
Parecer 3205/2024
Texto Completo
PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 1429/2023
AUTORIA: DEPUTADO DIOGO MORAES
ALTERA A LEI Nº 12.525, DE 30 DE DEZEMBRO DE 2003, QUE ESTABELECE NORMAS ESPECIAIS RELATIVAS AOS PROCEDIMENTOS DE LICITAÇÃO E CONTRATAÇÃO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ESTADUAL, E ALTERA A LEI N° 11.424, DE 7 DE JANEIRO DE 1997, E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS, A FIM DE EXIGIR DECLARAÇÃO DE ATENDIMENTO À LGPD. NOVA LEI DE LICITAÇÕES. OBRIGAÇÃO COMPATÍVEL. ARTS. 18 E 25, § 1º, C/C ART. 24, INCISO XII, DA CONSTITUIÇÃO DE 1988. PELA APROVAÇÃO DO SUBSTITUTIVO PROPOSTO E CONSEQUENTE PREJUDICIALIDADE DA PROPOSIÇÃO PRINCIPAL.
1. RELATÓRIO
Vem a esta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, para análise e emissão de parecer, o Projeto de Lei Ordinária nº 1429/2023, de autoria do Deputado Diogo Moraes, que visa alterar a Lei nº 12.525, de 30 de dezembro de 2003, que estabelece normas especiais relativas aos procedimentos de licitação e contratação na Administração Pública Estadual e altera a Lei n° 11.424, de 7 de janeiro de 1997; a fim de exigir declaração de atendimento à LGPD.
Em síntese, O Projeto em análise prevê que os editais de licitações promovidas pela administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes do Estado deverão prever cláusula exigindo dos licitantes a apresentação de declaração de que atendem a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD).
O Projeto de Lei em referência tramita nesta Assembleia Legislativa pelo regime ordinário (art. 253, inciso III, do Regimento Interno).
É o relatório.
2. PARECER DO RELATOR
A proposição vem arrimada no art. 19, caput, da Constituição Estadual e no art. 223, I, do Regimento Interno desta Assembleia Legislativa.
A matéria versada no Projeto de Lei em análise trata da crescente evolução da proteção dos dados pessoais, proteção esta que precisa contar com a marcante participação do Poder Público.
Trata-se, em verdade, de medida que reforça o princípio da legalidade – já que a LGDP tem força vinculante autônoma –, sem criar novas atribuições para a Secretarias Estaduais ou modificar a estrutura de órgãos do Poder Executivo.
Nesse sentido, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal – STF afirma que a reserva de iniciativa do Poder Executivo não abrange o tema de licitações e contratos administrativos:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. DIREITO ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. LEI Nº 11.871/02, DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, QUE INSTITUI, NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA REGIONAL, PREFERÊNCIA ABSTRATA PELA AQUISIÇÃO DE SOFTWARES LIVRES OU SEM RESTRIÇÕES PROPRIETÁRIAS. EXERCÍCIO REGULAR DE COMPETÊNCIA LEGISLATIVA PELO ESTADO-MEMBRO. INEXISTÊNCIA DE USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA LEGIFERANTE RESERVADA À UNIÃO PARA PRODUZIR NORMAS GERAIS EM TEMA DE LICITAÇÃO. LEGISLAÇÃO COMPATÍVEL COM OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA SEPARAÇÃO DOS PODERES, DA IMPESSOALIDADE, DA EFICIÊNCIA E DA ECONOMICIDADE. PEDIDO JULGADO IMPROCEDENTE. 1. A competência legislativa do Estado-membro para dispor sobre licitações e contratos administrativos respalda a fixação por lei de preferência para a aquisição de softwares livres pela Administração Pública regional, sem que se configure usurpação da competência legislativa da União para fixar normas gerais sobre o tema (CRFB, art. 22, XXVII).
2. A matéria atinente às licitações e aos contratos administrativos não foi expressamente incluída no rol submetido à iniciativa legislativa exclusiva do Chefe do Poder Executivo (CRFB, art. 61, §1º, II), sendo, portanto, plenamente suscetível de regramento por lei oriunda de projeto iniciado por qualquer dos membros do Poder Legislativo.
[...]
(ADI 3059, Relator(a): Min. AYRES BRITTO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 09/04/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-085 DIVULG 07-05-2015 PUBLIC 08-05-2015)
Nesse ponto, ressalte-se que a Lei nº 8.666/93 (Lei Geral de Licitações e Contratos Administrativos) - a qual, inegavelmente, cria inúmeras obrigações para a administração pública e, inclusive, exige a publicação de resumo dos contratos firmados pelo Poder Público posteriormente a sua assinatura (art. 61, parágrafo único) - originou-se de proposição legislativa do então Deputado Luís Roberto Ponte, sem que isso influísse em sua regularidade formal em face da Constituição Federal.
(ADI 2444, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 06/11/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-021 DIVULG 30-01-2015 PUBLIC 02-02-2015)
Por outro lado, no que tange à possibilidade de exercício da atribuição legislativa em âmbito estadual, verifica-se que, também a priori, o Projeto de Lei ora analisado encontra amparo no regime de repartição de competências adotado pela Constituição Federal. Com efeito, o art. 22, inciso XXVII, da Carta Magna estabelece:
Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:
[...]
XXVII - normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1°, III; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
Embora o referido dispositivo constitucional disponha sobre a competência privativa da União, trata-se de campo reservado tão somente à edição de “normas gerais”. Ou seja, reconhece-se, de forma implícita, a competência suplementar dos demais entes federativos para legislar sobre licitações e contratos administrativos em questões específicas, com fundamento no art. 24, §§ 3° e 4º, da Constituição Federal.
A propósito do assunto, destaca-se a lição de Rafael Carvalho Rezende Oliveira:
“Na forma do art. 22, XXVII, da CRFB, compete à União legislar sobre normas gerais de licitações e contratos. É importante frisar que o texto constitucional estabeleceu a competência privativa apenas em relação às normas gerais, razão pela qual é possível concluir que todos os Entes Federados podem legislar sobre normas específicas.
Desta forma, em relação à competência legislativa, é possível estabelecer a seguinte regra:
a) União: competência privativa para elaborar normas gerais (nacionais), aplicáveis a todos os Entes Federados.
b) União, Estados, DF e Municípios: competência autônoma para elaboração de normas específicas (federais, estaduais, distritais e municipais), com o objetivo de atenderem as peculiaridades socioeconômicas, respeitadas as normas gerais.
A dificuldade, no entanto, está justamente na definição das denominadas “normas gerais”, pois se trata de conceito jurídico indeterminado que acarreta dificuldades interpretativas. Isso não afasta, todavia, a importância da definição das normas gerais, em virtude das consequências em relação à competência legislativa.” (OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Licitações e contratos administrativos. 4º ed., Rio de Janeiro: Forense).
Dessa forma, conclui-se que a atividade legislativa estadual em matéria de licitações e contratos é possível, desde que não afronte as normas gerais editadas pela União e tenha por finalidade a complementação ou suplementação de lacunas, sem corresponder à generalidade.
Destacamos, por fim, que esta comissão tem admitido a possibilidade de iniciativa parlamentar em matérias relativas ao regulamento de Licitações e Contratos. Não é à toa que a Lei nº 12.525/2003 possui modificações dessa natureza, tais como a relativamente recente Lei nº 17.162/2021.
Faz-se mister, contudo, a apresentação de Substitutivo para prever que a exigência de adequação à LGPD se restrinja aos contratos cujos objetos envolvam o tratamento de dados pessoais, sob pena de infringência ao Princípio da Livre Concorrência, nos seguintes termos:
SUBSTITUTIVO Nº /2024 AO PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 1429/2023
Altera, integralmente, a redação do Projeto de Lei Ordinária nº 1429/2023.
Artigo único. O Projeto de Lei Ordinária nº 1429/2023 passa a ter a seguinte redação:
“Altera a Lei nº 12.525, de 30 de dezembro de 2003, que estabelece normas especiais relativas aos procedimentos de licitação e contratação na Administração Pública Estadual, altera a Lei n° 11.424, de 7 de janeiro de 1997, e dá outras providências; a fim de exigir declaração de atendimento à LGPD nos casos que indica.
Art. 1º A Lei nº 12.525, de 30 de dezembro de 2003, passa a vigorar com o seguinte acréscimo:
‘Art. 4º-A. Os editais de licitações promovidas pela administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes do Estado, cujos objetos envolvam tratamento de dados pessoais, deverão prever cláusula exigindo dos licitantes a apresentação de declaração de que atendem a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD). (AC)
Parágrafo único. O declarante responderá pela veracidade das informações prestadas, na forma da lei.’ (AC)
Art. 2º A alteração de que trata o art. 1º não afeta os contratos em vigor, nem os contratos oriundos de processos licitatórios iniciados antes da vigência desta Lei.
Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.”
Feitas as considerações pertinentes, ausentes vícios de inconstitucionalidade, ilegalidade ou antijuridicidade, o parecer do relator é pela aprovação do Substitutivo apresentado e consequente prejudicialidade da Proposição Principal.
É o Parecer do Relator.
3. CONCLUSÃO DA COMISSÃO
Diante do exposto, tendo em vista as considerações expendidas pelo relator, a CCLJ, por seus membros infra-assinados, opina pela aprovação do Substitutivo apresentado e consequente prejudicialidade da Proposição Principal.
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