
Parecer 3164/2020
Texto Completo
PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 666/2019
AUTORIA: DEPUTADA DELEGADA GLEIDE ÂNGELO
PROPOSIÇÃO QUE AUTORIZA O GOVERNO DO ESTADO A DOAR BICICLETAS APREENDIDAS EM DECORRÊNCIA DA PRÁTICA DE ILÍCITOS PENAIS. COMPETÊNCIA DE INICIATIVA DE DEPUTADA ESTADUAL, ART. 19, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO. COMPETÊNCIA ESTADUAL EM MATÉRIA ADMINISTRATIVA. AUSÊNCIA DE VÍCIO DE INCONSTITUCIONALIDADE OU ILEGALIDADE. PRECEDENTE DO STF. PELA APROVAÇÃO.
1. RELATÓRIO
É submetido à apreciação desta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça o Projeto de Lei Ordinária nº 666/2019, de autoria da Deputada Delegada Gleide Ângelo, que autoriza o Estado de Pernambuco a doar bicicletas apreendidas em decorrência da prática de ilícito penal, para pessoas de baixo poder aquisitivo.
Segundo afirma em sua justificativa:
“De acordo com dados fornecidos pela Secretaria de Defesa Social, o número de furtos e roubos de bicicletas em Pernambuco aumentou, no primeiro semestre de 2019, em 9% em relação ao mesmo período do ano passado, saltando de 332 registros de ocorrência para 363. No entanto, sabe-se que o número de bicicletas furtadas ou roubadas é superior aos dados fornecidos pela SDS, uma vez que a maioria das vítimas não comunica a polícia sobre o fato, ou seja, são crimes subnotificados.
Infelizmente elas acabam se tornando ferramentas da criminalidade, sendo usadas para a prática de novas infrações, ou são desmontadas e revendidas no mercado informal. Trata-se de um tipo de crime de difícil investigação, pois poucas bicicletas contam com dispositivos de identificação e rastreio.
Ocorre que, durante as operações da Polícia Civil de Pernambuco ou da Polícia Militar, muitas bicicletas são apreendidas e encaminhadas para os pátios das delegacias, aguardando para que sejam periciadas nos casos em que compete. Por nem sempre ser possível identificar os seus proprietários originais, ficam no limbo aguardando uma destinação.
Esses veículos se amontoam nos depósitos públicos, sendo inviável a sua alienação, posto que o retorno financeiro para o Estado seria irrisório, diante dos gastos para a realização de um leilão público. No entanto, proporcionalmente, também há prejuízo ao erário, em virtude dos gastos para a manutenção de depósitos e pátios de bens apreendidos.
Pesquisando em outros Estados, verificamos a existência de Leis que autorizam a doação dessas bicicletas para entidades sem fins lucrativos que as transformam em cadeiras de rodas populares. Inclusive, há esse precedente normativo em Pernambuco (Lei nº 16.374/18), para os casos de bicicletas apreendidas pela Secretaria da Fazenda, em decorrência da prática de infrações administrativas. [...]”
O Projeto de Lei em análise tramita nesta Assembleia Legislativa pelo regime ordinário, conforme inciso III, do art. 223, do Regimento Interno.
É o Relatório.
2. PARECER DO RELATOR
Cabe à Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, nos termos do art. 94, I, do Regimento Interno desta Casa, manifestar-se sobre a constitucionalidade, legalidade e juridicidade das matérias submetidas a sua apreciação.
A proposição em análise trata de autorizar o Governo do Estado a doar bicicletas apreendidas em decorrência da prática de ilícitos penais.
Como bem ressaltou a autora do projeto, inúmeras bicicletas se amontoam por longo tempo em depósitos públicos aguardando sua destinação devida ou retirada pelo proprietário, o que na maioria das vezes não acontece.
Verifica-se, portanto, que a matéria em análise encontra-se em região limítrofe entre a legislação de trânsito, segurança pública e legislação administrativa sobre uso de bens sob custódia do Poder Público.
O Código de Trânsito Brasileiro (Lei Federal nº 9.503/97) trata de bens apreendidos prescrevendo sua alienação após 60 dias sem reclamo por parte do proprietário:
Art. 328. O veículo apreendido ou removido a qualquer título e não reclamado por seu proprietário dentro do prazo de sessenta dias, contado da data de recolhimento, será avaliado e levado a leilão, a ser realizado preferencialmente por meio eletrônico.
Isso poderia levar a crer que a matéria se trata de trânsito e transporte, que seria de competência privativa da União (art. 22, XI, CF/88).
Contudo, no julgamento da ADI nº 3.327/ES, em que se discutia lei semelhante, o STF por maioria entendeu se tratar de matéria administrativa, estando, assim sob alçada do Estado.
Na ocasião, inclusive, o Min. Teori Zavascki se manifestou acerca do art. 328 acima afirmando que “O Código Nacional de Trânsito, ao tratar dessa matéria, é que tratou de uma matéria estranha ao trânsito”.
A conclusão, portanto, é que não há impedimento para que os Estados regulamentem alternativa possível para destinação de bens apreendidos além da alienação pura e simples, desde que respeitados os direitos fundamentais e o devido processo legal.
Por fim, a ementa do julgado, referido pela autora, atesta claramente a ausência de competência privativa da União:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEIS CAPIXABAS NS. 5.717/1998 E 6.931/2001. AUTORIZAÇÃO DE UTILIZAÇÃO, PELA POLÍCIA MILITAR OU PELA POLÍCIA CIVIL DO ESTADO, DE VEÍCULOS APREENDIDOS E NÃO IDENTIFICADOS QUANTO À PROCEDÊNCIA E À PROPRIEDADE, EXCLUSIVAMENTE NO TRABALHO DE REPRESSÃO PENAL. QUESTÃO AFETA À ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ESTADUAL: COMPETÊNCIA NÃO ATRIBUÍDA PRIVATIVAMENTE À UNIÃO. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. (STF - ADI: 3327 ES, Relator: Min. DIAS TOFFOLI, Data de Julgamento: 08/08/2013, Tribunal Pleno, Data de Publicação: ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-213 DIVULG 29-10-2014 PUBLIC 30-10-2014)
Ademais, no que tange a competência formal subjetiva, entendemos haver possibilidade de apresentação do projeto por parlamentar nos termos do art. 19, caput da Constituição do Estado.
É que, esta casa já aprovou a Lei Estadual nº 15.338/14 de autoria do então Deputado André Campos que dispõe acerca do tratamento dado a veículos abandonados no Estado, tema similar ao ora tratado. Além disso, vale citar também a aprovação da Lei Estadual n° 16.634, de 25 de setembro de 2019, que autorizou o Estado de Pernambuco a fazer uso de veículos automotores apreendidos em decorrência da prática de ilícitos penais ou de infrações administrativas.
Feitas as considerações pertinentes, o parecer do Relator é pela aprovação do Projeto de Lei Ordinária nº 666/2019, de iniciativa da Deputada Delegada Gleide Ângelo.
É o Parecer do Relator.
3. CONCLUSÃO DA COMISSÃO
Tendo em vista as considerações expostas pelo relator, a Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, por seus membros infra-assinados, opina pela aprovação do Projeto de Lei Ordinária nº 666/2019, de autoria da Deputada Delegada Gleide Ângelo.
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