
O artista plástico pernambucano Abelardo da Hora, que morreu ontem de manhã aos 90 anos, está sendo velado no Plenário da Assembleia Legislativa. O corpo de um dos maiores escultores brasileiros chegou no fim da tarde de ontem ao local e o espaço ficou aberto à visitação pública das 18h às 22h. Hoje o velório será reaberto das 8h às 10h30, quando o cortejo fúnebre seguirá para o Cemitério de Santo Amaro, onde o artista será sepultado às 11h.
Abelardo da Hora foi internado com uma virose, há pouco mais de um mês, no Hospital Memorial São José, no Recife. Lutou contra uma pneumonia e faleceu em decorrência de insuficiência cardiorrespiratória, mas manteve-se lúcido até os últimos instantes, segundo familiares.
Escultor, desenhista, ceramista, gravador e poeta, Abelardo da Hora era um apaixonado pelas artes e trabalhava com frequência temas como as mulheres, o frevo e o maracatu em suas obras. Suas esculturas enfeitam praças, prédios públicos e condomínios privados do Recife. Seu ateliê funcionava em sua casa na Rua do Sossego, no bairro da Boa Vista.
Emocionado, Abelardo da Hora Filho disse que o pai era um amigo. “Embelezou como ninguém essa cidade que tanto amava. Era uma pessoa admirável pela sua ética e seu comportamento digno. Não queria morrer. Estava o tempo inteiro com o pensamento no futuro, pensando nos novos projetos e no que faria quando saísse do hospital”, comentou.
Muito abalado, o cantor Claudionor Germano lamentou a morte do irmão. “É uma perda irreparável para a cultura da nossa terra. Pouco antes de morrer, Abelardo disse que estava sofrendo mais do que quando sofreu as torturas da ditadura. Nós agradecemos a ele o legado imenso que está nos deixando”, revelou.
A secretária de Cultura do Recife, Leda Alves, veio se despedir do amigo. “Em contraste com o seu físico, frágil e franzino, sua obra é de um peso enorme para o País. De uma importância cultural e artística, de uma valentia e coragem de denunciar a pobreza, a miséria e a morte. Nossa cidade foi povoada pelas esculturas de Abelardo, esse homem tão pequeno e tão gigante na sua obra”, comparou.
Marcelo Canuto, secretário de Cultura do Estado, lembrou que Abelardo da Hora é um homem que marca Pernambuco desde a década de 40. “Teve influência também no teatro e formou vários quadros, como Francisco Brennand e Aloísio Magalhães, que foram seus alunos. Tinha o prazer de dividir o seu saber. Outra marca importante era a sua alegria”, afirmou.
A artista plástica Tereza Costa Rego rememorou a longa convivência com Abelardo, na arte e na política. “Caminhamos juntos em várias exposições e politicamente, no Partido Comunista. Nossas vidas sempre se entrelaçaram.
Abelardo, para mim, era um irmão. Fomos namorados na juventude. O Recife não percebeu ainda a falta que Abelardo vai fazer. Ele formou várias gerações de pintores. Era um artista, mas foi sempre um professor”, citou.
Na visão do deputado Raimundo Pimentel (PSB) – autor da indicação que concedeu a Medalha Leão do Norte a Abelardo da Hora, no ano passado -, trata-se de um artista insubstituível. “Abelardo era reconhecido internacionalmente e continuou trabalhando ativamente até os 90 anos. Além disso, era um militante político. Um homem que atuou politicamente num dos momentos mais difíceis desse país, em defesa da democracia e da justiça social”, afirmou.
Em nota, a deputada Laura Gomes (PSB), presidente da Comissão de Educação e Cultura da Alepe, disse que Abelardo “sempre orgulhou os pernambucanos”. A deputada Teresa Leitão (PT) lamentou a morte de “um artista popular de 90 anos em plena atividade e que inspira novas gerações”.
O governador de Pernambuco, João Lyra Neto (PSB), e o prefeito do Recife, Geraldo Júlio (PSB), decretaram luto oficial de três dias em memória do escultor.
Trajetória 1924 – Nasce Abelardo Germano da Hora, na Usina Tiuma, em São Lourenço da Mata, em 31 de julho 1942 – À frente do Diretório Acadêmico da Escola de Belas Artes, comanda grupo de alunos que pintava paisagens nas matas da Várzea. O trabalho chama atenção do industrial Ricardo Brennand, para quem trabalhou de 1943 até 1945 1948 – Realiza sua 1ª exposição de esculturas, no Recife 1950 – Cria a Sociedade de Arte Moderna do Recife (SAMR) e, em 1952, funda o Ateliê Coletivo da SAMR, do qual foi professor e diretor 1955 – Elabora, a pedido da Prefeitura do Recife, esculturas de tipos populares que estão em praças da cidade 1956 – É eleito delegado de Pernambuco na Seção Brasileira da Associação Internacional de Artes Plásticas, da Unesco. Entre 1957 e 1958, expõe em vários países da Europa, na Mongólia, Argentina, Israel, Rússia, China e EUA 1960 – É um dos idealizadores do Movimento de Cultura Popular (MCP), na gestão do então prefeito do Recife, Miguel Arraes 1970 – Com direitos políticos cassados pelo governo militar, passa a explorar em sua obra aspectos da natureza, o sincretismo religioso do candomblé e a sensualidade feminina. Foi preso 70 vezes durante a ditadura 1990 – Volta a se dedicar ao desenho e à pintura 2004 – Sua família funda o Instituto Abelardo da Hora, para preservar o legado do artista 2007 – Começa a inaugurar uma série de obras no Recife, como o Monumento aos Retirantes, no Parque Dona Lindu; o Monumento ao Maracatu, perto do Forte das Cinco Pontas; e o Monumento ao Frevo, na Rua da Aurora 2011 – Recebe o Título de Cidadão recifense da Câmara Municipal 2013 – Recebe, em 27 de novembro, da Assembleia Legislativa, a Medalha Leão do Norte Classe Ouro no Mérito Cultural Gilberto Freyre 2014 – No dia 31 de julho, celebra 90 anos inaugurando escultura de 7,5 metros na Arena Pernambuco. Menos de dois meses depois, falece, no Recife