
Parecer 3501/2024
Texto Completo
PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 365/2023 E EMENDA ADITIVA Nº 1/2023, AMBOS, DE AUTORIA DA DEPUTADA SIMONE SANTANA.
PROPOSIÇÃO PRINCIPAL QUE INSTITUI A POLÍTICA ESTADUAL DE PROTEÇÃO E DEFESA CIVIL. EMENDA ADITIVA Nº 1/2023. SISTEMA ESTADUAL DE PROTEÇÃO E DEFESA CIVIL. COMPETÊNCIA LEGISLATIVA CONCORRENTE. ART. 24, VI, VII, IX E XII. COMPETÊNCIA COMUM. ART. 23, III, VI E VII. CONSONÂNCIA COM OS ARTS. 1º, II E III, 3º, I E III DA CF/88. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. PROTEÇÃO E DEFESA DA VIDA. PRECENTES DESTA CCLJ. PELA APROVAÇÃO DO SUBSTITUTIVO PROPOSTO E CONSEQUENTE PREJUDICIALIDADE DA PROPOSIÇÃO PRINCIPAL E DA EMENDA ADITIVA Nº 1/2024 PROPOSTA.
1. RELATÓRIO
É submetido a esta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, para análise e emissão de parecer, o Projeto de Lei Ordinária (PLO) nº 365/2023, de autoria da Deputada Simone Santana, que institui a Política Estadual de Proteção e Defesa Civil no Estado de Pernambuco.
A autora da proposição, na justificativa, destaca a relevância social, nos seguintes termos:
Entende-se que a criação dessa política estadual é de extrema importância para garantir a segurança e o bem-estar da população pernambucana.
Infelizmente, ano após ano presenciamos a destruição que as chuvas provocam em algumas regiões de nosso Estado, vitimando milhares de pessoas. Apenas para citar um triste exemplo, não podemos esquecer a tragédia de maio de 2022, que ceifou a vida de 132 cidadãos.
Pernambuco é um dos estados brasileiros com maior risco de desastres naturais, como enchentes, deslizamentos de terra e seca. Portanto, ao criar uma política estadual de defesa civil e prevenção de desastres, podemos diminuir os riscos e aumentar a capacidade de resposta em situações de emergência, salvando vidas e preservando o patrimônio público e privado.
Assim, é nosso dever como legisladores garantir que a população tenha acesso a uma vida digna e segura, sendo a criação da política pública ora apresentada um passo importante nessa direção.
Acessoriamente, a autora do projeto, apresentou, nos termos do art. 235 do R.I., a Emenda Aditiva nº 1/2023, cuja finalidade é dispor sobre a criação do Fundo Estadual de Defesa Civil e do Sistema Estadual de Proteção e Defesa Civil.
As proposições em referência tramitam nesta Assembleia Legislativa pelo regime ordinário (art. 253, III, Regimento Interno).
É o relatório.
2. PARECER DO RELATOR
Cabe à Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, nos termos do art. 99, I, do Regimento Interno desta Casa, manifestar-se sobre a constitucionalidade, legalidade e juridicidade das matérias submetidas à sua apreciação.
As proposições em análise encontram guarida no art. 19, caput, da Constituição Estadual e no art. 223, I, do Regimento Interno desta Assembleia Legislativa, uma vez que o deputado estadual detém competência para apresentar projetos de lei ordinária.
De partida, registre-se que esta Comissão já firmou entendimento pela viabilidade constitucional de projetos de lei de iniciativa parlamentar que instituam políticas públicas ou estabeleçam diretrizes para estas, desde que não promovam aumento de despesa pública e não interfiram nas atribuições dos órgãos vinculados ao Poder Executivo.
No entanto, é de se observar que, com alteração da Constituição Estadual, por meio da Emenda Constitucional nº 57, de 2023, das premissas adotadas por esta CCLJ, apenas a interferência nas atribuições dos órgãos vinculados ao Poder Executivo remanesce como óbice constitucional intransponível. A proposição principal em análise não desborda da premissa remanescente. Todavia, a Emenda nº 01/2023 apresenta vários dispositivos que interferem nas atribuições de órgãos vinculados ao Poder Executivo.
Dito isso, é de bom tom, em breve definição, destacar que as políticas públicas são tidas como “programas de ação governamental visando a coordenar os meios à disposição do Estado e as atividades privadas para a realização de objetivos socialmente relevantes e politicamente determinados. ” (BUCCI, Maria Paula Dallari. Direito Administrativo e Políticas Públicas. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 241).
Desta feita, é possível inferir que o PLO 365/2023 trata essencialmente de política pública, a qual deve guardar observância com as demais regras de repartição constitucional de competências e hipóteses de iniciativa reservada ou privativa.
No âmbito das competências administrativas e legislativas dos entes federativos, observa-se que as proposições em análise encontram supedâneo nos seguintes dispositivos da Constituição Federal:
Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:
[...]
III - proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos;
[...]
VI - proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas;
VII - preservar as florestas, a fauna e a flora;
[...]
X – combater as causas da pobreza e os fatores de marginalização, promovendo a integração social dos setores desfavorecidos;
[...]
Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
[...]
VI - florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição;
VII - proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico;
VIII - responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;
IX – educação, cultura, ensino, desporte, ciência, tecnologia, pesquisa, desenvolvimento e inovação;
XII - previdência social, proteção e defesa da saúde;
No que tange à constitucionalidade material, frise-se que há total consonância da proposição principal com os preceitos constitucionais, destacadamente, com a cidadania e a dignidade da pessoa humana, fundamentos da República previstos nos incisos II e III do art. 1º da Constituição Federal, e com os objetivos de construir uma sociedade livre, justa e solidária e de reduzir as desigualdades sociais, previstos nos incisos I e III do art. 3º da CF/88.
Reitere-se que a proposição não versa sobre a criação, reestruturação ou extinção de órgãos ou entidades do Poder Executivo, de modo que pudesse caracterizar afronta à iniciativa legislativa do Governador do Estado.
O Projeto de Lei em análise tão somente relaciona diretrizes, objetivos, princípios e finalidades a serem adotadas por parte do Poder Público em relação às políticas públicas de proteção e defesa civil em Pernambuco.
A implantação, a coordenação e o acompanhamento da política pública, quando for implementada, ainda ficarão a cargo do órgão competente do Poder Executivo, como não poderia deixar de ser, a quem incumbirá, também, promover concretamente as ações previstas nas proposições, mediante conveniência e oportunidades administrativas.
Por ser a Função Legislativa atribuída, de forma típica, ao Poder Legislativo, as hipóteses de iniciativa privativa do Governador são taxativas e, enquanto tais, são interpretadas restritivamente. Sobre o tema:
“A iniciativa reservada, por constituir matéria de direito estrito, não se presume e nem comporta interpretação ampliativa, na medida em que, por implicar limitação ao poder de instauração do processo legislativo, deve necessariamente derivar de norma constitucional explícita e inequívoca” (STF, Pleno, ADI-MC nº 724/RS, Relator Ministro Celso de Mello, DJ de 27.4.2001 (original sem grifos).
“(...) uma interpretação ampliativa da reserva de iniciativa do Poder Executivo, no âmbito estadual, pode resultar no esvaziamento da atividade legislativa autônoma no âmbito das unidades federativas.” (STF - ADI: 2417 SP, Relator: Min. Maurício Corrêa, Data de Julgamento: 03/09/2003, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJ 05-12-2003)
Desse modo, não estando a matéria no rol das afetas à iniciativa privativa do Governador do Estado, franqueia-se ao parlamentar a legitimidade subjetiva para deflagrar o correspondente processo legislativo. Infere-se, portanto, que não há vício de iniciativa na proposição principal ora analisada.
Todavia, conforme já mencionado, a mesma lisura não reside na proposição acessória apresentada, pois a Emenda nº 01/2023 em quase todos os seus dispositivos afronta a iniciativa privativa do Governador, tendo em vista que interferem nas atribuições dos órgãos vinculados ao Poder Executivo. Ressalte-se que os dispositivos meramente autorizativos também padecem de vício de inconstitucionalidade.
Dessa forma, a fim de concatenar a proposição principal e os dispositivos da Emenda nº 01/2023 que não estão maculados por vício de inconstitucionalidade, faz-se necessária a apresentação do seguinte Substitutivo:
SUBSTITUTIVO Nº /2024
AO PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 365/2023
Altera integralmente a redação do Projeto de Lei nº 365/2023, de autoria da Deputada Simone Santana.
Artigo Único. O Projeto de Lei Ordinária nº 365/2023 passa a ter a seguinte redação:
“Institui a Política Estadual de Proteção e Defesa Civil no Estado de Pernambuco.
Art. 1° Fica instituída a Política Estadual de Proteção e Defesa Civil no Estado de Pernambuco.
Art. 2° Para os fins desta Lei, considera-se:
I - proteção e defesa civil: conjunto de ações de prevenção, mitigação, preparação, resposta e recuperação destinadas a evitar desastres e minimizar seus impactos sobre a população e a promover o retorno à normalidade social, econômica ou ambiental;
II - desastre: resultado de eventos adversos, naturais, tecnológicos ou de origem antrópica, sobre um cenário vulnerável exposto a ameaça, causando danos humanos, materiais ou ambientais e consequentes prejuízos econômicos;
III - situação de emergência: situação anormal provocada por desastres, causando danos e prejuízos que impliquem comprometimento parcial da capacidade de resposta do poder público;
IV - estado de calamidade pública: situação anormal, provocada por desastres, ou por qualquer outro fenômeno natural e eventos endêmicos ou pandêmicos, ou pela ação humana, que cause danos e prejuízos que impliquem comprometimento substancial da capacidade de resposta do poder público;
V - ações de prevenção: medidas e atividades prioritárias, anteriores à ocorrência do desastre, destinadas a evitar ou reduzir a instalação de novos riscos de desastre;
VI - ações de mitigação: medidas e atividades adotadas imediatamente para reduzir ou evitar as consequências do risco de desastre;
VII - ações de preparação: medidas e atividades anteriores à ocorrência do desastre, destinadas a otimizar as ações de resposta e minimizar os danos e as perdas decorrentes do desastre;
VIII - ações de resposta: medidas emergenciais realizadas durante ou após o desastre, que visam ao socorro e à assistência da população atingida e ao restabelecimento dos serviços essenciais compreendendo:
a) ações de socorro: têm por finalidade preservar a vida das pessoas cuja integridade física esteja ameaçada em decorrência do desastre, incluindo a busca e o salvamento, os primeiros socorros e o atendimento pré-hospitalar;
b) ações de assistência às vítimas: têm por finalidade manter a integridade física e restaurar as condições de vida das pessoas afetadas pelo desastre até o retorno da normalidade;
c) ações de restabelecimento de serviços essenciais: têm por finalidade assegurar, até o retorno da normalidade, o funcionamento dos serviços que garantam os direitos sociais básicos à população atingida em consequência do desastre; e
d) ações de reestabelecimento de autossustento: têm por finalidade assegurar, até o retorno da normalidade, a capacidade de autossustento dos atingidos pelo desastre, de modo que possam, com dignidade, exercer o autossustento de si próprio e daqueles que dependem do assistido;
IX - ações de recuperação: medidas desenvolvidas após o desastre para retornar à situação de normalidade, abrangem a reconstrução de infraestrutura danificada ou destruída e a reabilitação do meio ambiente e da economia, visando ao bem-estar social; e
X - agentes de proteção e defesa civil:
a) os agentes políticos do Estado de Pernambuco e dos Municípios responsáveis pela direção superior dos órgãos do Sistema Estadual de Proteção e Defesa Civil;
b) os agentes públicos responsáveis pela coordenação e direção de órgãos ou entidades públicas prestadores dos serviços de proteção e defesa civil;
c) os agentes públicos detentores de cargo, emprego ou função pública, civis ou militares, com atribuições relativas à prestação ou execução dos serviços de proteção e defesa civil; e
d) os agentes voluntários, vinculados a entidades privadas ou prestadores de serviços voluntários que exercem, em caráter suplementar, serviços relacionados à proteção e defesa civil.
Art.3º A Política Estadual de Proteção e Defesa Civil tem as seguintes diretrizes:
I - atuação articulada entre a União, o Estado e os Municípios pernambucanos para redução de riscos de desastres e apoio às comunidades atingidas;
II - abordagem sistêmica das ações de prevenção, mitigação, preparação, resposta e recuperação;
III - prioridade às ações preventivas relacionadas à minimização de desastres;
IV - adoção da bacia hidrográfica como unidade de análise das ações de prevenção de desastres relacionados a corpos d’água;
V - planejamento com base em pesquisas e estudos sobre áreas de risco e incidência de desastres, no território estadual;
VI - participação da sociedade civil; e
VII- adoção de medidas emergências de geração de renda para o autossustento do atingido pelos desastres.
Art. 4º São objetivos da Política Estadual de Proteção e Defesa Civil:
I - desenvolver a cultura estadual de prevenção de desastres, destinada ao desenvolvimento da consciência acerca dos riscos de desastre;
II - estimular:
a) os comportamentos de prevenção capazes de evitar ou minimizar a ocorrência de desastres;
b) a reorganização do setor produtivo e a reestruturação econômica das áreas atingidas por desastres;
c) o desenvolvimento de cidades resilientes e os processos sustentáveis de urbanização;
III - estabelecer medidas preventivas de segurança contra desastres em escolas e hospitais situados em áreas de risco;
IV - oferecer capacitação de recursos humanos para as ações de proteção e defesa civil;
V - fornecer dados e informações para o Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil – SINPDEC; e
VI - planejar mecanismos de geração emergencial de renda para autossustento do atingido por desastres, nos termos desta Lei;
Art. 5º O Plano Estadual de Proteção e Defesa Civil, instrumento da Política Estadual de Proteção e Defesa Civil, abrange o Estado, os Municípios pernambucanos e a sociedade civil, inclusive as entidades públicas e privadas com atuação significativa na área de proteção e defesa civil.
Art. 6º São objetivos do Plano Estadual de Proteção e Defesa Civil:
I - planejar e promover a defesa permanente contra desastres;
II - atuar na iminência e em situações de desastres;
III - prevenir ou minimizar danos, socorrer e assistir comunidades atingidas e recuperar áreas afetadas por desastres;
IV - auxiliar os Municípios pernambucanos na identificação e avaliação das ameaças, suscetibilidades e vulnerabilidades a desastres;
V - monitorar os eventos meteorológicos, hidrológicos, geológicos e outros potencialmente causadores de desastres;
VI - produzir alertas antecipados sobre a possibilidade de ocorrência de desastres naturais;
VII - estimular os Municípios pernambucanos a designar ou instituir órgãos locais para funcionar como Coordenadorias Municipais de Proteção e Defesa Civil - COMPDEC, e Núcleos de Proteção e Defesa Civil (NUPDEC), nas comunidades locais; e
VIII - planejar ações de geração de renda para autossustento do atingido pelos desastres.
Art. 7º Os programas habitacionais do Estado de Pernambuco devem priorizar a realocação de comunidades de áreas afetadas por desastres e de moradores de áreas de risco, na forma da Lei nº 14.717, de 4 de julho de 2012.
Art. 8º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.”
Diante do exposto, opina-se, nos termos do art. 214, II, do Regimento Interno, pela aprovação do Substitutivo apresentado acima e pela prejudicialidade do Projeto de Lei nº 365/2023 e da Emenda Aditiva nº 1/2023, ambos, de autoria da Deputada Simone Santana.
É o Parecer do Relator.
3. CONCLUSÃO DA COMISSÃO
Ante o exposto, tendo em vista as considerações expendidas pelo relator, a Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, por seus membros infra-assinados, opina, nos termos do art. 214, II, do Regimento Interno, pela aprovação do Substitutivo apresentado deste Colegiado e pela prejudicialidade do Projeto de Lei nº 365/2023 e da Emenda Aditiva nº 1/2023, ambos, de autoria da Deputada Simone Santana.
Histórico