A cada 15 horas, um brasileiro registra denúncia de intolerância religiosa, segundo dados, de 2017, do Ministério dos Direitos Humanos. Quase 40% das vítimas segue religião de matriz africana, como a umbanda e o candomblé. Gente como a professora de história e mãe de santo Jane de Oyá, líder de um terreiro em Olinda, na Região Metropolitana do Recife. Em audiência pública sobre o tema, realizada na Assembleia Legislativa de Pernambuco, no último mês de agosto, mãe Jane relatou um caso de violência verbal dentro de um ônibus de transporte público. O agressor foi um neopentecostal. “Ele me menosprezou, falou o que quis da minha religião, disse que eu era o diabo, que iam descer várias tochas de fogo mandadas por Deus para me queimar. Quando ele parou de falar, eu cantei pra Oxalá, né? Em seguida, quando desci o viaduto, tinha um carro de polícia, e pedi, como cidadã, que levassem ele preso”.
A comunidade que frequenta terreiros sofre violências como essa de forma cotidiana, na opinião do pai de santo Edson de Omolu, também de Olinda. Na audiência, ele criticou o texto do projeto de lei que cria o Estatuto da Liberdade Religiosa em Pernambuco. A proposta, de autoria do deputado Henrique Queiroz, do PR, está em tramitação na Alepe. Na avaliação de pai Edson, o documento abre brechas para violações contra grupos religiosos minoritários. O representante da Diocese Anglicana do Recife, Joanildo Buriti, afirmou que a norma não traz inovação jurídica, já que a liberdade de crença é um direito assegurado pela Constituição Federal. “Numa perspectiva de que o Estado deve ser laico, a garantia da liberdade da informação tem que vir junto com o tratamento isonômico das religiões. Ou seja, o Estado não pode legislar nem atuar de tal maneira que ele dê preferência ou privilegie ou favoreça uma religião determinada em detrimento de outras”.
Para mãe Elza de Yemojá, integrante da Coordenadoria de Igualdade Racial da Secretaria de Justiça e Direitos Humanos de Pernambuco, as religiões africanas são, de fato, as que ainda mais sofrem discriminação. “Não são só as religiões de matriz africana que sofrem preconceito. Toda e qualquer religião não cristã passa por essa dificuldade. Mas a gente compreende que a má ‘pegada’ do momento é perseguir quem é de matriz africana. Porque, infelizmente, essa sociedade foi ensinada a ter preconceito e mantê-lo sobre pessoas e sobre comportamentos que não sejam o viés cristão.”
A orientação dada por mãe Elza é de que vítimas de preconceito devem procurar a delegacia mais próxima para registrar boletim de ocorrência. O número do B.O, ou uma cópia do documento, pode ser encaminhada à Ouvidoria da Secretaria de Justiça e Direitos Humanos do Estado para o acompanhamento do caso. O telefone de contato é o 3182 7607. Repetindo: 3182 7607. A intolerância por motivo religioso é considerada, desde 1997, crime de ódio, previsto em lei federal. A pena para quem praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito religioso pode chegar a três anos de prisão. Denúncias de agressões também podem ser feitas pelo Disque 100. O canal funciona 24 horas, todos os dias da semana. Além do número de telefone, o serviço conta com uma página na internet, em que podem ser denunciados comentários ou posts em redes sociais. O endereço é www.disque100.gov.br. Basta selecionar o tema da denúncia, inserir o link e o comentário denunciado. Tanto as ligações recebidas pelo Disque 100 quanto os registros criados pelo site podem ser anônimos e sigilosos.