Trajetória de pernambucanos na Rio 2016 revela importância de políticas públicas para fomentar esportes menos populares

Em 30/09/2016 - 12:09
-A A+

REPRESENTAÇÃO – Pentatleta Yane Marques (acima) foi porta-bandeira do Brasil na cerimônia de abertura na Olimpíada. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil/Divulgação

Dos 462 atletas brasileiros que participaram dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, 16 eram pernambucanos – a maior representação que o Estado já teve nesse evento esportivo. O grupo não chegou a subir ao pódio na edição que marcou a melhor campanha do Brasil na história das Olimpíadas, com 19 medalhas, sete delas de ouro. No entanto, a exposição obtida por esses competidores nas 11 modalidades disputadas pode significar outra vitória: a criação de uma cultura esportiva mais diversa em Pernambuco.

Dentre as 13 mulheres e os três homens que representaram o Estado, vários protagonizaram histórias marcantes. Na abertura, a sertaneja Yane Marques, única latino-americana detentora de medalha olímpica no pentatlo moderno, carregou a bandeira à frente da delegação brasileira. As defesas de pênaltis da goleira Bárbara Micheline garantiram a vitória do time feminino de futebol nas quartas de final. Érica Sena conquistou um inédito sétimo lugar para o Brasil na prova de 20 km da marcha atlética, enquanto Wagner Domingos colocou o País na final da disputa do lançamento de martelo. Na natação, Etiene Medeiros foi à final dos 50m de nado livre e, aos 29 anos, a nadadora Joanna Maranhão chegou à sua quarta Olimpíada, nadando dois segundos abaixo do tempo que fez em Atenas 2004.

O secretário estadual de Turismo, Esporte e Lazer, Felipe Carreras, considera positiva a campanha. “Tanto os mais jovens quanto os mais experientes colocaram o nome do Estado em alta e nos presentearam com exemplos de espírito olímpico, respeito e disciplina”, avalia. “Temos que analisar os resultados de acordo com o contexto. As conquistas de Érica Sena e de Wagner Domingos, por exemplo, podem ser consideradas históricas por seu ineditismo.”

CONQUISTA – Érica Sena obteve inédito sétimo lugar na marcha atlética. Foto: Wagner Carmo/ CBAT/Divulgação

A marchadora Érica Sena chama atenção para a necessidade de se valorizar os atletas independentemente do resultado. “Na minha primeira disputa internacional, em 2010, fiquei em último lugar. Seis anos depois, melhorei meu tempo em mais de 15 minutos e me tornei recordista sulamericana”, conta a esportista, que descobriu a modalidade na escola em que estudava no município de Camaragibe, na Região Metropolitana do Recife, aos 11 anos. “Quero melhorar ainda mais e chegar aos Jogos de Tóquio em 2020”, planeja. Érica é uma das sete atletas pernambucanas beneficiadas atualmente pelo Programa Time PE, destinado aos destaques esportivos do Estado.

Yane Marques, Etiene Medeiros e Joanna Maranhão são outros nomes que recebem o apoio, assim como Teliana Pereira (tênis), Felipe Nascimento (pentatlo moderno) e Cisiane Dutra (marcha atlética), também participantes da Rio 2016. Entre os atletas paralímpicos, estão Jenifer Martins e Ana Cláudia Silva, do paratletismo, e Raimundo Nonato, do futebol de 5. No Time PE, os atletas são contemplados com um auxílio mensal de R$ 2,5 mil, enquanto os técnicos recebem R$ 1 mil, além de contarem com o custeio de passagens para eventos nacionais e internacionais.

Muitos competidores também são vinculados às Forças Armadas e a programas federais de auxílio aos esportistas, como o Bolsa Atleta e o Bolsa Pódio. Esse último, destinado àqueles com chances de medalhas, oferece benefícios de até R$ 15 mil. Pernambuco também tem um programa denominado Bolsa Atleta, direcionado a esportistas de alto nível. Mais ampla que o Time PE, a ação contempla 313 competidores de diversas modalidades, do nível estudantil (com bolsas de R$ 500) ao patamar olímpico (R$ 2,5 mil).

Para o presidente da Comissão de Esporte e Lazer da Alepe, deputado Beto Accioly (PSL), programas de incentivo são fundamentais. “Projetos nas escolas fortalecem o aprendizado e dão perspectiva aos nossos jovens”, acredita. O parlamentar cita outras ações do Governo estadual nesse sentido: o projeto Quadra Viva, de reestruturação dos ginásios poliesportivos das instituições de ensino; e o Ganhe o Mundo Esportivo, que possibilita intercâmbio internacional de treinamentos a alunos da rede estadual. “Assim, estudantes pernambucanos podem ter contato com centros de referência esportiva de diferentes lugares do mundo”, avalia.

MULHERES – Para Bárbara, Rio 2016 quebrou preconceito sobre futebol feminino. Foto: Rovena Rosa. Agência Brasil/Divulgação

Visibilidade – O futebol feminino brasileiro terminou a competição em quarto lugar e, embora não tenha sido o melhor resultado da seleção em Olimpíadas, a audiência das partidas chegou a superar a do time masculino no início do torneio. “A gente luta por uma visibilidade maior há muitos anos. A Copa do Brasil feminina ainda não tem transmissão pela TV, por exemplo”, comenta a goleira Bárbara, que foi revelada no Sport Clube do Recife. Ela também enfrenta a incerteza sobre o vínculo com a Confederação Brasileira de Futebol (CBF), que, em vez de fazer convocações, montou um time permanente para a Copa do Mundo de 2015 e para a Olimpíada de 2016. “Será difícil para jogadoras como eu, que estão sem clube.”

Apesar das ponderações, Bárbara tira uma lição da Rio 2016. “Essa campanha mostrou uma quebra importante do preconceito sobre o futebol feminino, que me afetou muito no começo da carreira”, acredita. Ela aponta caminhos: “os grande clubes deveriam ser obrigados a ter times femininos, e punidos se não o fizessem. Dessa forma, a gente seria mais respeitada.”

A trajetória de Yane Marques é outro exemplo de enriquecimento da cultura esportiva nos últimos anos. A medalha de bronze conquistada pela pentatleta na Olimpíada de Londres, em 2012, fez com que muitos brasileiros conhecessem a modalidade. “Minha carreira tomou uma proporção muito maior do que eu poderia imaginar. Comecei por acaso”, lembra a pernambucana, que ficou na 23ª colocação na Rio 2016.

Natural de Afogados da Ingazeira, Yane foi descoberta em 2003 no biatlo (corrida e natação) e depois chegou ao pentatlo moderno, modalidade que reúne os atributos ideais de um soldado do início do século XX, com competições de esgrima, natação, hipismo, tiro e corrida. “Minha equipe técnica de pentatlo sempre foi militar. Ao entrar para o Exército, em 2009, a única mudança foi que passei a vestir o mesmo uniforme que os meus treinadores”, conta, referindo-se ao Programa de Atletas de Alto Rendimento, criado em 2008 por meio de uma parceria entre os ministérios da Defesa e do Esporte.

Aos 32 anos, Yane diz que ainda vai competir em 2017 e, então, pensar em chegar a uma quarta Olimpíada. Para a veterana, a importância do trabalho de base vai além da formação de novos atletas. “Levar diferentes modalidades para crianças e adolescentes é também uma ferramenta de educação e de criação de oportunidades”, ressalta. Atualmente, Pernambuco, São Paulo e Rio de Janeiro são os únicos estados do País a contar com o projeto de revelação de novos talentos da Confederação Brasileira de Pentatlo Moderno, o PentaJovem. “Com esse trabalho, nosso Estado tem hoje os três primeiros lugares do ranking brasileiro feminino da modalidade”, comemora Yane.