
“VÔLEI BOLÃO” – Professor de Alice adaptou fundamentos do vôlei para crianças jogarem juntas na aula de Educação Física da escola. Foto: Jarbas Araújo
Ivanna de Castro
Campeã brasileira de bocha adaptada nas Paralimpíadas Escolares deste ano, a estudante Andreza Vitória Ferreira, 16 anos, apenas observa os colegas de turma se exercitarem durante as aulas de Educação Física do colégio. Aluna da Escola Estadual José Mariano, no Recife, ela revela que a participação na disciplina é baseada na entrega de trabalhos escritos. “Não me sinto bem com a situação. Queria que o colégio oferecesse alguma atividade de que eu pudesse participar”, conta.
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VITÓRIA – Campeã brasileira de bocha adaptada nas Paralimpíadas Escolares, Andreza lamenta não poder participar das aulas de Educação Física. Foto: Acervo Pessoal
Os bons resultados esportivos da jovem, que é cadeirante e tem problemas na fala em virtude de uma síndrome neurológica, são fruto da participação dela no Projeto Paratleta UFPE, vinculado ao Núcleo de Educação Física e Desporto da Universidade Federal de Pernambuco. A mãe da estudante, Maria das Graças Ferreira, é funcionária da instituição e descobriu a iniciativa há três anos. “As aulas de bocha mudaram a vida de Andreza. Minha filha era tímida, pouco comunicativa. Hoje, viaja pelo Brasil para competir”, diz, orgulhosa da classificação da adolescente para o campeonato brasileiro da modalidade.
Professor de Andreza no projeto, o educador físico Maurílio Tenório explica que os treinamentos são elaborados de forma individualizada, considerando as habilidades e dificuldades de cada participante. “Trabalhamos de forma lúdica com os atletas mais jovens, buscando oferecer a eles prazer durante a prática da modalidade. Já com os adultos, desenvolvemos um trabalho de caráter mais técnico. Em ambos os casos, é gratificante observar cada um desafiando e vencendo seus limites”, relata.
“É gratificante observar cada um desses jovens desafiando e vencendo seus limites.”
Maurílio Tenório, educador físico
Diferentemente de Andreza, Alice Reis Goulart, 7 anos, conta com estímulo na própria escola. Cadeirante e sem os membros superiores, a aluna do Colégio Apoio, no Recife, diverte-se com os colegas de sala durante a atividade “vôlei bolão”, desenvolvida pela equipe de Educação Física da instituição para garantir que todos se exercitem e convivam. A modalidade simula um jogo de vôlei, com o uso de uma bola grande e leve, rede mais baixa e regras adaptadas a alunos de pouca idade.
Alice usa os pés para fazer o saque e a ela é permitido ficar mais próxima ao campo adversário, bem como fazer pontos por baixo da rede. Os colegas veem com naturalidade as adaptações e vibram com os pontos que a estudante conquista para a equipe (confira na animação à esquerda). “Não existe um manual de atividade física para alunos com deficiência. Nossos professores estão sempre dialogando e experimentando possibilidades diferentes e inclusivas. Se uma opção não dá certo, buscamos outras que permitam o desenvolvimento de todos”, explica o educador físico e professor de Alice, André Fernandes de Almeida. Ele acredita que os profissionais precisam ser capacitados para a função.
“É como um salto com varas. Você vai adaptando a altura do sarrafo de acordo com a condição do atleta. Se uma criança salta um metro, pode-se colocar a meta de um metro e dez centímetros. Mas, depois, baixamos o sarrafo para estimular, também, aquele que só atinge uma pequena altura”, exemplificou a diretora do Colégio Apoio, Rejane Maia. Ela conta que, dos 1.190 alunos da instituição, 120 possuem necessidades educacionais especiais. “O olhar especial para a criança com dificuldade não significa uma aula entediante para os demais alunos. Buscamos estimular nos estudantes não uma relação de pena, mas de respeito e de entendimento dos limites do outro”, pontua.
Inclusão legal
Para que não apenas Alice, mas todo estudante com deficiência tenha o direito de participar efetivamente das aulas de Educação Física oferecidas pelas escolas pernambucanas, a Alepe aprovou, em maio deste ano, a Lei n° 16.043/2017. A norma, proposta pelo deputado Joel da Harpa (PODE), obriga instituições públicas e particulares instaladas no Estado a ofertarem programas dessa disciplina adaptados aos alunos com deficiência.
De acordo com o texto, “a comprovação da necessidade de educação física adaptada deverá ser feita por meio de laudo médico fundamentado”, a ser encaminhado à direção da escola. Já em vigor, a lei aguarda regulamentação do Poder Executivo, que definirá parâmetros e punições em caso de descumprimento.
“A prática de esportes por pessoas com deficiência tem se desenvolvido e a gente observa isso nos excelentes resultados alcançados por atletas nas Paralimpíadas. Assim, verificamos a importância de se estimular a atividade física inclusiva desde o início da vida do indivíduo dentro da escola”, justifica o parlamentar.
Segundo a responsável pela Gerência de Educação Inclusiva e Direitos Humanos da Secretaria Estadual de Educação, Vera Braga, o Estado oferece capacitação continuada aos docentes, com conteúdo voltado à inclusão de alunos com deficiência. “A lei vem dar mais visibilidade e fortalecer a política que já vem sendo realizada em Pernambuco. Trabalhamos para que estudantes que necessitem de ensino especializado tenham um professor capaz de desenvolver as potencialidades do aluno”, afirma.
A profissional esclarece que casos como o de Andreza, em que o atendimento especializado não é oferecido pela escola, devem ser notificados à Gerência Regional de Educação. “Vamos verificar a dificuldade e tentar solucioná-la. É preciso garantir o acesso de nossos alunos a todos os componentes curriculares, os quais precisam ser adaptados às limitações de cada um”, pontua.
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