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PARECER

PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº. 668/2016
AUTOR: DEPUTADO VINÍCIUS LABANCA

EMENTA: PROPOSIÇÃO DE LEI ORDINÁRIA DETERMINANDO A BAIXA DE PONTUAÇÃO NA CNH
DOS DOADORES DE SANGUE NO ESTADO DE PERNAMBUCO. INVASÃO DA COMPETÊNCIA
PRIVATIVA DA UNIÃO PARA LEGISLAR SOBRE TRÂNSITO (ART. 22, XI, DA CF/88).
DESRESPEITO AO ART. 199, § 4º DA CF/88(VEDAÇÃO À COMERCIALIZAÇÃO DE SUBSTÂNCIAS
HUMANAS DESTINADAS A TRANSPLANTE). PRECENDENTES DA CCLJ E DO STF. PARECER PELA
REJEIÇÃO, POR VÍCIO DE INCONSTITUCIONALIDADE.

1. RELATÓRIO
É submetido à apreciação desta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça,
para análise e emissão de parecer, Projeto de Lei Ordinária (PLO) nº 668/2016,
de autoria do Deputado Vinícius Labanca, que visa assegurar à baixa da
pontuação aos doadores de sangue de todo o Estado de Pernambuco, que atingirem
vinte pontos ou mais na Carteira Nacional de Habilitação – CNH.
O projeto ora em análise, em apertada síntese, visa criar um mecanismo legal
para bonificar (com a baixa dos pontos na CNH) os condutores que infringirem a
legislação de trânsito, os quais sejam, ou venham a se tornar, doadores de
sangue. Ademais o PLO estabelece procedimentos a serem adotados pelas unidades
de saúde.
O projeto de lei em referência tramita sob o regime ordinário.


2. PARECER DO RELATOR
A proposição vem arrimada no Art. 19, caput, da Constituição Estadual e no Art.
194, I, do Regimento Interno desta Assembleia Legislativa.
O projeto de lei em análise, apesar de louvável a intenção, conforme consta na
justificativa do PLO, de incentivar a doação de sangue, aumentar os estoques
deste e cuidar da saúde da população, padece de vício de inconstitucionalidade
na medida em que viola a proibição de comercialização de órgãos, tecidos e
substâncias humanas, nos termos do art. 199, § 4º da Constituição Federal, in
verbis:
Art. 199. A assistência à saúde é livre à iniciativa privada.
(...)
§ 4º A lei disporá sobre as condições e os requisitos que facilitem a remoção
de órgãos, tecidos e substâncias humanas para fins de transplante, pesquisa e
tratamento, bem como a coleta, processamento e transfusão de sangue e seus
derivados, sendo vedado todo tipo de comercialização. (grifos acrescidos)

Assento, por oportuno, que o entendimento pela inconstitucionalidade acima
apontado encontra abrigo em precedente desta CCLJ, pois esta rechaçou o PLO nº
148/2015, o qual visava isentar os doadores de sangue e de medula óssea do
pagamento de taxa de inscrição em concurso público e vestibular, sob o
argumento acima destacado, conforme se depreende do teor do Parecer nº
760/2015. Assim, percebe-se que, segundo o entendimento desta Comissão,
oferecer vantagens pessoais para incentivar a doação de sangue não é compatível
com o Texto Maior.
Além da mácula acima apontada, o PLO em apreço também incide em
inconstitucionalidade por invadir a competência privativa da União para
legislar sobre trânsito e transporte, conforme dicção do art. 22, XI, ad
litteram:
Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:
(...)
XI – trânsito e transporte

Vale destacar que o STF já firmou o entendimento pela inconstitucionalidade de
leis estaduais que objetivam dispor sobre o cancelamento de infração ou forma
de pagamento de multas por invadir a competência legislativa privativa da
União. Nesse sentido, seguem ementas de julgamento:

EMENTA Ação direta de inconstitucionalidade. Lei nº 3.279/99 do Estado do Rio
de Janeiro, que dispõe sobre o cancelamento de multas de trânsito anotadas em
rodovias estaduais em certo período relativas a determinada espécie de veículo.
Inconstitucionalidade formal. Violação da competência privativa da União para
legislar sobre trânsito e transporte. 1. Inconstitucionalidade formal da Lei nº
3.279/99 do Estado do Rio de Janeiro, a qual dispõe sobre o cancelamento de
multas de trânsito. 2. Competência privativa da União para legislar sobre
trânsito e transporte, consoante disposto no art. 22, inciso IX, da
Constituição. Precedentes: ADI nº 3.196/ES; ADI nº 3.444/RS; ADI nº 3.186/DF;
ADI nº 2.432/RN; ADI nº 2.814/SC. 3. O cancelamento de toda e qualquer infração
é anistia, não podendo ser confundido com o poder administrativo de anular
penalidades irregularmente impostas, o qual pressupõe exame individualizado.
Somente a própria União pode anistiar ou perdoar as multas aplicadas pelos
órgãos responsáveis, restando patente a invasão da competência privativa da
União no caso em questão. 4. Ação direita de inconstitucionalidade julgada
procedente. (ADI 2137/RJ, Rel. Min. Dias Toffoli, Tribunal Pleno, julgamento em
11.04.2013, public 09.05.2013)

EMENTA: Ação direta de inconstitucionalidade. 2. Lei Distrital no 2.929/02, que
dispõe sobre o prazo para vigência da aplicação de multas a veículos no
Distrito Federal em virtude da reclassificação de vias. 3. Usurpação de
competência legislativa privativa da União. Precedentes. 4. Procedência da
ação. (ADI 3186/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgamento em
16.11.2005, DJ 12.05.2006).

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 12.064, DE 29.03.04, DO ESTADO DO RIO
GRANDE DO SUL. TRÂNSITO. INVASÃO DA COMPETÊNCIA LEGISLATIVA DA UNIÃO PREVISTA
NO ART. 22, XI, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. É pacífico nesta Corte o
entendimento de que o trânsito é matéria cuja competência legislativa é
atribuída, privativamente, à União, conforme reza o art. 22, XI, da
Constituição Federal. Precedentes: ADI 2.064, rel. Min. Maurício Corrêa e ADI
2.137-MC, rel. Min. Sepúlveda Pertence. 2. A instituição da forma parcelada de
pagamento da multa aplicada pela prática de infração de trânsito integra o
conjunto de temas enfeixados pelo art. 22, XI, da Constituição Federal.
Precedentes: ADI 2.432 (medida cautelar, rel. Min. Nelson Jobim, DJ de
21.09.01; mérito, rel. Min. Eros Grau, julg. em 09.03.05, Informativo STF 379)
e ADI 3.196-MC, rel. Min. Gilmar Mendes, DJ de 22.04.05. 3. Ação direta cujo
pedido se julga procedente. (ADI 3444/RS, Rel. Min. Ellen Gracie, Tribunal
Pleno, julgamento em 16.11.2005, DJ 03.02.2006).

Nesta senda, destacamos que a Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997, que
institui o Código de Trânsito Brasileiro – CTB coloca o sistema de pontuação
como uma forma de penalização dos condutores infratores, inclusive prevendo a
suspensão do direito de dirigir quando o infrator atingir, no período de 12
(doze) meses, a contagem de 20 (vinte) pontos. Vale transcrever alguns
dispositivos do CTB que tratam do tema em tela:
Art. 259. A cada infração cometida são computados os seguintes números de
pontos:
I - gravíssima - sete pontos;
II - grave - cinco pontos;
III - média - quatro pontos;
IV - leve - três pontos.
(...)
Art. 261. A penalidade de suspensão do direito de dirigir será aplicada, nos
casos previstos neste Código, pelo prazo mínimo de um mês até o máximo de um
ano e, no caso de reincidência no período de doze meses, pelo prazo mínimo de
seis meses até o máximo de dois anos, segundo critérios estabelecidos pelo
CONTRAN.
§ 1o Além dos casos previstos em outros artigos deste Código e excetuados
aqueles especificados no art. 263, a suspensão do direito de dirigir será
aplicada quando o infrator atingir, no período de 12 (doze) meses, a contagem
de 20 (vinte) pontos, conforme pontuação indicada no art. 259.
§ 2º Quando ocorrer a suspensão do direito de dirigir, a Carteira Nacional de
Habilitação será devolvida a seu titular imediatamente após cumprida a
penalidade e o curso de reciclagem.
§ 3o A imposição da penalidade de suspensão do direito de dirigir elimina os
20 (vinte) pontos computados para fins de contagem subsequente
§ 4o (VETADO).
§ 5o O condutor que exerce atividade remunerada em veículo, habilitado na
categoria C, D ou E, será convocado pelo órgão executivo de trânsito estadual a
participar de curso preventivo de reciclagem sempre que, no período de um ano,
atingir quatorze pontos, conforme regulamentação do Contran.
§ 6o Concluído o curso de reciclagem previsto no § 5o, o condutor terá
eliminados os pontos que lhe tiverem sido atribuídos, para fins de contagem
subsequente.
§ 7o Após o término do curso de reciclagem, na forma do § 5o, o condutor não
poderá ser novamente convocado antes de transcorrido o período de um ano.
§ 8o A pessoa jurídica concessionária ou permissionária de serviço público tem
o direito de ser informada dos pontos atribuídos, na forma do art. 259, aos
motoristas que integrem seu quadro funcional, exercendo atividade remunerada ao
volante, na forma que dispuser o Contran.

Assim, ao intentar assegurar à baixa da pontuação da CNH dos doadores de sangue
o projeto em análise invade o sistema de penalidades previsto no CTB e,
conforme a jurisprudência do STF, a competência privativa da União para
legislar sobre trânsito e transporte.
Ademais, alguns dispositivos da proposição em tela estabelecem atribuições para
as unidades de saúde (órgãos vinculados ao Poder Executivo) contrariando,
assim, o principio constitucional da reserva da administração, segundo o qual é
vedado a ingerência normativa do Poder Legislativo em matérias sujeitas à
exclusiva competência administrativa do Poder Executivo, tendo em vista a
necessária separação dos poderes prevista no art. 2º da Constituição Federal e
a atribuição conferida ao Chefe do Poder Executivo para exercer a direção
superior da administração pública, nos termos do art. 84, II da Carta Magna.
Em relação a ingerência do Poder Legislativo sobre a reserva da administração,
o Supremo Tribunal Federal tem se pronunciado da seguinte forma:

E M E N T A: RECURSO EXTRAORDINÁRIO - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO
RECURSO DE AGRAVO - DECISÃO QUE SE AJUSTA À JURISPRUDÊNCIA PREVALECENTE NO
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - CONSEQÜENTE INVIABILIDADE DO RECURSO QUE A IMPUGNA -
SUBSISTÊNCIA DOS FUNDAMENTOS QUE DÃO SUPORTE À DECISÃO RECORRIDA - RECURSO DE
AGRAVO IMPROVIDO. - O princípio constitucional da reserva de administração
impede a ingerência normativa do Poder Legislativo em matérias sujeitas à
exclusiva competência administrativa do Poder Executivo. É que, em tais
matérias, o Legislativo não se qualifica como instância de revisão dos atos
administrativos emanados do Poder Executivo. Precedentes. Não cabe, desse modo,
ao Poder Legislativo, sob pena de grave desrespeito ao postulado da separação
de poderes, desconstituir, por lei, atos de caráter administrativo que tenham
sido editados pelo Poder Executivo, no estrito desempenho de suas privativas
atribuições institucionais. Essa prática legislativa, quando efetivada,
subverte a função primária da lei, transgride o princípio da divisão funcional
do poder, representa comportamento heterodoxo da instituição parlamentar e
importa em atuação “ultra vires” do Poder Legislativo, que não pode, em sua
atuação político-jurídica, exorbitar dos limites que definem o exercício de
suas prerrogativas institucionais. (STF, 2ª T., RE nº 427574 ED/MG, rel. Min.
CELSO DE MELO, pub. no DJe de 10/02/2012).

A Constituição Estadual destaca que se encontra reservada à iniciativa
privativa do Governador do Estado os projetos de lei que criem atribuições para
órgãos do Poder Executivo, conforme prescreve o art. 19, § 1º, VI, da
Constituição Estadual, in verbis:

Art. 19. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer
membro ou Comissão da Assembleia Legislativa, ao Governador, ao Tribunal de
Justiça, ao Tribunal de Contas, ao Procurador-Geral da Justiça e aos cidadãos,
nos casos e formas previstos nesta Constituição.
§ 1º É da competência privativa do Governador a iniciativa das leis que
disponham sobre:
................................................................................
......................
VI - criação, estruturação e atribuições das Secretarias de Estado, de órgãos e
de entidades da administração pública.

Assim, percebe-se que o projeto de lei em comento, ao invadir a competência
privativa da União para legislar sobre trânsito e transporte, ao contrariar a
vedação constitucional de comercialização de substâncias humanas voltadas para
transplante e ao desrespeitar a iniciativa privativa do Governador para dispor
sobre as atribuições dos órgãos do Poder Executivo, está maculado por vício de
inconstitucionalidade.

Diante do exposto, opino pela rejeição, por vício de inconstitucionalidade, do
Projeto de Lei Ordinária nº 668/2016, de autoria do
Deputado Vinícius Labanca.
É o Parecer do Relator.

3. CONCLUSÃO DA COMISSÃO
Tendo em vista as considerações expendidas pelo relator, o parecer desta
Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, por seus membros
infra-assinados, é pela rejeição do Projeto de Lei Ordinária nº 668/2016, de
autoria do Deputado Vinícius Labanca, por vício de inconstitucionalidade.

Presidente em exercício: Tony Gel.
Relator: Romário Dias.
Favoráveis os (5) deputados: Aluísio Lessa, Ricardo Costa, Rodrigo Novaes, Romário Dias, Teresa Leitão.
Favoráveis com restrições os (0) deputados: .
Contrários os (0) deputados: .

Presidente
Waldemar Borges
Efetivos
Edilson Silva
Isaltino Nascimento
Ricardo Costa
Rodrigo Novaes
Romário Dias
Sílvio Costa Filho
Teresa Leitão
Tony Gel
Suplentes
Aluísio Lessa
Antônio Moraes
Joel da Harpa
José Humberto Cavalcanti
Julio Cavalcanti
Lucas Ramos
Simone Santana
Socorro Pimentel
Terezinha Nunes
Autor: Romário Dias

Histórico

Sala da Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, em 24 de outubro de 2017.

Romário Dias
Deputado


Informações Complementares

Status
Situação do Trâmite: Enviada p/Publicação
Localização: Publicação

Tramitação
1ª Publicação: 25/10/2017 D.P.L.: 10
1ª Inserção na O.D.:

Sessão Plenária
Result. 1ª Disc.: Data:
Result. 2ª Disc.: Data:

Resultado Final
Publicação Redação Final: Página D.P.L.: 0
Inserção Redação Final na O.D.:
Resultado Final: Data:


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