
Parecer 6484/2021
Texto Completo
TRAMITAÇÃO CONJUNTA DO PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 586/2019, DE AUTORIA DO DEPUTADO JOAQUIM LIRA, COM O PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 2268/2021, DE AUTORIA DA DEPUTADA GLEIDE ÂNGELO
TRAMITAÇÃO CONJUNTA, CONFORME ART. 232 DO REGIMENTO INTERNO. PROPOSIÇÃO N° 2268/2021 DE AUTORIA DA DEPUTADA GLEIDE ANGELO E PROPOSIÇÃO 586/2019, DE AUTORIA DO DEPUTADO JOAQUIM LIRA. PL 586/2019, QUE
DISPÕE SOBRE A PRIORIDADE PARA ATENDIMENTO E EMISSÃO DE LAUDOS PELO INSTITUTO MÉDICO LEGAL – IML, E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS. PL 2268/2021 QUE
ASSEGURA ATENDIMENTO ESPECIALIZADO NO ÂMBITO DOS ÓRGÃOS PERMANENTES DO SISTEMA DE SEGURANÇA PÚBLICA DO ESTADO DE PERNAMBUCO E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS. SIMILITUDE DE MATÉRIAS. COMPETENCIA LEGISLATIVA CONCORRENTE DOS ESTADOS PARA DISPOR SOBRE PROTEÇÃO E DEFESA DA SAÚDE, PROTEÇÃO À INFÂNICA E À JUVENTUDE E PROTEÇÃO DAS PESSOAS PORTADORAS DE DEFICIÊNCIA (ART. 24, XII, XIV E XV, CF/88). CONSTITUCIONALIDADE MATERIAL (ARTS. 1º, II E III; 3º, II E IV; 227, CF/88). OBSERVÂNCIA DA LEI FEDERAL Nº 13.431, DE 4 DE ABRIL DE 2017. AUSÊNCIA DE VÍCIOS DE INCONSTITUCIONALIDADE E DE ILEGALIDADE. PELA APROVAÇÃO, NOS TERMOS DO SUBSTITUTIVO DESTE COLEGIADO.
1. RELATÓRIO
É submetido à apreciação desta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça o Projeto de Lei Ordinária nº 2268/2021, de autoria da Deputada Gleide Ângelo, a fim de assegurar atendimento especializado, no âmbito dos órgãos permanentes do Sistema de Segurança Pública do Estado de Pernambuco, às mulheres, às crianças e adolescentes, à pessoa idosa, à pessoa com deficiência e a outros grupos em situação de vulnerabilidade socioeconômica vítimas de violência.
Anteriormente, havia sido publicado o Projeto de Lei Ordinária nº 586/2019, de autoria do Deputado Joaquim Lira que dispõe sobre a prioridade de atendimento e emissão de laudos pelo Instituto Médico Legal – IML nos casos de violência doméstica, objetivo este que, em certa medida, está sendo contemplado pelo projeto posterior.
Nos termos do artigo 232, do Regimento Interno desta Casa, a tramitação das proposições pode ser conjunta, por deliberação da Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, haja vista tratar-se de proposições com matéria correlata.
Os Projetos de Lei em referência tramitam sob o regime ordinário.
É o relatório.
2. PARECER DO RELATOR
Quanto ao PL nº 586/2019, indubitavelmente, a iniciativa do Exmo. Sr. Deputado é valorosa, e representa uma elevada sensibilidade social. No entanto, a proposição é eivada de alguns vícios, sendo um deles o dispositivo que dispõe sobre matéria inserta no rol de iniciativa reservada ao Governador do Estado:
Art. 2° Em caso de agressão ou qualquer outra forma de violência física praticada contra a mulher e que venha a ser periciada por agentes do IML, o laudo técnico que comprova o ocorrido deverá ser emitido em um prazo máximo de 24h (vinte e quatro horas), estando à disposição tanto da autoridade que investiga o caso quanto das partes envolvidas na agressão.
Aqui, chama-se a atenção para o prazo estabelecido no PLO ora em análise, qual seja 24 (vinte e quatro) horas, para a emissão do laudo técnico. Tendo em vista as implicações nas atribuições dos órgãos vinculados ao Poder Executivo, no caso o IML, a iniciativa de projetos de lei com esse jaez incumbe ao Governador do Estado.
Deste modo, o Projeto de Lei em análise ensejaria interferência nas atribuições de órgãos integrantes do Poder Executivo, matéria cuja iniciativa encontra-se reservada ao Governador do Estado, nos termos do art. 19, § 1º, VI, da Constituição Estadual, in verbis:
“Art. 19.[...]
§ 1º É da competência privativa do Governador a iniciativa das leis que disponham sobre:
[...]
VI - criação, estruturação e atribuições das Secretarias de Estado, de órgãos e de entidades da administração pública.”
Retirando-se, no entanto, tal dispositivo, percebe-se que as demais providências previstas no PL 586/2019 encontram eco na legislação federal (art. 158, do Código de Processo Penal) e estão relacionadas com algumas das matérias versadas no Projeto de Lei nº 2268/2021, de autoria da Deputada Gleide Ângelo, também objeto de análise nesse Parecer, justamente pelo fato da ocorrência de tal similitude de matérias.
Avançando a análise para o PLO 2268/2021 de autoria da Deputada Gleide Ângelo, não há criação de novas atribuições para órgãos ou entidades vinculadas ao Poder Executivo, sendo indevido alegar, portanto, que a matéria estaria na órbita de iniciativa privativa do Governador, em decorrência do art. 19, § 1º, VI, da Constituição Estadual.
Isto porque, embora a proposta trat de atendimento no âmbito de órgão da administração pública, é notável que o Poder Público já é obrigado a prestar um atendimento humanizado às vítimas de violência. Assim, as proposições se destinam, principalmente, a reafirmar o direito das vítimas de violência, inclusas na categoria de grupos vulneráveis, de serem atendidas de forma humanizada, com tratamento digno, prioritário e célere. O mesmo pode ser dito sobre o artigo 1º do PLO nº 586/2019.
Diante dessas considerações, entende-se que, do ponto de vista formal, a matéria se insere na competência concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal para legislar sobre proteção e defesa da saúde, proteção à infância e à juventude e proteção das pessoas portadoras de deficiência, nos termos do art. 24, XII, XIV e XV, da Lei Maior.
A matéria, e aqui a observação também pode ser aplicada para o artigo 1º do PLO 586/2019, também é condizente com o dever do Poder Público de adotar medidas para efetivar a proteção à parcela da população considerada mais vulnerável, pois a Constituição Federal, seu art. 3º, incisos I e IV, respectivamente, estabelece como objetivos de nossa República a construção de uma sociedade livre justa e solidária; e a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Ademais, em seu art. 1º, incisos II e III, estabelece como fundamento de nossa República Federativa a cidadania e a dignidade da pessoa humana.
A proposição também colabora para a efetivação do disposto no art. 227 da CF/88, caput, o qual afima: “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivênvia familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”
Destaque-se, ainda, que o PLO nº 2268 está em consonância com as normas gerais estabelecidas pela Lei Federal nº 13.431, de 4 de abril de 2017, que estabelece o sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência. Tal norma, em seu art. 14, assevera que: “as políticas implementadas nos sistemas de justiça, segurança pública, assistência social, educação e saúde deverão adotar ações articuladas, coordenadas e efetivas voltadas ao acolhimento e ao atendimento integral às vítimas de violência.”
Frise-se, por fim, que o STF robustece a presunção de constitucionalidade da proposição, haja vista que, ao julgar a medida cautelar na ADI 6039, assentou, por maioria, que lei do Estado do Rio de Janeiro que trata de matéria análoga é constitucional. Senão vejamos a ementa do referido julgado:
MEDIDA CAUTELAR. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO N. 8.008/2018 (ART. 1º, §3º). VÍTIMAS DE ESTUPRO. MENORES DE IDADE DO SEXO FEMININO. PERITO LEGISTA MULHER. OBRIGATORIEDADE. ALEGA OFENSA À COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO (ART. 22, I, DA CFRB) E NORMAS GERAIS SOBRE PROCEDIMENTOS EM MATÉRIA PROCESSUAL (ART, 24, XI, DA CFRB). INEXISTÊNCIA. COMPETÊNCIA PREVISTA NO ART. 24, XV, DA CFRB. INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL POR OFENSA AO DIREITO DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES DE ACESSO À JUSTIÇA E AOS PRINCÍPIOS DA PROTEÇÃO INTEGRAL E DA PRIORIDADE ABSOLUTA (arts. 5º, XXXV, e 227, caput, da CRFB). SUSPENSÃO DA NORMA DEFERIDA. INTERPRETAÇÃO CONFORME À CONSTITUIÇÃO. DESDE QUE NÃO IMPORTE RETARDAMENTO OU PREJUÍZO DA DILIGÊNCIA. EFEITOS EX TUNC. 1. A Lei Estadual n.º 8.008/2018 do Rio de Janeiro, que impõe a obrigatoriedade de que as crianças e adolescentes do sexo feminino vítimas de estupro sejam examinadas por perito legista mulher, não padece do vício de inconstitucionalidade formal, porque a regra concerne à competência concorrente prevista no art. 24, inciso XV, da CFRB, “proteção à infância e à juventude”. 2. Trata-se de regra que reforça o princípio federativo, protegendo a autonomia de seus membros e conferindo máxima efetividade aos direitos fundamentais, no caso, o direito da criança e da adolescente à absoluta prioridade na proteção dos seus direitos (CFRB, art. 227). Compreensão menos centralizadora e mais cooperativa da repartição de competências no federalismo brasileiro. A lei federal n. 13.431/2017 (Estabelece o sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência) reservou espaço à conformação dos Estados. Inconstitucionalidade formal afastada. 3. Lei impugnada em sintonia com o direito fundamental à igualdade material (art. 5º, I, da CRFB), que impõe especial proteção à mulher e o atendimento empático entre iguais, evitando-se a revitimização da criança ou adolescente, mulher, vítima de violência. 4. Risco evidenciado pela negativa de realização de atos periciais às vítimas menores de idade do sexo feminino por legistas homens, o que compromete, concretamente e de modo mais urgente, o direito de crianças e adolescente de acesso à justiça (art. 39 da Convenção sobre os Direitos das Crianças) e os princípios da proteção integral e da prioridade absoluta (arts. 5º, XXXV, e 227 da CRFB). Inconstitucionalidade material concreta. Necessidade de interpretação conforme à Constituição. Desde que não importe retardamento ou prejuízo da diligência. 5. Medida cautelar deferida. Suspensão da norma impugnada. Efeitos excepcionais efeitos ex tunc, a fim de resguardar as perícias que porventura tenham sido feitas por profissionais do sexo masculino. (ADI 6039 MC, Relator(a): EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 13/03/2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-167 DIVULG 31-07-2019 PUBLIC 01-08-2019)
Por fim, entendemos necessária a apresentação de Substitutivo, nos termos do art. 208 do Regimento Interno desta Casa, com o fito de aperfeiçoar a redação das proposições e eliminar alguns trechos considerados inconstitucionais:
SUBSTITUTIVO Nº ______/2021
AOS PROJETOS DE LEI ORDINÁRIA Nº 586/2019 E Nº 2268/2021
Altera integralmente a redação do Projeto de Lei Ordinária nº 586/2019, de autoria do deputado Joaquim Lira, e do Projeto de Lei Ordinária nº 2268/2021, de autoria da Deputada Gleide Ângelo.
Artigo Único. Os Projeto de Lei Ordinária nº 2268/2021 e nº 586/2019 passam a ter a seguinte redação:
“Assegura atendimento especializado, no âmbito dos órgãos permanentes do Sistema de Segurança Pública do Estado de Pernambuco, e dá outras providências.
Art. 1º Fica assegurado o atendimento especializado, pelos órgãos permanentes que integram o Sistema de Segurança Pública do Estado de Pernambuco, às mulheres, às crianças, aos adolescentes, à pessoa idosa, à pessoa com deficiência e a outros grupos em situação de vulnerabilidade socioeconômica, que tenham sido vítimas de crime de violência.
§ 1º Para os fins desta Lei, são considerados órgãos permanentes que integram o Sistema de Segurança Pública aqueles elencados no art. 101 da Constituição do Estado de Pernambuco.
§ 2º Os outros grupos em situação de vulnerabilidade socioeconômica, a que se refere o caput deste artigo, serão definidos em legislação específica ou em norma regulamentadora.
Art. 2º O atendimento especializado a que se refere o caput do art. 1º deverá ser realizado através de tratamento digno, humanizado, prioritário e célere, livre de constrangimentos e situações que possam induzir à culpabilização da vítima, tanto no interior dos órgãos permanentes quanto em suas ações externas, especialmente no momento de socorro e resgate às vítimas.
Parágrafo único. Na realização de perícias e exames de corpo de delito, assegurar-se-á o cumprimento do parágrafo único, do art. 158, do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal.
Art. 3º O Poder Público poderá promover programas, projetos e ações, no âmbito dos órgãos permanentes que integram o Sistema de Segurança Pública do Estado de Pernambuco, para consecução dos objetivos desta Lei.
Art. 4º O descumprimento dos dispositivos desta Lei pelas instituições públicas ensejará a responsabilização administrativa de seus dirigentes, em conformidade com a legislação aplicável.
Art. 5º Caberá ao Poder Executivo regulamentar a presente Lei em todos os aspectos necessários para a sua efetiva aplicação.
Art. 6º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.”
Diante do exposto, opino no sentido de que o parecer desta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça seja pela aprovação dos Projetos de Lei Ordinária nº 586/2019 e 2268/2021, de autoria, respectivamente, do Deputado Joaquim Lira e da Deputada Gleide Angelo, analisados conjuntamente, de acordo com o art. 232, do Regimento Interno, na forma do Substitutivo acima proposto.
É o Parecer do Relator.
3. CONCLUSÃO DA COMISSÃO
Ante o exposto, tendo em vista as considerações expendidas pelo relator, a Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, por seus membros infra-assinados, opina pela aprovação dos Projetos de Lei Ordinária nº 586/2019 e 2268/2021, de autoria, respectivamente, do Deputado Joaquim Lira e da Deputada Gleide Angelo, analisados conjuntamente, de acordo com o art. 232, do Regimento Interno, na forma do Substitutivo acima proposto.
Sala de Reuniões da Comissão, em
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