Parecer 685/2023
Texto Completo
PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 422/2023
AUTORIA: DEPUTADO WILLIAM BRIGIDO
PROPOSIÇÃO QUE VEDA A COBRANÇA DE VALOR ADICIONAL PELO USO DE EQUIPAMENTOS SUPLEMENTARES EM LEITOS DE HOSPITAIS, CLÍNICAS, MATERNIDADES E DEMAIS UNIDADES CONGÊNERES. COMPETÊNCIA LEGISLATIVA CONCORRENTE PARA LEGISLAR SOBRE PRODUÇÃO E CONSUMO (ART. 24, V, CF/88). HIPÓTESE CONSTITUCIONALMENTE VÁLIDA DE LIMITAÇÃO À LIVRE INICIATIVA (ART. 170, V, CF/88). CONFORMIDADE COM O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR (LEI FEDERAL Nº 8.078/90). CÓDIGO ESTADUAL DE DEFESA DO CONSUMIDOR (LEI ESTADUAL Nº 16.559/2019). PELA APROVAÇÃO DO SUBSTITUTIVO, COM A CONSEQUENTE PREJUDICIALIDADE DA PROPOSIÇÃO PRINCIPAL.
1. RELATÓRIO
Submete-se à apreciação desta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, para análise e emissão de parecer, o Projeto de Lei Ordinária nº 422/2023, de autoria do Deputado William Brigido, que altera a Lei nº 16.559, de 15 de janeiro de 2019, que institui o Código Estadual de Defesa do Consumidor de Pernambuco, originada de projeto de lei de autoria do Deputado Rodrigo Novaes, a fim de vedar a cobrança de valor adicional pelo uso de equipamentos suplementares em leitos de hospitais, clínicas, maternidades e demais unidades congêneres.
O Projeto de Lei em referência tramita nesta Assembleia Legislativa pelo regime ordinário (Art. 253, III, Regimento Interno).
É o relatório.
2. PARECER DO RELATOR
Cabe à Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, nos termos do art. 99, I, do Regimento Interno desta Casa, manifestar-se sobre a constitucionalidade, legalidade e juridicidade das matérias submetidas à sua apreciação.
A proposição em análise encontra guarida no art. 19, caput, da Constituição Estadual e no art. 223, I, do Regimento Interno desta Assembleia Legislativa, não estando no rol de matérias afetas à iniciativa privativa do Governador do Estado. Infere-se, portanto, quanto à iniciativa, sua constitucionalidade formal subjetiva.
Pela ótica das competências constitucionais, a matéria versada no Projeto de Lei ora em análise insere-se na esfera de competência legislativa concorrente da União, Estados e Distrito Federal, para legislar sobre produção e consumo, nos termos do art. 24, V, da CF/88, in verbis:
Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar
concorrentemente sobre:
[...]
V - produção e consumo;
Avançando na análise, é importante avaliar a constitucionalidade material da proposta, à luz do princípio da livre iniciativa.
Primeiro, deve-se levar em conta que a Constituição Federal, ao eleger a livre iniciativa como um de seus fundamentos (art. 1º, IV), deixou assente que a República Federativa do Brasil tem orientação essencialmente capitalista. Em suma, deve ser garantido a todo indivíduo a liberdade de lançar-se ao exercício de uma atividade econômica, sem peias por parte do Estado, visando auferir lucros.
Em contraparte, o texto constitucional relativiza a opção pela economia de mercado, deixando vários segmentos sujeitos à intervenção estatal ativa. Uma das consequências de tal diretriz é a permissão direcionada ao legislador ordinário, no sentido de poder intervir diretamente em setores da economia, desde que seja para dar conformidade a outras normas também de índole constitucional.
Nesse esteio, a livre iniciativa é repetida no art. 170, da CF, que trata da Ordem Econômica e Financeira, desta feita imbricada a diversos princípios, que funcionam como um contraponto ao modelo liberal. Dentre esses princípios estão: a soberania nacional; a propriedade privada; a função social da propriedade; a livre concorrência; a defesa do consumidor; a defesa do meio ambiente; a redução das desigualdades regionais e sociais; a busca do pleno emprego etc.
Assim, é inegável que a liberdade econômica é um traço substancial do ordenamento jurídico brasileiro, sendo, por outro lado, igualmente inegável que o legislador ordinário pode promover restrições à livre iniciativa plena, desde que o faça plasmado em algum dos princípios da Ordem Econômica acima transcritos.
Em ordem a reforçar o raciocínio supra, vale transcrever o lapidar voto do Ministro Celso Peluso, proferido no julgamento da AC 1.657:
“…livre iniciativa não é sinônimo de liberdade econômica absoluta (...). O que ocorre é que o princípio da livre iniciativa, inserido no caput do art. 170 da CF, nada mais é do que uma cláusula geral cujo conteúdo é preenchido pelos incisos do mesmo artigo. Esses princípios claramente definem a liberdade de iniciativa não como uma liberdade anárquica, porém social, e que pode, consequentemente, ser limitada.” (STF, AC 1.657-MC, voto do rel. p/ o ac. min. Cezar Peluso, julgamento em 27-6-2007, Plenário, DJ de 31-8-2007.)
No caso sub examine, é preciso observar que o inciso V, do art. 170, CF/88, estabelece que a livre iniciativa é orientada pela defesa do consumidor, parte vulnerável na relação de consumo.
A vedação ora instituída, qual seja, a proibição da cobrança ao consumidor pelo uso de TV, ar-condicionado e internet nas unidades de saúde, encontra-se igualmente em conformidade com o Código de Defesa do Consumidor (Lei Federal nº 8.078, de 11 de setembro de 1990), notadamente com o disposto nos art. 39, IV e V, e no art. 51, IV, in verbis:
Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:
[...]
IV - prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor, tendo em vista sua idade, saúde, conhecimento ou condição social, para impingir-lhe seus produtos ou serviços;
V - exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva;
Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
[...]
IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade;
De forma semelhante preceitua a Carta Estadual de 1989, ao estabelecer que é dever do Estado de Pernambuco promover a defesa do consumidor, inclusive mediante legislação suplementar específica sobre produção e consumo (vide art. 143, CE-PE/89).
Por outro lado, os serviços de hotelaria considerados supérfluos devem ser excluídos do elenco previsto no PLO. Ou seja, a cobrança vedada é aquela relativa aos itens básicos de conforto, que, uma vez ofertados, não podem gerar custo extra. Assim, faz-se uma adequação técnica por meio de substitutivo, de forma consentânea com as prescrições do art. 3º, IV, da Lei Complementar Estadual nº 171/2011, que dispõe sobre a elaboração, a alteração e a consolidação das leis estaduais.
Assim sendo, tem-se o seguinte:
SUBSTITUTIVO N° /2023
AO PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 422/2023
Altera integralmente a redação do Projeto de Lei Ordinária nº 422/2023.
Artigo único. O Projeto de Lei Ordinária nº 422/2023 passa a ter a seguinte redação:
“Altera a Lei nº 16.559, de 15 de janeiro de 2019, que institui o Código Estadual de Defesa do Consumidor de Pernambuco, de autoria do Deputado Rodrigo Novaes, a fim de proibir a cobrança ao consumidor pelo uso de ar-condicionado, televisão e internet nos serviços de saúde no âmbito do Estado de Pernambuco, e dá outras providências.
Art. 1° A Lei nº 16.559, de 15 de janeiro de 2019, passa a vigorar com o seguinte acréscimo:
‘Art. 106-B. É vedado exigir do consumidor qualquer valor adicional pelo uso de equipamentos suplementares. (AC)
§1º Para os fins do caput, consideram-se equipamentos suplementares: (AC)
I - ar-condicionado; (AC)
II - televisão; e (AC)
III - internet. (AC)
§2º O descumprimento ao disposto neste artigo sujeitará o infrator à penalidade de multa prevista no art. 180, nas Faixas Pecuniárias A ou B, sem prejuízo da aplicação cumulativa de outras sanções previstas neste Código. (AC)’
Art. 2º Esta Lei entra em vigor após decorridos 90 (noventa) dias da sua publicação oficial.
Feitas as considerações pertinentes, o parecer do Relator é pela aprovação do Substitutivo proposto ao Projeto de Lei Ordinária nº 422/2023, de autoria do Deputado William Brigido, e consequente prejudicialidade da proposição principal.
3. CONCLUSÃO DA COMISSÃO
Ante o exposto, tendo em vista as considerações expendidas pelo relator, a Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, por seus membros infra-assinados, opina pela aprovação do Substitutivo proposto ao Projeto de Lei Ordinária nº 422/2023, de autoria do Deputado William Brigido, e consequente prejudicialidade da proposição principal.
Histórico