Brasão da Alepe

Parecer 5698/2021

Texto Completo

TRAMITAÇÃO EM CONJUNTO DO PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 1459/2020, DE AUTORIA DO DEPUTADO CLODOALDO MAGALHÃES E DO  PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 1561/2020, DE AUTORIA DO DEPUTADO GUSTAVO GOUVEIA

 

PROPOSIÇÕES QUE VISAM FORTALECER A GARANTIRA À LIBERDADE RELIGIOSA NO ESTADO DE PERNAMBUCO. LIBERDADE DE CRENÇA COMO DIREITO FUNDAMENTAL, NOS TERMOS DO ART. 5º, VI E VIII DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. LEI FEDERAL Nº 7.716, DE 5 DE JANEIRO DE 1989. APLICAÇÃO DE SANÇÕES ADMINISTRATIVAS. PODER DE POLÍCIA DO ESTADO. TRAMITAÇÃO CONJUNTA, NOS TERMOS DOS ARTS. 232 A 234 DO REGIMENTO INTERNO. PELA APROVAÇÃO, NOS TERMOS DO SUBSTITUTIVO DESTE COLEGIADO.

 

1. RELATÓRIO

 

É submetido à apreciação desta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, para análise e emissão de parecer, Projetos de Lei Ordinária (PLO) nº 1459/2020, de autoria do Deputado Clodoaldo Magalhães, que visa dispor sobre a liberdade religiosa e dá outras providências e o PLO nº 1561/2020, de autoria do Deputado Gustavo Gouveia, que dispõe sobre penalidades administrativas a serem aplicadas pela prática de atos de discriminação por motivo religioso, no âmbito do Estado de Pernambuco.

As proposições deixam claro, nas respectivas justificativas, que o objetivo principal é fortalecer a liberdade religiosa, direito constitucionalmente previsto. O PLO 1459/2020 assegura a liberdade religiosa de forma positiva, ao passo que o PLO 1561/2020, por vias sancionatórias, também tem por finalidade evitar que as pessoas sofram perseguições e sejam discriminadas em decorrência das suas manifestações religiosas.

Assim, tendo em vista a similitude de objetos das proposições e a fim de resguardar a unidade da legislação estadual, opta-se pela tramitação conjunta das proposições, em observância ao teor dos arts. 232 a 234 do Regimento Interno desta Alepe.

O projeto de lei em referência tramita sob o regime ordinário, nos termos do art. 223, III, do Regimento Interno desta Assembleia Legislativa.

É o relatório.

2. PARECER DO RELATOR

As proposições em análise encontram guarida no art. 19, caput, da Constituição Estadual e no art. 194, I, do Regimento Interno desta Assembleia Legislativa.

No que tange à sua constitucionalidade material, importante frisar que a Constituição Federal preceitua a liberdade de crença, assegurando o livre exercício dos cultos religiosos e garantindo, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias (art. 5º, VI e VIII da CF/88).

A Carta Magna enfatiza, ainda, que ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa, conforme redação do art. 5º, VIII. Disposição essa que reflete, claramente, a vedação à discriminação religiosa, conferindo a todos os mesmos direitos constitucionalmente assegurados, sem qualquer distinção.

José Afonso da Silva assenta que a religião não é apenas sentimento sagrado puro. Não se realiza na simples contemplação do ente sagrado, não é simples adoração a Deus. Ao contrário, ao lado de um corpo de doutrina, sua característica básica se exterioriza na prática dos ritos, no culto, com suas cerimônias, manifestações, reuniões, fidelidades aos hábitos, às tradições, na forma indicada pela religião escolhida. (José Afonso da Silva. Curso de direito constitucional positivo. 38. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 251). (grifos acrescidos).

Ademais, a partir de uma análise sistêmica da Constituição Federal e da legislação infraconstitucional, nota-se que a CF/88, em seu art. 5º, XLI, diz que “a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais”. Nessa linha, é cediço que vige no ordenamento pátrio a Lei Federal nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989, que visa punir os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Preceitos esses que ratificam, novamente, a ideia da necessidade de proteção da livre manifestação religiosa, sendo previstas punições para os que exerçam quaisquer formas de discriminação.

Assim, seja sob a perspectiva doutrinária, seja sob a perspectiva legal e constitucional, mostra-se evidente a proteção conferida pelo ordenamento jurídico brasileiro à liberdade de crenças e à sua manifestação, além da vedação a qualquer tipo de preconceito que tolha os direitos fundamentais dos cidadãos em virtude da sua religião. Logo, depreende-se que a presente proposição está em consonância com as referidas disposições legais e constitucionais, constituindo mais um instrumento de garantia do exercício do direito fundamental à liberdade religiosa, haja vista a laicidade do país.

Importante ainda destacar que a Lei Federal nº 7716/89 estabelece crimes contra o preconceito de diversas ordens, inclusive a religiosa:

Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.

 

Pena: reclusão de um a três anos e multa.

Por sua vez, registre-se que não há impedimento para que uma conduta sofra uma sanção penal e administrativa, pois  a aplicação de sanções administrativas decorre do poder de polícia estatal, o qual, em sentido amplo, contempla a função legislativa e administrativa que busca condicionar ou restringir o uso de bens, o exercício de atividades e o gozo de direitos em prol do bem estar da coletividade. Nesse sentido, veja-se lição de JUSTEN FILHO:

O chamado poder de polícia se configura, primariamente, como uma competência legislativa. Afinal, ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei. O princípio da legalidade significa que a competência de poder de polícia é criada, disciplinada e limitada por lei. Até se poderia aludir a poder de polícia legislativo para indicar essa manifestação, cuja característica fundamental consiste na instituição de restrições à autonomia privada na fruição da liberdade e da propriedade, caracterizando-se pela imposição de deveres e obrigações de abstenção e de ação.

Em virtude do princípio da legalidade, cabe à lei dispor sobre a estrutura essencial das medidas de poder de polícia. A competência administrativa de poder de polícia pressupõe a existência de norma legal. Essa competência se configura como uma atividade infralegislativa, de natureza discricionária ou vinculada.” (JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 10ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014, p. 593-594.)

 

Observe-se ainda que não há vedação para o Estado-membro legislar sobre o tema em testilha, sendo, portanto, viável a atuação legislativa do ente federativo subnacional, nos termos dos seguintes dispositivos da Constituição Federal de 1988:

Art. 18. A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.

[...]      

Art. 25. Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem, observados os princípios desta Constituição.

 § 1º São reservadas aos Estados as competências que não lhes sejam vedadas por esta Constituição.

 

Todavia, é importante registrar que o PLO 1561/2020, ao tipificar novas condutas ensejadoras de sanção administrativa para os servidores públicos e estabelecer as respectivas sanções, invade o regime jurídico desses servidores.

Outrossim, o mencionado PLO também disciplina o procedimento administrativo de apuração e aplicação das sanções nele previstas e cria atribuições para órgãos vinculados ao Poder Executivo, no caso a Secretaria de Justiça e Direitos Humanos.

Desta feita, tanto o regime jurídico dos servidores quanto as atribuições dos órgãos vinculados ao Poder Executivo são matérias reservadas à iniciativa legislativa privativa do Governador do Estado, nos termos dos incisos IV e VI  do § 1º do art. 19 da Constituição Estadual,  devendo tais dispositivos serem excluídos da proposição, a fim de evitar o vício de inconstitucionalidade.

Desse modo, considerando que  os vícios de inconstitucionalidade apontados podem ser excluídos das proposições, entende-se viável a aprovação destas.

Assim, faz-se necessária a apresentação de Substitutivo para, em obediência ao art. 234 do Regimento Interno desta Assembleia Legislativa, conciliar as disposições das proposições em análise, bem como excluir os dispositivos possivelmente inconstitucionais. Segue o Substitutivo:

SUBSTITUTIVO Nº    /2020

AOS PROJETOS DE LEI ORDINÁRIA Nº 1459/2020 e Nº 1561/2020

 

Altera integralmente a redação dos Projetos de Lei Ordinária nº 1459/2020 e nº 1561/2020, de autoria, respectivamente, do Deputado do Deputado Clodoaldo Magalhães e do Deputado Gustavo Gouveia.

 

Artigo Único. Os Projetos de Lei Ordinária nº 1549/2020 e 1561/2020 passam a ter a seguinte redação:

 

“Dispõe sobre a liberdade religiosa e a aplicação de sanções administrativas a quem praticar atos de discriminação por motivo de religião ou crença, no âmbito do Estado de Pernambuco.

 

 

Art. 1º Fica assegurada, no âmbito do Estado de Pernambuco, a liberdade religiosa destinada a proteger e garantir o direito individual à liberdade de crença, pensamento, discurso, culto e de orientação religiosa.

 

Art. 2º É livre a expressão e manifestação da religiosidade, individual ou coletivamente, por todos os meios constitucionais e legais permitidos, assegurando:

 

I - o livre exercício de cultos religiosos e igrejas e a proteção aos respectivos locais de culto, sem qualquer embaraço ao seu funcionamento, permitida a ainda a colaboração de interesse público; e

 

II – o regular funcionamento de cultos religiosos, igrejas e templos.

 

Art. 3º Ninguém será obrigado a:

 

I -  professar ou negar crença religiosa;

 

II - participar ou rejeitar participação em atos de culto religioso;

 

III - receber assistência religiosa;

 

IV - prestar juramento desonroso a sua religião ou crença.

 

Art. 4º Nenhum indivíduo ou grupo, ainda que minoritário, poderá sofrer discriminação por motivos de religião ou crença.

 

Parágrafo único. Para os efeitos desta Lei, consideram-se atos discriminatórios por motivo de religião ou crença:

 

I - toda distinção, exclusão, restrição ou preferência estatal fundada em religião ou crença específica;

 

II - qualquer ato ou incitação à violência contra indivíduos ou grupos religiosos;

 

III - a restrição de ingresso ou  permanência em ambientes públicos ou privados acessíveis ao público em razão de convicção religiosa;

 

IV - criar embaraços à utilização das dependências comuns e áreas não privativas de edifícios por motivo de religião ou crença;

 

IV - restrição à contratação de bens e serviços em ração de convicção religiosa de quaisquer das partes;

 

V - proibição à livre expressão ou manifestação religiosa, individual ou coletiva;

 

VI - recusar, retardar, impedir ou onerar a utilização de bens, serviços, meios de transporte ou de comunicação, consumo de bens, hospedagem em hotéis, motéis, pensões e estabelecimentos congêneres ou o acesso a espetáculos artísticos ou culturais por motivo de religião ou crença;

 

VII - recusar, retardar, impedir ou onerar a locação, compra, aquisição, arrendamento ou empréstimo de bens móveis ou imóveis por motivo de religião ou crença;

 

VIII - praticar, induzir ou incitar, pelos meios de comunicação, o preconceito ou prática de qualquer conduta discriminatória por motivo de religião ou crença; e

 

IX - criar, comercializar, distribuir ou veicular símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propagandas que incitem ou induzam à discriminação por motivo de religião ou crença.

 

Art. 5º O descumprimento ao disposto nesta Lei sujeitará o infrator às seguintes penalidades, sem prejuízo de outras previstas na legislação vigente:

 

I - advertência, quando da primeira autuação de infração; ou

 

II - multa, a ser fixada entre R$ 5.000,00 (cinco mil reais) e 50.000,00 (cinquenta mil reais), considera a situação econômica do infrator e as circunstâncias da infração;

 

III - suspensão da licença estadual para funcionamento por 30 (trinta) dias; e

 

IV - cassação da licença estadual para funcionamento.

 

§ 1º A cada reincidência o valor da penalidade de multa será aplicado em dobro.

 

§ 2º Os valores limites de fixação da penalidade de multa prevista no caput serão atualizados, anualmente, de acordo com o Índice de Preços ao Consumidor Amplo – IPCA, ou índice previsto em legislação federal que venha a substituí-lo.

 

§ 3º As penalidades previstas nos incisos III e IV do caput serão aplicadas às pessoas jurídicas que reincidirem no descumprimento do disposto nesta Lei, sem prejuízo da aplicação da penalidade de multa.

 

Art. 6º O descumprimento dos dispositivos desta Lei por órgãos e entidades públicas ensejará a responsabilização administrativa de seus dirigentes, em conformidade com a legislação aplicável.

 

 

Art. 7º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.”

 

Diante do exposto,  opina-se pela aprovação dos Projetos de Lei Ordinária nº 1459/2020 e nº 1561/2020, de autoria, respectivamente, do deputado Clodoaldo Magalhães e do Deputado Gustavo Gouveia, nos termos do Substitutivo acima apresentado.

É o Parecer do Relator.

3. CONCLUSÃO DA COMISSÃO

Tendo em vista as considerações expendidas pelo relator, o parecer desta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, por seus membros infra-assinados, é pela aprovação do Projetos de Lei Ordinária nº 1459/2020 e nº 1561/2020, de autoria, respectivamente, do deputado Clodoaldo Magalhães e do Deputado Gustavo Gouveia, nos termos do Substitutivo deste Colegiado.

Histórico

[31/05/2021 12:24:17] ENVIADA P/ SGMD
[31/05/2021 15:30:09] ENVIADO PARA COMUNICA��O
[31/05/2021 15:39:50] ENVIADO P/ PUBLICAÇÃO
[31/05/2021 22:34:06] PUBLICADO





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