
Parecer 681/2023
Texto Completo
PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 319/2023
AUTORIA: DEPUTADO WILLIAM BRIGIDO
OBRIGA A ASSINATURA FÍSICA EM CONTRATOS DE CRÉDITO CONSIGNADO FIRMADOS POR PESSOAS IDOSAS. MATÉRIA INSERTA NA COMPETÊNCIA CONCORRENTE DA UNIÃO E ESTADOS-MEMBROS PARA LEGISLAR SOBRE “PRODUÇÃO E CONSUMO” (ART. 24, V, CF/88). DIREITO DO CONSUMIDOR. DEVER GERAL DE INFORMAÇÃO. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR (ART. 6º, III, DO CDC). COMPETÊNCIA SUPLEMENTAR COMPLEMENTAR DOS ESTADOS-MEMBROS. NECESSIDADE DE APRESENTAÇÃO DE SUBSTITUTIVO A FIM DE ADEQUAR A REDAÇÃO DO PROJETO, COMPATIBILIZANDO SEGURANÇA E BOM FUNCIONAMENTO DA ATIVIDADE. PELA APROVAÇÃO DO SUBSTITUTIVO COM A CONSEQUENTE PREJUDICIALIDADE DA PROPOSIÇÃO PRINCIPAL.
1. RELATÓRIO
Trata-se do Projeto de Lei Ordinária nº 319/2023, de autoria do Deputado William Brigido, que “dispõe sobre a obrigatoriedade da assinatura física em contratos de operação de crédito contratados por meio eletrônico ou telefônico, firmado por pessoas idosas”.
Nos termos da justificativa, a proposição é mais uma medida que visa fortalecer o direito a informações dos consumidores idosos e evitar fraudes, conforme se observa: “A presente proposição visa criar no ordenamento jurídico estadual a obrigatoriedade da assinatura física de pessoas idosas em contratos de operação de crédito firmado por meio eletrônico ou telefônico, com instituições financeiras e de crédito, tendo em vista sua posição de vulnerabilidade perante a relação de consumo.”
O projeto de lei em referência tramita sob o regime ordinário.
É o relatório.
2. PARECER DO RELATOR
A proposição vem arrimada no art. 19, caput, da Constituição Estadual e no art. 223, I, do Regimento Interno desta Assembleia Legislativa, não estando no rol de matérias afetas à iniciativa reservada ao Governador do Estado, não havendo, portanto, vício de iniciativa.
Pela ótica das competências constitucionais, a matéria versada no Projeto de Lei ora em análise se insere na esfera de competência legislativa concorrente da União, Estados e Distrito Federal, para legislar sobre produção e consumo (e Direito do Consumidor), nos termos do art. 24, V, da CF:
Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar
concorrentemente sobre: [...]
V - produção e consumo; [...]
Sobre a competência legislativa dos Estados-membros, assim leciona Pedro Lenza, in verbis:
“7.5.3.2. Competência legislativa
Como a terminologia indica, trata-se de competências, constitucionalmente definidas, para elaborar leis.
Elas foram assim definidas para os Estados-membros:
- Expressa: art. 25, caput > qual seja, como vimos, a capacidade de auto-organização dos Estados-membros, que se regerão pelas Constituições e leis que adotarem, observados os princípios da CF/88;
- Residual (remanescente ou reservada): art. 25, § 1.º > toda competência que não for vedada está reservada aos Estados-membros, ou seja, o resíduo que sobrar, o que não for de competência expressa dos outros entes e não houver vedação, caberá aos Estados materializar;
- Delegada pela União: art. 22, parágrafo único > como vimos, a União poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas das matérias de sua competência privativa prevista no art. 22 e incisos. Tal autorização dar-se-á por meio de lei complementar;
- Concorrente: art. 24 > a concorrência para legislar dar-se-á entre a União, os Estados e o Distrito Federal, cabendo à União legislar sobre normas gerais e aos Estados, sobre normas específicas;” (LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado / Pedro Lenza. 16. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Saraiva, 2012.)
Materialmente, a proposição está de acordo com o papel do Estado de promover a defesa do consumidor, que tem status de Direito Fundamental e que também faz parte do rol de Princípios da Ordem Econômica do Brasil (art. 5º, XXXII e art. 170, V, da CF).
Ademais, o art. 143 da Constituição Estadual preceitua que cabe ao Estado promover a defesa do consumidor, mediante: política governamental de acesso ao consumo e de promoção dos interesses e direitos dos consumidores, legislação suplementar específica sobre produção e consumo, dentre outras formas.
Apesar de haver presunção de boa-fé nas relações entre fornecedores e consumidores, o fato é que é pública e notória que a contratação de empréstimo consignado por telefone impossibilita que o consumidor conheça todas as implicações que a tomada de crédito gera. No mais, como a ligação da instituição financeira é ativa (e não passiva), mediante captação da clientela, o consumidor – sobretudo a pessoa idosa – que recebe a ligação pode não estar preparado para analisar todas as variáveis do contrato. Nesse sentido, o PLO contribui para o consumo consciente.
Portanto, é inegável que o conflito social existe, razão pela qual se mostra salutar a atuação legislativa.
O Código de Defesa do Consumidor (Lei Federal nº 8.078/90) assegurou a informação como direito básico do consumidor, senão vejamos:
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
[...]
III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;
Art. 31. A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores.
Sobre o dever geral de informação, posiciona-se a doutrina:
[...] o dever de informar deve ser exigido em todas as etapas da relação de consumo: (i) no oferecimento do produto ou serviço no mercado (momento este em que a informação já deverá ser cumprida em sua totalidade, a teor do princípio da integralidade), (ii) durante a fase contratual, ou seja, no momento da efetiva aquisição e fruição do bem, quando podem surgir, inclusive, novas obrigações de informar, além das informações prévias, (iii) nas etapas pós-contratuais, por exemplo, durante a vigência de garantia legal ou contratual, durante o tempo de vida útil até a extinção efetiva do produto ou serviço e que venha a “quebrar” qualquer nexo de causalidade entre um fato e colocação do produto no mercado, ainda que não mais exista relação entre fabricante e consumidor, como na hipótese em que o adquirente já tenha vendido a terceiro, um veículo objeto de recall, por exemplo. (SANTOS, Fabíola Meira de Almeida. Informação como instrumento para amenizar riscos na sociedade de consumo. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo: RT, Vol. 107, Ano 2016, p. 374).
“[...] Assim, o osso sistema de direito consumerista prevê o direito do consumidor de ser informado e o dever do fornecedor de informar adequada, clara e ostensivamente sobre as informações que se fazem relevantes para que a compra do produto ou serviço ofertado seja feita de maneira consciente” (NERY, Rosa Maria de Andrade e NERY Nelson Nery Junior. Instituições de Direito Civil, Vol. I, Tomo I, Teoria Geral do Direito Privado, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014, p. 501)
Diante dessas considerações, pode-se concluir que o projeto de lei em análise não apresenta vício de inconstitucionalidade ou ilegalidade.
Também cabível mencionar que, no início de 2023, o Supremo Tribunal Federal julgou constitucional uma lei estadual que exigia a assinatura presencial de contratos de crédito firmados por pessoas idosas. Eis a ementa do citado acórdão:
Ação direta de inconstitucionalidade. 2. Lei n. 12.027, de 26 de agosto de 2021, do Estado da Paraíba. 3. Normas que obrigam pessoas idosas a assinarem fisicamente contratos de operação de crédito firmados por meio eletrônico ou telefônico. Possibilidade. 4. Competência suplementar dos Estados para dispor sobre proteção do consumidor. Precedentes. 5. Adequação e proporcionalidade da norma impugnada para a proteção do idoso. 6. Ação direta de constitucionalidade conhecida e julgada improcedente.
(ADI 7027, Relator(a): GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 17/12/2022, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-012 DIVULG 24-01-2023 PUBLIC 25-01-2023)
Entretanto, muito embora a proposição da forma que apresentada pelo nobre parlamentar seja constitucional, entendemos que é possível garantir um maior equilíbrio entre a tutela do consumidor idoso e o exercício da atividade bancária, modificando o texto para garantir que os contratos de operação de crédito entre instituições financeiras e pessoas idosas também possam ser firmados de forma não presencial, desde que adotados determinados procedimentos de segurança.
Assim sendo, apresentamos o seguinte Substitutivo:
SUBSTITUTIVO Nº ___/2023,
AO PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 319/2023
Altera integralmente a redação do Projeto de Lei Ordinária nº 319/2023.
Artigo Único. O Projeto de Lei Ordinária nº 319/2023 passa a ter a seguinte redação:
Dispõe sobre a obrigatoriedade da assinatura física ou adoção de procedimentos de segurança em contratos de operação de crédito contratados por meio eletrônico ou telefônico, firmado por pessoas idosas.
“Art. 1º Fica determinado, no Estado de Pernambuco, a assinatura física ou a adoção de procedimentos de segurança em contratos de operação de crédito firmados por pessoas idosas por meio eletrônico ou telefônico com instituições financeiras e de crédito, seus representantes ou prepostos.
§ 1º Considera-se contrato de operação de crédito para fins desta Lei, todo e qualquer tipo de contrato, serviços ou produtos na modalidade de consignação para desconto em aposentadorias, pensões, pecúlios, poupanças, contas correntes, tais como empréstimos, financiamentos, arrendamentos, hipotecas, seguros, aplicações financeiras, investimentos, ou qualquer outro tipo de operação que possua natureza de crédito.
§ 2º Considera-se procedimento de segurança para fins desta Lei, todo e qualquer método utilizado para assegurar identificação segura e pessoal do consumidor, como senha, biometria, geolocalização, registro fotográfico, confirmação positiva de dados ou qualquer outro tipo de tecnologia capaz de garantir a legitimidade da contratação.
Art. 2º As condições dos contratos de operação de crédito firmados por meio eletrônico ou telefônico com pessoas idosas devem obrigatoriamente ser informadas previamente para conhecimento do contratante, conforme previsto em Lei.
Parágrafo Único. A instituição financeira e de crédito contratada deve fornecer cópia, preferencialmente em meio físico, do contrato firmado ao idoso contratante, sob pena de nulidade do compromisso.
Art. 3º O descumprimento do previsto nesta lei sujeitará o infrator à penalidade de advertência na primeira infração, e às penalidades previstas no art. 180 da Lei Estadual nº 16.559, de 15 de janeiro de 2019, nas Faixas Pecuniárias A ou B, no caso da segunda infração em diante, sem prejuízo de outras sanções previstas em outras leis sobre a matéria.
Art. 4º A fiscalização do disposto nesta Lei será realizada pelos órgãos públicos nos respectivos âmbitos de suas atribuições, os quais serão responsáveis pelas sanções decorrentes de infrações às normas nelas contidas, mediante procedimento administrativo, assegurados a ampla defesa e o contraditório.
Art. 5º Esta Lei entra em vigor após 90 (noventa) dias da data de sua publicação. ”
Feitas essas considerações, o parecer do Relator é pela aprovação do Substitutivo ao Projeto de Lei Ordinária nº 319/2023, de autoria do Deputado William Brigido, com a consequente prejudicialidade da proposição principal.
É o Parecer do Relator.
3. CONCLUSÃO DA COMISSÃO
Tendo em vista as considerações expendidas pelo relator, o parecer desta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, por seus membros infra-assinados, é pela aprovação do Substitutivo ao Projeto de Lei Ordinária nº 319/2023, de autoria do Deputado William Brigido, com a consequente prejudicialidade da proposição principal.
Histórico