
Parecer 9507/2022
Texto Completo
Projeto de Lei Complementar nº 3438/2022
Autor: Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco
PROPOSIÇÃO QUE ALTERA A LEI COMPLEMENTAR Nº 100, DE 27 DE NOVEMBRO DE 2007, QUE DISPÕE SOBRE O CÓDIGO DE ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA DE PERNAMBUCO, A FIM DE FIXAR DIRETRIZES ÀS ATRIBUIÇÕES EXTRAORDINÁRIAS DOS MAGISTRADOS PERNAMBUCANOS QUANDO DO EXERCÍCIO CUMULATIVO DE JURISDIÇÃO E DE ACERVO PROCESSUAL, BEM COMO PERMITIR, MEDIANTE NORMATIVO INTERNO, ALTERAR COMPETÊNCIA E DENOMINAÇÃO DE UNIDADES JUDICIÁRIAS. MATÉRIA INSERIDA NA ESFERA DE COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO, CONFORME PREVISTO NOS ARTS. 19 E 20 DA CE/89.INEXISTÊNCIA DE VÍCIOS DE INCONSTITUCIONALIDADE OU ILEGALIDADE. PELA APROVAÇÃO.
1. Relatório
Submeto à apreciação desta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça o Projeto de Lei Complementar nº 3438/2022, de autoria do Tribunal de Justiça do Estado, que visa alterar a Lei Complementar nº 100, de 27 de novembro de 2007, que dispõe sobre o Código de Organização Judiciária de Pernambuco, a fim de fixar diretrizes às atribuições extraordinárias dos magistrados pernambucanos quando do exercício cumulativo de jurisdição e de acervo processual, bem como permitir, mediante normativo interno, alterar competência e denominação de unidades judiciárias.
Conforme justificativa do Desembargador Presidente do Tribunal, a proposição tem as seguintes razões:
“O presente projeto de lei complementar altera a Lei Complementar nº 100, de 21 de novembro de 2007, que dispõe sobre o Código de Organização Judiciária do Estado de Pernambuco (COJE), para instituir diretrizes às atribuições extraordinárias dos magistrados pernambucanos quando do exercício cumulativo de jurisdição e de acervo processual.
O regime constitucional (CF, art. 39, §4º) de pagamento unitário que caracteriza o modelo do subsídio repele acréscimos remuneratórios devidos pelo trabalho ordinário de agentes públicos.
Há situações, contudo, o legítimo acréscimo pecuniário à parcela única. É indispensável, para que determinada verba ou prestação pecuniária seja percebida em cumulação ao subsídio, o fundamento no desempenho de atividades extraordinárias ou decorrente de indenização por aquilo que não constitua atribuição regular desempenhada pelo magistrado.
Nesse sentido, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), por meio da Resolução nº 13, de março de 2006, autorizou o pagamento, aos membros do Poder Judiciário, de algumas gratificações, dentre elas as pertinentes ao “exercício cumulativo de atribuições” em razão do seu caráter eventual ou temporário, tal como se pode ver do seu artigo 5º, inciso II, alínea “c”:
Art. 5º As seguintes verbas não estão abrangidas pelo subsídio e não são por ele extintas:
(...)
c) exercício cumulativo de atribuições, como nos casos de atuação em comarcas integradas, varas distintas na mesma Comarca ou circunscrição, distintas jurisdições e juizados especiais.
Por sua vez, no âmbito, respectivamente, da Justiça Federal e da Justiça do Trabalho de primeiro e segundo graus, as Leis nº 13.093 e nº 13.095, de 12 de janeiro de 2015, instituíram formas de compensação pelo exercício cumulativo de jurisdição - que compreende a cumulação de juízo e a cumulação de acervo processual.
Diante da existência das referidas modalidades de compensação financeira no
âmbito da Justiça Federal e da Justiça do Trabalho, o CNJ, com o nítido objetivo de preservar o caráter nacional e unitário do Poder Judiciário brasileiro, editou a Recomendação nº 75, de 10 de setembro de 2020, com o desiderato de uniformizar a regulamentação, por todos os tribunais, do direito à compensação decorrente da cumulação de unidade ou órgão jurisdicional e pela assunção de acervo, consoante bem destacou o Ministro do STF - e presidente do CNJ à época - Dias Toffoli:
Para os fins das Leis nº 13.093 e 13.095, de 12 de janeiro de 2015, compreende-se por acumulação de juízo o exercício da jurisdição em mais de um órgão jurisdicional, como nos casos de atuação simultânea em varas distintas, e, por acervo processual, o total de processos distribuídos e vinculados ao magistrado.
Outrossim, não há discrímen que justifique a desigualação das demais Justiças quanto ao direito à compensação por assunção de acervo.
Ao revés: conforme dados deste Conselho Nacional de Justiça, referidos na petição inicial, “enquanto o número de Magistrados no Brasil cresceu, de 2010 a 2019, 7,16% (partindo de 16.883 Magistrados para 18.091 em 2019), o número de casos novos que ingressam, anualmente, no Poder Judiciário cresceu mais que o triplo: 25,94% (de 23,991 milhões a 30,214 milhões por ano).
Apesar do número de novos processos, como exposto, ser desproporcional ao ingresso de novos magistrados, “o número de julgamentos cresceu 37,07%, partindo de 23,137 milhões em 2010 para 31,714 milhões em 2019”, como demonstra a requerente com base em dados deste Conselho Nacional de Justiça, acrescentando que “a avaliação quanto à razão do número de julgamentos por Magistrado atesta o mesmo cenário de sobrecarga de trabalho e excesso de acervo: no mesmo período, essa razão cresceu 27,92%, partindo de 1.370 julgamentos por Magistrado em 2010 para 1.753 julgamentos por Magistrado em 2018.
Exsurge nítido, assim, o reconhecimento do direito de todos os magistrados a formas de compensação por assunção de acervo, tal como pleiteado pela Associação dos Magistrados Brasileiros, razão por que proponho seja expedida recomendação para que os tribunais regulamentem o exercício desse direito.
Diante da citada Recomendação do CNJ, mostra-se necessária a edição de atos normativos nos diversos Estados da Federação dispondo sobre a criação da gratificação por cumulação de atribuições, pois não há justificativa constitucional que ampare tratamento desigual para magistrados em face da atuação em distintos braços da Justiça – Federal, do Trabalho ou Estadual.
Com efeito, a União editou as Leis nº 13.093, nº 13.094, nº 13.095 e nº 13.096, todas de 2015, que regulamentaram, no âmbito da Justiça Federal de primeiro e segundo graus, da Justiça do Distrito Federal e Territórios, da Justiça do Trabalho e da Justiça Militar da União, a gratificação pelo exercício cumulativo de jurisdição aos seus magistrados no montante de 1/3 (um terço) do subsídio, inclusive na denominada cumulação de acervo.
Os Tribunais de Justiça nordestinos, à exceção de Pernambuco, vêm
implementando as diretrizes contidas na Recomendação nº 75 do CNJ, consoante se percebe no quadro ilustrativo abaixo (...)
A modificação ora proposta também materializa o postulado constitucional da simetria (CF, 129, §4°) e guarda similitude com o praticado pelo Ministério Público do Estado de Pernambuco - MPPE (Lei Complementar nº 12/1994, art. 64, inciso XII), evidenciando-se razoável a equivalência do Poder Judiciário Estadual.
Nesse ser assim, é necessário que o Tribunal de Justiça de Pernambuco dê início ao
processo legislativo, mediante o envio do projeto em tela, como o escopo de implementar a diretiva do CNJ, especialmente, guardando as peculiaridades administrativas e financeiras, uma vez que se trata de competência privativa de cada um dos tribunais (CF, art. 96, inciso II, alínea ‘b’).
Em outras palavras, o caráter nacional e unitário do Poder Judiciário está a impor aos Estados a edição de leis semelhantes para os magistrados estaduais, sob pena de permanecerem em uma situação de grave desigualdade remuneratória decorrente da omissão legislativa.
Assim, a inserção do art. 144, inciso VII-A, e a modificação do art. 146, inciso IV, do COJE, tem o propósito, respectivamente, de reproduzir as espécies de serviço extraordinário consagradas na Recomendação nº 75 do CNJ e, assim, definir o direito à compensação, decorrente da cumulação de atribuições, no percentual de 20% (vinte por cento) do subsídio, ainda que inferior ao legalmente previsto (1/3 - um terço - do subsídio), diante da realidade orçamentária do TJPE.
Por outro lado, o projeto traz uma novidade relevante: é o primeiro do país a exigir o incremento de produtividade do magistrado para fazer jus à gratificação, por força da inclusão do § 5º ao art. 144 do COJE.
Desse modo, o projeto pretende não só equalizar as vantagens e os ônus decorrentes do exercício cumulativo de atribuições atualmente em vigor, mas principalmente estimular e premiar o cumprimento de metas, mediante o condicionamento do pagamento da aludida verba ao efetivo desempenho de produtividade dos juízes e desembargadores, com o intuito de proporcionar uma justiça mais célere e eficaz aos cidadãos pernambucanos.
Com efeito, a verba por exercício cumulativo de jurisdição e de acervo, nos termos propostos, fomentará a produtividade do Poder Judiciário, atenuará as distorções remuneratórias existentes entre a magistratura pernambucana e as demais carreiras jurídicas e, especialmente, entregará aos pernambucanos um serviço jurisdicional mais tempestivo e justo.
Para tanto, o projeto atribuirá ao Tribunal de Justiça a competência para editar resolução com critérios objetivos sobre o tema, levando em conta (1) a realização de uma quantidade mínima de atos processuais, (2) a distribuição e (3) o acervo da unidade ou do órgão, (4) a natureza e (5) complexidade dos feitos, (6) o atendimento às metas nacionais fixadas pelo c. CNJ, e, ainda, (7) a estrutura física e (8) de pessoal disponibilizadas aos magistrados e magistradas.
A limitação a 02 (duas) cumulações, proposta no art. 146, inciso IV, é medida de racionalidade administrativa para uma melhor gestão dos serviços extraordinários e também de economicidade, com vistas à materializar o proposto, dentro da realidade orçamentário-financeira deste Tribunal, como prevê a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Cuidou o projeto, ademais, de fixar autorização para o Tribunal de Justiça alterar a competência e a denominação de unidades judiciais. A regra materializa o princípio constitucional da eficiência administrativa, estampado no art. 37, caput, da Carta Federal. Com isso, o órgão terá flexibilidade no direcionamento das unidades
judiciais para as comarcas que apresentem maior demanda judicial, como também, no seio da mesma comarca, alterar a competência funcional da unidade, permitindo a sua especialização conforme as necessidades emergentes na localidade.
Deve-se, de partida, destacar que a proposta se autolimita ao vedar quaisquer aumentos de despesas decorrentes da sua aplicação. Esse é um compromisso inafastável.
A proposta encontra amparo no art. 96, I, ‘a’, e II, ‘d’, da Constituição da República, de seguinte dicção:
“Art. 96. Compete privativamente:
I - aos tribunais:
a) eleger seus órgãos diretivos e elaborar seus regimentos internos, com observância das normas de processo e das garantias processuais das partes, dispondo sobre a competência e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos;
(...)
II - ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores e aos Tribunais de Justiça propor ao Poder Legislativo respectivo, observado o disposto no art. 169:
(...)
d) a alteração da organização e da divisão judiciárias;”
O Supremo Tribunal Federal já se pronunciou sobre a constitucionalidade da matéria objeto desta proposta quando do julgamento do HC 88660-4/CE, extraindo-se do voto da Ministra Carmén Lúcia:
“(...) 14. Conquanto seja de iniciativa dos Tribunais a proposta a serem enviadas ao Poder Legislativo quanto à alteração da organização judiciária, a correta compreensão das questões envolvendo a competência dos órgãos jurisdicionais – tema pertinente à organização judiciária – não está restrita ao campo de incidência exclusiva da lei, uma vez que depende da integração de critérios preestabelecidos na Constituição (Ex: arts. 102, 105, 108, 109, 114, 121, 124 e 125, § 1º, da Constituição da República), nas leis (Ex: Códigos de Processo Civil e Penal) e nos regimentos internos dos tribunais (Ex: art. 96, inc. I, alínea “a”, da Constituição da República).
15. Na Constituição da República, a adoção e a aplicação do princípio da separação dos poderes - que preconiza que um poder não pode ter influência dominante sobre os demais, devendo cada qual dispor de competências que assegurem a sua autonomia e independência em relação aos demais – reforça o entendimento de que determinadas matérias acham-se subtraídas do domínio normativo das leis, quer dizer, excluem-se do âmbito da reserva da legalidade específica.
16. Na espécie em foco, há de se observar que se o Poder Judiciário não dispusesse de autonomia para cuidar da distribuição interna de atribuições dos seus órgãos, estaria a sua independência irreversivelmente abalada, pois se teria, então, instituído uma dependência deste com o Poder Legislativo em comprometimento da própria prestação jurisdicional efetiva e eficiente, que é a sua atividade-fim. Poderia – pelo menos abstratamente - o Poder Legislativo negar-se ou omitir-se em promover as alterações de atribuições reclamadas, muitas vezes, com urgência,
para que o jurisdicionado receba o seu direito.
Note-se que não se está a cuidar, aqui, de competência do Poder, mas de atribuições próprias dos órgãos competentes para o exercício da jurisdição.
17. A Constituição da República adota o princípio da separação de poderes, mas explicita a distribuição de competências que permite a independência e harmonia entre eles.
18. Observa-se, com facilidade, que a Constituição estabeleceu a organização da Justiça Federal transferindo a sede normativa da competência para dispor sobre as atribuições dos órgãos judiciais, antes outorgada ao Congresso Nacional e ao Conselho da Justiça Federal, aos tribunais.
19. A competência do Poder Legislativo para legislar sobre a alteração da organização judiciária não se estende, dessa forma, à estipulação das atribuições específicas dos órgãos jurisdicionais, o que ficou a cargo do Poder Judiciário, que detém competência necessários para dispor sobre a especialização de varas.
20. Ao tratar das regras de interpretação do Direito Constitucional, Carlos Maximiliano assevera que a Constituição deve ser “entendida inteligentemente: se teve em mira os fins, forneceu meios para os atingir.”( “Hermenêutica e Aplicação do Direito”, Rio de Janeiro: Edição Revista Forense, 1.999, p. 312)
Não se há imaginar que o Poder Judiciário tenha recebido constitucionalmente autonomia e independência sem que dispusesse de competência cujo exercício pudesse e devesse se dar no sentido de atuar para que a eficiência e efetividade da prestação jurisdicional pelos órgãos do Poder, na forma constitucionalmente estatuída, fosse permitida.
É de José Afonso da Silva a lição segundo a qual “a Constituição assegura aos tribunais... a garantia de autonomia orgânicoadministrativa, que compreende a sua independência na estruturação e funcionamento de seus órgãos... para... elaborar seus regimentos internos, com observância das normas de processo e das garantias processuais das partes, dispondo sobre a competência e o funcionamento de seus órgãos jurisdicionais”. (“Curso de Direito Constitucional Positivo”, São Paulo: Malheiros Editores, 2.006, p. 588)
21. O Poder Legislativo, desse modo, detém competência para interferir normativamente no regramento das competências que se qualifique, em função de sua própria natureza, como matéria de natureza estritamente legal (princípio da reserva legal), devendo ser assegurado aos tribunais, na forma legalmente estabelecido – tal como acima transcrito – a estatuição da forma de desempenho de suas atribuições, segundo a lei disponha.”
Bem se vê, a presente inovação legislativa não apenas materializará o princípio da eficácia administrativa, como também permitirá que o Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco exerça na sua plenitude a autonomia que a Carta Magna lhe confere.
Por todas essas considerações, esta Presidência confia no acolhimento e apoio desta e. Casa Legislativa à presente proposição.”
O Projeto tramita no regime ordinário. É o relatório.
2. Parecer do Relator
A matéria do projeto de lei, ora em análise, encontra-se inserta na esfera de iniciativa do Tribunal de Justiça do Estado, conforme determina os arts. 19 e 20 da Constituição Estadual, in verbis:
“Art. 19. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Assembléia Legislativa, ao Governador, ao Tribunal de Justiça, ao Tribunal de Contas, ao Procurador-Geral da Justiça e aos cidadãos, nos casos e formas previstos nesta Constituição.
Art. 20. É da competência exclusiva da Assembleia Legislativa e privativa dos Tribunais a iniciativa das leis, que disponham sobre a criação e extinção de cargos de suas Secretarias e serviços auxiliares, e a fixação dos respectivos vencimentos, respeitadas as limitações previstas na Constituição da República, a cujos projetos somente poderão ser admitidas emendas com os requisitos nela estabelecidos.”
Ademais, a Constituição Federal garante aos Tribunais de Justiça autonomia administrativa e financeira, de forma que o PLO aqui analisado está inserido nessa competência constitucionalmente assegurada ao TJ/PE. Vejamos:
“ Art. 99. Ao Poder Judiciário é assegurada autonomia administrativa e financeira.”
“Art. 96. Compete privativamente:
I - aos tribunais:
- eleger seus órgãos diretivos e elaborar seus regimentos internos, com observância das normas de processo e das garantias processuais das partes, dispondo sobre a competência e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos
(...)
II - ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores e aos Tribunais de Justiça propor ao Poder Legislativo respectivo, observado o disposto no art. 169
(...)
d) a alteração da organização e da divisão judiciárias;”
Imperioso destacar, também, o resultado do HC 88660-4/CE, extraindo-se do voto da Ministra Carmén Lúcia o seguinte:
“(...) 14. Conquanto seja de iniciativa dos Tribunais a proposta a serem enviadas ao Poder Legislativo quanto à alteração da organização judiciária, a correta compreensão das questões envolvendo a competência dos órgãos jurisdicionais – tema pertinente à organização judiciária – não está restrita ao campo de incidência exclusiva da lei, uma vez que depende da integração de critérios preestabelecidos na Constituição (Ex: arts. 102, 105, 108, 109, 114, 121, 124 e 125, § 1º, da Constituição da República), nas leis (Ex: Códigos de Processo Civil e Penal) e nos regimentos internos dos tribunais (Ex: art. 96, inc. I, alínea “a”, da Constituição da República).
15. Na Constituição da República, a adoção e a aplicação do princípio da separação dos poderes - que preconiza que um poder não pode ter influência dominante sobre os demais, devendo cada qual dispor de competências que assegurem a sua autonomia e independência em relação aos demais – reforça o entendimento de que determinadas matérias acham-se subtraídas do domínio normativo das leis, quer dizer, excluem-se do âmbito da reserva da legalidade específica.
16. Na espécie em foco, há de se observar que se o Poder Judiciário não dispusesse de autonomia para cuidar da distribuição interna de atribuições dos seus órgãos, estaria a sua independência irreversivelmente abalada, pois se teria, então, instituído uma dependência deste com o Poder Legislativo em comprometimento da própria prestação jurisdicional efetiva e eficiente, que é a sua atividade-fim. Poderia – pelo menos abstratamente - o Poder Legislativo negar-se ou omitir-se em promover as alterações de atribuições reclamadas, muitas vezes, com urgência,
para que o jurisdicionado receba o seu direito.
Note-se que não se está a cuidar, aqui, de competência do Poder, mas de atribuições próprias dos órgãos competentes para o exercício da jurisdição.
17. A Constituição da República adota o princípio da separação de poderes, mas explicita a distribuição de competências que permite a independência e harmonia entre eles.
18. Observa-se, com facilidade, que a Constituição estabeleceu a organização da Justiça Federal transferindo a sede normativa da competência para dispor sobre as atribuições dos órgãos judiciais, antes outorgada ao Congresso Nacional e ao Conselho da Justiça Federal, aos tribunais.
19. A competência do Poder Legislativo para legislar sobre a alteração da organização judiciária não se estende, dessa forma, à estipulação das atribuições específicas dos órgãos jurisdicionais, o que ficou a cargo do Poder Judiciário, que detém competência necessários para dispor sobre a especialização de varas.”
Com efeito, o STF já foi chamado a analisar Resoluções editadas por Tribunais de Justiça que efetivaram mudanças semelhantes à ora proposta. Vejamos como o Pretório Excelso se manifestou:
“O Poder Judiciário tem competência para dispor sobre especialização de varas, porque é matéria que se insere no âmbito da organização judiciária dos Tribunais. O tema referente à organização judiciária não se encontra restrita ao campo de incidência exclusiva da lei, eis que depende da integração de critérios preestabelecidos na Constituição, nas leis e nos regimentos internos dos Tribunais.
A leitura interpretativa do disposto no art. 96, I, a e d, II, d, da Constituição Federal admite que haja alteração da competência dos órgãos do Poder Judiciário por deliberação do Tribunal de Justiça, desde que não haja impacto orçamentário, eis que houve simples alteração promovida administrativamente, constitucionalmente admitida, visando uma melhor prestação da tutela jurisdicional, de natureza especializada” (HC 91024-6, 2ª Turma, STF, julgado em 05/08/2008, Rel. Min. Ellen Gracie)
Por fim, salientamos que o estudo mais acurado acerca dos impactos financeiros decorrentes desta proposição deverão ser apreciados pela Comissão de Finanças, Orçamento e Tributação, à qual competirá analisar os aspectos da Lei de Responsabilidade Fiscal e das leis orçamentárias, nos termos do art. 96, I, do Regimento Interno deste Poder Legislativo.
Dessa forma, inexistem nas disposições do projeto de lei ora em análise quaisquer vícios de inconstitucionalidade ou ilegalidade.
Diante do exposto, opino no sentido de que o parecer desta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça seja pela aprovação do Projeto de Lei Complementar nº 3438/2022, de autoria do Tribunal de Justiça do Estado.
3. Conclusão da Comissão
Ante o exposto, tendo em vista as considerações expendidas pelo relator, opinamos pela aprovação do Projeto de Lei Complementar nº 3438/2022, de autoria do Tribunal de Justiça do Estado.
Histórico