
Parecer 3723/2020
Texto Completo
PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 939/2020
AUTORIA: DEPUTADO DIOGO MORAES
DISPÕE SOBRE A PROIBIÇÃO DE ENTRADA, DISTRIBUIÇÃO, COMERCIALIZAÇÃO E USO, NO DISTRITO ESTADUAL DE FERNANDO DE NORONHA, DE COSMÉTICOS E PRODUTOS DE HIGIENE PESSOAL QUE CONTENHAM, EM SUA COMPOSIÇÃO, COMPONENTES QUÍMICOS NOCIVOS À VIDA MARINHA. PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE. MATÉRIA INSERTA NA COMPETÊNCIA LEGISLATIVA CONCORRENTE (ART. 24, VI) E NA COMPETÊNCIA ADMINISTRATIVA COMUM (ART. 23, VI). INICIATIVA PARLAMENTAR INVIÁVEL. COMPETÊNCIA DO PODER EXECUTIVO (ART, 19, § 1º, II DA CE89). EXISTÊNCIA DE VÍCIOS DE INCONSTITUCIONALIDADE.PELA REJEIÇÃO.
1. RELATÓRIO
Vem a esta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, para análise e emissão de parecer, o Projeto de Lei Ordinária nº 939/2020, de autoria do Deputado Diogo Moraes, que a proibição de entrada, distribuição, comercialização e uso, no distrito estadual de Fernando de Noronha, de cosméticos e produtos de higiene pessoal que contenham, em sua composição, componentes químicos nocivos à vida marinha.
Em síntese, afirma o autor da proposição:
Mais de 100.000 turistas visitam todos os anos as praias do Arquipélago de Fernando de Noronha, contaminando, sem perceber, as águas costeiras da Ilha. Muitos cosméticos e produtos de higiene pessoal, voltados para a proteção da pele contra os raios solares UVA e UVB, escondem em sua composição substâncias químicas capazes de causar impactos irreversíveis nos corais e na vida marinha como um todo.
(...)
Diversos estudos científicos comprovam o impacto causado pelas substâncias oxybenzona, octinoxato e metilbenzilideno cânfora nos ecossistemas marinhos. Oxibenzona e octinoxato causam danos genéticos e branqueamento de corais, degradando a resiliência e a capacidade dos corais de se ajustarem aos fatores de mudança climática e inibindo o surgimento de novos corais.. (...)
Dessa forma, a proposição veda a utilização de cosméticos com as substâncias descritas (art. 1º), impõe o dever de informação acerca da medida (art. 2º) e ainda aplica penalidades em caso de descumprimento (art. 5º).
O Projeto de Lei em referência tramita nesta Assembleia Legislativa pelo regime ordinário (art. 223, inciso III, do Regimento Interno).
É o relatório.
2. PARECER DO RELATOR
A proposição vem arrimada no art. 19, caput, da Constituição Estadual e no art. 194, inciso I, do Regimento Interno desta Assembleia Legislativa.
Desde logo cumpre destacar que o Distrito Estadual de Fernando de Noronha é uma figura ímpar na organização político-administrativa brasileira, decorrente de opção do legislador constituinte após a extinção do território federal correspondente e de sua reincorporação ao Estado de Pernambuco (art. 15 do Ato Constitucional das Disposições Transitórias da Constituição Federal). Trata-se de uma autarquia territorial, isto é, um ente desprovido de autonomia política, mas dotado de capacidade administrativa e financeira, nos termos do art. 1º e parágrafo único da Lei nº 11.304, de 28 de setembro de 1995:
Art. 1º O Arquipélago de Fernando de Noronha, conforme disposto no artigo 96 da Constituição Estadual, constitui região geoeconômica, social e cultural do Estado de Pernambuco, instituído sob a forma de Distrito Estadual, com natureza de autarquia territorial, regendo-se por estatuto próprio, nos termos desta Lei Orgânica, com personalidade jurídica de direito público interno e dotado de autonomia administrativa e financeira.
Parágrafo único. O Distrito Estadual de Fernando de Noronha, entidade autárquica integrante da administração direta do Poder Executivo, exerce sobre toda a extensão da área territorial do Arquipélago de Fernando de Noronha a jurisdição plena atribuída às competências estadual e municipal, bem como os poderes administrativos e de polícia próprios de ente público.
É certo que o projeto em testilha, ao instituir medidas para preservação dos ecossistemas no Arquipélago de Fernando de Noronha, é consentâneo com as disposições constitucionais.
Nesta senda, a Constituição Federal estabelece como competência material comum de todos os entes federativos proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas, nos termos do art. 23, VI, in verbis:
Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: (...)
VI - proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas; (...)
Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
VI - florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição;
No âmbito legislativo, o Texto Máximo aponta como competência concorrente da União, Estados e Distrito Federal dispor sobre “florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição”, conforme art. 24, VI, CF/88.
É cediço que ao determinar a proibição do uso de substâncias nocivas à preservação das espécies, estar-se-á promovendo a proteção ao meio ambiente.
Ademais, dispõe o art. 170 da CF/88 que a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados, dentre outros princípios, a defesa do meio ambiente.
A Constituição Federal, ainda, em seu art. 225, assegura que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”
Frise-se ainda que a Comissão de Constituição e Justiça da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, aprovou projeto similar, atestando sua validade com os mesmos argumentos acima (PL nº 1129/2019):
Faz-se importante mencionar que a oxibenzona (benzofenona-3) é um composto orgânico e um agente que permite a proteção da pele com relação à incidência de determinadas ondas dos raios solares. No entanto, o grande problema que envolve a oxibenzona está relacionado com a sua capacidade de penetrar nas camadas mais profundas da pele, de modo que uma quantidade significativa da substância acaba permanecendo no organismo.
Por conta disto, a oxibenzona tem sido associada a problemas hormonais e danos às células, o que pode provocar desde envelhecimento precoce até câncer.
É inegável a importância da proposição e deve-se enaltecer a preocupação do nobre deputado com a saúde e bem estar da população fluminense. (...)
A COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO E JUSTIÇA, na 29ª Reunião Ordinária, realizada em 13 de novembro de 2019, aprovou o parecer do relator pela CONSTITUCIONALIDADE, COM EMENDAS do Projeto de Lei nº 1129/2019.
Todavia, a Constituição do Estado de Pernambuco no seu art, 19, § 1, II, veda a propositura de lei, de iniciativa do Poder Legislativo estadual, que implique aumento de despesa pública, no âmbito do Poder Executivo.
Ocorre que para tornar o teor do projeto de lei exequível, considerando a previsão de proibição de entrada, distribuição, comercialização e uso, o Poder Executivo precisará impor barreiras portuárias e aeroportuárias, ampliar, significativamente, o efetivo de fiscais nas praias, bem como, nos estabelecimentos comerciais ao longo de todo o litoral distrital e, nem mesmo assim, será possível evitar que alguém aplique protetor solar contendo essas substâncias, por exemplo, em recinto fechado, antes de se conduzir a uma área de praia.
Além disso, as opções disponíveis no mercado brasileiro de cosméticos, livres das referidas substâncias, ainda é inacessível a grande parte da população, com ônus especial aos moradores do arquipélago e a restrição de uso de determinados produtos, acarretará uma nefasta consequência: a não utilização de protetores solares nas praias. Os cosméticos isentos dessas substâncias, custam em média, R$ 80,00 (oitenta reais) enquanto os produtos que possuem as referidas substâncias custam a partir de R$ 30,00 (trinta reais), valor que possui um peso considerável para quem precisa se expor aos raios solares e tem renda salarial mínima ou próxima ao do salário mínimo.
Ademais, a vedação intentada pelo projeto ainda implica considerável aumento do risco de doenças causadas pela exposição excessiva à radiação solar. É cediço que o principal causador do câncer de pele, que é o tumor de maior incidência no Brasil, é o excesso de exposição aos raios solares.
Dados do INCA – Instituto Nacional do Câncer, dão conta de que, em média, 181 mil novos casos desse tipo de câncer foram registrados no país, até o final de 2016, sendo 83.850 ocorrências nos homens e 97.580 em mulheres. 6 mil desses casos correspondem ao melanoma cutâneo, que possui a maior taxa de letalidade.
Por outro lado, é igualmente competência dos estados, concomitantemente com a União, velar pela saúde da população e colaborar com a ciência para a redução do risco de doenças causadas pela radiação solar, consoante os dizeres do art. 23, inc. II e do art. 196 da Constituição Federal. E, ciente do aprofundamento inevitável da crise econômica no país, restringir o uso de determinados produtos que visam a prevenção de doenças, não parece medida razoável e oportuna, no momento.
Pelo exposto, podemos concluir que o projeto de lei em análise apresenta vício de inconstitucionalidade sendo portanto, inevitável opinar pela opina-se pela rejeição do Projeto de Lei Ordinária nº 939/2020, de autoria do Deputado Diogo Moraes.
É o Parecer do Relator.
3. CONCLUSÃO DA COMISSÃO
Tendo em vista as considerações expendidas pelo relator, a Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, por seus membros infra-assinados, opina pela rejeição do Projeto de Lei Ordinária nº 939/2020, de autoria do Deputado Diogo Moraes.
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