Comissão de Cidadania debate condições de funcionamento da Funase

Em 25/11/2016 - 13:11
-A A+

CRÍTICAS – Entre os problemas apontados pelas entidades, estão a precariedade da contratação e formação de agentes, a superlotação e a ausência de ações socioeducativas. Foto: Jarbas Araújo

“A situação das unidades socioeducativas de Pernambuco ultrapassou o caos.” Essa foi a declaração de Vitor Cavalcante, representante do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), que participou de audiência pública na Assembleia nesta sexta (25), promovida pela Comissão de Cidadania. Com o objetivo de fazer diagnóstico sobre as unidades da Fundação de Atendimento Socioeducativo (Funase), o encontro reuniu integrantes da sociedade civil e representantes do Governo Estadual. Como encaminhamento, um relatório será construído pelo colegiado para garantir o avanço nas pautas do debate.

A audiência pública foi motivada, sobretudo, pelas rebeliões e mortes ocorridas na Funase nos últimos anos. Entre 2012 e 2016, 40 jovens morreram dentro das unidades. Somente este ano, houve registro de óbitos em Abreu e Lima, Cabo de Santo Agostinho (RMR), Timbaúba (Mata Norte) e Caruaru (Agreste). “Estamos reunidos aqui porque é preciso um esforço coletivo para reverter esse cenário”, declarou o deputado Edilson Silva (PSOL), presidente da Comissão.

Entre os principais problemas apontados, a precariedade da contratação e formação de agentes, a superlotação e, o mais grave, a ausência de ações socioeducativas. Diante da situação, o representante do Conanda afirma que “Pernambuco não tem sistema socioeducativo”. “Os reeducandos não vão à escola, porque não existem agentes suficientes para levá-los. Na verdade, não há sequer profissionais suficientes para contê-los”, frisou.

“É preciso dissociar a representação do agente da Funase do agente do sistema prisional, porque são coisas completamente diferentes”, defendeu Romero Silva, do Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares (Gajop). Nesse sentido, a presidente do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente (Cedca), Maria de Lourdes de Andrade, falou da necessidade de reordenamento do modelo arquitetônico das unidades: “Esses lugares mais parecem prisões. Difícil promover a ressocialização desse jeito”. Já Maria do Carmo Tabosa, representante da Defensoria Pública de Pernambuco, ressaltou a urgência do “fim da revista vexatória, por ferir a dignidade e coisificar o adolescente”.

Centrando seus comentários na natureza dos contratos dos agentes socioeducativos, o promotor da Infância e Juventude da Capital Josenildo da Costa afirmou que “é nisso que reside boa parte dos problemas da Funase”. “É um ato flagrantemente inconstitucional no Estado a contratação desses profissionais de forma temporária, em detrimento de criar o cargo dentro da administração”, analisou. “A pressuposição de que esses agentes vão cometer atos ilícitos e que, por isso, é melhor mantê-los sob um regime mais precário de contratação é um verdadeiro preconceito institucional”, completou.

Em defesa da categoria, o deputado Joel da Harpa (PROS) chamou a atenção para a especialidade do trabalho do agente socioeducativo. “Infelizmente, hoje, não estão qualificados para lidar com esses jovens.” Ele também cobrou a realização de concurso público. “Desde a época da Febem, não são realizadas seleções. A própria gratificação pela execução de trabalhos sob risco de vida, prevista na Lei Estadual nº 15.297/2014, não é cumprida”, criticou.

O secretário estadual de Desenvolvimento Social, Infância e Juventude, Isaltino Nascimento, pontuou que a Funase divide a responsabilidade com outros órgãos e não deve tratar sozinha desse tema. “A Funase não determina internação de ninguém, inclusive pareceres técnicos da fundação revelaram várias internações que não se justificavam. Tem interno na Funase por furto de celular”, afirmou. Nesse sentido, também cobrou dos municípios ações integradas que contribuam para evitar as infrações. O secretário trouxe, ainda, o dado de que a capacidade de internações das unidades está ultrapassada. “Só seria possível receber 702, mas temos 1146 jovens.”

Acerca das críticas, Isaltino avaliou que o sistema socioeducativo está funcionando no Estado. O secretário também destacou que “o governador Paulo Câmara tem feito grande esforço para garantir a ressocialização dos jovens”. Entre as ações estaduais com esse objetivo, ele citou o Projeto Cine Arte Social, que visa à implantação da cultura de paz. “Pernambuco foi, no dia 17 de julho, o primeiro Estado a ampliar o número de atendidos em programas de jovem aprendiz para socioeducandos e egressos. De lá para cá, já contabilizamos 40 jovens atuando com carteira assinada, o que contribui para melhorar a sua autoestima”, completou.

FUNASE – Pernambuco conta com 23 unidades da Funase, das quais oito são de internação. Somente no ano passado, 8.632 jovens ingressaram no sistema socioeducativo do Estado. O ato infracional com maior incidência entre eles é o roubo, responsável por quase metade das internações (44%), seguido de tráfico de entorpecente (22%), homicídio (9%) e tentativa de homicídio (4%).