Brasão da Alepe

Requerimento 27/2019

Texto Completo

Requeremos à Mesa, ouvido o Plenário e cumpridas as formalidades regimentares, seja transcrita nos Anais desta Casa Legislativa a série de três reportagens publicadas nos dias 3, 4 e 5 de fevereiro do corrente, no Jornal do Commércio, de Recife, sobre o Centenário de Nascimento do Médico Fernando Figueira.

 

Autor: Joaquim Lira

Justificativa

Como parte das homenagens ao centenário de nascimento do médico Fernando Figueira, um dos idealizadores do IMIP, o Jornal do Commércio publicou série de três reportagens nos dias 3, 4 e 5 de fevereiro do corrente, sob a autoria da jornalista do citado periódico, Cinthya Leite.

A expressiva matéria traz aspectos da biografia do renomado médico, nascido em Figueira da Foz, Portugal, que ainda criança veio para o Brasil, e que dedicou sua existência a causa da saúde, tornando possível o surgimento do IMIP, nos anos 60.

Para que fique registrado nos Anais da Casa de Joaquim Nabuco, a significativa reportagem do jornal pernambucano à figura do inesquecível médico, solicitamos a transcrição dessa matéria, através deste expediente, ao ensejo de seu acolhimento pelos Nobres Pares.

Na íntegra, os textos ora proposto nesta oportunidade.

“Uma medicina guiada pelo social”

03 de fevereiro de 2019

A vida pautada na medicina social inspira esta série de reportagens, de hoje até terça-feira, sobre o centenário de nascimento do médico e professor Fernando Figueira. Amanhã o JC revela como os discípulos perpetuam as lições do mestre.

Nossa memória afetiva tem o poder de armazenar cenas, sentimentos e detalhes das lembranças significativas. Elas vêm e vão, mas nunca deixam de trazer um instante do passado permeado de satisfação. É assim que acontece quando alguém recorda momentos ao lado do pediatra e professor Fernando Figueira (1919-2003), que celebraria 100 anos de nascimento amanhã. Mestre representativo da medicina social (campo que busca compreender como as condições sociais e econômicas afetam a saúde), ele deixou um legado enraizado no acesso universal ao sistema público de saúde. “O exercício da medicina não deve se subordinar à crueza das leis econômicas. Deve ser regido pelas necessidades sociais de um povo em determinado momento histórico”, já dizia o professor, que multiplicou discípulos com preceitos que permanecem atuais.

Ao abraçar ensinamentos que caminhavam na contramão da polimedicação, a favor do aleitamento materno e do olhar holístico, Figueira se tornou exemplo de solidariedade, fraternidade e respeito a pessoas em situação de vulnerabilidade social. Esse foi o combustível que o fez erguer o Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira (Imip), principal obra do mestre criada em 1960 e que inicialmente recebeu o nome de Hospital Geral de Pediatria do Imip – naquela época, era a sigla para Instituto de Medicina Infantil de Pernambuco.

“Aos poucos, ele foi desenhando uma assistência também para as mulheres, que aguardavam a consulta com os filhos. O professor viu que era preciso otimizar esse tempo para oferecer cuidado às mães. Começou, então, a treinar ginecologistas para oferecer preventivo e exames às mulheres”, conta o pediatra João Guilherme Alves, 64 anos, diretor de Ensino do Imip e um dos discípulos do professor. “Com ele, aprendemos que a vida tem valor independentemente da classe social. Era admirável o respeito dele com os pacientes”, recorda. Para o professor, a medicina precisava ser usada como ciência a serviço da população. Isso o fez extrapolar as fronteiras da pediatria: os cuidados ultrapassaram a faixa etária infantojuvenil e mergulharam num modelo de atenção integral para a família.

“Meus avós confiavam demais nele. Mesmo sendo pediatra, dava orientações a adultos. Ele cuidou de mim do nascimento aos 13 anos. Tio Fernando (como o chamava) tinha o dom de criar relação de confiança com os pacientes”, diz a servidora pública Maria Evangelina Guerra, 48 anos, que guardou caderneta de vacinação, relatório da visita que o professor fez na maternidade sete horas após o nascimento dela e fichas com requisição de medicamentos. Uma frase com a letra dele se destaca: “Ler cuidadosamente instruções”. Essa é uma das orientações que remetem a um ilustre pensamento de Figueira: “Um médico tem profunda responsabilidade sobre a vida dos que o procuram”. A reflexão faz o baú de memórias afetivas de Vanjinha (como era chamada pelo professor) ser remexido. “Há 20 anos, eu o reencontrei caminhando no Parque da Jaqueira (Zona Norte do Recife). Ele me reconheceu e fez elogios porque me achou bem. Era fabuloso”, conta Maria Evangelina, que – neste centenário – está com o coração cheinho de boas lembranças ao revisitar raízes da infância.

Mamadeira e leite em pó eram proibidos

À frente da Secretaria de Saúde de Pernambuco, no governo Eraldo Gueiros (1971-1975), Fernando Figueira tomou uma iniciativa que é relembrada e contada por muitos de seus discípulos. Naquela época, ele proibiu a distribuição de bicos, mamadeiras e latas de leite em pó, por parte da indústria de alimentos infantis, nas maternidades. A decisão, que causou polêmica, virou um marco na história mundial da amamentação e se tornou aplaudida pela comunidade científica, que hoje reconhece os benefícios do aleitamento materno. A proibição ocorreu pela Portaria 99, publicada no Diário Oficial de 3 de dezembro de 1974. Para justificar a medida, o professor alegou que o leite materno é insubstituível como alimento de proteção aos recém-nascidos. Foi um grito de guerra que atingiu multinacionais. Essa é apenas uma das lutas que Figueira empreendeu para ratificar a conduta de um homem que não se deixava levar por interesses de mercado e que tinha atitudes além do seu tempo. Hoje o Banco de Leite Humano do Imip é referência no incentivo ao aleitamento e representa a coroação pela batalha contra o desmame.

“Ele era destemido, inconformado com as injustiças sociais. Tinha uma visão de vanguarda e um espírito empreendedor à causa pública”, relata o médico Antonio Carlos Figueira – o quinto dos nove filhos do professor e que nasceu no ano de criação do instituto (1960). A profissão de médico também foi abraçada pelo filho caçula, Fernando Augusto Figueira, 39 anos, cirurgião cardiovascular e coordenador do Serviço de Transplante Cardíaco do Imip. A filha Maria Cristina Figueira se dedica à coordenação do curso de enfermagem da Faculdade Pernambucana de Saúde, que surgiu, em 2005, da aliança entre a Associação Educacional Boa Viagem e a Fundação Alice Figueira, organização de apoio ao desenvolvimento do Imip. “Mesmo os filhos que não são da área da saúde, contribuem direta ou indiretamente na manutenção da obra social deixada pelo professor”, destaca Fernando.

Na pauta de desejos, vários Imips instalados

Quem conviveu no dia a dia com Fernando Figueira sabe que o Imip se tornou o oxigênio de que o professor precisava para se manter vivo. A declaração é da nutricionista Silvia Rissin, que assumiu a presidência do instituto em agosto do ano passado, depois de ter ficado à frente da Fundação Alice Figueira por 22 anos. Para ela, a expansão do Imip se entrelaça com o próprio desenvolvimento da saúde pública em Pernambuco e com a história de vida do professor que continua a inspirar gerações de médicos. “Ele me convocou para trabalhar no Imip, mesmo sem saber em que setor eu ficaria nem o que faria exatamente, mas queria que eu arrecadasse recursos necessários para dar continuidade ao trabalho do instituto”, recorda Silvia.

A presidente da instituição conta que o sonho de Figueira era ver outros “Imips” espalhados, descentralizando a assistência à saúde, para que as famílias não percorressem longas distâncias para receber atendimento. “Esse desdobramento do instituto hoje pode ser representado, por exemplo, pelas UPAs (Unidades de Pronto Atendimento) e postos de saúde que estão pelo Estado. E aos poucos, o Imip foi crescendo sem se limitar à assistência, mas também oferecendo ensino e pesquisa.

O amor do professor pela medicina social plantada no Imip também é narrado pelo motorista da presidência, Salatiel Farias, 65 anos, que está há mais de três décadas no instituto. “Comecei dirigindo as ambulâncias, e ele sempre pediu para eu acompanhá-lo nas viagens que fazia de carro. Fiquei como motorista dele por uns dez anos. Era um homem muito bom, que só queria viver para ajudar as pessoas. Lembro uma vez que ele viu uma senhora à toa no Cais de Santa Rita (bairro de São José, no Centro do Recife), sensibilizou-se e pediu para ver do que ela estava precisando. Essa é só uma das muitas lembranças que tenho do quanto ele fazia o bem”, conta Salatiel, que guarda na memória o dia em que o Imip perdeu um pai ilustre. “No dia em que ele faleceu, eu estava na residência com ele. Passei mal, a minha pressão subiu. Até hoje só guardo boas lembranças dele.” Há cinco décadas no instituto, a secretária Francisca Sales, 86 anos, também só guarda recordações de bons momentos ao lado do professor. “Eu o conheci quando trabalhava na pediatria da Faculdade de Ciências Médicas, mas ele fez questão de me convocar para o Imip. Ofereceu até um salário mais alto. Ele era assim mesmo: gostava de ajudar”, conta.

O professor faleceu aos 84 anos, no dia 1º de abril de 2003. A despedida foi marcada por muitas homenagens feitas por funcionários da instituição, dos amigos, autoridades políticas e de saúde, entidades médicas, moradores da comunidade dos Coelhos (bairro onde fica o instituto) e pacientes do hospital que tanto o admiravam.

Amanhã, no dia em que Fernando Figueira completaria 100 anos, o Imip celebra uma missa, às 10h, em memória ao seu fundador, reverenciado pelas obras, ideais e luta em prol dos mais necessitados. A celebração será comandada pelo bispo auxiliar da arquidiocese de Olinda e Recife, dom Limacêdo Antonio da Silva. Já na próxima quarta-feira, também às 10h, será realizado o lançamento do Selo Especial Fernando Figueira, em parceria com os Correios, em solenidade na Sala de Defesa de Tese do instituto. Ao longo deste ano, serão feitas diversas homenagens, como lançamento de livro, conferências e congressos.

04 de fevereiro de 2019

No segundo dia da série que marca o centenário de nascimento do professor e médico Fernando Figueira, o valor que ele dava ao trabalho e a importância de atuar também como voluntário.

Certamente a lição de mais excelência e abnegação que o professor e médico Fernando Figueira deixou para os discípulos foram os ensinamentos sobre “salário mental” – a maior recompensa que a medicina social, plantada no Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira (Imip), pagava aos seus profissionais. Em artigo publicado neste JC, no dia 30 de abril de 2010, o médico e ex-presidente da instituição Gilliatt Falbo, atualmente coordenador acadêmico da Faculdade Pernambucana de Saúde (FPS), relata o primeiro contato com o professor, que o apresentou a esse tipo de recompensa. “Para se compreender o valor dessa moeda se carece de consciência, amor, compaixão e muitas vezes de tempo. Tempo”, escreveu Gilliatt Falbo para explicar como o “salário mental” é aquele que só se presta para fazer o bem. O médico Otelo Schwambach, 77 anos, um dos primeiros a fazer residência pediátrica com Figueira, relembra com carinho como o professor fazia menção a esse tipo de gratificação. “Ele dizia que todos nós precisamos ter o nosso salário mental, que recebemos sempre que fazemos aquilo que nos agrada e nos faz bem. O meu é ira Chã Grande (município do Agreste de Pernambuco) todas as sextas-feiras. Na cidade, trabalho como voluntário num posto de saúde atendendo as crianças e suas famílias. Elas ficam extremamente felizes com essa assistência, que não difere em nada da que dou aos meus pacientes do consultório particular. Estou certo de que é um trabalho que faz mais bem a mim do que a elas”, relata Otelo Schwambach sobreaforma com que retribui todos os ensinamentos que recebeu do professor. Também discípulo de Figueira, o pediatra Marcello Pontual, 76 anos, contemporâneo de Otelo, chegou ao Imip em 2 de janeiro de 1966. Desde então, nunca tirou o pé do instituto, do qual é voluntário até hoje. Pela admiração que tem pelo mestre e seriedade do trabalho realizado no Imip, continua a atender no Ambulatório de Nefrologia Pediátrica às segundas e quartas-feiras pela manhã. “O professor me deslocou para o serviço. Fui ficando por necessidade e depois veio uma paixão imensa pelo o que eu fazia”, conta Marcello Pontual, que também alimenta o seu “salário mental” às sextas, quando são realizadas as reuniões clínicas no Imip. “Tenho que retribuir à sociedade tudo aquilo que dela recebi em excesso. E faço questão de lutar para manter a ideia viva do professor, com foco no trabalho social que ele tanto valorizou”, acrescenta. O pediatra João Guilherme Alves, 64 anos, diretor de Ensino do Imip, também só exala admiração ao falar sobre Figueira, de quem segue doutrinas desde os tempos de faculdade. “Já nos primeiros contatos com o professor, o encanto foi tamanho que nem sei explicar. Tive o privilégio de diariamente ele me chamar para conversar. Com ele, aprendi que não precisamos saber só de medicina. O professor era firme ao dizer que o médico tem o compromisso de conhecer a sociedade em que vive. Então, ele chamava profissionais de outras áreas para ministrar aulas”, diz João Guilherme. Ele conta que até dom Helder Camara (arcebispo emérito de Olinda e Recife) era convidado para conversar com os residentes. Apenas 30% do corpo docente, segundo recorda, eram compostos por médicos. “Os demais professores convidados eram sociólogos, antropólogos, economistas, psicólogos e filósofos”, diz João Guilherme sobre o pioneirismo de Figueira ao desenvolver uma reflexão interdisciplinar e crítica do processo saúde/doença nas dimensões sociais, econômicas e políticas. “Ele dizia que o médico que só sabe medicina sabe muito pouco. Por isso, deveria contar com conhecimentos humanísticos para se compreender as verdadeiras causas das doenças”, salienta João Guilherme, sem deixar dúvidas de que, para se sensibilizar à dor alheia e praticar a solidariedade louvada pelo professor, também é necessário se debruçar em tratados não médicos.

“O impontual é o ladrão do tempo alheio”, dizia Figueira

O título acima é apenas uma de muitas frases que todos os que conhecem a história de vida de Fernando Figueira nunca esquecem. “O professor tinha muito respeito pela pontualidade. Dizia muito acertadamente que quem chegava na hora combinada era penalizado por aquele que chegava atrasado, pois o pontual tinha que esperar pelo retardatário, perdendo o precioso tempo”, escreve o pediatra João Guilherme Alves, em livro que organizou com o colega Otelo Schwambach, publicado em 2004, sobre o papel educador do mestre Figueira.

Para os profissionais que achavam 7h (hora em que os médicos do Imip iniciavam o trabalho) muito cedo, Figueira explicava, segundo relata João Guilherme: “Vivemos num clima tropical, o dia começa cedo. Temos muita gente precisando de nossos serviços. Além disso, vejam seus pacientes. A maioria deles chegou ao Imip ainda de madrugada, outros dormiram pelas calçadas, pegaram dois ou três transportes, outros andaram dezenas de quilômetros a pé, deixaram outros filhos em casa. Tudo isso na esperança de serem bem atendidos no Imip e recuperarem a saúde. Não podemos decepcioná-los”.

Essa história é contada por todos os discípulos de Fernando Figueira e denota o quanto o professor se preocupava com tudo o que estava por trás da doença. A lição de moral era tão distinta que ainda falava para os residentes e médicos que eles eram abençoados, amados, bem alimentados e vestidos, além de muitos possuírem condução própria. “Ora, se seus pacientes, que não têm nada disso, chegam ao Imip às 7h, por que vocês não conseguem?”.

No mesmo livro, a pediatra Geisy Lima, chefe da Unidade Neonatal e Unidade Canguru do Imip, também relembra um episódio em que a pontualidade do professor se sobressaiu. Ela conta que, em 1997, organizou um treinamento para médicos e enfermeiros sobre o modelo de assistência mãe canguru. Às 8h, horário em que o encontro estava previsto para começar, só havia chegado três dos 18 participantes. “O professor abriu a porta e perguntou por que eu não havia começado a dar aula. Justifiquei que estava esperando os alunos que estavam chegando do interior. Ele me deu ordem para começar porque o meu tempo deveria ser valorizado. Pediu para, no intervalo, levar os alunos à sua sala”, diz. Naquela ocasião, ele distribuiu um texto que abordava o desrespeito das pessoas que chegavam atrasadas aos compromissos. Foi mais uma lição de que o profissional deve seguir preceitos além da medicina.

05 de fevereiro de 2019

No terceiro e último dia da série, a ideia do professor Fernando Figueira de transformar agentes de saúde em parceiros das famílias mais pobres.

No bairro de Campina do Barreto, na Zona Norte do Recife, a Unidade de Saúde da Família Chão de Estrelas, requalificada há pouco mais de um ano, representa um dos serviços que remetem ao programa de agentes comunitários de saúde – uma das muitas crias do professor Fernando Figueira por qual ele era apaixonado. “Ele teve um papel essencial nessa iniciativa, que deu os primeiros passos no Imip (Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira). Nas favelas dos Coelhos (área central do Recife), o professor identificava líderes comunitários e treinava com um sistema de retaguarda formado por médicos”, relata o pediatra João Guilherme Alves, 64 anos, diretor de Ensino da instituição e um dos discípulos do professor. O depoimento do médico faz alusão aos primeiros passos do Programa Saúde da Família (PSF), implantado no Brasil pelo Ministério da Saúde, em 1994, e conhecido atualmente como Estratégia de Saúde da Família.

“A unidade de Chão de Estrelas é muito antiga; é do tempo das primeiras experiências do Imip com agentes comunitários e com a atenção primária à saúde. O serviço funciona antes da instalação do PSF, e o Imip ainda dá suporte técnico a essas unidades, com a oferta de treinamento e capacitação das equipes”, conta o secretário de Saúde do Recife, Jailson Correia, 47 anos, um representante das mais caçulas gerações que acompanharam o professor na casa dos 70 anos de idade, enquanto ele ainda estava na ativa no Imip. Pediatra, sanitarista, professor e pesquisador, Jailson Correia certifica que os passos profissionais que tem dado é, “em grande parte, por causa dele (de Figueira)”. Saudoso, ele recorda do dia em que o mestre o chamou na sala da presidência do Imip. Ficou apreensivo. Era o ano de 1995, quando estava na residência. “Ele teceu comentários críticos e elogiosos a um relatório que escrevi sobre o rodízio na comunidade de Santa Terezinha. Depois continuamos a conversa sobre o programa de agentes comunitários de saúde”, lembra Jailson Correia, em visita, na última semana, à unidade de Chão de Estrelas, que – assim como tantas outras – reproduz preceitos de Figueira. De tão próximos da população, os agentes atuam na prevenção, visitam residências, mapeiam problemas e possibilitam o acesso dos moradores aos serviços de saúde.

Foi justamente esse modelo, iniciado no Imip, que se perpetua. Em 1983, o instituto criou o Projeto de Ações Básicas de Saúde para a População de Baixa Renda, com ações concentradas na vacinação, incentivo à amamentação, pré-natal, controle de infecções, desenvolvimento infantil e prevenção de problemas como o câncer de colo do útero. Médicos, dentistas, assistentes sociais, psicólogos, enfermeiros, auxiliares de enfermagem e agentes comunitários de saúde (202 profissionais ao todo) foram treinados pelo Imip para atuar nas comunidades. A importância do trabalho foi corroborada em 1999, quando o instituto foi escolhido pelo Ministério da Saúde para elaborar o material usado pelos agentes comunitários do País.

Atual secretário de Saúde de Pernambuco, o médico André Longo reforça a imagem do Imip como marca da medicina e acrescenta que o exemplo de Figueira deve se manter vivo. “Falar do professor é fazer alusão ao compromisso com a saúde pública. O olhar que ele tinha para a infância foi marcante. Ele dizia que, enquanto tivesse uma criança sofrendo, ele se sentia torturado”, frisa André Longo, cuja declaração traz à memória um dos pensamentos célebres de Figueira: “Uma criança doente é um desafio. Para devolver-lhe a saúde, é preciso saber utilizar a ciência pelos caminhos mais lúcidos que só o amor pode inspirar”. Assim, neste centenário, brota o desejo de que, na luta contra as desigualdades sociais, a medicina diariamente se inspire (também) nos ensinamentos holísticos do mestre.

Lições do mestre perpetuadas por quase mil residentes

O ensino médico do Imip colocou Pernambuco, desde meados da década de 1960, entre os melhores Estados nas áreas de assistência e educação em saúde infantil. Criado em 1966, o programa de residência em pediatria contabiliza quase mil ex-residentes espalhados pelo Brasil. “Vários saíram do Imip e fundaram novos programas. Evidentemente que hoje os tempos são outros, mas o cerne da residência, com o respeito pela criança, permanece com a cara do professor”, disse o pediatra Eduardo Jorge da Fonseca Lima, 54 anos, presente à missa em memória de Fernando Figueira, celebrada ontem pelo bispo auxiliar da arquidiocese de Olinda e Recife, dom Limacêdo Antonio da Silva. Coordenador-geral das residências da instituição e presidente da Sociedade de Pediatria de Pernambuco, Eduardo Jorge destacou também que o programa continua com os alicerces fundamentais do mestre e se mantém como referência nacional no ensino.

Também presente à celebração, o médico infectologista Luís Cláudio Arraes de Alencar (conhecido como Lula Arraes), 60 anos, lembrou com saudades o professor que o acolheu no início do governo militar, em 1964. Lula é filho do governador de Pernambuco naquela época, Miguel Arraes (1916-2005), deposto pelo Exército brasileiro. “Fui paciente, assim como meus irmãos, do pediatra. Recebemos a visita dele quando todos evitavam a nossa família, inclusive os amigos. Além disso, fui aluno do professor. Ele sempre estava à disposição”, contou Lula Arraes, que recordou momentos em que teve chance de conversar com Figueira. “Sempre recebia grandes lições.” Em 1978, durante curso preparatório para o vestibular, Lula se tornou amigo do também médico Antonio Carlos Figueira, filho do professor.

A missa de ontem ainda foi marcada por uma corrente do bem. O Voluntariado do Imip, criado pelo fundador da instituição, conferiu as homenagens alusivas ao centenário. A voluntária Marta Ferreira, 69 anos, carinhosamente conhecida como Mamusca, tem quase duas décadas de trabalho dedicado à instituição e só guarda boas lembranças de Figueira. “Ele era uma pessoa muito boa, pensava nos mais humildes e só queria ajudar o próximo. Para ele, todos eram iguais.” Ela ajuda a cuidar das crianças e das gestantes. “Tenho amor pelo que faço. É um trabalho que me faz tão bem que parece que ganho rios de dinheiro”, acrescenta Mamusca, que enche o coração de alegria por multiplicar uma das marcas do professor: a solidariedade.

Histórico

Joaquim Lira
Deputado


Informações Complementares

Status
Situação do Trâmite: ENVIADO_PARA_COMUNICACAO
Localização: SECRETARIA GERAL DA MESA DIRETORA (SEGMD)

Tramitação
1ª Publicação: 07/02/2019 D.P.L.: 11
1ª Inserção na O.D.:




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