
Parecer 686/2019
Texto Completo
PROPOSIÇÃO QUE DISPÕE SOBRE O USO DO NOME AFETIVO DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES QUE ESTEJAM SOB A TUTELA DE SUA FAMÍLIA ADOTIVA, NOS CADASTROS DE INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO, SAÚDE, CULTURA E LAZER E NAS HIPÓTESES QUE ESPECIFICA. MATÉRIA INSERTA NA ESFERA DE COMPETÊNCIA DOS ESTADOS-MEMBROS PARA LEGISLAR SOBRE PROTEÇÃO À INFÂNCIA E À JUVENTUDE (ART. 24, INCISO XV, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL). VIABILIDADE DA INICIATIVA PARLAMENTAR. COMPATIBILIDADE MATERIAL EM FACE DO ART. 227 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E DOS ARTS. 15, 17, 18 E 19 DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, E DO ARTIGO 3 DA CONVENÇÃO INTERNACIONAL SOBRE OS DIREITOS DA CRIANÇA (DECRETO 99.710/90) . INEXISTÊNCIA DE VÍCIOS DE INCONSTITUCIONALIDADE OU DE ILEGALIDADE. NECESSIDADE DE SUBSTITUTIVO PARA AFASTAR O USO NOS CASOS EM QUE HOUVER APELAÇÃO COM EFEITO SUSPENSIVO. PELA APROVAÇÃO, NOS TERMOS DO SUBSTITUTIVO DESTE COLEGIADO.
1. RELATÓRIO
Vem a esta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, para análise e emissão de parecer, o Projeto de Lei Ordinária nº 309/2019, de autoria do Deputado Isaltino Nascimento, que dispõe sobre o uso do nome afetivo de crianças e adolescentes que estejam sob a tutela de sua família adotiva, nos cadastros de instituições de educação, saúde, cultura e lazer e nas hipóteses que especifica.
Em síntese, a proposição determina que as instituições públicas ou privadas de educação, saúde, cultura e lazer, em atividade no Estado de Pernambuco, adotem em seus cadastros e registros o nome escolhido pela família adotiva, ainda que as sentenças de destituição do poder familiar e de adoção não tenham transitado em julgado. Além disso, a proposta prevê que o nome civil poderá ser utilizado apenas para fins administrativos internos.
O Projeto de Lei em referência tramita nesta Assembleia Legislativa pelo regime ordinário (art. 223, inciso III, Regimento Interno).
É o relatório.
2. PARECER DO RELATOR
A proposição vem arrimada no art. 19, caput, da Constituição Estadual e no art. 194, inciso I, do Regimento Interno desta Assembleia Legislativa.
Inicialmente, sob o aspecto formal, verifica-se que a matéria vertida no Projeto de Lei nº 309/2019 insere-se na esfera de competência legislativa concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal, conforme estabelece o art. 24, inciso XV, da Constituição Federal, in verbis:
Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
[...]
XV - proteção à infância e à juventude;
Outrossim, inexiste óbice à iniciativa parlamentar, pois a hipótese não se enquadra nas regras de atribuição privativa do Governador do Estado para deflagrar o processo legislativo, previstas no art. 19, § 1º, da Constituição do Estado de Pernambuco.
Por outro lado, em relação ao aspecto material, a proposta revela-se compatível com o dever imposto ao Estado e à sociedade para assegurar a dignidade e a plena convivência familiar e comunitária de crianças e adolescentes, linha do exposto no art. 227 da Carta Magna:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Do mesmo modo, a medida coaduna-se com diversos preceitos presentes na Lei Federal nº 8.069, de 13 de julho de 1990, que dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA, sobretudo em relação aos direitos que garantem o respeito e a identidade durante o processo de desenvolvimento da criança e do adolescente. Nesse sentido, transcrevem-se os seguintes dispositivos do ECA:
Art. 15. A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis.
Art. 17. O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, idéias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.
Art. 18. É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor.
Art. 19. É direito da criança e do adolescente ser criado e educado no seio de sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente que garanta seu desenvolvimento integral
No mesmo sentido é a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, internacionalizada no ordenamento brasileiro pelo Decreto nº 99.710, de 21 de novembro de 1990, que em seu artigo 3º prevê o seguinte:
“Artigo 3
1. Todas as ações relativas às crianças, levadas a efeito por instituições públicas ou privadas de bem estar social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar, primordialmente, o interesse maior da criança.
2. Os Estados Partes se comprometem a assegurar à criança a proteção e o cuidado que sejam necessários para seu bem-estar, levando em consideração os direitos e deveres de seus pais, tutores ou outras pessoas responsáveis por ela perante a lei e, com essa finalidade, tomarão todas as medidas legislativas e administrativas adequadas.
3. Os Estados Partes se certificarão de que as instituições, os serviços e os estabelecimentos encarregados do cuidado ou da proteção das crianças cumpram com os padrões estabelecidos pelas autoridades competentes, especialmente no que diz respeito à segurança e à saúde das crianças, ao número e à competência de seu pessoal e à existência de supervisão adequada.”
Desta forma, determinar que o nome afetivo da criança ou adolescente já passe a ser utilizado pelas instituições públicas e privadas a partir da sentença que defere a adoção coaduna-se com o Princípio da Proteção Integral e da Prioridade Absoluta da Criança, vetores constitucionais do tema, sobretudo porque, para que a sentença seja proferida é necessária a oitiva ou consentimento do adotando, conforme o caso, nos termos do artigo 28.
Inexiste, portanto, qualquer vício de inconstitucionalidade ou de ilegalidade que possa comprometer a validade do Projeto de Lei nº 309/2019.
No entanto, é imprescindível destacar que, em que pese a regra ser a apelação da sentença que defere a adoção ser recebida apenas com efeito devolutivo, há exceções em que esta será recebida com efeito suspensivo também. São os casos do artigo 199-A do ECA, abaixo transcrito:
“Art. 199-A. A sentença que deferir a adoção produz efeito desde logo, embora sujeita a apelação, que será recebida exclusivamente no efeito devolutivo, salvo se se tratar de adoção internacional ou se houver perigo de dano irreparável ou de difícil reparação ao adotando”
Desta feita, há de ser incluída no projeto de lei a ressalva expressa de que em situações tais (adoção internacional ou quando o juiz considerar que há perigo de dano irreparável ou de difícil reparação ao adotando), quando a apelação é dotada de efeito suspensivo, o nome afetivo ainda não pode ser utilizado, tendo em vista que a sentença que defere a adoção ainda não produz efeitos.
Por conseguinte, faz-se necessária a realização de alterações no texto da proposição com o intuito de adequá-la às regras da técnica legislativa e ao regime jurídico adotado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. Além disso, a fim de conferir maior efetividade, é pertinente a inclusão de dispositivos que tratem das sanções aplicáveis em caso de descumprimento da legislação.
Dessa forma, propõe-se a aprovação do seguinte substitutivo:
SUBSTITUTIVO Nº ___/2019, AO PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 309/2019
Altera integralmente a redação do Projeto de Lei Ordinária nº 309/2019.
Artigo Único. O Projeto de Lei Ordinária nº 309/2019 passa a ter a seguinte redação:
“Dispõe sobre o uso do nome afetivo de crianças e adolescentes que estejam sob a tutela de sua família adotiva, nos cadastros de instituições de educação, saúde, cultura e lazer e nas hipóteses que especifica.
Art. 1º As instituições públicas ou privadas de educação, saúde, cultura e lazer, em atividade no Estado de Pernambuco, deverão adotar em seus cadastros e registros o nome afetivo escolhido pela família adotiva, ainda que as sentenças de destituição do poder familiar e de adoção não tenham transitado em julgado, ressalvados os casos em que a apelação for recebida com efeito suspensivo, nos termos do artigo 199-A do Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA.
Parágrafo único. Para os fins desta Lei consideram-se:
I - instituições de educação: as creches e escolas públicas ou particulares;
II - instituições de saúde: unidades de saúde públicas ou privadas, bem como consultórios, clínicas e estabelecimentos similares; e
III - instituições de cultura e lazer: locais relacionados a atividades culturais ou de lazer para crianças e adolescentes, tais como clubes, colônias de férias, academias, dentre outros espaços direcionados a fins recreativos.
Art. 2º O nome afetivo é aquele que os responsáveis legais pela criança ou adolescente pretendem tornar definitivo quando das alterações da respectiva certidão de nascimento, utilizado ainda durante o processo de adoção, antes do trânsito em julgado das respectivas sentenças de destituição do poder familiar e de adoção,
Art. 3º Os registros dos sistemas de informação, de cadastros, de programas, de serviços, de fichas, de formulários, de prontuários e congêneres dos órgãos e das entidades descritas no art. 1º deverão conter o campo nome afetivo em destaque, acompanhado do nome civil, que será utilizado apenas para fins administrativos internos.
Art. 4º O descumprimento do disposto nesta Lei sujeitará o infrator, quando instituição de direito privado, às seguintes penalidades:
I - advertência, quando da primeira autuação da infração; e,
II - multa, quando da segunda autuação.
Parágrafo único. A multa prevista no inciso II deste artigo será fixada entre R$ 500,00 (quinhentos reais) e R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a depender do porte do empreendimento e das circunstâncias da infração, tendo seu valor atualizado pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo - IPCA, ou outro índice que venha substituí-lo.
Art. 5º O descumprimento dos dispositivos desta Lei pelas instituições públicas ensejará a responsabilização administrativa de seus dirigentes, em conformidade com a legislação aplicável.
Art. 6º Caberá ao Poder Executivo regulamentar a presente Lei em todos os aspectos necessários para a sua efetiva aplicação.
Art. 7º Esta Lei entra em vigor após decorridos 90 (noventa) dias de sua publicação oficial.”
Diante do exposto, opina-se pela aprovação do Projeto de Lei Ordinária nº 309/2019, de autoria do Deputado Isaltino Nascimento, nos termos do Substitutivo acima proposto.
É o Parecer do Relator.
3. CONCLUSÃO DA COMISSÃO
Tendo em vista as considerações expendidas pelo relator, a Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, por seus membros infra-assinados, opina pela aprovação do Projeto de Lei Ordinária nº 309/2019, de autoria do Deputado Isaltino Nascimento, nos termos do Substitutivo deste Colegiado.
Histórico