Brasão da Alepe

Requerimento 562/2019

Texto Completo

Requeremos à Mesa, ouvido o Plenário e cumpridas as formalidades regimentais, seja transcrito nos Anais desta Casa Legislativa o artigo de título “O esquecido pioneirismo social de Agamenon Magalhães”, de autoria da Dra. Margarida de Oliveira Cantarelli, publicado na página Opinião do jornal Folha de Pernambuco, de 27 de maio do corrente.

 

Autor: Joaquim Lira

Justificativa

Em sua edição do último dia 27 de maio do corrente, a Folha de Pernambuco publicou artigo de autoria da atual presidente da Academia Pernambucana de Letras, Dra. Margarida de Oliveira Cantarelli de título “O esquecido pioneirismo social de Agamenon Magalhaes”.

O primoroso texto de autoria da desembargadora aposentada, escritora, jurista, traz uma homenagem ao grande pernambucano, ex-governador do Estado, falecido de forma precoce, em pleno mandato, Agamenon Magalhães, destacando seu legado de administrador maior em seu estado natal, sobretudo pelo trabalho social aos desassistidos, a partir de grandes obras que se notabilizaram segundo a autora, “tinham o caráter de serviço ao público e não de mera criatividade”. 

Na íntegra, o texto ora proposto.

 “O esquecido pioneirismo social de Agamenon Magalhães”

A História registrava dos homens públicos, preferencialmente, a sua atuação política, os cargos que exerceu, os posicionamentos que assumiu e, nem sempre, dava o merecido destaque a outros ângulos do seu trabalho e das suas realizações. Ainda mais, se essas atividades estivessem voltadas para o social e para as classes menos favorecidas da sociedade. Nas décadas de trinta e quarenta, tais ações eram consideradas muito mais como “obras de caridade”, que caberiam à Igreja, às suas Instituições Pias e, também, às senhoras devotas, do que como obras do governo. Talvez por visão da ação social, aqueles que se anteciparam no tempo quase visionários dentro do Poder Público, não tenham recebido os adequados registros pelo seu pioneirismo social. Agamenon Magalhães é um dos homens públicos que têm uma biografia incompleta.

O ex-governador de Pernambuco, que faleceu no exercício do seu mandato é lembrado como um hábil, duro que ocupou cargos de destaque no âmbito federal e que foi interventor no Estado durante o chamado Estado Novo. Timbrar um homem de grande dimensão social pelo exercício de um, dentre os muitos cargos que exerceu, é ficar com o transitório e esquecer o permanente. Tanto isto é verdade que o povo, que é o detentor da soberania, o elegeu para um mandato de governador pelo voto livre, num período de plena democracia.

Homenageado após a sua morte com a aposição do seu nome em avenidas, escolas, hospitais e outras instituições, parecia que isto seria o bastante para reverenciar a sua memória. Mas, não! O tempo sozinho se encarga de soltar a fumaça do esquecimento e os burocratas ajudam-no, transformando em siglas estranhas nomes eméritos.

Dentre as instituições que receberam o seu nome, duas merecem destaque. Uma delas, a grande “Escola Industrial Agamenon Magalhães”, na Encruzilhada, voltada para educação profissionalizante, sem faltar com o lado humanístico, pois dispunha de uma biblioteca completa, aberta também para os alunos, onde Luzila e eu íamos buscar emprestado os clássicos da literatura. Essa magnífica experiência educacional passou a ser conhecida como ETEPAM!

A segunda, o “Serviço Social Agamenon Magalhães”, nova denominação para a “Liga contra o Mocambo”, por ele criada e localizada no bairro de Santo Amaro.

Quando integrei a equipe de Joaquim Francisco, na Secretaria do Trabalho e Ação Social Agamenon Magalhães, que já era chamado de SSAM. Naquela oportunidade, conheci de perto os frutos da “Liga contra o Mocambo”, entendi a dimensão e o pioneirismo dessa Instituição que assim se manteve por décadas.

É preciso mergulhar no tempo e suas circunstâncias para compreender o alcance de determinadas ações. No Recife e adjacências, havia (e lamentavelmente ainda há) uma grande parte da população completamente desvalida. E a palavra é esta – desvalida, sem valor, desempregada! Alguns socorros vinham da Igreja, através da Santa Casa de Misericórdia e para atender os indigentes, o Hospital Santo Amaro!

Embora com precariedade, algumas categorias profissionais tinham um certo amparo assistencial: comerciários, ferroviários, funcionários públicos, etc. Os migrantes (chamados de retirantes) que chegava à capital fugindo das dificuldades do interior, inclusive das agruras das secas, alojavam-se em moradias extremamente precárias: os mocambos pouco visíveis sobre palafitas ou enterrados na lama dos manguezais nas proximidade dos cursos d´água. Eram homens, mulheres e crianças vivendo dos caranguejos e mariscos, quase como um deles.

  Por outro lado, também se encontravam desvalidas muitas mulheres que trabalharam durante toda a sua vida em empregos domésticos e ao final, quando já sem forças e sem saúde, nada tinham para sua velhice, salvo a caridade de alguma bondosa antiga patroa. Eram as cozinheiras, arrumadeiras, lavadeiras, entre outras.

Pelo que consegui depreender das atividades da “Liga contra i Mocambo”, ela atuava em dois eixos: as Ligas Operárias (Centros Educativos Operários) e as Vilas Populares.

As Ligas Operárias, uma eficiente antecipação do sistema público de saúde, ofereciam gratuitamente assistência médica e odontológica, localizadas nas próprias vilas ou proximidades, com horário condizente com a necessidade dos beneficiários. Todos eram atendidos, adultos e crianças, com boa qualidade, num claro respeito à dignidade do ser humano pobre. Tinham o caráter de serviço ao público e não de mera caridade.

As ações educativas desenvolvidas nas Ligas também tinham um diferencial, que era um direcionamento profissional. Para homens, os cursos eram de soldadores, eletricistas, reparadores de rádio (ainda não havia televisão, que depois foi incluído), etc. Pra as mulheres, eram corte e costura, flores artificiais (muito na moda) e outros.

Com frequência, havia distribuição, no Palácio, de máquinas de costura. Como se vê, os cursos não “davam o peixe, mas ensinavam a pescar”. Ainda encontrei diversos núcleos de cursos profissionalizantes em funcionamento.

Quanto as Vilas, conjunto de casas populares, destinavam-se à eliminação dos mocambos, trazendo dos manguezais para habitações dignas aquelas pessoas que viviam em condições subumanas; como também, construindo Vilas para cozinheiras, lavadeiras, e outras domésticas, em Santo Amaro. Neste último caso, há um duplo pioneirismo, pois visava atender a mulheres as quais exerciam atividades não contempladas em qualquer das modalidades de profissões já reconhecidas legalmente: as domésticas.

Ao falar da Vila das Cozinheiras, em Santo Amaro, veio-me uma lembrança tão antiga, da minha infância. Tonha (Antônia) irmã da minha babá Chica (Francisca) morava na Vila das Cozinheiras, numa casa situada na atual Avenida Norte, que recebeu de Agamenon Magalhães. Moradia digna, ainda existe, com um pequeno jardim e um quintal. Muitas vezes fomos visita-la! Sempre externou uma gratidão imensa pelo benefício recebido.

E a Liga contra o Mocambo, mesmo quando já se denominava Serviço Social Agamenon Magalhães, continuou construindo casas populares, como a Vila de Ouro Preto, à época a maior vila popular da América Latina, hoje um bairro importante de Olinda.

Quando estive na África do Sul, não fui procurar as aventuras dos Safaris, embora tenha participado de três com surpreendente entusiasmo, para quem tem medo até de velho cachorrinho dos netos.           Mas, fui conhecer dois lugares. Como aficionada pela obra de Camões, queria ir ao Cabo das Tormentas, depois da Boa Esperança e ali rememorar o Episódio do Gigante Adamastor. Que emoção!

O segundo, era ir ao Soweto, onde viviam segregados os negros, inclusive os que trabalhavam em Joanesburgo, na época do Aparthaid. Visitar, se possível, as casas de Mandela e o Bispo Tutu. Nunca tinha visto uma imagem do lugar. Ao externar o meu desejo de efetuar esse “passeio”, logo me foi dito que não estava incluído nos roteiros turísticos. Como sou determinada, respondi que iria lá de taxi, por conta própria. A nossa guia (moçambicana branca) entendeu o meu interesse e se dispôs a ir comigo na tarde destinada à visita a uma Casa de Lapidação de Diamantes. Claro que não iria comprar diamantes, eu queria enriquecer o meu espírito. Duas companheiras do grupo se juntaram e fomos as quatros, num taxi apertado (para não chamar atenção) atá o Soweto. Chocou-me na saída de Joanesburgo passar pela Estação Ferroviária e ver os vagões destinados ao transporte dos negros entre as duas localidades.

Ao chegar no Soweto, deveríamos seguir as recomendações de cautela da nossa guia, mas outro impacto me aguardava. Aquele imenso núcleo habitacional era, no estilo de construção das casas, extremamente parecido com a Vila das Cozinheiras do bairro do bairro de Santo Amaro. Soweto era um imenso Santo Amaro, só que em cada casa eram amontoadas várias famílias. Foi-nos explicado que Nelson Mandela, quando assumiu a presidência, mandou levantar os valores pagos pelos moradores ao governo ao longo de tantas décadas. Era muito superior ao devido para a compra. Então, ele entregou os títulos de propriedade e as famílias dividiam os espaços. Daí muitas casas já com melhor aparência, Hospitais, Universidade e outros serviços instalados, embora ainda instável socialmente.

Essa visita me mostrou outra importante grandeza de Agamenon Magalhães. As casas se pareciam, mas lá no Soweto, era um programa de exclusão social, sem conceder a propriedade, obrigando todo aquele povo a pagar caro por uma moradia e, por razão de raça, a viver segregado.

Aqui, ao contrario, cada família tinha desde logo a propriedade de sua casa, qualquer que fosse a cor da sua pele, era um real programa de inclusão social.

Se tudo isto não está nos registros históricos em torno da figura pública de Agamenon Magalhães, é lamentável, porque o seu exemplo ensinaria aos gestores de hoje o como tratar dignamente o ser humano. Mas, eu sei porque vi, o maior dos reconhecimentos, que é a gratidão daqueles que de invisíveis caranguejos se tornaram homens e daqueles que, da beira do fogão ou dos tanques, passaram a ter um teto como seu lar.

 

Histórico

Joaquim Lira
Deputado


Informações Complementares

Status
Situação do Trâmite: ENVIADO_PARA_COMUNICACAO
Localização: SECRETARIA GERAL DA MESA DIRETORA (SEGMD)

Tramitação
1ª Publicação: 05/06/2019 D.P.L.: 15
1ª Inserção na O.D.:




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