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Parecer 3634/2020

Texto Completo

PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 1230/2020

 

AUTORIA: DEPUTADO ROMERO SALES FILHO

 

PROPOSIÇÃO QUE DISPÕE SOBRE NORMAS DE TRANSPARÊNCIA SOBRE DADOS DAS EMPRESAS DE TRANSPORTE RODOVIÁRIO INTERMUNICIPAL DE PASSAGEIROS E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS. MATÉRIA INSERTA NA COMPETÊNCIA MATERIAL E LEGISLATIVA DOS ESTADOS-MEMBROS PARA EXPLORAR OS SERVIÇOS DE TRANSPORTE INTERMUNICIPAL (ART. 25, § 1º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL). USURPAÇÃO DA COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO PARA DISCIPLINAR CRIMES DE RESPONSABILIDADE (SÚMULA VINCULANTE Nº 46 DO STF). VIABILIDADE DA INICIATIVA PARLAMENTAR. OBRIGAÇÃO COMPATÍVEL COM DEVER GERAL DE PROMOÇÃO DE PUBLICIDADE E TRANSPARÊNCIA NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA (ART. 5º, INCISOS XXXIII E XXXIV, “B”, E ART. 37, CAPUT E § 3º, INCISO II, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL). EXISTÊNCIA DE LEGISLAÇÃO ESTADUAL SOBRE A MATÉRIA, TORNANDO-SE DESNECESSÁRIA A EDIÇÃO DE LEI AUTÔNOMA. AUSÊNCIA DE VÍCIOS DE INCONSTITUCIONALIDADE E DE ILEGALIDADE. PELA APROVAÇÃO, NOS TERMOS DO SUBSTITUTIVO DESTE COLEGIADO.

 

1. RELATÓRIO

 

Vem a esta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, para análise e emissão de parecer, o Projeto de Lei Ordinária nº 1230/2020, de autoria do Deputado Romero Sales Filho, que dispõe sobre normas de transparência sobre dados das empresas de transporte rodoviário intermunicipal de passageiros e dá outras providências.  

 

Em síntese, a proposição obriga que as empresas que compõem o Sistema de Transporte Coletivo Intermunicipal de Passageiros forneçam planilhas de custos que compõem a tarifa do serviço de transporte rodoviário à Secretaria Estadual das Cidades do Estado de Pernambuco. Além disso, o projeto de lei prevê que as planilhas serão disponibilizadas pela Secretaria das Cidades, em sítio eletrônico, para conhecimento público, de forma que contenha informações detalhadas sobre custo variável, custo com pessoal, depreciação de capital, custos de administração, fluxo de caixa relativo à receita, fluxo de caixa relativo aos custos e fluxo de caixa relativos aos impostos. Por fim, a proposta afirma que o não cumprimento dos seus comandos implicará crime de responsabilidade.

 

O Projeto de Lei em referência tramita nesta Assembleia Legislativa pelo regime de urgência.

 

É o relatório.

2. PARECER DO RELATOR

 

A proposição vem arrimada no art. 19, caput, da Constituição Estadual e no art. 194, I, do Regimento Interno desta Assembleia Legislativa.

 

Em relação à possibilidade de exercício da competência legislativa na esfera estadual, cumpre esclarecer que, ainda que não exista no texto constitucional comando expresso, infere-se que cabe aos Estados-membros a competência para explorar e disciplinar os serviços de transporte intermunicipal em face da chamada competência residual (art. 25, § 1º, da Constituição Federal).

 

No mesmo sentido é a orientação adotada pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal - STF:

 

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. § 2º DO ARTIGO 229 DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO. TRANSPORTE COLETIVO INTERMUNICIPAL. TRANSPORTE COLETIVO URBANO. ARTIGO 30, V DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. TRANSPORTE GRATUITO. COMPETÊNCIA LEGISLATIVA. POLICIAIS CIVIS. DIREITO ADQUIRIDO. INEXISTÊNCIA. 1. Os Estados-membros são competentes para explorar e regulamentar a prestação de serviços de transporte intermunicipal. 2. Servidores públicos não têm direito adquirido a regime jurídico. Precedentes. 3. A prestação de transporte urbano, consubstanciando serviço público de interesse local, é matéria albergada pela competência legislativa dos Municípios, não cabendo aos Estados-membros dispor a seu respeito. 4. Pedido de declaração de inconstitucionalidade julgado parcialmente procedente. (ADI 2349, Relator(a):  Min. EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 31/08/2005, DJ 14-10-2005 PP-00007 EMENT VOL-02209-01 PP-00125 LEXSTF v. 27, n. 323, 2005, p. 46-53)

 

Portanto, de uma forma geral, não existe óbice ao tratamento normativo do tema na linha preconizada pelo Projeto de Lei Ordinária nº 1230/2020.  

 

Nada obstante, especificamente quanto ao art. 3º da proposição (“O não cumprimento do disposto nesta Lei implicará em crime de responsabilidade, sujeito às sanções legais.”), vislumbra-se a ocorrência de inconstitucionalidade por usurpação à competência privativa da União. De fato, conforme Súmula Vinculante nº 46 do Supremo Tribunal Federal: “A definição dos crimes de responsabilidade e o estabelecimento das respectivas normas de processo e julgamento são de competência legislativa privativa da União.

 

Portanto, exceto pelo art. 3º, resta afirmada a constitucionalidade formal orgânica do Projeto de Lei em apreço.

 

Por outro lado, no que tange à constitucionalidade formal subjetiva, a matéria versada no Projeto de Lei nº 1230/2020 não se encontra no rol de assuntos reservados à iniciativa do Governador do Estado ou de outros órgãos/autoridades estaduais (arts. 19, § 1º; 20; 45; 68, parágrafo único, e 73-A, todos da Constituição Estadual). Logo, revela-se viável a deflagração do processo legislativo pela via parlamentar.

 

 Ressalta-se que a divulgação documentos que informam a composição do preço da tarifa do serviço de transporte intermunicipal constitui especificação de um dever geral que já está previsto no ordenamento jurídico, conforme se depreende do art. 37, caput e § 3º, inciso II, c/c art. 5º, incisos XXXIII e XXXIV, “b”, da Constituição de 1988, in verbis:

 

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:  

[...]

§ 3º A lei disciplinará as formas de participação do usuário na administração pública direta e indireta, regulando especialmente:                       (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

[...]

II - o acesso dos usuários a registros administrativos e a informações sobre atos de governo, observado o disposto no art. 5º, X e XXXIII; 

 

Art. 5º [...]

XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado;             

XXXIV - são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas:

[...]

b) a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal;”   

 

Dessa forma, os comandos vertidos na proposição não criam novas atribuições ou acarretam o aumento de despesa para órgãos da Administração Pública estadual e, portanto, não demandam a iniciativa do Chefe do Poder Executivo.

 

Em sentido semelhante, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal afirmou a constitucionalidade de projeto de lei de origem parlamentar que aperfeiçoa a transparência das atividades governamentais:

 

EMENTA Ação direta de inconstitucionalidade. Lei nº 11.521/2000 do Estado do Rio Grande do Sul. Obrigação do Governo de divulgar na imprensa oficial e na internet dados relativos a contratos de obras públicas. Ausência de vício formal e material. Princípio da publicidade e da transparência. Fiscalização. Constitucionalidade. 1. O art. 22, inciso XXVII, da Constituição Federal atribuiu à União a competência para editar normas gerais de licitações e contratos. A legislação questionada não traz regramento geral de contratos administrativos, mas simplesmente determina a publicação de dados básicos dos contratos de obras públicas realizadas em rodovias, portos e aeroportos. Sua incidência é pontual e restrita a contratos específicos da administração pública estadual, carecendo, nesse ponto, de teor de generalidade suficiente para caracterizá-la como “norma geral”. 2. Lei que obriga o Poder Executivo a divulgar na imprensa oficial e na internet dados relativos a contratos de obras públicas não depende de iniciativa do chefe do Poder Executivo. A lei em questão não cria, extingue ou modifica órgão administrativo, tampouco confere nova atribuição a órgão da administração pública. O fato de a regra estar dirigida ao Poder Executivo, por si só, não implica que ela deva ser de iniciativa privativa do Governador do Estado. Não incide, no caso, a vedação constitucional (CF, art. 61, § 1º, II, e). 3. A legislação estadual inspira-se no princípio da publicidade, na sua vertente mais específica, a da transparência dos atos do Poder Público. Enquadra-se, portanto, nesse contexto de aprimoramento da necessária transparência das atividades administrativas, reafirmando e cumprindo o princípio constitucional da publicidade da administração pública (art. 37, caput, CF/88). 4. É legítimo que o Poder Legislativo, no exercício do controle externo da administração pública, o qual lhe foi outorgado expressamente pelo poder constituinte, implemente medidas de aprimoramento da sua fiscalização, desde que respeitadas as demais balizas da Carta Constitucional, fato que ora se verifica. 5. Não ocorrência de violação aos ditames do art. 167, I e II, da Carta Magna, pois o custo gerado para o cumprimento da norma seria irrisório, sendo todo o aparato administrativo necessário ao cumprimento da determinação legal preexistente. 6. Ação julgada improcedente.

(ADI 2444, Relator(a):  Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 06/11/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-021 DIVULG 30-01-2015 PUBLIC 02-02-2015)

 

Ademais, sob o aspecto material, o Projeto de Lei também se mostra compatível com a Lei Federal nº 12.527, de 18 de novembro de 2011, verdadeiro marco no que tange ao acesso à informação em face de órgãos e entidades da Administração Pública, direta e indireta, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Com efeito, a Lei nº 12.527/2011, conhecida como Lei de Acesso à Informação – LAI, parte do pressuposto de que todas as informações produzidas ou custodiadas pelo Poder Público, desde que não classificadas como sigilosas, são públicas e, portanto, acessíveis aos cidadãos.

 

O tratamento normativo adotado pela referida lei federal distingue duas formas de divulgação da informação: a transparência ativa e a transparência passiva. Segundo o entendimento da Controladoria Geral da União:

 

A LAI contém comandos que fazem referência à obrigatoriedade de órgãos e entidades públicas, por iniciativa própria, divulgarem informações de interesse geral ou coletivo, salvo aquelas protegidas por algum grau de sigilo.

A iniciativa do órgão público de dar divulgação a informações de interesse geral ou coletivo, ainda que não tenha sido expressamente solicitada, é denominada de princípio da “Transparência Ativa”. Diz-se que, nesse caso, a transparência é “ativa”, pois parte do órgão público a iniciativa de avaliar e divulgar aquilo que seja de interesse da sociedade.

[...]

Assim como estabelece mecanismos da chamada “Transparência Ativa”, a LAI estabelece procedimentos e ações a serem realizados pelos órgãos e entidades públicas de forma a garantir o atendimento ao princípio da “Transparência Passiva”. A “Transparência Passiva” se dá quando algum órgão ou ente é demandado pela sociedade a prestar informações que sejam de interesse geral ou coletivo, desde que não sejam resguardadas por sigilo. A obrigatoriedade de prestar as informações solicitadas está prevista especificamente no artigo 10 da LAI: Art. 10. “Qualquer interessado poderá apresentar pedido de acesso a informações aos órgãos e entidades referidos no art. 1° desta Lei, por qualquer meio legítimo, devendo o pedido conter a identificação do requerente e a especificação da informação requerida”. Dessa forma, além de disponibilizar informações que o estado/município julgue ser de caráter público e de interesse coletivo, é também dever do ente garantir que as informações solicitadas pela população sejam atendidas.

(Manual da Lei de Acesso à Informação para Estados e Municípios, 1ª ed., 2013. Disponível em: <www.cgu.gov.br/Publicacoes/transparencia-publica/brasil-transparente/arquivos/manual_lai_estadosmunicipios.pdf>)

 

Na hipótese do Projeto de Lei analisado, tem-se uma manifestação própria da transparência ativa, visto que Poder Público adota a iniciativa de divulgar informações e dados de inegável interesse da coletividade.

 

Isto posto, conclui-se que não existem vícios que possam comprometer a validade da proposição ora examinada.

 

Todavia, faz-se necessário o aperfeiçoamento do texto da proposta no tocante aos seguintes pontos: 1) inserção dos comandos da proposição no bojo da Lei nº 13.254, de 21 de junho de 2007, que estrutura o Sistema de Transporte Coletivo Intermunicipal de Passageiros do Estado de Pernambuco, autoriza a criação da Empresa Pernambucana de Transporte Intermunicipal – EPTI, e dá outras providências, em razão da pertinência temática; 2) simplificação da relação de documentos a serem disponibilizados, adotando-se, como referência, a estrutura da planilha de custos utilizada pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (http://files.antp.org.br/2017/8/21/1.-metodo-de-calculo--final-impresso.pdf); 3) previsão de divulgação das informações pela Empresa Pernambucana de Transporte Coletivo Intermunicipal, na qualidade de órgão gestor do sistema, remetendo-se o detalhamento de critérios e forma de divulgação a Decreto do Poder Executivo; e 4) exclusão do dispositivo que prevê a configuração de crime de responsabilidade por seu descumprimento e a respectiva substituição pela cláusula que dispõe sobre responsabilização das autoridades administrativas.

 

Assim, com intuito de promover adequações pertinentes, propõe-se a aprovação de substitutivo nos termos a seguir expostos:

 

SUBSTITUTIVO N°         /2020

AO PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 1230/2020

 

Altera integralmente a redação do Projeto de Lei Ordinária nº 1230/2020.

 

Artigo único. O Projeto de Lei Ordinária nº 1230/2020 passa a ter a seguinte redação:

 

“Altera a Lei nº 13.254, de 21 de junho de 2007, que estrutura o Sistema de Transporte Coletivo Intermunicipal de Passageiros do Estado de Pernambuco, autoriza a criação da Empresa Pernambucana de Transporte Intermunicipal – EPTI, e dá outras providências, a fim de dispor sobre a disponibilização e divulgação de custos que compõem a tarifa do serviço público de transporte intermunicipal.  

 

Art. 1° A Lei nº 13.254, de 21 de junho de 2007, passa a vigorar com as seguintes modificações:

 

‘Art. 7º-A Os delegatários do serviço de transporte coletivo intermunicipal de passageiros do Estado de Pernambuco ficam obrigados a fornecer à EPTI as planilhas que compõem o cálculo da tarifa vigente, contendo, no mínimo, as seguintes informações: (AC)

 

I - custos variáveis: combustível, lubrificantes, rodagem, peças e acessórios; (AC)

 

II - custos fixos: depreciação, despesas administrativas e custos com pessoal de operação, de manutenção e administrativo; (AC)

 

III - remuneração pela prestação de serviços; (AC)

 

IV - tributos; e (AC)

 

V - dados operacionais: passageiros transportados e equivalentes, quilometragem programada e frota total. (AC)

 

§ 1º A EPTI deverá disponibilizar em seu sítio eletrônico informações sobre os custos por delegatário, de forma clara e acessível à população, observando-se critérios e forma de divulgação previstos em Decreto do Poder Executivo.  (AC)

 

§ 2º O descumprimento do disposto no caput sujeitará o delegatário à penalidade de multa prevista no inciso V do art. 26-F. (AC)

 

§ 3º O descumprimento do disposto no § 1º ensejará a responsabilização administrativa da autoridade responsável, em conformidade com a legislação aplicável. (AC)

.

Art. 2º Caberá ao Poder Executivo regulamentar a presente Lei em todos os aspectos necessários a sua efetiva aplicação.

 

Art. 3º Esta Lei entra em vigor após decorridos 60 (sessenta) dias de sua publicação oficial.”

 

Diante do exposto, opina-se pela aprovação do Projeto de Lei Ordinária nº 1230/2020 de autoria do Deputado Romero Sales Filho, nos termos do Substitutivo acima proposto.

 

É o Parecer do Relator.

3. CONCLUSÃO DA COMISSÃO

 

Tendo em vista as considerações expendidas pelo relator,  o parecer desta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, por seus membros infra-assinados, é pela aprovação do Projeto de Lei Ordinária nº 1230/2020, de autoria do Deputado Romero Sales Filho, nos termos do Substitutivo deste Colegiado.

Histórico

[27/07/2020 15:15:14] ENVIADA P/ SGMD
[27/07/2020 15:55:36] ENVIADO PARA COMUNICA��O
[27/07/2020 15:55:49] ENVIADO P/ PUBLICAÇÃO
[28/07/2020 08:53:52] PUBLICADO





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