Isabela Senra e Tayza Lima
O que você quer ser quando crescer? Essa pergunta, ouvida da infância à adolescência, traduz a pressão para decidir uma atividade profissional que se vai exercer por toda a vida. Porém, nem sempre o processo de escolha é simples ou definitivo: dos 11 milhões de estudantes brasileiros que cursavam o Ensino Superior em 2016, mais de 3 milhões tiveram a matrícula encerrada ou trancada, de acordo com o Ministério da Educação (MEC).
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As causas variam da impossibilidade de pagar as mensalidades à falta de afinidade com a carreira – caso do estudante Carlos Filizola, que largou a graduação em História faltando apenas um semestre para terminar. “Eu queria fazer Música, só que precisava saber solfejo. Fiz umas aulas e não gostei”, conta. “Mas tinha que fazer alguma coisa, há uma pressão da sociedade pela escolha. É chato.” Atualmente, o jovem está perto de concluir o curso de Produção Fonográfica.

VOCAÇÃO – Falta de afinidade com a carreira levou Carlos Filizola a abandonar graduação em História no último semestre. Foto: Kerol Correia
Para auxiliar os futuros universitários, existe a orientação vocacional. O acompanhamento é prestado por pessoas especializadas, que realizam testes e atividades conectadas com as preferências e habilidades do estudante para direcioná-lo a uma área de atuação que atenda ao perfil. A psicóloga Ana Cleide Jucá destaca algumas dificuldades comuns. “Falta, principalmente, maturidade, até pela idade. Além disso, nosso País não investe em educação para a carreira: o ensino é muito conteudista e o jovem não se experimenta em situações profissionais”, avalia.
O apoio e a orientação da família são essenciais. Muitos jovens se sentem pressionados pelos parentes a seguir uma carreira com a qual não se identificam e acabam desistindo no meio do processo. Ana Cleide ressalta a importância da noção de projeto de vida: “Relacionam, erroneamente, a matéria que gostam de estudar na escola com o que vão querer fazer. Tem que se inteirar mais do cotidiano da profissão e se ela vai se encaixar naquilo que ele deseja para a vida”.
“Os estudantes abandonam por fatores econômicos: manter-se no curso demanda investimento e as famílias são carentes. A solução está vinculada ao sucesso das políticas de assistência estudantil.”
Assis Leão, pró-reitor de Ensino do IFPE
Hoje médica, Andrea Lacerda passou por esse conflito. No Ensino Médio, Biologia era uma das disciplinas favoritas dela, o que a levou a prestar vestibular para a área. Já perto da formatura, largou o Bacharelado em Ciências Biológicas na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) para estudar Medicina. “Quando eu comecei a estagiar, percebi que não era aquilo que eu queria para minha vida. O biólogo faz, sobretudo, pesquisa, o que é absurdamente difícil no Brasil”, observa. “Decidi ir para uma profissão que aliasse o que eu gostava de estudar com uma situação financeira mais estável.”
Pró-reitor de Ensino do Instituto Federal de Pernambuco (IFPE), o professor Assis Leão vê a evasão como um fenômeno mundial e um desafio para a Educação Superior. De acordo com o MEC, mais de 86 mil matrículas em cursos de graduação foram trancadas ou encerradas em Pernambuco em 2016. “A grande agenda hoje é permanência e êxito”, afirma. “Os estudantes abandonam por fatores econômicos: manter-se no curso demanda investimento e as famílias são carentes. A solução está vinculada ao sucesso das políticas de assistência estudantil, sobretudo nas instituições federais.”
Apoio e financiamento
Uma dessas políticas é o Programa Universidade Para Todos (Prouni). Criada em 2004, a iniciativa disponibiliza bolsas de estudo para alunos de instituições particulares, como a técnica administrativa Angélica Mendonça. “Consegui uma bolsa parcial de 50%. Eu me formei em Administração sem ter um custo muito alto”, comemora. Dois milhões de brasileiros receberam o benefício, que atende estudantes que cursaram o Ensino Médio em escola pública ou como bolsista integral na rede privada.
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Outra alternativa é o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), que concede crédito para pagar um curso de graduação. Diretor de Políticas e Programas de Educação Superior do MEC, Vicente de Paula explica que o programa possui duas modalidades: “A primeira tem como fonte de recursos o Tesouro Nacional e se destina a estudantes que comprovam renda de até três salários mínimos. Para esses, o financiamento tem juro zero. Já a outra, que chamamos de P-Fies, atende aqueles com renda de até cinco salários mínimos.”
Apesar desses incentivos, dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico apontam que apenas 15% dos brasileiros com mais de 25 anos têm graduação. Uma alternativa para os pernambucanos são as 13 autarquias municipais de Ensino Superior, que oferecem 118 cursos e são mantidas por mensalidades, mas não visam ao lucro.

INCENTIVO – Programa PE no Campus oferece bolsas para alunos de universidades públicas se manterem nos dois primeiros anos de curso. Foto: Kerol Correia
Para conceder bolsas nas autarquias, o Governo Estadual criou o Programa Universidade para Todos em Pernambuco (Proupe). O professor Antônio Habib, presidente da Associação das Instituições de Ensino Superior de Pernambuco, relata que o número de bolsistas do programa, que já foi de 13 mil em 2015, atualmente não chega a cinco mil. “Grande parte da evasão que experimentamos foi porque os alunos não tiveram mais a oportunidade de concorrer a uma bolsa”, acredita.
De acordo com a Secretaria Estadual de Ciência, Tecnologia e Inovação (Secti), gestora do Proupe, a redução das vagas se deu a partir da avaliação insatisfatória das autarquias em provas como o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade), que concede notas às instituições de Educação Superior. “Essa mudança foi acordada com os dirigentes das autarquias, administração do Estado, Alepe e representantes estudantis, de forma que a requalificação não acarretasse prejuízo para a formação de recursos humanos qualificados. Ao mesmo tempo, deveria permitir que as autarquias pudessem melhorar a formação dos profissionais”, afirma o gerente de Tecnologia da pasta, César Andrade.
Em 2018, foi lançado o PE no Campus, que oferece bolsas para alunos de universidades públicas. Nesse caso, o objetivo é auxiliar os estudantes a se manterem nos dois primeiros anos do curso. O secretário-executivo de Planejamento e Coordenação da Secretaria Estadual de Educação, Severino Andrade, enumera os critérios para quem quer ser beneficiário: “Estudar o Ensino Médio integralmente na rede estadual; ter renda inferior a dois salários mínimos ou ser beneficiário do Programa Bolsa Família; realizar o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) ou o Sistema Seriado de Avaliação e ser admitido em universidade pública; e residir em município distante pelo menos 50 quilômetros da universidade que pretende cursar”.