
Parecer 3202/2024
Texto Completo
PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 1281/2023
AUTORIA: DEPUTADO LUCIANO DUQUE
PROPOSIÇÃO QUE ALTERA A LEI Nº 11.781, DE 6 DE JUNHO DE 2000, QUE REGULA O PROCESSO ADMINISTRATIVO NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ESTADUAL, A FIM DE ADEQUAR O PRAZO DECADENCIAL. VIABILIDADE DA INICIATIVA PARLAMENTAR. MATÉRIA INSERTA NA AUTONOMIA ADMINISTRATIVA DOS ESTADOS-MEMBROS (ARTS. 18 E 25, § 1º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL). VIABILIDADE DA INICIATIVA PARLAMENTAR. INCOMPATIBILIDADE DO PRAZO DECENAL VIGENTE COM O PRINCÍPIO DA ISONOMIA. NECESSIDADE DE ADEQUAÇÃO NOS TERMOS DA JURISPRUDÊNCIA DO STF. PELA APROVAÇÃO DO SUBSTITUTIVO COM A CONSEQUENTE PREJUDICIALIDADE DA PROPOSIÇÃO PRINCIPAL.
1. RELATÓRIO
Vem a esta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, para análise e emissão de parecer, o Projeto de Lei Ordinária nº 1281/2023, de autoria do Deputado Luciano Duque, que altera a Lei nº 11.781, de 6 de junho de 2000, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Estadual, originada de projeto de lei de autoria do Deputado Pedro Eurico, a fim de adequar o prazo decadencial.
Em síntese, a proposição modifica o art. 54 da Lei nº 11.781/2000 com a finalidade de reduzir o prazo de anulação de atos administrativos pela Administração de 10 anos para 5 anos.
O projeto de lei em referência tramita nesta Assembleia Legislativa pelo regime ordinário (art. 253, III, do Regimento Interno).
É o relatório.
2. PARECER DO RELATOR
Cabe à Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, nos termos do art. 99, I, do Regimento Interno desta Casa, manifestar-se sobre a constitucionalidade, legalidade e juridicidade das matérias submetidas à sua apreciação.
No que tange à constitucionalidade formal, verifica-se que a matéria vertida no projeto de lei tem fundamento na autonomia administrativa inerente aos Estados-membros, nos termos dos arts. 18 e 25 da Constituição Federal:
Art. 18. A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.
Art. 25. Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem, observados os princípios desta Constituição.
Logo, fica reconhecida a possibilidade de exercício da competência legislativa para dispor sobre a matéria na esfera estadual.
Além disso, revela-se viável a iniciativa parlamentar, uma vez que a pretensão legislativa não se enquadra nas regras que exigem a deflagração do processo legislativo de forma privativa pelo Governador do Estado (art. 19, § 1º, da Constituição do Estado de Pernambuco) ou por outros órgãos/autoridades específicos (arts. 20; 45; 68, parágrafo único; 73-A, todos da Constituição Estadual).
Quanto à constitucionalidade material, o prazo decadencial de 10 anos, atualmente previsto no art. 54 da Lei nº 11.781/2000, não se mostra compatível com o princípio da igualdade, tendo em vista que o prazo assegurado para os administrados impugnarem atos da Administração é de 5 anos (Decreto Federal nº 20.910, de 6 de janeiro de 1932). Nesse sentido, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:
Ementa: Direito constitucional e administrativo. Ação direta de inconstitucionalidade. Prazo decadencial para o exercício do poder de autotutela pela Administração Pública estadual. 1. Ação direta contra o art. 10, I, da Lei nº 10.177/1998, do Estado de São Paulo, que estabelece o prazo decadencial de 10 (dez) anos para anulação de atos administrativos reputados inválidos pela Administração Pública estadual. 2. Lei estadual que disciplina o prazo decadencial para o exercício da autotutela pela administração pública local não ofende a competência da União Federal para legislar sobre direito civil (art. 22, I, CF/1988) ou para editar normas gerais sobre licitações e contratos (art. 22, XXVII, CF/1988). Trata-se, na verdade, de matéria inserida na competência constitucional dos estados-membros para legislar sobre direito administrativo (art. 25, § 1º, CF/1988). 3. O dispositivo impugnado não viola os princípios constitucionais da segurança jurídica e da razoabilidade. O prazo decenal não é arbitrário e não caracteriza, por si só, instabilidade das relações jurídicas ou afronta às legítimas expectativas dos particulares na imutabilidade de situações jurídicas consolidadas com o decurso do tempo. Esse é, inclusive, o prazo prescricional geral do Código Civil (art. 205) e de desapropriação indireta (Tema 1.019, STJ), dentre outros inúmeros exemplos no ordenamento jurídico brasileiro. 4. Sem embargo, o prazo quinquenal consolidou-se como marco temporal geral nas relações entre o Poder Público e particulares (v., e.g., o art. 1º do Decreto nº 20.910/1932 e o art. 173 do Código Tributário Nacional), e esta Corte somente admite exceções ao princípio da isonomia quando houver fundamento razoável baseado na necessidade de remediar um desequilíbrio entre as partes. 5. Os demais estados da Federação aplicam, indistintamente, o prazo quinquenal para anulação de atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis aos administrados, seja por previsão em lei própria ou por aplicação analógica do art. 54 da Lei nº 9.784/1999. Não há fundamento constitucional que justifique a situação excepcional do Estado de São Paulo, impondo-se o tratamento igualitário nas relações Estado-cidadão. 6. A presente ADI foi ajuizada somente em 2018 e o art. 10, I, da Lei nº 10.177/1998 vem sendo aplicado há décadas pela Administração Pública paulista, tendo servido de base à anulação de diversos atos administrativos. A declaração de nulidade, com efeitos ex tunc, do dispositivo ora impugnado acarretaria enorme insegurança jurídica no Estado de São Paulo, com potencial de (i) refazimento de milhares de atos administrativos cuja anulação já se consolidou no tempo, (ii) ampla e indesejável litigiosidade nas instâncias ordinárias e (iii) provável impacto econômico em momento de grave crise financeira que assola o país, tendo em vista que os atos anulados haviam produzido efeitos favoráveis aos administrados 7. Desse modo, impõe-se a modulação dos efeitos desta decisão (art. 27 da Lei nº 9.868/1999), para que (i) sejam mantidas as anulações já realizadas pela Administração até a publicação da ata do julgamento de mérito desta ação direta (23.04.2021), desde que tenham observado o prazo de 10 (dez) anos; (ii) seja aplicado o prazo decadencial de 10 (dez) anos aos casos em que, em 23.04.2021, já havia transcorrido mais da metade do tempo fixado na lei declarada inconstitucional (aplicação, por analogia, do art. 2.028 do Código Civil); e (iii) para os demais atos administrativos já praticados, seja o prazo decadencial de 5 (cinco) anos contado a partir da publicação da ata do julgamento de mérito desta ação (23.04.2021). 8. Procedência do pedido, com a declaração de inconstitucionalidade do art. 10, I, da Lei nº 10.177/1998, do Estado de São Paulo, modulando-se os efeitos na forma acima descrita. (ADI 6019, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 12-05-2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-134 DIVULG 05-07-2021 PUBLIC 06-07-2021)
Nesse contexto, a proposição em apreço modifica a Lei nº 11.781/2000 de modo a adequar o tratamento normativo do art. 54 ao entendimento firmado pela Corte Suprema, sem que se cogite de óbices que possam comprometer sua constitucionalidade.
No entanto, com o intuito de preservar a segurança jurídica, faz-se necessária a inclusão de regras de direito intertemporal no texto da proposta, inspiradas no próprio precedente do STF e no art. 2.028 do Código Civil.
Assim, com o intuito de realizar os ajustes necessários e adequações pertinentes à técnica legislativa, sugere-se a aprovação do seguinte Substitutivo:
SUBSTITUTIVO Nº ______/2024
AO PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 1281/2023
Altera integralmente a redação do Projeto de Lei Ordinária nº 1281/2023.
Artigo único. O Projeto de Lei Ordinária nº 1281/2023 passa a ter a seguinte redação:
“Altera a Lei nº 11.781, de 6 de junho de 2000, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Estadual, originada de projeto de lei de autoria do Deputado Pedro Eurico, a fim de dispor sobre o prazo decadencial para anulação de atos administrativos pela Administração, e dá outras providências..
Art. 1º O art. 54 da Lei nº 11.781, de 6 de junho de 2000, passa a vigorar com a seguinte alteração:
‘Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em 5 (cinco) anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé. (NR)
....................................................................................................’
Art. 2º Em relação aos atos administrativos praticados antes da vigência desta Lei, o prazo de decadência será de:
I - 10 (dez) anos, contados da data da prática do ato, se já havia transcorrido mais da metade do prazo decenal previsto na redação anterior do art. 54 da Lei nº 11.781, de 2000;
II - 5 (cinco) anos, contados a partir da publicação desta Lei, se transcorrido menos da metade do prazo decenal previsto na redação anterior do art. 54 da Lei nº 11.781, de 2000.
Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.”
Diante do exposto, opina-se pela aprovação do Substitutivo ao Projeto de Lei Ordinária nº 1281/2023, de autoria do Deputado Luciano Duque, com a consequente prejudicialidade da proposição principal.
É o Parecer do Relator.
3. CONCLUSÃO DA COMISSÃO
Tendo em vista as considerações expendidas pelo relator, o parecer desta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, por seus membros infra-assinados, é pela aprovação do Substitutivo ao Projeto de Lei Ordinária nº 1281/2023, de autoria do Deputado Luciano Duque, com a consequente prejudicialidade da proposição principal.
Histórico