Brasão da Alepe

Parecer 5573/2021

Texto Completo

TRAMITAÇÃO EM CONJUNTO  DO PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 952/2020, DE AUTORIA DO DEPUTADO JOÃO PAULO COSTA, COM O PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 979/2020, DE MESMA AUTORIA, E COM O PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 1541/2020, DE AUTORIA DO DEPUTADO GUSTAVO GOUVEIA

 

 

PROPOSIÇÕES QUE ESTABELECEM PENALIDADES ADMINISTRATIVAS EM RAZÃO DA PRÁTICA DE ATOS DE RACISMO OU DE ATOS DE DISCRIMINAÇÃO OU OFENSIVOS CONTRA MULHERES NOS ESTÁDIOS DE FUTEBOL, GINÁSIOS E DEMAIS LOCAIS ONDE SÃO REALIZADOS EVENTOS ESPORTIVOS, NO ÂMBITO DO ESTADO DE PERNAMBUCO E InstituEM diretrizes para o combate ao assédio e À violência sexual contra as mulheres nAQUELES AMBIENTES.  MANIFESTAÇÃO DO PODER DE POLÍCIA ESTATAL.  matéria inserta na AUTONOMIA ADMNISTRATIVA DOS ESTADOS-MEMBROS (artS. 18, CAPUT, E 25, § 1º, da Constituição Federal). viabilidade da iniciativa parlamentar, SALVO QUANTO À autorização para criação de fundo estaduaL (ART. 19, § 1º, INCISO VI, DA cONSTITUIÇÃO eSTADUAL). COMPATIBILIDADE MATERIAL COM O DISPOSTO NO ART. 3º, INCISO iv, DA cONSTITUIÇÃO FEDERAL. INEXISTÊNCIA DE VÍCIOS DE INCONSTITUCONALIDADE OU DE ILEGALIDADE. PELA APROVAÇÃO, NOS TERMOS DO SUBSTITUTIVO DESTE COLEGIADO.

 

 

1. RELATÓRIO

É submetido à apreciação desta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, para análise e emissão de parecer, o Projeto de Lei Ordinária nº 952/2020, de autoria do Deputado João Paulo Costa, que estabelece penalidades administrativas aos torcedores infratores e aos clubes de futebol cuja torcida praticarem crime de racismo em estádios do Estado de Pernambuco.

No mesmo sentido, verifica-se a existência do Projeto de Lei Ordinária nº 1541/2020, de autoria do Deputado Gustavo Gouveia, que estabelece, igualmente, penalidades administrativas contra atos discriminatórios ou ofensivos praticados em estádios de futebol, porém se atém àqueles cometidos contra mulheres e abarca os demais locais onde ocorrem eventos esportivos. 

 

Também tratando de matéria correlata há o  Projeto de Lei Ordinária nº 979/2020, de autoria do Deputado João Paulo Costa, que institui diretrizes para o combate às ações de assédio e violência sexual contra mulheres nos estádios de futebol do Estado de Pernambuco.

Diante da similitude de objetos entre o PLO nº 952/2020, de autoria do Deputado João Paulo Costa, , PLO nº 979/2020, de autoria do mesmo Deputado,  e o PLO 1541/2020, de autoria do Deputado Gustavo Gouveia, submetem-se as proposições à tramitação conjunta, em observância ao disposto nos arts. 232 e seguintes do Regimento Interno deste Poder Legislativo.

Os Projetos de Lei em referência tramitam nesta Assembleia Legislativa pelo regime ordinário (art. 223, inciso III, do Regimento Interno).

É o relatório.

2. PARECER DO RELATOR

As proposições vêm arrimadas no art. 19, caput, da Constituição Estadual e no art. 194, I, do Regimento Interno desta Assembleia Legislativa.

Sob o aspecto da constitucionalidade formal, é preciso reconhecer que a matéria vertida nos Projetos de Lei nº 952/2020 e nº 1541/2020 constitui expressão do poder de polícia estatal. Com efeito, em sentido amplo, o poder de polícia contempla a função legislativa e administrativa que busca condicionar ou restringir o uso de bens, o exercício de atividades e o gozo de direitos em prol do bem estar da coletividade.  

De acordo com JUSTEN FILHO:

O chamado poder de polícia se configura, primariamente, como uma competência legislativa. Afinal, ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei. O princípio da legalidade significa que a competência de poder de polícia é criada, disciplinada e limitada por lei. Até se poderia aludir a poder de polícia legislativo para indicar essa manifestação, cuja característica fundamental consiste na instituição de restrições à autonomia privada na fruição da liberdade e da propriedade, caracterizando-se pela imposição de deveres e obrigações de abstenção e de ação.

Em virtude do princípio da legalidade, cabe à lei dispor sobre a estrutura essencial das medidas de poder de polícia. A competência administrativa de poder de polícia pressupõe a existência de norma legal. Essa competência se configura como uma atividade infralegislativa, de natureza discricionária ou vinculada.” (JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 10ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014, p. 593-594.)

 

Sem embargo, as pretensões normativas acima citadas estabelecem mecanismos de coerção indireta (notadamente a cominação de multas), a serem impostos pelas autoridades administrativas competentes, com o intuito de reprimir eventuais manifestações de cunho racista, discriminatórias ou ofensivas contra mulheres nos locais de realização de eventos esportivos.

Nesse contexto, não se cogita de inconstitucionalidade formal orgânica (vício de competência legislativa), o mesmo valendo para o PL nº 979/2020, pois o objeto das proposições está abarcado pela atribuição prevista nos arts. 18, caput, e 25, § 1º, da Constituição Federal, in verbis:

Art. 18. A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.

[...]     

Art. 25. Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem, observados os princípios desta Constituição.

 § 1º São reservadas aos Estados as competências que não lhes sejam vedadas por esta Constituição.

No mesmo sentido, inexiste óbice à iniciativa parlamentar, uma vez que o teor das propostas não se enquadra nas regras que conferem a deflagração do processo legislativo privativamente ao Governador do Estado, nos termos do art. 19, §1º, da Constituição do Estado de Pernambuco.

Cumpre registrar que o texto dos Projetos de Lei nº 952/2020 e nº 1541/2020 não faz menção ao órgão/entidade da Administração Pública responsável pela apuração e aplicação das sanções, deixando ao crivo do Poder Executivo determinar qual o órgão com maiores condições para realizar tais tarefas.

Isto posto, de uma forma geral, não há vício de iniciativa nos Projetos de Lei nº 952/2020. nº 979/2020 e nº 1541/2020.

Nada obstante, especificamente em relação à autorização concedida ao Poder Executivo para a criação de um Fundo Estadual de Combate ao Racismo (art. 2º do Projeto de Lei 952/2020), entende-se caracterizados vícios de inconstitucionalidade e de antijuridicidade.

De fato, o STF assevera que a matéria está atrelada à autonomia financeira e administrativa da cada Poder (ADI 2123-MC, Rel. Min. Marco Aurélio, Tribunal Pleno, julgado em 06/06/2001, DJ de 31/10/2003, p. 13), ou seja: a instituição de fundo a ser gerido pelo Poder Executivo deve ser oriunda de lei de autoria do respectivo Chefe de Poder. Além disso, a mera circunstância de se tratar de uma “autorização” não legitima a iniciativa, visto que, neste particular, a medida incorre em vício de antijuridicidade, consoante lição de Sérgio Resende de Barros:

Autorizativa é a ‘lei’ que – por não poder determinar – limita-se a autorizar o Poder Executivo a executar atos que já lhe estão autorizados pela Constituição, pois estão dentro da competência constitucional desse Poder. O texto da “lei” começa por uma expressão que se tornou padrão: ‘Fica o Poder Executivo autorizado a...’. O objeto da autorização – por já ser de competência constitucional do Executivo – não poderia ser ‘determinado’, mas é apenas ‘autorizado’ pelo Legislativo. Tais ‘leis’, óbvio, são sempre de iniciativa parlamentar, pois jamais teria cabimento o Executivo se autorizar a si próprio, muito menos onde já o autoriza a própria Constituição. Elas constituem um vício patente. (BARROS, Sérgio Resende de. “Leis” autorizativa. Revista do Instituto de Pesquisas e Estudos. Bauru, n. 29, pp. 259-265, ago./nov. 2000)

Por outro lado, sob o aspecto da constitucionalidade material, as propostas coadunam-se com os valores e preceitos consagrados na Carta Magna, em especial com o objetivo da República Federativa do Brasil em “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação” (art. 3º, inciso IV, da Constituição Federal).

Isto posto, salvo pelo art. 2º do PLO nº 952/2020, não existem vícios que possam comprometer a validade das proposições.

Por fim, em relação ao conteúdo, verifica-se que o PLO nº 952/2020 limita-se a instituir penalidades administrativas voltadas a torcedores e clubes de futebol. Todavia, em face da natureza do problema, revela-se pertinente ampliar o campo de aplicação da norma a fim de coibir os atos de racismo praticados não só em estádios de futebol, mas também em ginásios e demais locais onde são realizados eventos esportivos no âmbito do Estado de Pernambuco, assim como já prevê o PLO nº 1541/2020 em relação aos atos de discriminação contra as mulheres.

Outrossim, salutar ampliar não apenas o âmbito de incidência espacial do Projeto, conforme explanado no parágrafo supra, mas também realizar ampliação objetiva em relação aos insultos que a proposição visa coibir, passando a prever também penalidades para o caso de ofensas de cunho homofóbico.

Assim, faz-se necessária a apresentação de Substitutivo para, em obediência ao art. 234 do Regimento Interno desta Assembleia, conciliar as disposições das proposições em análise e proceder às adequações necessárias:

 

                SUBSTITUTIVO Nº ______/2021

AOS PROJETOS DE LEI ORDINÁRIA Nº 952/2020, Nº 979/2020 E Nº 1541/2020


Altera integralmente a redação dos Projetos de Lei Ordinária nº 952/2020, nº 979/2020, ambos de autoria do Deputado João Paulo Costa, e nº 1541/2020, de autoria do Deputado Gustavo Gouveia.

 

Artigo único. Os Projetos de Lei Ordinária nº 952/2020, nº 979/2020 e nº 1541/2020 passam a ter a seguinte redação:

 

“Dispõe sobre as penalidades administrativas aplicáveis em razão de atos de racismo, LGBTQI+fobia, bem  como de atos discriminatórios ou ofensivos contra mulher, praticados em estádios de futebol, ginásios e demais locais onde são realizados eventos esportivos no âmbito do Estado de Pernambuco, institui diretrizes para o Poder Público no combate ao assédio sexual nos locais que indica e dá outras  providências . 

 

 

 

Art. 1º A prática de atos de racismo, LGBTQI+fobia ou de atos discriminatórios ou ofensivos contra mulher em estádios de futebol, ginásios e demais locais onde são realizados eventos esportivos no Estado de Pernambuco constitui infração administrativa sujeita às penalidades previstas nesta Lei.

 

§1º Para os fins desta Lei, considera-se ato de racismo qualquer tipo de manifestação ou ação ofensiva, violenta, constrangedora, intimidatória ou vexatória, de ordem moral, ética, filosófica ou psicológica, resultante de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional, ainda que não seja dirigida a pessoa ou grupo determinado.

 

§2º Para os fins desta Lei, consideram-se atos discriminatórios ou ofensivos contra a mulher qualquer tipo de manifestação ou ação violenta, constrangedora, intimidatória ou depreciativa, resultante de preconceito de gênero ou da condição feminina, tais como:

 

I - portar ou ostentar cartazes, bandeiras, símbolos ou outros sinais com mensagens de caráter misógino;

 

II - entoar cânticos insultuosos ou vexatórios às mulheres, ainda que não sejam dirigidos a pessoa ou grupo determinado; ou

 

III - incitar ou praticar qualquer forma de assédio contra as mulheres.

 

§3º Para os fins desta Lei, consideram-se atos de  LGBTQI+fobia qualquer tipo de manifestação ou ação ofensiva, violenta, constrangedora, intimidatória ou vexatória, de ordem moral, ética, filosófica ou psicológica, resultante de discriminação ou preconceito em virtude de orientação sexual ou de identidade de gênero, ainda que não seja dirigida a pessoa ou grupo determinado.

 

 

Art. 2º Sem prejuízo das sanções civis e penais definidas em legislação específica, a prática de quaisquer dos atos citados no art. 1º sujeitará o infrator a multa, observados os seguintes parâmetros:

 

I - a penalidade será fixada no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais) a R$ 1.000,00 (mil reais), se o infrator for torcedor ou membro do público identificado; e

 

II - a penalidade será fixada no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 20.000,00 (vinte mil reais), se o infrator for o clube ou agremiação esportiva, os administradores dos estádios de futebol ou ginásios esportivos ou os responsáveis pela promoção do evento.

 

§1º Os clubes ou agremiações esportivas, os administradores dos estádios de futebol e ginásios esportivos ou os responsáveis pela promoção do evento somente serão responsabilizados pelas infrações cometidas por seus torcedores se:

 

I - houver comprovação de materialidade do fato ou prova testemunhal; e

 

II - o infrator não puder ser identificado.

 

§ 2º A multa será graduada de acordo com a capacidade econômica da pessoa ou do estabelecimento, a gravidade do ato e as circunstâncias da infração.

 

§ 3º Em caso de reincidência, o valor da penalidade de multa será aplicado em dobro.

 

§ 4º Os valores limites de fixação da penalidade de multa prevista neste artigo serão atualizados, anualmente, de acordo com o Índice de Preços ao Consumidor Amplo - IPCA, ou índice previsto em legislação federal que venha a substituí-lo.

 

 

 Art. 3º O Poder Público, no âmbito do Estado de Pernambuco, deve guiar-se pelas seguintes diretrizes quanto ao combate ao assédio e à violência sexual nos estádios, ginásios e demais locais onde são realizados eventos esportivos:

     I – incentivo e criação de políticas, programas e projetos de combate ao assédio e à violência sexual contra as mulheres nos estádios, ginásios e demais locais onde são realizados eventos esportivos;

     II – apoio à realização de campanhas educativas e não discriminatórias de enfrentamento ao assédio e a violência sexual, através das agremiações desportivas, da administração dos estádios,  ginásios e demais locais onde são realizados eventos esportivos ou em parcerias com o Poder Público; e

     III – fomento e divulgação das políticas públicas voltadas para o atendimento às vítimas de assédio e a violência sexual nos estádios, ginásios e demais locais onde são realizados eventos esportivos.

 

 

Art. 4º A fiscalização do disposto nesta Lei será realizada pelos órgãos públicos nos respectivos âmbitos de atribuições, os quais serão responsáveis pela aplicação das sanções decorrentes de infrações às normas nela contidas, mediante procedimento administrativo, assegurada a ampla defesa.

 

Art. 5º Caberá ao Poder Executivo regulamentar a presente Lei em todos os aspectos necessários para a sua efetiva aplicação.

 

Art. 6º Esta Lei entra em vigor após decorridos 60 (sessenta) dias de sua publicação oficial.”

Diante do exposto, opino pela aprovação dos Projetos de Lei Ordinária nº 952/2020, nº 979/2020, ambos de autoria do Deputado João Paulo Costa  e nº 1541/2020, de autoria do Deputado Gustavo Gouveia, nos termos do Substitutivo acima proposto.

É o Parecer do Relator.

 

3. CONCLUSÃO DA COMISSÃO

Tendo em vista as considerações expendidas pelo relator, o parecer desta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, por seus membros infra-assinados, é pela aprovação dos Projetos de Lei Ordinária nº 952/2020, nº 979/2020, ambos de autoria do Deputado João Paulo Costa   e nº 1541/2020, de autoria do Deputado Gustavo Gouveia, respectivamente, nos termos do Substitutivo deste Colegiado.

Histórico

[17/05/2021 13:06:49] ENVIADA P/ SGMD
[17/05/2021 17:03:53] ENVIADO PARA COMUNICA��O
[17/05/2021 17:04:17] ENVIADO P/ PUBLICAÇÃO
[17/05/2021 21:55:42] PUBLICADO





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