
Parecer 5365/2025
Texto Completo
PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 131/2023
AUTORIA: DEPUTADO ROMERO SALES FILHO
PROPOSIÇÃO QUE DISPÕE SOBRE A POSSIBILIDADE DE REMIÇÃO DA PENALIDADE/PONTUAÇÃO NA CNH AOS DOADORES DE SANGUE NO ESTADO DE PERNAMBUCO. MATÉRIA INSERTA NA COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO PARA LEGISLAR SOBRE TRÂNSITO (ART. 22, INCISO XI, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL). PRECEDENTES DO STF. INVIABILIDADE DA INICIATIVA PARLAMENTAR EM FACE DA CRIAÇÃO DE ATRIBUIÇÃO PARA ENTIDADE VINCULADA AO PODER EXECUTIVO (ART. 19, § 1º, INCISO VI, DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL). PELA REJEIÇÃO.
1. RELATÓRIO
Vem a esta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, para análise e emissão de parecer, o Projeto de Lei Ordinária nº 131/2023, de autoria do Deputado Romero Sales Filho, que dispõe sobre a possibilidade de remição da penalidade/pontuação na CNH aos doadores de sangue, não isentando ao pagamento da multa e desde que não tenham cometido infração grave e/ou gravíssima no Estado de Pernambuco.
O Projeto de Lei em referência tramita nesta Assembleia Legislativa pelo regime ordinário (art. 253, inciso III, Regimento Interno).
É o relatório.
2. PARECER DO RELATOR
A proposição vem arrimada no art. 19, caput, da Constituição Estadual e no art. 223, inciso I, do Regimento Interno desta Assembleia Legislativa.
Entretanto, apesar de louvável iniciativa voltada ao incentivo para doação de sangue, o Projeto de Lei nº 131/2023 apresenta vícios de inconstitucionalidade que impedem sua aprovação no âmbito desta Comissão.
Com efeito, o teor da proposta imiscui-se em assunto relativo ao sistema de pontuação como forma de penalização dos condutores que infringem a legislação de trânsito. Nesse contexto, trata-se de matéria inserta na competência privativa da União para legislar sobre trânsito, de acordo com o art. 22, inciso XI, da Constituição Federal, in verbis:
Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:
[...]
XI - trânsito e transporte
Vale destacar que o STF, ao analisar assunto correlato, já firmou o entendimento pela inconstitucionalidade de leis estaduais que objetivam dispor sobre o cancelamento de infração ou forma de pagamento de multas por usurpar a competência legislativa da União:
EMENTA Ação direta de inconstitucionalidade. Lei nº 3.279/99 do Estado do Rio de Janeiro, que dispõe sobre o cancelamento de multas de trânsito anotadas em rodovias estaduais em certo período relativas a determinada espécie de veículo. Inconstitucionalidade formal. Violação da competência privativa da União para legislar sobre trânsito e transporte. 1. Inconstitucionalidade formal da Lei nº 3.279/99 do Estado do Rio de Janeiro, a qual dispõe sobre o cancelamento de multas de trânsito. 2. Competência privativa da União para legislar sobre trânsito e transporte, consoante disposto no art. 22, inciso IX, da Constituição. Precedentes: ADI nº 3.196/ES; ADI nº 3.444/RS; ADI nº 3.186/DF; ADI nº 2.432/RN; ADI nº 2.814/SC. 3. O cancelamento de toda e qualquer infração é anistia, não podendo ser confundido com o poder administrativo de anular penalidades irregularmente impostas, o qual pressupõe exame individualizado. Somente a própria União pode anistiar ou perdoar as multas aplicadas pelos órgãos responsáveis, restando patente a invasão da competência privativa da União no caso em questão. 4. Ação direita de inconstitucionalidade julgada procedente. (ADI 2137/RJ, Rel. Min. Dias Toffoli, Tribunal Pleno, julgamento em 11.04.2013, public 09.05.2013).
EMENTA: Ação direta de inconstitucionalidade. 2. Lei Distrital no 2.929/02, que dispõe sobre o prazo para vigência da aplicação de multas a veículos no Distrito Federal em virtude da reclassificação de vias. 3. Usurpação de competência legislativa privativa da União. Precedentes. 4. Procedência da ação. (ADI 3186/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgamento em 16.11.2005, DJ 12.05.2006).
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 12.064, DE 29.03.04, DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. TRÂNSITO. INVASÃO DA COMPETÊNCIA LEGISLATIVA DA UNIÃO PREVISTA NO ART. 22, XI, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. É pacífico nesta Corte o entendimento de que o trânsito é matéria cuja competência legislativa é atribuída, privativamente, à União, conforme reza o art. 22, XI, da Constituição Federal. Precedentes: ADI 2.064, rel. Min. Maurício Corrêa e ADI 2.137-MC, rel. Min. Sepúlveda Pertence. 2. A instituição da forma parcelada de pagamento da multa aplicada pela prática de infração de trânsito integra o conjunto de temas enfeixados pelo art. 22, XI, da Constituição Federal. Precedentes: ADI 2.432 (medida cautelar, rel. Min. Nelson Jobim, DJ de 21.09.01; mérito, rel. Min. Eros Grau, julg. em 09.03.05, Informativo STF 379) e ADI 3.196-MC, rel. Min. Gilmar Mendes, DJ de 22.04.05. 3. Ação direta cujo pedido se julga procedente. (ADI 3444/RS, Rel. Min. Ellen Gracie, Tribunal Pleno, julgamento em 16.11.2005, DJ 03.02.2006).
Dessa forma, conclui-se que o Projeto de Lei Ordinária nº 131/2023 invade a esfera de competência privativa da União (art. 22, inciso XI, da Constituição Federal), incorrendo em vício de inconstitucionalidade formal orgânica, consoante a lição de Carvalho:
A inconstitucionalidade orgânica decorre da inobservância da regra de competência para a edição do ato, ou do vício de competência do órgão de que promana o ato normativo, como, por exemplo, a edição, pelo Estado-Membro, de lei em matéria penal, que viola a regra de competência privativa da União (art. 22, I, da Constituição Federal) [...] (CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional: Teoria do Estado e da Constituição. 20 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2013, v.1. p. 404).
Além disso, a medida também inova ao criar atribuições para o Detran/PE, entidade com natureza autárquica vinculada ao Poder Executivo (Decreto-lei nº 23, de 24 de maio de 1969 c/c Decreto 30.363, de 17 de abril de 2007).
Assim, resta caracterizado o vício de inconstitucionalidade formal subjetiva tendo em vista a violação à iniciativa reservada ao Governador do Estado, nos termos do art. 19, § 1º, inciso VI, da Constituição Estadual:
Art. 19. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Assembleia Legislativa, ao Governador, ao Tribunal de Justiça, ao Tribunal de Contas, ao Procurador-Geral da Justiça, ao Defensor Público-Geral do Estado e aos cidadãos, nos casos e formas previstos nesta Constituição. (Redação alterada pelo art. 1° da Emenda Constitucional n° 41, de 21 de setembro de 2017.)
§ 1º É da competência privativa do Governador a iniciativa das leis que disponham sobre:
[...]
VI - criação, estruturação e atribuições das Secretarias de Estado, de órgãos e de entidades da administração pública.
Ressalta-se que o entendimento pela rejeição ora exposto já foi adotado por esta Comissão ao apreciar proposição semelhante nas legislaturas passadas. Nesse sentido, o Parecer nº 5064/2017, relativo ao Projeto de Lei Ordinária nº 668/2016.
Diante do exposto, opina-se pela rejeição, por vício de inconstitucionalidade, do Projeto de Lei Ordinária nº 131/2023, de autoria do Deputado Romero Sales Filho.
É o Parecer do Relator.
3. CONCLUSÃO DA COMISSÃO
Tendo em vista as considerações expendidas pelo relator, o parecer desta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, por seus membros infra-assinados, é pela rejeição, por vício de inconstitucionalidade, do Projeto de Lei Ordinária nº 131/2023, de autoria do Deputado Romero Sales Filho
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