermédio do órgão estadual competente, sendo permitida a realização de parcerias ou convênios com o fito de assegurar gratuitamente a sua execução às categorias contempladas por esta Lei.
Art. 3º No ato de apresentação para vacinação, as pessoas gestantes ou puérperas devem ser orientadas sobre os seguintes aspectos:
I - pessoas gestantes ou puérperas devem manter as medidas de proteção contra a Covid-19, mesmo após a aplicação das doses da vacina e após transcorrido o período necessário para a imunoconversão.
II - em caso de reação adversa, a pessoa gestante ou puérpera deverá procurar unidade de saúde para fins de acompanhamento e monitoramento.
Art. 4º As despesas relativas à execução desta Lei serão decorrentes das dotações orçamentárias próprias da Secretaria Estadual de Saúde, podendo eventualmente ser suplementadas caso haja necessidade.
Art. 5º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Justificativa
O Brasil atualmente ocupa o primeiro lugar em mortalidade de pessoas gestantes e puérperas por Covid-19 no mundo[1]. Um estudo do International Journal of Gynecology and Obstetrics intitulado, The Tragedy of COVID-19 in Brazil[2], aponta para a gravíssima realidade na qual o país se encontra, cuja razão de mortalidade de pessoas gestantes e puérperas por Covid-19 é, sozinha, equivalente a 77% (setenta e sete por cento) de todas estas mortes no mundo, em todos os demais países somados[3].
Em outros termos, atualmente, em nenhum lugar do mundo morrem mais pessoas gestantes e puérperas por Covid-19 do que no Brasil. Esse montante é tão acentuado que a sua proporção é superior ao somatório de todas as mortes de pessoas gestantes e puérperas por Covid-19 em todos os países do mundo juntos.
Esta pesquisa foi realizada por enfermeiras e obstetras brasileiras ligadas ao Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira (IMIP), Universidade Estadual Paulista – Unesp, Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR) e a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Nele, foram analisados dados do sistema de monitoramento do Ministério da Saúde, o Sistema de Informação da Vigilância Epidemiológica da Gripe (SIVEP-Gripe). Conforme as cientistas, o risco aumentado para as pessoas gestantes e puérperas está relacionado à imunodeficiência relativa associada a adaptações fisiológicas durante o período da gravidez.
Elementos como o atendimento pré-natal de baixa qualidade ou escasso, a falta de recursos para cuidados críticos e de emergência, disparidades raciais no acesso aos serviços pré-natal e neonatal, violência obstétrica, além das barreiras adicionais colocadas pela pandemia para o acesso aos demais serviços e cuidados de saúde também são fatores que corroboram para esta altíssima razão de mortalidade no Brasil. A mesma pesquisa indica, ainda, que a maior parte das complicações decorrentes da Covid-19 que acarretam óbitos e consequências graves para as pacientes ocorrem durante o estado puerperal.
Diversos estudos apontam para a severidade da situação não apenas considerando a potencialidade letal da doença quando adquirida por pessoas gestantes e puérperas. Para além do crítico cenário de óbitos decorrentes da Covid-19, há que se considerar, igualmente, as sequelas e complicações decorrentes daquelas que, conquanto não venham a falecer, são infectadas pela doença e desenvolvem gravíssimas consequências.
Estudos observacionais prospectivos realizados e publicados em junho de 2020 pelo Royal College of Obstetricians and Gynaecologists em Londres mostram que 19% (dezenove por cento) das pessoas gestantes que foram avaliadas desenvolveram pneumonia grave e que 62,5% (sessenta e dois vírgula cinco por cento) de tais pacientes desenvolveram o quadro de síndrome de pré-eclâmpsia (grave aumento da pressão arterial).
Acirrando ainda mais este cenário, uma análise conduzida por pesquisadores brasileiros da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) em novembro de 2020 concluiu que o vírus Sars-Cov-2 tem o condão de alterar a forma de agir de, ao menos, 30 (trinta) modificadores moleculares em pessoas gestantes. Essa transmutação repentina na forma como as moléculas deveriam funcionar no organismo durante o período gestacional é responsável pela crítica consequência da pré-eclâmpsia.
Se esta condição não é tratada corretamente – especialmente considerando a atual realidade de superlotação dos sistemas público e privado de saúde[4] como consequência da pandemia de Covid-19 – ela pode acarretar um quadro de eclâmpsia em si durante os momentos finais da gravidez, sendo esta uma complicação profundamente crítica com consequências potencialmente letais que agravam ainda mais o sinistro pódio de mortalidade de pessoas gestantes e puérperas no Brasil. O distúrbio é caracterizado pela pressão constantemente muito alta e pode ser acompanhado de outros sintomas como convulsões, trombos e inchaços, fatores que trazendo risco de vida tanto para a pessoa gestante quanto para o feto.
Além dos estudos já mencionados destaca-se, também, a publicação na revista científica Biochimica et Biophysica Acta – Molecular Basis of Disease, em sua edição BBA Research Letter[5], intitulada The risk of COVID-19 for pregnant women: Evidences of molecular alterations associated with preeclampsia in SARS-CoV-2 infection[6], que aponta que o recorte específico das pesquisas relacionadas à pré-eclâmpcia surgiu após a constatação de outras consequências graves para a saúde das pessoas gestantes quando infectadas, como taxas significativas de aborto espontâneo, parto prematuro, morte perinatal e do próprio quadro de pré-eclâmpsia e eclampsia em si.
No mesmo sentido, pesquisadores brasileiros encontraram 14 (catorze) publicações que relatavam especificamente a associação do coronavírus com distúrbios hipertensivos e/ou pré-eclâmpsia e, ainda, pacientes que desenvolveram estas mesmas condições durante o curso da infecção respiratória. No universo dos dados mencionados, os autores destacam que há também a evidência de 48,3% (quarenta e oito vírgula três por cento) de má perfusão vascular fetal em placentas de gestantes com coronavírus, enquanto apenas 11,3% (onze vírgula três por cento) nas que estavam em condições saudáveis. São números que reforçam a relação da infecção respiratória com problemas vasculares, como a já mencionada formação de trombos e a própria hipertensão.
Diante dos evidentes números que relacionam a Covid-19 com os graves quadros de pré-eclâmpsia, abortos espontâneos, parto prematuro e morte perinatal, os pesquisadores concluem pelo reforço de que pessoas grávidas devem ser priorizadas por fazerem parte do grupo de risco, considerando que precisam de atenção especial quando desenvolvem a doença. O supramencionado artigo reforça que “gestantes são indivíduos suscetíveis que requerem um cuidado diferenciado durante um surto, principalmente por causa de sua resposta imunológica e fisiológica alterada que aumenta sua suscetibilidade a infecções e outras condições clínicas”[7] (tradução livre).
O estudo complementa ainda que os dados coletados na análise “apoiam as evidências clínicas que indicam que o SARS-CoV-2 pode afetar diferentes estruturas moleculares relacionadas à doença de pré-eclâmpsia tais como angiogênese, hipóxia, sinalização inflamatória, hipercoagulação e desequilíbrio de peptídeos vasoativos”. Conclui que pessoas “grávidas compõem uma população de alto risco, de modo que os cuidados pré-natais devem ser uma prioridade”[8] (tradução livre).
Ainda na esteira deste raciocínio, a Nota Técnica nº 01/2021, emitida pelo Ministério da Saúde[9], assevera que a preocupação com a vacinação de pessoas gestantes, na ausência de evidências insegurança, considerando o mero risco teórico de dano fetal, não pode ser considerado suficiente para justificar a negativa do acesso aos imunizantes pelas pessoas gestantes em meio à pandemia.
Demais disto, a mesma Nota Técnica aponta que o Colégio Americano de Obstetrícia e Ginecologia (ACOG) e a Society for Maternal-Fetal Medicine (Sociedade de Medicina Materno-Fetal) recomendam que pessoas gestantes e puérperas recebam doses de vacina, considerando o baixíssimo risco dos imunizantes mRNA – os mesmos que serão disponibilizados no país. Reforça-se, por oportuno, que nenhuma das vacinas disponíveis no país utiliza o vírus vivo, tampouco possui potencial contraindicação nas fases de gravidez e puerpério.
Ante os dados já mencionados, na medida em que a pandemia avança pelo país e, em especial, no estado de Pernambuco, as chances de consequências graves envolvendo pessoas gestantes e puérperas se revelam cada vez mais críticas. As evidências científicas atualmente disponíveis e ora apontadas demonstram que referido grupo possui risco ampliado de desenvolver complicações, precisar de UTI, ventilação mecânica, ou mesmo de vir a óbito, quando comparadas com pessoas não gestantes. Insta reiterar que o Brasil continua sendo apontado como o país no mundo com a maior razão de mortalidade de pessoas gestantes e puérperas por Covid-19 em todo o mundo. Cabe destacar também que já há um estudo feito com 20 gestantes em Isarel com a vacina Pfizer/BioNTech e divulgado no dia 16 de março de 2021, que aponta para a possibilidade de que as grávidas vacinadas desenvolverem proteção aos bebês[10].
Neste diapasão, tem-se como objetivo garantir a imunização prioritária de todas pessoas gestantes e puérperas, considerando que este grupo vulnerável atualmente não se encontra entre aqueles contemplados como preferenciais, em que pesem os acachapantes dados de óbito e complicações aos quais estas pessoas estão submetidas em decorrência da pandemia.
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[1] TAKEMOTO, Maira L. S.; MENEZES, Mariane de O.; ANDREUCCI, Carla B.; NAKAMURA-PEREIRA, Marcos; AMORIM, Melania M.R.; KATZ, Leila; KNOBEL, Roxana. The tragedy of COVID-19 in Brazil: 124 maternal deaths and counting. International Journal Of Gynecology & Obstetrics, [S.L.], v. 151, n. 1, p. 154-156, 29 jul. 2020. Wiley. http://dx.doi.org/10.1002/ijgo.13300.
[2] “A tragédia da COVID-19 no Brasil” (tradução livre do título).
[3] Disponível em: <https://g1.globo.com/bemestar/coronavirus/noticia/2020/07/14/brasil-tem-77percent-das-mortes-de-gestantes-e-puerperas-por-covid-19-registradas-no-mundo-diz-estudo.ghtml>. Acesso em: 17 mar. 2021.
[4] Disponível em: <https://g1.globo.com/pe/pernambuco/noticia/2020/09/23/sessenta-gravidas-dividem-espaco-em-maternidade-que-tem-capacidade-para-17-mulheres-no-recife.ghtml>. Acesso em: 30 mar 2021.
[5] Disponível em: <https://www.sciencedirect.com/journal/biochimica-et-biophysica-acta-bba-molecular-basis-of-disease>. Acesso em: 17 mar 2021.
[6] “O risco da Covid-19 para mulheres grávidas: evidências de alterações moleculares associadas com a pré-eclâmpcia em infecções por Sars-CoV-2” (tradução livre do título). Idem.
[7] [Pregnant people] “[...] are susceptible in-dividuals that require a differential care during an outbreak, mainly because of their altered immunological and physiological response which increases their susceptibility to infections and other clinical conditions.”. Idem, p. 3.
[8] Idem.
[9] NT nº 01/2021 – DAPES/SAPS/MS. Disponível em: <http://www.saude.df.gov.br/wp-conteudo/uploads/2018/02/NT-vacinacao-gestantes-peurperas-e-lactantes.pdf>. Acesso em: 17 mar 2021.
[10] Disponível em: <https://agenciabrasil.ebc.com.br/internacional/noticia/2021-03/vacinacao-de-gravidas-contra-covid-19-pode-proteger-bebes#:~:text= Novo%20estudo%20%C3%A9%20de%20pesquisadores%20de%20Israel&text=De%20acordo %20com%20pesquisa%20conduzida,por%20meio%20de%20transfer%C3%AAncia%20placent %C3%A1ria>. Acesso em 30 mar. 2021.
Histórico
Juntas
Deputada
Informações Complementares
Status | |
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Situação do Trâmite: | PUBLICADO |
Localização: | SECRETARIA GERAL DA MESA DIRETORA (SEGMD) |
Tramitação | |||
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1ª Publicação: | 09/04/2021 | D.P.L.: | 11 |
1ª Inserção na O.D.: |