
REPÚDIO – Para José Queiroz, racismo está por trás dos altos índices de homicídios de jovens negros nas periferias: “A senzala vive perto de nós”. Foto: Reprodução/Evane Manço
Protestos antirracistas ocorridos nos Estados Unidos e no Brasil com lemas como “Vidas Negras Importam” ganharam destaque em pronunciamentos na Reunião Plenária desta quinta (4). Citando casos de violência e discriminação contra a população negra, deputados trataram da questão do racismo estrutural, relacionando-o ao passado escravista nesses dois países. As discussões ocorreram durante pronunciamento do deputado José Queiroz (PDT), além de terem sido abordadas nos discursos das Juntas (PSOL) e de Doriel Barros (PT).
A morte de Miguel Otávio Santana da Silva, de 5 anos, ao cair do nono andar do Edifício Píer Maurício de Nassau, no Centro do Recife, na terça (2), foi abordada por Jô Cavalcanti, titular do mandato coletivo psolista. O menino era filho de uma empregada doméstica que trabalhava no prédio. “Ela era obrigada a ir mesmo durante a pandemia e levava o filho porque não tinha com quem deixar. É preciso apurar o caso, que resultou em mais uma família negra destroçada”, salientou, identificando racismo na situação.
As Juntas também repudiaram o fato ocorrido com a advogada Anna Cristina Santos da Silva, no último dia 28 de maio, na frente da Delegacia do Varadouro, em Olinda. A profissional, que é negra, esperava uma cliente em frente à delegacia, quando teria sido abordada pelo delegado Osias Tibúrcio Fernandes de Melo. “O policial pediu a identificação e, após ela ter apresentado a carteira da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), quis reter o documento. Ante a negativa, arrastou-a pelo braço e a deteve por mais de seis horas, sem autorização nem para ir ao banheiro. Exigimos uma rigorosa investigação sobre o caso”, disse a deputada.

JUNTAS – Jô Cavalcanti lamentou morte de criança ao cair de edifício no Centro do Recife. “Mais uma família negra destroçada”, salientou. Foto: Reprodução/Evane Manço
A morte do americano negro George Floyd, ao ser sufocado por mais de oito minutos por um policial branco que se ajoelhou sobre seu pescoço, foi lembrada por José Queiroz como “o estopim dos protestos nos EUA”. Ele citou, ainda, o assassinato do adolescente João Pedro Mattos Pinto, de 14 anos, com um tiro de fuzil nas costas, quando teve a casa invadida durante operação policial em São Gonçalo (RJ).
Para o parlamentar do PDT, o racismo está por trás desses casos e dos altos índices de homicídios de jovens negros nas periferias. Também segundo ele, as senzalas continuam a existir “em todos setores da vida nacional”. “A senzala vive perto de nós. Se não estivermos atentos ao que acontece em nossas vidas, nos habituamos a ela e viramos donos da casa grande sem nem perceber que estamos sendo injustos e desumanos”,observou. “É hora de pensarmos seriamente, para que haja uma política nacional de protesto contra o racismo estrutural”, defendeu.
Queiroz remeteu-se, ainda, à luta do abolicionista Joaquim Nabuco (1849-1910), patrono da Assembleia Legislativa de Pernambuco. “Em momentos como este, precisamos nos lembrar de Nabuco. Ele foi um grande defensor dos negros e um ícone mundial na luta pela libertação dos escravos”, prosseguiu. “Saudemos nosso patrono na esperança de que possamos ser instrumentos das lutas libertárias, que exigem um comportamento digno contra o racismo e todo tipo de preconceito”, agregou.
Em aparte ao discurso de Queiroz, o deputado Antonio Fernando (PSC) referiu-se ao racismo como “repugnante” e frisou que o Brasil é um país miscigenado. Tony Gel (MDB) reverenciou Nabuco como “um homem muito à frente de seu tempo”. Isaltino Nascimento (PSB) lembrou que, ao longo da história, os negros brasileiros foram impedidos por leis de terem acesso a educação e à propriedade de terras. E observou que as mulheres negras são as mais atingidas pelo racismo estrutural. “A abolição não se completou. As populações negras e periféricas têm menos acessos a direitos. O racismo é uma ferida que dói, mas que precisa ser exposta para ser superada”, acrescentou Teresa Leitão (PT).

POLÍCIA – Doriel Barros ressaltou violência sofrida pela população negra. “O Brasil segue naturalizando o assassinato estatal do corpo negro”, disse. Foto: Reprodução/Evane Manço
Em discurso na sequência, Doriel Barros enfatizou a relevância da luta contra a violência sofrida pela população negra. Ele destacou o dado do Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2019 apontando que 75,4% das pessoas vitimadas por intervenções policiais no Brasil foram negros. “O Brasil segue naturalizando o assassinato estatal do corpo negro. E o presidente Bolsonaro, desde a campanha de 2018, tem dito que não quer mudar essa situação”, lamentou.
Pandemia – O enfrentamento pelo Brasil da pandemia de Covid-19 foi outro tema abordado por José Queiroz. Ele atribuiu aos equívocos do Governo Federal o fato de o País ter hoje mais mortes pela doença do que todas as outras nações sul-americanas somadas. Na avaliação dele, se o Brasil tivesse um presidente que atuasse como líder nacional na coordenação de prefeitos e governadores, “não estaríamos com essa triste marca”.
*Foto da home: Daniel Arauz, CC 2.0. Editada na proporção 680X380. Imagem original no Flickr do autor.