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Parecer 6146/2025

Texto Completo

PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 1791/2024

 

AUTORIA: DEPUTADO ABIMAEL SANTOS

 

 

PROPOSIÇÃO QUE ISENTA A COBRANÇA DE ESTACIONAMENTO EM INSTITUIÇÕES DE ENSINO. MATÉRIA INSERTA NA COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO PARA LEGISLAR SOBRE DIREITO CIVIL (ART. 22, INCISO I, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL). PRINCÍPIO DA LIVRE INICIATIVA. INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL. PRECEDENTES DESTA CCLJ E PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PELA REJEIÇÃO.

 

1. RELATÓRIO

 

Vem a esta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, para análise e emissão de parecer, o Projeto de Lei Ordinária nº 1791/2024, de autoria do Deputado Abimael Santos, que altera a Lei nº 16.559, de 15 de janeiro de 2019, que institui o Código Estadual de Defesa do Consumidor, de autoria do Deputado Rodrigo Novaes, a fim de coibir cobranças de estacionamentos pelas instituições de ensino aos alunos e colaboradores. 

 

Em sua justificativa, o Exmo. Deputado alega que:

 

“[...] A mensalidade paga pelos alunos já inclui todos os custos associados ao funcionamento da instituição de ensino, incluindo a manutenção de infraestruturas como estacionamentos. Portanto, a cobrança adicional pelo uso do estacionamento pode ser considerada ilegal, especialmente em casos onde o estacionamento é de propriedade da instituição de ensino, mesmo que seja gerido por terceiros.

 

O Art. 5º do Código Estadual de Defesa do Consumidor, Lei Nº 16.559, de 15 de janeiro de 2019, estabelece que o consumidor tem o direito a um mercado equilibrado e sustentável, bem como à proteção especial pelo Estado. A cobrança de taxas de estacionamento por instituições de ensino pode ser vista como uma violação desses direitos, uma vez que se aproveita da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo.

 

Além disso, o Código também reconhece o direito do consumidor à informação e à educação. A cobrança de taxas adicionais, como a taxa de estacionamento, não é geralmente comunicada de forma clara e transparente para os alunos e seus responsáveis no momento da matrícula, o que pode ser considerado uma violação desse direito à informação. [...]”

 

O Projeto de Lei em referência tramita nesta Assembleia Legislativa pelo regime ordinário (art. 253, inciso III, Regimento Interno).

 

É o relatório.

2. PARECER DO RELATOR

 

A proposição vem arrimada no art. 19, caput, da Constituição Estadual e no art. 223, inciso I, do Regimento Interno desta Assembleia Legislativa.

 

Entretanto, apesar de louvável iniciativa, o Projeto de Lei nº 1791/2024 apresenta vícios de inconstitucionalidade que impedem sua aprovação no âmbito desta Comissão.

 

Inicialmente, cumpre esclarecer que a proposta, a pretexto de reduzir o ônus suportado por alunos e colaboradores em estacionamentos das instituições de ensino, impõe uma forma de gratuidade para o referido serviço.

 

Nesse contexto, verifica-se que a matéria está abarcada pela competência privativa da União para legislar sobre direito civil, a teor do art. 22, inciso I, da Constituição Federal, in verbis:

 

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:

I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho;

 

Com efeito, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal revela-se refratária à possibilidade de a legislação estadual limitar a cobrança pelo uso de estacionamentos, sob o risco de usurpação da competência privativa da União. Nesse sentido, colacionam-se os seguintes precedentes:

 

EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI DISTRITAL QUE REGULOU PREÇO COBRADO POR ESTACIONAMENTO. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL E MATERIAL. 1. O Supremo Tribunal Federal firmou entendimento no sentido de que a regulação de preço de estacionamento é matéria de direito civil, inserindo-se na competência privativa da União para legislar (CF/88, art. 22, I). Inconstitucionalidade formal. Precedentes: ADI 4.862, rel. Min. Gilmar Mendes; AgR-RE 730.856, rel. Min Marco Aurélio; ADI 1.623, rel. Min. Joaquim Barbosa. 2. Ressalva de entendimento pessoal do relator, no sentido de que a regulação de preço na hipótese configura violação ao princípio da livre iniciativa (CF/88, art. 170). Inconstitucionalidade material. 3. Ação julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade da norma. (ADI 4008, Rel. Min. Roberto Barroso; DJe 291, Public 18-12-2017)

 

EMENTA: Ação Direta de Inconstitucionalidade. 2. Lei 16.785, de 11 de janeiro de 2011, do Estado do Paraná. 3. Cobrança proporcional ao tempo efetivamente utilizado por serviços de estacionamento privado. Inconstitucionalidade configurada. 4. Ação direta julgada procedente. (ADI 4862, Rel. Min. Gilmar Mendes; DJe 023, Public 07-02-2017)

 

EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGO 2º, CAPUT E §§ 1º E 2º, DA LEI Nº 4.711/92 DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO. ESTACIONAMENTO DE VEÍCULOS EM ÁREAS PARTICULARES. LEI ESTADUAL QUE LIMITA O VALOR DAS QUANTIAS COBRADAS PELO SEU USO. DIREITO CIVIL. INVASÃO DE COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO. 1. Hipótese de inconstitucionalidade formal por invasão de competência privativa da União para legislar sobre direito civil (CF, artigo 22, I). 2. Enquanto a União regula o direito de propriedade e estabelece as regras substantivas de intervenção no domínio econômico, os outros níveis de governo apenas exercem o policiamento administrativo do uso da propriedade e da atividade econômica dos particulares, tendo em vista, sempre, as normas substantivas editadas pela União. Ação julgada procedente. (ADI 1918, Rel. Min. Maurício Correa; DJ 01.08.2001).

 

EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL E CIVIL. AÇÃO DIRETA DA INCONSTITUCIONALIDADE DA EXPRESSÃO "OU PARTICULARES" CONSTANTE DO ART. 1º DA LEI Nº 2.702, DE 04/04/2001, DO DISTRITO FEDERAL, DESTE TEOR: "FICA PROIBIDA A COBRANÇA, SOB QUALQUER PRETEXTO, PELA UTILIZAÇÃO DE ESTACIONAMENTO DE VEÍCULOS EM ÁREAS PERTENCENTES A INSTITUIÇÕES DE ENSINO FUNDAMENTAL, MÉDIO E SUPERIOR, PÚBLICAS OU PARTICULARES". ALEGAÇÃO DE QUE SUA INCLUSÃO, NO TEXTO, IMPLICA VIOLAÇÃO ÀS NORMAS DOS ARTIGOS 22, I, 5º, XXII, XXIV e LIV, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. QUESTÃO PRELIMINAR SUSCITADA PELA CÂMARA LEGISLATIVA DO DISTRITO FEDERAL: a) DE DESCABIMENTO DA ADI, POR TER CARÁTER MUNICIPAL A LEI EM QUESTÃO; b) DE ILEGITIMIDADE PASSIVA "AD CAUSAM". 1. Não procede a preliminar de descabimento da ADI sob a alegação de ter o ato normativo impugnado natureza de direito municipal. Argüição idêntica já foi repelida por esta Corte, na ADIMC nº 1.472-2, e na qual se impugnava o art. 1º da Lei Distrital nº 1.094, de 31 de maio de 1996. 2. Não colhe, igualmente, a alegação de ilegitimidade passiva "ad causam", pois a Câmara Distrital, como órgão, de que emanou o ato normativo impugnado, deve prestar informações no processo da A.D.I., nos termos dos artigos 6° e 10 da Lei n° 9.868, de 10.11.1999. 3. Não compete ao Distrito Federal, mas, sim, à União legislar sobre Direito Civil, como, por exemplo, cobrança de preço de estacionamento de veículos em áreas pertencentes a instituições particulares de ensino fundamental, médio e superior, matéria que envolve, também, direito decorrente de propriedade. 4. Ação Direta julgada procedente, com a declaração de inconstitucionalidade da expressão "ou particulares", contida no art. 1° da Lei n° 2.702, de 04.4.2001, do Distrito Federal. (ADI 2448, rel. Min. Sydney Sanches, Tribunal Pleno, DJ 13.06.2003)

 

Dessa forma, conclui-se que o Projeto de Lei Ordinária nº 1791/2024, neste particular, invade a esfera de competência legislativa da União (art. 22, inciso I, da Constituição Federal), incorrendo em vício de inconstitucionalidade formal orgânica, consoante a lição de Carvalho:

 

A inconstitucionalidade orgânica decorre da inobservância da regra de competência para a edição do ato, ou do vício de competência do órgão de que promana o ato normativo, como, por exemplo, a edição, pelo Estado-Membro, de lei em matéria penal, que viola a regra de competência privativa da União (art. 22, I, da Constituição Federal) [...] (CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional: Teoria do Estado e da Constituição. 20 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2013, v.1. p. 404)

 

Em reforço, cumpre destacar que outros projetos semelhantes já foram intentados nesta Casa Legislativa envolvendo a gratuidade do serviço de estacionamento, sendo que por duas oportunidades esta CCLJ entendeu pela inconstitucionalidade da medida, senão vejamos:

 

- Projeto de Lei nº 12/2015 (ementa: Dispõe sobre a cobrança da taxa de estacionamento cobrada por shoppings centers e hipermercados) foi retirado de tramitação pelo próprio autor.

 

- Projeto de Lei nº 54/2015 (ementa: Determina a obrigatoriedade de gratuidade de acesso em estacionamentos, garagens e assemelhados no caso que especifica e dá outras providências.) recebeu parecer da CCLJ pela rejeição, por vício de inconstitucionalidade.

 

- Projeto de Lei nº 1975/2014 (ementa: Determina a gratuidade em estacionamentos, garagens e assemelhados no caso que especifica e dá outras providências.) foi arquivado.

 

- Projeto de Lei nº 1049/2009 (ementa: Dispõe sobre a cobrança da taxa de estacionamento cobrada por Shoppings Centers e Hipermercados) recebeu parecer da CCLJ pela rejeição, por vício de inconstitucionalidade.

 

Por outro lado, além da inconstitucionalidade formal mencionada, cumpre salientar que a proposição também encontra óbice de natureza material, ferindo direitos fundamentais e princípios basilares postos pelo constituinte.

 

Nesse particular, tendo em vista o exercício de atividade econômica quando da prestação do serviço de estacionamento, nota-se a ofensa ao art. 170, II, IV e parágrafo único, da CF, que determina a regência da ordem econômica com base nos princípios da propriedade privada, da livre concorrência e da livre iniciativa. Desse modo, não cabe ao Estado determinar o modo de atuação do particular na gestão de sua atividade empresarial.

 

Diante do exposto, opina-se pela rejeição, por vício de inconstitucionalidade, do Projeto de Lei Ordinária nº 1791/2024, de autoria do Deputado Abimael Santos.

 

É o Parecer do Relator.

3. CONCLUSÃO DA COMISSÃO

 

Tendo em vista as considerações expendidas pelo relator, o parecer desta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, por seus membros infra-assinados, é pela rejeição, por vício de inconstitucionalidade, do Projeto de Lei Ordinária nº 1791/2024, de autoria do Deputado Abimael Santos.

Histórico

[20/05/2025 12:10:57] ENVIADA P/ SGMD
[20/05/2025 17:36:40] ENVIADO PARA COMUNICA��O
[20/05/2025 17:36:56] ENVIADO P/ PUBLICAÇÃO
[21/05/2025 09:27:29] PUBLICADO
[21/05/2025 09:29:34] ARQUIVADO





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Esta proposição não possui emendas, pareceres ou outros documentos relacionados.